quinta-feira, 14 de julho de 2016

Um lugar chamado Felicidade.


Lendas Escoteiras.
Um lugar chamado Felicidade.

                  Era uma vez uma cidade chamada Felicidade. Uma cidade pequena quem sabe um arraial crescido com seus cinco mil habitantes. Ouve uma época que todos dariam tudo para mudar para lá, pois era o lugar onde existia o sorriso, a alegria, onde o sol tinha mais fulgor e a lua era incrivelmente linda nas noites de lua cheia. Não havia ricos e nem pobres, todas as casas eram iguais. Ninguém queria ser mais que o outro e onde a cadeia não tinha celas nem presos. Não havia carros buzinando, as pessoas não brigavam, as ruas eram limpas, pois cada cidadão fazia questão de limpar a área de sua morada. Dava gosto ver as crianças correndo pelas praças, indo para seu único colégio onde as professoras sempre tinham um sorriso em primeiro lugar. As casas não tinham grandes e as portas e janelas sempre abertas. À tardinha os casais namoram na mais completa felicidade de alguém que ama e sabe que é amado.

                Felicidade tinha algum muito importante que não sei se sim ou se não dava alma ao lugar. Não era o Cabo Damião que nunca prendeu ninguém e nem mesmo o Prefeito Nolasco que nunca deu golpe e nunca roubou nada que a prefeitura com seus parcos recursos recebiam. Não foi o Juiz Tião, que desistiu e foi embora do lugar por não ter ninguém para julgar. Dom Pedrito o vigário vinha sempre às quartas feiras rezar uma missa e a pequena capela quase não cabia seus fieis que ali nunca faltaram para dar graças a Deus. A população tinha alegria no coração, pois Toledo criou os escoteiros. Era belo vê-los passar. Com suas mochilas as costas, um chapelão escondendo a chumaça dos cabelos, um meião cortante até o joelho e a calça curta fazendo às vezes do sonho de seu criador do outro lado do oceano.

                   Era tudo perfeito. Escoteiros cantantes, sorridentes e a chumaça da patuleia sabia que seus jovens meninos tinham conquistado o que toda cidade sonhava: - A honra, a palavra, a ética e o respeito para ser respeitado. Quando pela primeira vez juraram a bandeira não faltou ninguém do lugar para assistir. Foi no Campo do Peroba Futebol Clube. Montaram um palanque e lá estava Dom Pedrito o vigário, o Cabo Damião, o Juiz Tião e o Prefeito Nolasco. Não faltou dona Cacilda a professora e claro Toledo o Chefe envergado no seu caqui descomunal como se fosse um exemplo para aquele povo feliz que tudo ia durar para sempre. Foi belo, foi lindo, meninos dando continência, levando a mão direita até o ombro de dizendo que iriam fazer um novo Brasil. Durante anos a cria escoteira cresceu. Mas tudo que é bom dura pouco. Uma doença mortal levou para a eternidade o Chefe Nolasco. Tristeza, choro, desânimo, melancolia e desalento por parte de todos.

                     Chefe Toledo cometeu um erro tremendo. Não preparou ninguém para um possivel afastamento seu. Era Chefe da Tropa, da Alcatéia e fazia às vezes da Diretoria. Poderia ter convidado, mas se sentiu possuído pela divindade e pensou que era um Deus Escoteiro. Morreu e ninguém para ficar no seu lugar. A cidade não sabia o que fazer. Reuniões aconteciam. O prefeito imperfeito nesta hora não tinha a menor ideia para que o grupo não acabasse no ostracismo. Seria fácil buscar ajuda, mas ninguém sabia que havia alguém em outra cidade que poderia ajudar. Ninguem entendia nada e sabiam que eles corriam para o campo, cantavam, brincavam de esconde, esconde onde sempre havia um pega de soldados contra índios. Alguns chegaram a ver patrulhas correndo nas matas, construindo pontes, casas, ninhos trinchados no alto das árvores.

                      Tudo escorregou entre os dedos. O último pingo do suor caiu e ninguém sabe onde, pois ninguém viu. Tudo acabou? Virou fumaça? A tristeza invadiu o lugar. Onde procurar ajuda? O tempo passou. A cidade triste acabrunhada. A meninada esqueceu seus folguedos na patrulha, esqueceu-se do sol da lua e das estrelas nas noites lindas de fogo de conselho onde eles cantavam e riam sem parar. Para-raios passou por Felicidade em uma noite de natal. Precisava descansar. Viajava há dias no seu Cavalo Trombone procurando uma fazenda para comprar. Ficou sabendo que dona Chiquitita pôs a venda sua casinha atrás do Armazém das flores. Lá tinha de tudo. Seu Pascoal alma sofrida ajudava no que podia a quem não podia pagar. Para-Raios ficou sócio de Seu Pascoal. Comprou um pequeno sitio na Nascente do Rio Florido. Pensou que agora tinha um lugar para morar e morrer. Seu passado se foi, importava só o presente.

                      Na porta do armazém via todos os sábados dois meninos escoteiros andando devagar, mochilas as costas, mas iam até a praça para sentar e chorar. – O que é isto meu Deus? – pensou. Foi até eles. Uma conversa amena, um sorriso breve, um aperto de mão e ele voltou para casa pensando em voltar. Ali precisam dele, e ele não podia faltar. Não seria como em São Domingos, onde a chefia do grupo não se entendia, onde só havia ódio em vez de amor. Tentou mudar, deu tudo que podia, mas nada conseguiu. Meninos iam e vinham nunca querendo ficar. Ele um antigo Escoteiro sabia que ali não era mais o seu lugar. Foi com os dois meninos escoteiros até a sede. Um abraço uma promessa. Os três hastearam a bandeira Nacional. Muitos curiosos aportaram para ver o acontecimento.

                       Ah! Ainda existe neste mundo um lugar chamado felicidade. A cidade voltou ao passado. Os sorrisos, os abraços e apertos de mão agora fazia parte da rotina do lugar. O Prefeito Nolasco sorria de orelha a orelha. Dom Pedrito rezou naquela tarde a missa mais linda que tinha rezado. O Cabo Damião suspirou e soltou Bate Boca o bêbado que prendeu na noite anterior. O Juiz Tião retornou e Dona Cacilda suspirou fundo, pois sabia que agora a meninada da escola tinha juízo, pois Escoteiro é assim, sabe obedecer, tem disciplina e sabe opinar. Ainda me lembro quando naquela final de sexta, Vinte e oito meninos escoteiros passaram marchando, envergando garbosamente seus uniformes com belos chapéus escoteiros rumo a Salamanca, um vale perto do Riacho das Flores onde iam acampar.


                  Era uma vez uma cidade chamada Felicidade. Um lugar lindo, desses que qualquer um de nós gostaria de morar. Não tinha rico remediado ou pobre. Não tinha mansão nem favela. Os burricos que pastavam na praça não faziam dela seu lugar especial. As pessoas não brigavam. Havia um sorriso em qualquer dos seus habitantes. As pequenas casas eram pintadas de branco, com portas e janelas azuis da cor do céu. Todas tinham lindas tulipas, rosas vermelhas, brancas, gardênias, Jasmim, Dama da Noite e tantas que até esqueço de contar. As janelas e portas estavam sempre abertas e o melhor de tudo, havia escoteiros que todas as tardes iam a praça para contar histórias e cantar. Duvida? Um dia levarei você até lá e vai admirar uma cidade chamada Felicidade!

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