sexta-feira, 8 de setembro de 2017

Minha maior amiga foi uma Coruja.


Crônica de um Velho Chefe Escoteiro.
Minha maior amiga foi uma Coruja.

                       Eu conheci uma Coruja. Por favor, não riam de mim. Não foi uma coruja qualquer. Imagine, ela me olhando e eu olhando para ela e pam! Surgiu uma amizade eterna. Eu era amigo de uma Coruja. Alguém já foi amigo de uma Coruja? Eu fui e sou. Ela me disse um dia que apesar de ser um menino e ela uma ave, ela nos considerava irmãos! Podem acreditar, pois eu acreditei! Eu tenho certeza do dia que surgiu a maior amizade que já encontrei em minha vida.  Faz tempo. Muito tempo. Quem sabe mais de sessenta anos? Sim, acho que foi isso mesmo.

                       Tudo começou em uma floresta densa, fumacenta, mas gostosamente adorável. Difícil para caminhar, abrindo caminhos entre espinhos com meu bastão, usando uma bússola Silva velha de guerra, pele queimada, braços e pernas arranhadas, alguns profundos com sangue ao redor. Quem disse que paramos? Quem disse que voltamos ou desistimos? Nunca! Escoteiros não desistem! Ela me disse que nos acompanhava de longe. Disse que não sentiu pena de mim. Não gostava de meninos. Eles eram malvados. Jogavam pedras. Disse que não viu meu rosto. Disse que o chapelão de três bicos atrapalhava.

                      Quando a vi pela primeira vez foi na clareira que fizemos. Difícil. Um matagal imenso. Não foi em um Fogo de Conselho. Não foi não. Lembro que fizemos um “foguito” pequeno, a clareira amarelou. Apenas uma “Conversa ao pé do Fogo”. Canções, “causos”, planos de jornada, gargalhadas coisas de escoteiros. Não vi as estrelas. As árvores não deixavam. Não havia lua. Escuro. Muito escuro. Apenas nosso lampião vermelho a querosene com seu lusco fusco brilhava.

                      Teve um momento sublime. Isto sempre acontece quando escoteiros estão em reunião em plena floresta. Um silêncio se fez. Segundos que só se ouvia os grilos zumbindo. Ela para chamar a atenção crocitava baixinho, e me olhava com seus olhos negros profundos como se fosse me hipnotizar. Ninguém viu. Só eu. Todos foram dormir. Estavam cansados e eu também. A Coruja fez um sinal como se eu devesse ficar ali. Todos foram e eu fiquei. O silêncio continuou a tomar conta da floresta. Nem os grilos zumbiam mais. Vi alguns vagalumes ao lado da Coruja. Pareciam ser seus olhos noturnos a mostrar o caminho.

                      Senti seu peso nos ombros quando ela pousou. Olhava para mim. Não piscou. Não sabia o que fazer. Dizem que na floresta as corujas são sábias, todos a procuram para aconselhar. Uma vez disseram que era o símbolo da deusa Atena. Ela a chamava de Olhos Brilhantes. Contaram-me que uma Sociedade Secreta de nome Bohemian Clube onde anualmente se encontravam só os poderosos eram convidados. Dizem que a reunião era em uma floresta ao norte de São Francisco, e ficavam em volta de uma grande pedra talhada como se fosse uma coruja. Escreveram em baixo: “Weaving dealing spiders come not here”. Parece que vem a ser uma frase de Shakespeare que significava: “Deixe seus negócios sujos na porta”. Dizem que poucos contam até hoje o segredo da cerimônia. Quem contou morreu de morte misteriosa.

                      Mas isto não importa. Importa a amizade que fiz com a Coruja. Quantas coisas belas naquela noite eu e ela conversamos. Eu contei minha vida de menino para ela. Ela me olhava e não piscava. A melhor ouvinte que já tive. Perguntei a ela se era uma ave de mau agouro. Ela riu. Quem sabe? Quem sabe? Disse. Mas olhe retrucou, quando tem uma festa no céu ou aqui na floresta eu pio e canto sem parar. Ela me disse que sabia canções Escoteiras. Ri baixinho. Não acreditas? E começou a cantar A Arvore da Montanha. Cantava com uma voz linda. Cantou outras.

                      Notei que o por do sol aparecia através das árvores. Notei que eu tinha esquecido de tudo a minha volta. Até o orvalho da madrugada não o senti no rosto. Ela me olhou. Passamos uma bela noite juntos. Noite inesquecível. Impossível ter outra como aquela. Ela disse – Adeus! Porque perguntei? Nunca mais voltarei. Dizem que entre nós quem conversa com meninos é condenada ao exílio. – Venha comigo então! Venha morar comigo! Eu levo você para a cidade! Fica na minha casa. Lá tem um pé de Jacarandá lindo!  Não posso ela disse e voou entre os galhos negros e a folhagem espessa para nunca mais voltar!
             
                       Eu conheci uma Coruja. Não foi uma Coruja qualquer. Imagine, ela me olhando e eu olhando para ela e pam! Surgiu uma amizade eterna. Eu era amigo de uma Coruja. Alguém já foi amigo de uma Coruja? Eu fui e sou. Ela me disse um dia que apesar de ser um menino e ela uma ave, ela nos considerava irmãos! E acreditem! Eu acreditei! Pena que ela se foi e eu me fui também. Nunca mais voltei naquela floresta. Não sei se ela já morreu se está no exílio. Eu? Estou aqui. Sempre me lembrando daquela noite que conheci uma Coruja de Olhos Brilhantes. Apenas uma noite. Noite que nunca mais irei esquecer...

Nota de rodapé - “O espírito da coruja mora neste acampamento”! Eu conheci uma coruja. Ficamos amigos. Ela tinha olhos verdes e gostava de cantar. Nininha era o nome dela. Adorável coruja. Saudades... Eu conheci uma coruja... Ficamos amigos, dela nunca mais esqueci!

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