quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Pirilampo, um Beija Flor no verde Vale de Nagoya.


Acalma-te e serve.
Não fizeste o Sol que te ilumina.
Não fabricaste o ar que respiras.
Não criaste o solo em que te apóias.
Não teceste a vestimenta das flores que te rodeiam.
Não pares de trabalhar.
A vida te pede o bem que se te faça possível.
O impossível virá de Deus.

Lendas Escoteiras.
Pirilampo, um Beija Flor no verde Vale de Nagoya.

        Não faz muito tempo quem sabe uns trinta ou quarenta anos. Já não era mocinho e meus anos ultrapassavam as trinta primaveras. Éramos mais de doze e menos de quinze. A quantidade não lembro-me bem. Foi até um acampamento gostoso, só de chefes. Tinhamos feitos outros e não pertencíamos ao mesmo grupo e isto nada significava para a fraternidade e irmandade que existia entre nós. Programa? Duas patrulhas, dois compôs, trabalhando e se divertindo com seus patrulheiros. Eu era um Guanambi, e quando me disseram o que era fiquei perplexo – Chefe, Guanambi é um beija-flor! Tudo bem, eu admirava os pequenos voadores a procura de seu néctar das flores. Eles entre os pássaros poderiam ser considerados príncipes ou quem sabe Reis? Sabia que tinham todas as cores e nunca parei para observar melhor. Onde estávamos acampados uma calma enorme se fazia acontecer no campo. Uma gostosa passarada a cantar seus cantos maravilhosos, o som intermitente de uma pequena cascata, grilos que anunciavam tempo bom e formigas indo e vindo sem pressa com suas cargas enormes.

           As noites para nós eram belas. Não havia pressa para nada, que o jantar ficasse pronto quando estivesse pronto. O banho da tarde no pequeno remanso refrescou o corpo de tanto sol que pegamos, só por tentar se aproximar pé ante pé de um esquilo. Não dava para mexer e o suor corria naquele sol escaldante das três horas da tarde. Um jantar supimpa e aos poucos os chefes iam chegando na Pedra do Conselho, nome pomposo que dávamos a conversa ao pé do fogo. Um nome roubado dos lobos, mas que seria devolvido tão logo o acampamento terminasse. O Cantor logo deu o ar da graça. Terra do Belo Olmeiro. Linda canção dos caçadores de pele dos lagos canadenses. – ¶“Terra do belo olmeiro, lar do castor, lá onde o alce airoso é o senhor”... Uma letra de tirar o folego. Alguém contou uma piada. Uma piada Escoteira. Ali a pureza nos pensamentos palavras e ações tinham seu lugar ao sol, ou melhor, à noite.

           O bule de café e outro de chá a beira do fogo tinha visitantes frequentes. Todos nós esperávamos que  Cabelos Vermelhos pedisse a palavra. Alto, forte nós sabíamos que ele sempre tinha uma bela história para contar. – Ficou em pé, olhou para o céu, sentou novamente e com uma voz clara começou mais uma bela história para nosso deleite. - Era uma vez... Há muito tempo, eu era menino de calças curtas e recém admitido na tropa. – Cada um de nós nos refestelamos no banco tosco e nenhum som mais se ouviu a não ser o crepitar do fogo e olhar pequenas fagulhas dengosas a subir aos céus. A voz de Cabelos Vermelhos era sonhadora, ele sabia como contar uma história. A principio sentado, mas a gente já sabia que ele ia ficar em pé, ia gesticular pular e cantar. Era seu dom. ele sim era um contador de histórias. – Naquela época, dizia Cabelos Vermelhos a nossa inocência, o nosso amor e a fraternidade nos dava oportunidade de conviver com os animais com os pássaros e até os repteis eram nossos amigos.

