domingo, 1 de outubro de 2017

A Carta de Zé da Donana a Baden-Powell.


Lendas Escoteiras.
A Carta de Zé da Donana a Baden-Powell.

                 Sei que vocês nunca ouviram falar. Poucos conheceram Zé da Donana. Garantiram-me que ainda está vivo e morando na mesma choupana que construiu em 1934. Se estiver vivo é o homem mais velho do Brasil com seus 105 anos. Zé nasceu em 1917 no Povoado de Galego. Aos cinco anos mudaram para Mares do Sul. Uma cidade onde só passava o Córrego dos Andradas e a maioria dos habitantes nunca viram um mar ou oceano na vida. Seu pai era um sapateiro de primeira e Zé aprendeu o ofício com ele. Sua mãe lavava e passava ajudando na manutenção da família. Quando fez doze anos Zé viu em um Jornal no Armazém do Seu Praxedes uma foto de escoteiros ingleses. Inteligente sabia ler e escrever.

                  Foi para casa levando o recorte do jornal. Conversou com seu pai sua mãe e eles explicaram as dificuldades para ele ser escoteiro. Procurou Dona Rosana Smith uma americana Diretora da Escola Pedro I. Ela sorriu para ele e na biblioteca da escola tirou o volume cinco Da Enciclopédia Britânica e deu para ele ler. Pela primeira vez Zé tomou contato com os escoteiros. A Britânica foi publicada pela primeira vez em 1770 em Edimburgo e em 1801 na terceira edição com seus vinte volumes se espalhou pelo mundo. Zé ficou encantado com os escoteiros e seu fundador Baden-Powell.

                 Tito Molon o prefeito ouviu o que ele tinha a dizer, mas disse que nada podia fazer. Zé não desistiu. Rodou meio mundo e tentou até com os Vicentinos. Resolveu então ele mesmo montar sua Patrulha. Chamou Carlinho, Tom Zé, Ricardinho, Pedro das Dores, Totonho e Valtinho. Sabia o que era uma Patrulha, o Monitor o sub e os demais patrulheiros. Todos juraram fidelidade quando escolheram o nome da Patrulha, o código de honra e o lema. Sua mãe bordou em um pano cinza o perfil da Raposa. Foi escolhido como Monitor e Totonho o Sub.

                 A cidade sorria com eles. Passavam marchando pela manhã e a tarde rumo a Estrada dos Boiadeiros ou mesmo no Morro da Cotia. Ganharam oito sacos de Estopa e a mãe de cada um transformou em uma bela mochila. A cidade começou a gostar dos novos escoteiros principalmente quando apareceram de uniforme com seus indefectíveis bibicos. O primeiro acampamento foi feito na Pedreira do Gavião. Um belo lago, uma nascente, uma mata fechada e até mesmo um pesqueiro muito bom. O Vigário Lozano preocupado foi a cavalo fazer uma visita para ver o que estavam fazendo.

                  Voltou pensativo. Conversou com o Prefeito com dona Rosana Smith e chamou todos os pais dos meninos escoteiros na Igreja. Era uma época que os meninos não ficavam presos em casa, não havia TV e o mais moderno que conheciam foi o telefone do Seu Geraldo dono da Pharmacia Biotônico e o Radio de ondas longas e curtas do Doutor Frederico. Foi uma bomba quando eles souberam que não poderiam mais ser escoteiros. Revolta geral. Alguns queriam fugir de casa outros se alistar na Legião Estrangeira. Não teve jeito. A Patrulha Raposa se reuniu pela última vez chorosa, no Vale das Lagrimas dentro da Caverna do Cristo Redentor.

                   Ninguém da Patrulha contou o que aconteceu lá. Disseram ser um segredo de estado. Quem disse isso nem sabia o que era estado. Zé da Donana revoltado procurou Dona Rosana Smith para ela escrever uma carta em inglês para ele. Ela surpresa não se recusou. – Para quem Zé é a carta? – Para Baden-Powell o fundador do Escotismo. Ele precisa saber o que acontece com os escoteiros aqui em Mares do Sul. Ela riu, mas escreveu o que ele pedia. Poucas palavras, mas se resumia em um pedido de socorro. A carta:

- Senhor Baden-Powell.

Em nome de Carlinho, Tom Zé, Ricardinho, Pedro das Dores, Totonho e Valtinho e meu, da Patrulha Raposa, venho pedir ajuda para que não proíbam que façamos atividades escoteiras na cidade de Mares do Sul no Brasil. Amamos o escotismo, queremos correr pelas montanhas, pelos vales e fizemos o mais belo acampamento na Pedreira do Gavião. Fizemos tudo que o senhor escreveu em seu fascículo número um do “Scouting For Boys”. Obedecemos a seus ensinamentos. Fizemos o juramento e nosso lenço é verde e amarelo.

Senhor Baden-Powell. Amamos o escotismo. A cidade não quer nos ajudar e nossos pais nos proibiram de acampar e sair pelos campos e vales em volta da cidade. Por favor, nos ajude!
Zé da Donana Monitor da Patrulha Raposa.

                     Dona Rosana Smith não tinha o endereço. Escreveu no verso do envelope: Ao General Baden-Powell. Aos cuidados do Palácio de Buckingham. Ingleses são sérios com suas correspondências. Quatro meses depois Zé Donana correu atrás de Dona Rosana Smith levando uma correspondência em inglês para ela traduzir. Ela se emocionou. – Zé, ela disse. – Vêm dois chefes ingleses na cidade. Irão montar um grupo para você! Zé chorou. A Patrulha chorou. A cidade se emocionou. Até eu mesmo quando soube da história fiquei com os olhos marejados de lágrimas.

                    Zé Donana nunca recebeu a visita de um Dirigente do Brasil, mas recebeu dois chefes Insígnias de Madeira, de Gilwell Park que chegaram com simplicidade, abraçando os meninos, procurando as autoridades, fazendo reuniões de pais e ficaram dois meses treinando os futuros chefes. O Primeiro ministro Inglês doou uma verba e tudo que o novo grupo precisava foi comprado. Ventos do Sol Nascente é um grupo que existe até hoje. Se quiser conhecer toda sua saga e sua história visite Mares do Sul. Procure Zé da Donana na Rua dos Alferes. Ele está lá até hoje cantando a canção que ele mais ama: - O espírito de BP vive em mim!



Nota de rodapé: Muitos me perguntam se é uma história verdadeira. Já contei em fogos de conselho e em fogueiras acesas neste longínquo Brasil. Sempre a mesma pergunta: - Verdade Chefe? Prefiro não dizer. Neto Bragança um Chefe de Mares do sul me mostrou uma copia da Carta que Baden-Powell enviou para Zé da Donana. Não havia como duvidar. Será que a carta era falsa? Não acredito. O Escoteiro tem uma só palavra e sua honra vale mais que sua própria vida!

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