domingo, 30 de setembro de 2018

Contos de fogo de conselho. Sustenidos e bemóis, coisas de pardais no ar.



Contos de fogo de conselho.
Sustenidos e bemóis, coisas de pardais no ar.

Nota: - Senhor ajudai-nos a construir a nossa casa Com janelas de aurora e árvores no quintal - Árvores que na primavera fiquem cobertas de flores E ao crepúsculo fiquem cinzentas como a roupa dos pescadores.

                    A peregrinação me fazia repensar o porquê elevando ao quadrado um sonho abstrato em matemática era como se dirigir ao meu coração que batia calmamente obedecendo às normas surreais de um passeio não programado. Não corria, trilhava o asfalto quente sem eira somente. Pisante macio era como se naquela tarde eu velejava em mar aberto em um céu de brigadeiro. Tarde quente, sol longe do poente. Eu não o via.

                   Estava eu escondido naquela selva de pedra onde se sobressaiam os arranha-céus que queriam tocar as nuvens, mas elas se desmanchavam na poeira do vento amigo. Mente deletéria imaginava como seria fácil ir de encontro ao impossível coisa que não acreditava que pudesse fazer. Sons de veículos passantes, buzinas estridentes, passadas no chão corrente tentando voltar ao lar. Uma gota pequenina de suor correu de mansinho em minha face e se esparramou borrachuda no chão pedregoso. Pensei no homem que faz trabalho penoso, vive do suor do povo. Mentira? Mas não dizem que é fruto de uma jornada, o suor no rosto é custa de muito esforço e grandes penosos sacrifícios?

                  Parei... Eis que sintomaticamente avistei um pequeno parque surgido do nada como se o Mágico Houdini me revelasse que ali era meu lugar. Bonito, resplandecente agora eu ia parquear. Escondido entre as avenidas asfálticas, prédios gigantescos parece que agora encontrei o meu lar. Banco de madeira convidativo, lugar sedutor. Sombra cativante árvores atraentes e áreas esplendidamente vazias. Sentei, me acomodei corporalmente nas curvas gostosas do banco acolhedor. Pensei em voltar meu rosto na direção do sol, e então, as sombras lentamente foram ficando para trás.

                  Amigo, meu objeto direto do desejo de admirar o belo perdido entre as sombras, me alertava que o campo dos sonhos não é onde estamos. Só lá sombras verdadeiras de arvoredo dão as sombras que precisamos. Deixei me levar pelos sonhos. Lembrei-me de Michelle quando escreveu: - Fechei os olhos e me comprometi a sonhar com você. Disse ao sono: venha logo, para que eu possa vê-lo, para que eu possa senti-lo, para que eu possa ter um pouco mais do pedacinho do céu. Logo adormeci. De repente o sol poente estava sumindo.

                            Foi então que me dei conta que era ela que me fazia sonhar. Linda Arvore enorme, verde que te quero verde, uma sombra que se espalhava ao redor do meu mundo que encontrei perdida naquela praça desaparecida entre os prédios daquela cidade de pedra. Olhei para ela, como era bela, era como se eu disse sem dizer, “eu sei que já faz tempo, mas ainda amo você”! Sombra enorme, vivente, escondida do sol poente braços enormes, me voltei no tempo.

                          Ah! De Camisa de Escoteiro subia como anarquista, explorador, batedor ou pioneiro a descobrir ate aonde ia e onde podia chegar. Elas as árvores que me acolheram sorriam sem me condenar. Venha! Suba você não é um agitador ou um anarquista, aproveite dos meus galhos faça de mim o que quiser... E lá eu ia na correia de mateiro, como bom e valente Escoteiro a explorar as alturas do Jequitibá, da Peroba Rosa, do Pau Brasil e de tantas que se alegraram em me abraçar...

                          Eu absorto naquele lugar encantado, pensativo e concentrado olhava a árvore como se ela sempre fizesse parte da minha vida. A tarde foi se aconchegando no horizonte. Eu me sentia abraçado, amado, e por ela adotado tinha certeza que éramos um só. Eu e a árvore da Praça do arredor. Um bordel de sons começou a se formar. Ventania de revoada, como se fossem trovões tocados ao longe por uma mão invisível naquele céu escuro do alvorecer.