                  Nos preparamos para mais um acampamento de verão. Dizem que no verão as chuvas caem mais forte, mas nós não nos importávamos. Não foi Edson quem disse que tudo passa, a chuva passa, tempestades passam. Até furacão passa difícil é saber o que sobra? Sabe amigos, nos amávamos a chuva. Dizíamos para nós mesmos que não importa a chuva que cai... Pois após as tempestades eu tenho encontros com o sol! Nossos preparativos foram rapidamente realizados. Em uma bela manhã partimos rumo ao verde Vale de Nagoya. Era um dos vales mais lindos que conhecíamos. Era lá que o sol quando nascia nos dava um sorriso e quando se ponha deixava escrito no céu – Que a lua e as estrelas cuidem de vocês como eu cuidei. Não choveu a não ser uma pequena garoa no terceiro dia. O nosso programa nos dava tempo para belas construções e explorações de grutas que lá havia as dezenas.

                   Foi em uma tarde bolorenta, daquelas que dá vontade de cochilar e não acordar que vi um Beija Flor em cima da mesa do refeitório. Semblante triste asa caída me olhou choroso e disse – Olá Escoteiro, foi bom ver vocês. Estou partindo do Vale de Nagoya aqui nunca mais voltarei. – Olhei espantado para o Beija Flor e sem precisar perguntar ele continuou. Meu nome? Pirilampo. No passado diziam que eu tinha luzes que piscavam que eu levava o sorriso aos meus irmãos. Hoje Escoteiro, hoje não sou nada aqui neste vale que um dia foi florido e hoje não é mais. Vou as escarpas, voo rasante pelas cascatas no vale, tento subir mais alto para descobrir flores que agora não existem mais. Você meu amigo Escoteiro sabe como somos. Temos o dom de voar em marcha-ré e de permanecer imóveis no ar. Você sabe que podemos voar a velocidade do som e que adianta tudo isto?

                   Olhei o Pirilampo e não disse nada. A patrulha já tinha observado que o Vale de Nagoya já não era mais o mesmo. As flores desapareceram com as queimadas dos sitiantes, onde havia um bosque com uma nascente cristalina desapareceu. As árvores eram vendidas pelo melhor preço para servirem de carvão e nas usinas siderúrgicas produzirem o ferro ou o aço para as máquinas infernais. Vi nos olhos de Pirilampo pequenas gotas de lágrimas que caiam. – Pois é Escoteiro, os sitiantes acreditam que nós somos anjos, que podemos voar em suas terras, que nosso néctar nunca ia se acabar. Eles mesmos inventaram o meio de nos dar água com açúcar como isto fosse substituir nosso néctar. Eles não sabem que quando o sol esquenta fermenta a água açucarada e ela tem nos feito tanto mal que alguns de nós morremos em poucos dias.

              Tenho de partir, meus irmãos já foram. Eu sou o último beija flor do Vale de Nagoya. Não sei se aqui voltaremos, pois acredito que o Vale de Nagoya se foi para sempre. Não queria ir sem me despedir de vocês. A vida aqui no vale me ensinou a dizer adeus às pessoas que tenho amizades e vocês ficarão para sempre em meu coração. Adeus Escoteiro, que as gotas de chuva de hoje possam lavar os pensamentos ruins e alegrar os olhos de vocês para sonhar com um futuro, um Vale de Nagoya novamente seja um vale florido, cheio de Beijas  Flores no céu. Pirilampo levantou voo e se foi. Não deu uma revoada em cima do nosso campo de patrulha. Partiu como se quisesse esquecer aquele vale de agora e lembrar sempre como foi em um passado distante.

                 Cabelos Vermelhos se calou. Todos nós estávamos calados. Não havia o que dizer. Alguém com os olhos vermelhos perguntou – E aí Cabelos Vermelhos, como é hoje o Vale de Nagoya? – Aquele Chefe contador de histórias nos olhou, fechou os olhos e disse: - O homem destrói a natureza na justificativa de sobreviver, a natureza luta para sobreviver, para garantir a sobrevivência do homem!

"Afogue a tristeza nas ondas da alegria;
Enxugue as lágrimas no manto do sol e faça brilhar um sorriso nos lábios.

 A boca que vive a chorar desaprende a sorrir.”.

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Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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