terça-feira, 15 de maio de 2018

Contos ao redor da fogueira. O espólio do Escoteiro falecido.



Contos ao redor da fogueira.
O espólio do Escoteiro falecido.

- Verdade mesmo Chefe? – Dei risadas. Sempre me perguntam se é verdade. Afinal escoteiro não tem uma só palavra? – Bem respondi assim me contaram verdade ou não sei de muita gente que adora receber de herança um espolio de um Chefe Famoso, pois calcularam que com tantos anos de escotismo deveria possuir centenas ou milhares de badulaques escoteiros. Chefe Penha era famoso. Muito, dirigiu cursos, viajou para o exterior à custa da EB dezenas de vezes. Deveria possuir um espolio grande e ninguém sabia se ele iria doar ou não.

- Você deve ter conhecido o Chefe Ganzé. Vivia na casa do Chefe Penha. Onde ele fosse ele ia atrás. Ele era um autêntico Ajudante de Ordens do Chefe Penha. Fazia às vezes de secretário, de serviçal de campo, e nunca o deixou carregar peso. Era pegar a mochila e lá ia correndo o Chefe Ganzé. Cá prá nós, tem puxa saco prá tudo, mas ser puxa saco no escotismo e de doer! Não acha?

- Mas vamos ao finalmente, sei que você gosta sempre de ler o final da história, apesar de que o inicio sempre é a melhor parte. Chefe Penha tinha uma doença crônica de pulmão, parecida com a minha, mas diferente. Sua respiração aos poucos minguava, precisava de ar muito ar. Seus filhos compraram para ele um aparelho e pagaram a uma empresa para manter em sua casa um bujão próprio com oxigênio medicinal (02): O oxigênio com gás inodoro, incolor e próprio para estes casos. – Chefe Ganzé disse que seria responsável para não faltar.

- Mais dias menos dias Chefe Ganzé sabia que o Chefe Penha ia dessa para melhor. Claro era um autêntico Chefe escoteiro, cumpridor da lei escoteira e ajudou tanta gente que a UEB recebeu uma comenda do WOSM para ele. O único brasileiro com aquela medalha. Chefe Ganzé sonhava com uma ou até mesmo de menor valor. Sabia que não ia receber por vias legais, mas era declarante nato a ser o merecedor da herança do Chefe Penha. Dona Eulália gostava do Chefe Ganzé. Esposa do Chefe Penha tinha por ele uma amizade sincera.

- Chefe Ganzé passava horas na Sala Grande da Casa do Chefe Penha. Não era uma casa de ricaço, nada disso, poltronas de couro puídas com o tempo, uma TV de plasma usada que um dos seus filhos lhe deu. As noites ele lá estava a ouvir os contos do Chefe Penha. Adorava os contos, pelo sim pelo não ele era um admirador emérito do Chefe Penha. Sorria das aventuras escoteiras, sorria das viagens no exterior, na vivência com chefes de outros países. Chefe Penha tinha tudo para ser o Escoteiro Chefe, mas não foi.

- Verdade seja dita, a alta cúpula do escotismo em seu país não tinha por ele muito respeito. Ele sempre metido com suas ideias, com seu passado queria tolher tudo que eles faziam. A vida teve seu curso e um dia trabalhando na Prefeitura emprego que, aliás, foi o Chefe Penha que conseguiu para ele recebeu a noticia do falecimento do Chefe Penha. Saiu chorando. No seu íntimo o Chefe Penha era seu herói. Mas um desejo estava preso em seu cérebro: - O espolio do Chefe Penha. Ele sabia que não seria esquecido no inventário.

- Nem vou contar como foi o enterro do chefão. Gente que não cabia mais. Zito Gabiroba fez a festa. Vendia torradinhas, quebra queixo e doce de abóbora na porta do cemitério e naquele dia vendeu tudo e teve de ir correndo buscar mais em sua casa. No final da festa do defunto ele pediu a Deus que levasse para o céu ou para inferno esses chefões escoteiros. Aí sim ele iria se enricar! Dizem que chefões demoram a morrer, sei lá, mesmo sendo um chefinho meu dia está próximo para fazer a alegria do Zito Gabiroba e suas deliciosas goiabadas.

- Na segunda feira dona Eulália ligou para ele. – Chefe Ganzé, desculpe, sei que as feridas da morte do Penha ainda estão fortes no coração, mas ele no seu último suspiro lembrou-se de você e me pediu para entregar o Baú do “transato” (passado) para o senhor. Ele até riu quando disse que o Senhor foi seu melhor amigo e... Desculpe Chefe Ganzé, mas melhor não dizer o final do que ele disse. Chefe Ganzé entendeu. Prometeu passar lá no sábado, não queria mostrar seu sonho, seu desejo de ser o único herdeiro do espólio escoteiro do Chefe Penha.

- No sábado fez questão de postar a vestimenta. Chefe Penha detestava, só admitia o caqui curto, mas ele se sentia bem em colocar a camisa para fora, usar a calça curta amarrada com embira, pois ninguém ia dar falta do cinto mesmo com seu enorme barrigão. Deixou a barba crescer, sempre quis ser um grandão da Corte escoteira e a maioria adorava uma barba e camisa fora da calça. – Ao entrar e bater na porta agradeceu ao Chefe Penha por ser tão benevolente com ele.

- Esperando dona Eulália abrir a porta disse baixinho: - Chefe Penha vou sentir sua falta, mas olhe o senhor nunca me indicou para ser um figurão da UEB! Até minha Insígnia o senhor não aprovou. Entendo, não guardo mágoa. Portanto meu amigo desculpe, agora com seu espólio vou ser invejado por muitos chefes do Brasil e do mundo! Fez as honras mortuárias a família do morto, do defunto escoteiro que ele mesmo nem sabia se foi para o céu. Ele não acreditava muito no tal Grande Acampamento. Devia ser uma balburdia com tantos figurões. Nunca vou para lá se Deus quiser!

- Pediu emprestada a caminhonete do Zé das Dores para o transporte. Ficou decepcionado, apenas um bau e pequeno. Chegou em casa espavorido, levou o Bau para o porão abriu e viu umas medalhas, a medalha da WOSM um cinto dos novos, três diplomas e uma cartinha para ele do Chefe Penha:

- Querido amigo Chefe Ganzé. Sei do seu apreço e amor pela minha pessoa. Vou levar isso para o céu e abençoá-lo. Sei que me prometeu fazer tudo por mim, e agradeço. Peço a gentileza de devolver tudo nesse bau para a UEB e a WOSM, pois nada foi de graça, tiveram a pachorra de me cobrar e jurei nunca pagar. Para honrar meu nome, pague tudo e devolva. Do seu grande amigo, Chefe Penha!

Nota - Nunca conheci o Chefe Penha. Sinceramente nem sei se ele existiu. Mas quando em um Fogo de Conselho o Chefe Tomaz contou a historia todos deram belas risadas menos os escoteiros que foram para suas barracas em grupo com medo do falecido aparecer para que eles fossem imbuídos do seu espólio. Pelo sim pelo não eu achei bom par o Chefe Ganzé. Bem feito. Tomou papudo!

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Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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