quinta-feira, 10 de março de 2016

A lenda de Tiger Joy, o pássaro preto cantador.


Lendas Escoteiras.
A lenda de Tiger Joy, o pássaro preto cantador.

“Tudo em vorta é só beleza sol de abril e a mata em frô
Mas assum preto, cego dos óio não vendo a luz, ai, canta de dor.
Tarvez por ignorança ou mardade das pió
furaro os óio do assum preto para ele assim, ai, cantá mió”.

             Zito Francesco era um bom Escoteiro. Não era faroleiro e nem mal educado. Almoxarife na Patrulha Gralha ele fez história. Uma história que até hoje é contada pelos Escoteiros do sertão do Piaui. Poderia dizer que Zito Francesco era um cavalheiro de maneira tal que alguns se incomodavam. Mas ele tinha um defeito, defeito que muitos jovens ainda não aprenderam que fazer o bem sem olhar a quem é vida dentro do Espírito Escoteiro. Seu hobby favorito era ouvir o cantar dos pássaros. Sabia de cor e salteado quando algum cantava. Era comum a patrulha em reunião ou em marcha de estrada ele parar e dizer: - Parem! Ouçam, é um Rouxinol da montanha! Todos já conheciam os pássaros cantores por causa de Zito Francesco. Podia ser um Uirapuru, um Rouxinol, um Curió, um Sabiá Laranjeira ou um Pintassilgo. Ficou dois dias na Mata do Roncador a procura de um Inhapim, que muitos diziam estar em extinção. Depois foi para a Mata do Azulão e ficou lá dez dias só para ouvir o Tuiuiú cantar.

            Era amado pela tropa, pelos chefes e em seu lar. Seus pais sentiam uma vibração boa quando estava à família toda reunida. Não foi um Escoteiro que fez carreira. Mal chegou a Segunda Classe. Poucas especialidades. O cantar dos pássaros o prendiam mais que o sonho de ser um Correia de Mateiro ou mesmo um Cordão Dourado. A vida ia passando, as chuvas de verão chegaram e os acampamentos diminuíram de intensidade. Zito Francesco não se incomodava. Ele tinha aonde ir e viver seu sonho aventureiro. Gostava da chuva, e elas lhe faziam muito bem, pois ele sabia que nas chuvas de verão ao aproximar-se a primavera era a época das falas novas, onde os pássaros cantavam melhor. Ninguém se preocupava quando ele passava de mochila e Chapelão, com a borrasca no seu auge em direção a Mata do Jaú. Sabiam que dois ou três dias depois ele voltava sorrindo, cantando baixinho a imitar seu pássaro preferido.

             A história do acontecido é difícil de explicar. Juan Maneco seu Monitor o ouviu contou que ao passar em frente à Barbearia do Fagundes uma das poucas existentes em Barra Vermelha, viu uma aglomeração de gente na porta. Fizeram silêncio e ele ouviu o canto triste de um Pássaro Preto. Triste, choroso, aflito em sua gaiola azul a olhar para o nada. Zito Francesco viu os seus olhos opacos, sem destino, com dois buracos negros como se tivesse sido furados, sem olhar para ninguém. Ele estava cego. Seus olhos ficaram marejados de lágrimas. Era penoso, era angustiante ver que existia alguém capaz de furar os olhos de um lindo pássaro como aquele só para vê-lo cantar diferente. Zito Francesco não ficou ali a ouvir o cantar do Pássaro Preto. Foi para casa penalizado e chorou noites seguidas. Ficou dias sem falar com ninguém. Na reunião do sábado todos estranharam sua tristeza. – O que foi Zito? Ele não disse nada. Se coração estava machucado. Para ele era uma maldade tão cruel como matar alguém.