                        Olhei para o céu espantado e vi que a hora tinha chegado. Milhões deles, já iam se recolher. Como se fosse uma sinfonia com sustenidos e bemóis vi que eram coisas de pardais no ar. Nada de novo no front para um Velho Escoteiro que tinha a natureza na alma e viveu tantas sinfonias de rádios de pássaros errantes tocadas em plena floresta do Pica Pau e o Bem ti Vi. Eles foram alcançando os mais altos galhos, os grasnados foram escasseando. Aos poucos o silencio retornou com a brisa fresca do ar. Os pardais dormiam. Hora de partir, levantei tropegamente.

                            Uma partida silenciosa. Não iria acordar a orquestra sinfônica que resolveu se acomodar na mais bela árvore do lugar. Uma duas três passadas trêmulas. Parei. Voltei o rosto para a praça. Tudo quieto, tranquilo, calmo e sossegado. Os pardais dormiam sobre a proteção da árvore da vida. Árvore tão querida que os passantes do dia não sabiam o tesouro que tinham ali intocável, mas que todos podiam usufruir ou desfrutar. Mudei de pensar, sorri ao andar, pensei que nada seria como hoje para mim dora em diante. Pião de madeira... Carrinho de ferro... Tudo era tão solido... Ah! Vida tão cheia de vida, mas que um dia vai acabar...

Gosto quando me falas de ti... e vou te percorrendo
e vou descortinando a tua vida
na paisagem sem nuvens, cenário de meus desejos
Tranquilos

Gosto quando me falas de ti... e então percebo
que antes mesmo de chegar, me adivinhavas,
que ninguém te tocou, senão o vento
que não deixa vestígios, e se vai
desfeito em carícias vãs...
J.G. de Araújo Jorge.


sábado, 29 de setembro de 2018

Lendas Escoteiras. O Vagalume que não sabia voar



Lendas Escoteiras.
O Vagalume que não sabia voar

                        No acampamento vi Naldinho no seu campo de patrulha. Estranhei. Todos tinham ido cortar madeira, pois era dia das grandes pioneiras. O chamei: - Porque não foi com os outros Naldinho: - Ele sorriu e me disse: - Estou ajudando este vagalume chefe.  E sua patrulha? Porque não foi com ela? Disseram que iam cortar madeira para fazer uma mesa. Foram todos, achei que não precisava ir. Mas veja, aproveitei bem o tempo. O senhor sabia que o vagalume só voa nas primeiras horas da noite? - Não sabia respondi. – Pois é ele é reconhecido pelo brilho esverdeado, continuo, e vive mais entre vegetação das regiões tropicais e temperadas. Em alguns lugares o chamam de pirilampo.

                        - Olhe chefe, pode não acreditar, mas este vagalume me disse que está perdido. Mora muito longe daqui. Pensou que eu poderia ajudar. Está tentando falar com seus irmãos e não consegue – Pensei com meus botões – Ele quer me enrolar. Conheço o tipo que sempre tem uma história para contar. Vivem criando histórias e mais histórias muitas vezes para não fazer nada. – Naldinho abaixou a cabeça, fingiu que ouvia o vagalume e me disse – Ele está dizendo que eu não tenho sonhos. E ele disse também que não estou criando histórias chefe!

                   Arregalei os olhos! Como? Repita que não entendi. Ora chefe, ele diz que é verdadeiro, que eu sou verdadeiro e só não fui com a patrulha porque o Lídio monitor disse que não precisava. Estava ali olhando para Naldinho e pensando o que dizer e fazer com ele. Essas invencionices já estavam passando da conta. Naldinho riu. Sabe o que ele está dizendo chefe? Que o senhor acha que eu estou inventando. Ora Naldinho deixa disso. Não vai querer que eu acreditasse que você conversa com um vagalume!

                              Quer uma prova chefe? O nome dele é Pimaisdois. Ele entende o que eu falo. Veja: - Pimaisdois, dê um pulo – O vagalume deu. Você soprou nele, eu disse. Está bem chefe – Pimaisdois, agora cinco pulos. O vagalume deu cinco pulos. Porque Pimaisdois? É o nome dele chefe. O escoteiro estava me fazendo de bobo. Estou perdendo o meu tempo aqui. Olhe vou lhe mostrar o que faço com um vagalume falador – Peguei meu sapato e ia esmagá-lo quando Naldinho pediu. Não chefe, não. Não faça isso. Ele se comunica com os outros. Poderiam vir milhares aqui e nos carregar para a cratera negra.

