quinta-feira, 26 de outubro de 2017

A incrível paixão de Lourenço Malenkaia.


Lendas escoteiras.
A incrível paixão de Lourenço Malenkaia.

                     Todos gostavam de Lourenço Malenkaia. Querido na tropa e no Grupo Escoteiro. Todos sabiam dos seus feitos nos grandes acampamentos e nas jornadas incríveis que fizeram com ele. Havia um orgulho em ser amigo de Lourenço Malenkaia. Na Patrulha Leão era o mais motivado na hora do grito. Alto, magro, cabelos louros encaracolados Lourenço Malenkaia sabia como fazer amigos. Com quinze anos pediu ao Chefe Para fazer sua jornada sozinho. Vou terminar minha Primeira Classe com chave de ouro. Disse. - Chefe preciso fazer minha jornada antes de ir para Sênior. Pretendo ficar três dias, levando minha faca, meu facão, uma manta, sal e óleo e mais nada. Seria seu desafio. Preciso provar que sei sobreviver.  As outras patrulhas assustaram. Como? – Isto é possível? De Lourenço Malenkaia nada era impossível.

                 Em uma sexta partiu atraindo olhares rumo a Mata do Roncador. Mochila, um bastão a tiracolo cantava o “Avançam as Patrulhas” sorridente. Todos o virão seguindo rumo à trilha do Cardim para atravessar o Rio Jambreiro na parte alta da fazenda Santa Cecília. Era um fato inédito. Uma jornada sozinho? Nunca aconteceu. No domingo a tarde ele retornou na curva do Urubu Rei, próximo à porteira do seu Nonato. Cantando, sorrindo, chapéu jogado para trás, mechas de cabelos louros caindo na testa com passadas que dava inveja, foi direto para a sede se apresentando ao seu Chefe. - Pronto Chefe! Jornada realizada. O Chefe o saudou respeitosamente.

                 Lourenço Malenkaia era filho do médico Doutor Arthur Malenkaia e de Dona Arminda Malenkaia. Não era um aluno brilhante, mas muito querido. Nunca tivemos uma grande amizade. Até hoje não entendi porque ele me procurou naquela manhã de domingo. Não fui acampar com minha Patrulha nas margens do Rio Barão Vermelho. Meu pai adoecera e eu fiquei na sapataria a seu pedido. Ele adentrou na sapataria com os olhos tristes e chorosos. Sozinho engraxando alguns pares de sapato, que me daria uns trocados, me cumprimentou sem nenhuma alegria.

                    Preciso falar com você – disse. Fiquei calado. – Você conhece a Dorita Valverde? – Assustei. Conheço disse. – Estou perdidamente apaixonado por ela, disse de supetão.  Não sei o que fazer. – Falar o que? Dorita Valverde não era bem vista e um dodói da garotada sedenta de amor. Sua fama de namoradeira e outras “cositas más” corriam longe. Muitos diziam que era a única que deixava beijar com beijos de “língua”. Eu mesmo nem sabia o que era isto. Vi que Lourenço soluçava baixinho. – Não sei o que fazer! Não quero conselhos. Acho que estou louco. Nunca pensei em ficar assim. Amor para mim sempre foi uma bobagem que em escoteiros como nós nunca pode acontecer. Quer saber? – Se amar pode nos deixar loucos então estou louco. – Deus do céu! O que aconteceu com Lourenço Malenkaia?

                  Eu sempre fui bom ouvinte. Ficamos horas conversando na sapataria. Nada demovia seu intento. Disse que ela o beijou sem ele esperar no muro atrás do Colégio das Irmãs Caritas. – Fui pego de surpresa – Mas que beijo! Senti sua língua na minha boca. Sensação incrível! Nunca imaginei que isto pudesse acontecer. Tornei-me seu escravo na hora! – Porque não procura o Chefe? Falei. – Não, ele não vai me ajudar. Vai ficar falando, falando dando conselhos e ele nem sabe o que é um amor de verdade. – Mas você só tem dezesseis anos! – Ainda nem sabe o que é a vida! – Sei sim disse, sei que agora minha paixão por ela é única. Sei que ri de mim, fala de mim como se fosse um bobão, mas eu sei que a amo. Meu amor é a essência de minha alma.  Nunca vou deixar de amar Dorita Valverde.