             Seu Chefe lhe disse um dia que matar alguém é tirar tudo que ele tem e o que ele poderia ter um dia. O Pássaro Preto perdeu tudo que tinha ao perder a visão e nunca mais teria nada na vida. Seu cantar era para lembrar o tempo que viveu a voar pelos céus. Uma tarde a mãe de Zito Francesco foi à casa do Monitor de sua patrulha a procura dele. – Não sei Dona Mercedes. Ela procurou o Delegado Tonhão. Cidade pequena impossível sumir assim. Uma semana, um mês, dois três. Zito Francesco o Escoteiro nunca mais apareceu. Quem sabe estaria ligado ao sumiço do Pássaro Preto do Barbeiro Tobias? Ninguém sabia explicar. O pássaro desaparecera da noite para o dia de sua gaiola azul. Enfim a vida passa, as nuvens passam, e as histórias continuam a ser contadas. Muitos juraram que o viram com o Pássaro Preto na Floresta Negra. Reviraram a floresta e nada. Outros estranharam porque uma nuvem de pássaros pretos saia pela manhã e voltava à tarde para a Floresta Negra. À noite ninguém se arriscava a entrar lá. Histórias, ah! Quantas histórias fizeram de Zito Francesco.

              Uma tarde de outono a patrulha Pico da Neblina passou Barra Vermelha. Iam para Ventos do Sul no dia seguinte. Iam acampar com um Grupo Escoteiro estava iniciando. Ficaram uma noite na cidade. Em uma gostosa Conversa ao Pé do fogo na sede do grupo causos e causos foram contados. São coisas de Escoteiros quando se encontram e matam saudades para ficar na memória para sempre. Foi Neco Sartano Sub Monitor da Gralha quem contou a história de Zito Francesco. Fazia dois anos que ele sumira. Ninguém nunca mais ouviu falar nele e os poucos que o viram disseram que era um fantasma da Floresta Negra. A conversa foi até lá pelas tantas. Dormiram no salão da sede. Bem de madrugada partiram. A patrulha tinha decidido que não podiam partir sem antes saber o que aconteceu lá na Floresta Negra.

              Tinham tempo. Jornada de doze dias perder mais dois ou três dias não iria fazer falta. Partiram cedo. Tralhas amarradas nas bicicletas e partiram. Logo após o Morro do Sultão avistaram a Floresta Negra. Não era grande, mas era linda. Montaram um acampamento na clareira do Sargaço. Era notável o silencio da floresta e nenhum cantar dos pássaros nativos. Quando a noite chegou ouviram um pio angustiado de um Pássaro Preto. Choroso, plangente e tristonho se fez ouvir. Ficaram estáticos. Ninguém falava nada. Milhares de pássaros pretos começaram a cantar acompanhando a melodia triste de quem já não enxergava mais. Um brilho azul reluziu no meio da floresta. Viram um vulto Escoteiro, perdido nas sombras da noite e um choro convulsivo. Se era Zito Francesco ninguém soube. Assim como chegou partiu adentro da Floresta Negra. O silêncio se fez novamente. A Floresta parecia mergulhar numa mudez penosa e triste. Alguns segundos depois só um pássaro se fez ouvir. Tinha que ser o Tuiuiú com sua melodia majestosa. Uma calma gostosa voltou a vibrar naquela noite sem luar, mas com lindas estrelas no céu.


              Dormiram sem sobressaltos e pela manhã partiram. Foi uma noite que ninguém naquela patrulha nunca mais esqueceu. Viram que a tristeza foi substituída pelo cantar da floresta e de um lindo pássaro que quando canta fica preso na garganta de quem pode ouvir e sentir uma felicidade intensa. Antes de partir fizeram uma oração para Zito Francesco. Não se esqueceram de Tiger Joy o pássaro Preto cego pela maldade dos homens. Quem sabe ele devia ter nascido soturno, calado sem voz e assim estaria hoje vendo a natureza em flor, vendo o desabrochar da Primavera, ou até mesmo um outono suave ou um verão que poderia voar pelos campos verdes onde os pássaros voam ao sabor do vento como se fossem entes mágicos a trazer para os homens o que eles ainda não têm: A melodia suave, a paz e amor no coração!  

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Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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