                          Já estava cheio daquilo. Deu uma pancada com o sapato no tal Pimaisdois. Ele pulou. Corri atrás. Ele pulou. O danado só me escapava. Ouvi um grande zumbido. Olhei para trás, centenas de milhares de vagalumes voavam em minha direção. Corri mas não tinha onde esconder. Corri mais e sem olhar para frente caí na cratera negra. Fui caindo e lá em baixo tudo vermelho. Ia morrer queimado. Comecei a gritar, a chorar e pedir perdão. Tremia como vara verde.

                             Chefe, chefe, calma, não grite. Era Naldinho. Abri os olhos. Estava dormindo debaixo de uma castanheira. – Chefe não é hora da atividade do jogo noturno? Caramba. Dormi mais de quatros horas. Já escurecia. Que sono. Ferrei no sono. Mas que pesadelo. Que susto. Vamos lá Naldinho. As patrulhas não podem esperar. Naldinho foi a minha frente, com minha lanterna olhava o chão para não tropeçar. Olhei as costas de Naldinho, um grande vagalume está lá em seu ombro. Olhando para mim e sorrindo com um olhar zombeteiro! Não acredito! Era o Pimaisdois!

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Histórias da Jângal. Como Apareceu O Medo... E outras histórias.



Histórias da Jângal.
Como Apareceu O Medo... E outras histórias.

Nota - O conto é mais introspectivo, menos divertido, e é sem dúvida o conto mais sério de Mowgly. É muito tocante, Mas o conto faz o necessário: termina a história de Mowgly de forma tocante, simples e direta, com elementos simbólicos permeando tudo.

Essa história se passa antes do primeiro conto, quando Mowgly ainda vivia com os animais na selva. É tempo de seca e todos os animais se reúnem no Poço da Paz, um dos poucos locais que acumulam água e onde a caça é proibida e todos, carnívoros ou herbívoros, vão até ali sem medo para beber. Shere Khan perturba a paz reinante e Hathi, o elefante, o animal mais sábio da floresta, resolve contar a história de como, por culpa de um tigre, o medo surgiu entre os animais.

Eu pessoalmente acho esse um dos contos mais sem graça do livro, apesar de reconhecer seu valor como lenda indiana coletada pelo autor. Os personagens nada fazem na história a não ser ouviu o conto de Hathi, e sinceramente isso não é das coisas mais empolgantes.

O Avanço da Selva
- Depois que Mowgly é expulso da aldeia dos homens – fato descrito no conto Tigre! Tigre! – ele resolve deixar as coisas como estão e voltar para a selva, onde ele agora acredita que pertence pelo resto da vida. Mas aí ele e seus amigos lobos ouvem o caçador Buldeo conversando numa trilha com alguns carvoeiros, e Mowgly descobre que a aldeia vai queimar o casal que o acolheu como feiticeiros por terem abrigado o menino-demônio.

Enfurecido, Mowgly vai até a aldeia e conversa com Messua, a mulher que o acolheu, e a encontra machucada e amarrada dentro de uma casa. O marido dela explica – mas Mowgly não entende bem – que o motivo real pelo qual estão sendo acusados é que ele é um dos homens mais ricos da aldeia, e se ele for queimado como feiticeiro todos os seus bens serão redistribuídos, O cheiro do sangue de Messua faz com que Mowgly tome a decisão definitiva. Ele planeja resgatar ela e o marido, arranjar uma “escolta” até a cidade mais próxima onde os ingleses têm base – os ingleses não aceitam essa bobagem de queimar vivos os acusados de feitiçaria – e destruir toda a cidade.

Para isso ele pede a ajuda de Hathi, o elefante, que já participou de uma destruição semelhante, quando foi pego por uma armadilha e resolveu se vingar dos homens que a tinham armado. Não estamos falando de um simples duelo entre dois seres que são inimigos. Estamos falando da destruição de casas e fazendas de dezenas de pessoas para a vingança pessoal de um garoto pesado. E o pior – ou melhor – é que é tudo baseado em história real: existem relatos na Índia de elefantes enfurecidos com um indivíduo, por terem sido atacados durante caçadas, que voltaram para a cidade do tal e destruíram tudo.

O Ankus do Rei
Muito favorito! A história pode ser dividida em duas partes, a primeira com Mowgly e Kaa e a segunda com Mowgly e Bagheera. Primeira parte: o que eu chamo de A Cobra Branca. Mowgly e Kaa estão brincando de se espancar – é normal, gente, amizade – e Mowgly, depois de perder da cobra, reclama que está entediado. Kaa se lembra de uma colega muito estranha que encontrou nos subterrâneos das Tocas Frias e decide levar o colega até lá.