                Já entrando nos meus dezessete anos eu não sabia como aconselhar. Naquela época era inocente destas coisas. Beijo? Nem pensar. De língua então me assustava. Sua vida mudou. Seu pai o deixou preso em casa. Não quis estudar mais. Um desastre na família. O tempo foi passando. Lourenço Malenkaia foi definhando. Quem viu aquele belo Escoteiro não acreditava no que via. O internaram no famoso Hospício que hoje não existe mais. Muitos anos depois estava em Capistrano Ferreira onde tentava vender uma colheitadeira para um fazendeiro. Á noite, cidade pequena, sem cinema, sem TV fui tomar uma cervejinha gelada no “Vale das Flores”. Com trinta e dois anos, casado, era só uma fugidinha. Entrei na Boate da Rosinha. Uma “Minina” me procurou. Não me leve a mal disse. Só uma cerveja, mais nada.

                  Bebia devagar ouvindo um Xaxado e eis que aparece do nada Lourenço Malenkaia! Espantado ele disse: - Vado! O Escoteiro engraxate da Patrulha Lobo? – Sorri. Eu mesmo Lourenço Malenkaia. Nunca pensei em encontrá-lo ainda mais aqui. Ele sentou. Sorrindo me contou em poucas palavras sua vida. – Olhe meu amigo, fugi do manicômio, corri atrás dela. Meu amor por Dorita Valverde era doentio, era demais. Nunca a deixei. Hoje sou seu escravo. Dizem meu amigo que o amor é como o vento. Não podemos ver, mas podemos sentir.

                   Ela é dona desta boate. Pouco liga para mim. De vez em quando me dá um pouco de seu carinho. Aprendi a aceitar as migalhas que ela me dá. Sou louco mesmo. Louco de amor. Fiz da minha vida um sonho imperfeito. Só vivo a me arrastar por esta mulher. Se amar é um afeto, uma ilusão eu a amo demais. Pediu um guaraná. Uma mulher meio gorducha, toda “embonecada”, mas com feições belas se aproximou. Deu para reconhecer. Era Dorita Valverde. Deu um beijo na testa de Lourenço Malenkaia e se foi entre as dezenas de clientes da boate que pediam sua companhia. Nem me olhou. Claro não me conhecia - E o escotismo? Perguntei. - Nunca mais. Era um amor que tinha no peito e foi substituído por esta paixão avassaladora. Falar o que? Tomei o último copo e parti. Nunca mais o vi. Vida é vida, história é história. Destino é destino. Escolhas são escolhas e o livro arbítrio de cada um não pode ser alterado ou ignorado.

                    O sonho de um menino Escoteiro fugiu em uma nuvem que se espalhou no céu. Não dá para segurar a brisa e o orvalho da manhã ao mesmo tempo. O melhor é esperar o raiar do dia para ver se conseguiu. São recordações que sumiram como o vento forte que pegou de jeito uma Patrulha em uma ravina qualquer. Nem deu tempo de alertar para fincar os chapéus. Afinal escoteiros também amam? Amor é uma palavra que poucos ainda souberam explicar com exatidão. Mas a felicidade não é a minha. A felicidade é a de quem achou um dia ter encontrado uma razão para viver. Lourenço Malenkaia e Dorita Valverde encontraram seu verdadeiro amor. Que eles sejam felizes para sempre!


Nota de rodapé: Uma história tirada da minha imaginação. Afinal escoteiros também amam? Dizem que sim. Eles não são robôs não são animais irracionais. Amam o campo, os vales floridos, os belos tombos das cascatas que caem em pedras brancas.  Dizem que seus amores são forte, muitas vezes não aceitos. Mas e amor de alguém que se tornou uma paixão para nunca mais esquecer? Meu amigo, quem não tem o direito de ser feliz? 

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