segunda-feira, 6 de março de 2017

A vida não sorriu para mim.


Lendas Escoteiras.
A vida não sorriu para mim.

                 Seus olhos brilhavam. Saudades demais. Ali no alto do Morro da Morena Matias chorou. Uma vibração incrível em todo o seu corpo. Lembranças chegavam aos borbotões, saudades machucavam e seus olhos molhados estavam fixos no passado que não voltaria mais. Viu no horizonte o rosto de cada um dos seus companheiros de Patrulha. Belardo bonachão sorrindo, Juliano Palito sempre a contar uma anedota, Valério o Sub. querendo ser sério e explodindo em gargalhadas das piadas de Juliano, Moralto o cozinheiro sempre a inventar uma comida qualquer quando faltava tudo na intendência. Jânio Mosca o Monitor, imitando o capitão Nonato do Tiro de Guerra e Dirceu que sempre calado e calado ficou quando deixou a terra pelo céu.

               Sabia que corria risco em voltar no Morro da Morena. Sabia que o Doutor Moura nunca iria perdoá-lo e moveu céus e terra para encontrá-lo. Seu futuro era longe de Lagoa da Prata. Ali nasceu ali fez amigos e ali aprendeu a filosofia escoteira que só meninos apaixonados pelo escotismo podem ter. Que idéia foi aquela de fugir com Maria Antônia? Ela jurava que o amava e ele não queria ficar longe dela. Se o pai dela o Doutor Moura não entendia o melhor era fugirem para longe onde viveriam felizes para sempre. Na patrulha todos diziam que ele não podia fugir, não tinha nada, apenas quatorze anos e seus pais uns pobres coitados que viviam de salário mínimo. Conselhos vem e vão. Com sua mochila e um saco de linhagem pegou tudo que tinha e na estrada do Calando encontrou Maria Antônia que acreditava poder ser feliz ao seu lado. 

                Foram quatro dias de sonhos. A fome, a intempérie e o medo mostrou que a realidade era bem diferente de seus sonhos. Maria Antônia sempre a chorar. À tardinha Bebum o pistoleiro do Doutor Moura os encontrou. Levou uma surra tão grande que o deixaram na beira da estrada quase morto. Matias pensou que era um Escoteiro aventureiro, daqueles audazes das histórias dos famosos Bandeirantes que desbravaram as terras do Brasil. Sonhava em ser um Fernão Dias, um Borba Gato, um Antonio Raposo ou mesmo um Manoel Preto. Se Caio Vianna Martins andou com suas próprias pernas ele também poderia andar. Curou-se com ervas do mato, sozinho e perdido chegou a Belém. Pensou que agora era um anjo e foi encontrar o pequeno mestre que iria nascer em um pequeno celeiro naquela cidade imortal. Natal? Dezembro? Sua mente fervilhava.

                Um carro preto parou perto dele e jogou uma sacola cheia de dinheiro. Matias sorriu. Um milagre pensou. Estava na cidade do Senhor todo Poderoso e ele podia tudo. Viu que era uma bolada. Não notou um carro da polícia chegando. Foi acusado e preso apesar de sua pouca idade. Apanhou por uma semana para confessar o que não sabia. Viu chegando através das grades da cela um Chefe Escoteiro. Com dificuldade levantou e disse: - Sempre Alerta! O Chefe Portal era tenente. Chefe Escoteiro amava o escotismo com todo amor do seu coração. Olhou para Matias. Mandou levá-lo a sua sala. Ouviu sua história. O levou para um Quarto que tinha na Sede e que servia para os escoteiros visitantes.

                  Ficou nove meses com eles. Escoteirou, cantou, brincou, participou da Tigre e acampou no Vale da Coruja. Um dia pensou que era hora de voltar. Chefe Portal não achou boa ideia. Teimoso queria rever os velhos amigos de patrulha, seu pai sua mãe e nem pensava mais em Maria Antônia. Aquele amor acabou para sempre. A patrulha e o Chefe Portal fizeram uma vaquinha e lhe deram uma bicicleta usada. Partiu como se fosse retornar ao céu azul que sempre foi dele. Antes de entrar na cidade subiu ao Morro da Morena. Tinha belas lembranças. Sentiu um silvo cortando o ar que nem imaginou o que era. Uma mordida no ombro. A bala entrou por trás no coração e saiu na frente do seu peito. Caiu morto. Quem atirou era um perfeito pistoleiro.


                 Abriu os olhos e viu Dirceu junto a outros meninos de uniforme. Estava em casa de novo. Se juntou a eles e partiram rumo a um acampamento nas Luzes brilhantes de Antares na constelação de Scorpions. Nem pensou que agora estava morto. Fora Escoteiro na terra e conseguiu no céu continuar Escoteiro. Não perguntou pela patrulha da terra, não perguntou como estavam seu pai e sua mãe. Seguiu Dirceu que agora era seu novo líder e monitor. Só ficou sabendo que sua promessa feita na terra também valia no céu. Sorriu para Dirceu e os demais patrulheiros. Pegou seu bastão colocou seu chapéu e cantou o Rataplã quando pegaram uma carona na cauda do Cometa Hyakutake. Sorriu para sua nova patrulha e seus novos amigos meninos de todas as nações que ali se encontraram para na eternidade serem fraternos para todo o sempre!     

           Uma das coisas mais belas da vida é olhar para o céu, contemplar uma estrela e imaginar que muito distante existe alguém olhando para o mesmo céu, contemplando a mesma estrela e murmurando baixinho: "Que Saudade"!

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

Bem vindo ao Blog As mais lindas historias escoteiras. Centenas delas, histórias, contos lendas que você ainda não conhecia....