Sem muito a contara, o fato é que Kaa sai dali mais do que certa que sua colega descolorida é completamente louca e Mowgly sai segurando uma peça que ele gostou muito: um cetro com um gancho na ponta, decorado com coisas brilhantes e desenhos de elefantes, que atraem Mowgly imensamente porque o lembram de seu amigo Hathi.

A segunda parte, é quando Mowgly, ao conversar com Bagheera (que já viveu entre os homens), descobre pra que serve o tal cetro: é um Ankus, usado por rajás para enfiar na cabeça dos elefantes que cavalgam para fazê-los andar mais rápido – o equivalente a esporas. Mowgly fica horrorizado que aquilo tenha sido usado para machucar animais e o joga longe, mas Bagheera o alerta de que se cair em mãos erradas – ou seja, nas mãos de homens – vai dar problema. Mowgly, que não entende porque os rubis e esmeraldas, dos quais ele nem sabe o nome, encrustados no Ankus são interessantes, ignora o aviso e vai dormir.

No dia seguinte, o Ankus não está mais onde ele o havia jogado, e pelas pegadas o objeto foi pego por um homem. Curiosos, Mowgly e Bagheera passam a seguir os rastros. Aqui a crítica social fica mais do que clara. E, além dela, tem a história da Cobra Branca, ou Thuu, como Mowgly a apelida, que é de uma graça só dela: os tesouros perdidos dos antigos rajás da Índia são para qualquer criança dar asas à imaginação.

Os Cães Vermelhos
- Esse é, sem dúvida, o melhor conto de Mowgly.
Porque os dholes, os cães vermelhos das planícies indianas, estão invadindo a selva, e eles vêm em excursão sangrenta, para matar tudo o que veem. Do começo perfeito, com o pheeal (grito de morte de um lobo) deixando a todos de cabelo em pé, passando pelo meio, quando o conselho de Kaa faz com que Mowgly arrisque sua vida como nunca antes, até o final, com a batalha épica contra os cães vermelhos, esse é sem dúvida a obra prima do livro: aterrorizante, desesperador, épico, o conto poderia fechar a série da vida de Mowgly com maestria.

O Despertar da Primavera
E Mowgly chega à idade adulta. Quase todos os que conhecia na selva já estão mortos. Os que sobraram estão pouco se importando com sua crise existencial, já que é primavera e todos estão ocupados com seus afazeres. Entediado, deprimido e irrequieto, Mowgly vaga pela floresta sem saber o que lhe acomete.

terça-feira, 18 de setembro de 2018

Lendas Escoteiras. Nunca é tarde para perdoar.



Lendas Escoteiras.
Nunca é tarde para perdoar.

Nota - Nota - Errar é humano, aprender com o erro é ser sábio, perdoar quem errou é ser os dois ao mesmo tempo. A nossa lei sempre nos ensinou a sermos irmãos. Não há como não perdoar um irmão. Feliz quem sabe perdoar, pois a felicidade é assim. Fazendo os outros felizes com seu perdão!

                       Gente fina o Robertinho. Alegre, feliz, abraçava todo mundo quando chegava às reuniões. O escotismo o transformou. Era outro jovem, diferente daquele taciturno, sem amigos em sua escola e em sua rua. Mudou e como mudou! Mesmo na Patrulha ele fazia questão de honrar o nome dos Touros. Sabia que tinha sete novos amigos, fora o Monitor Tolon. Sentia-se bem com eles. Tolon não era um bom monitor. Gostava de mandar, humilhar, e se gabar que só ele era o bom.

                     A patrulha cabisbaixa não reclamava. Ele nunca valorizou ninguém. Nem mesmo Nicodemos o Submonitor. Robertinho aprendeu muito com Nicodemos. Era ele um bom camarada que sabia conversar e respeitar. Aprendeu tudo para tirar o Cordão Verde e Amarelo. Não recebeu, pois Tolon não concordou. Ele achava que só ele tinha o direito de receber primeiro. Ele era o Presidente da Corte de Honra e o Chefe Givaldo fazia questão de deixar tudo nas mãos dos monitores.

                        Interessante que por dois anos ninguém saiu da Patrulha mesmo com um monitor mandão, gritador, que vivia chamando a todos de mariquinhas, preguiçosos e negligentes. As outras patrulhas não gostavam de Tolon. Moreno monitor da Gaivota o achava prepotente, abusado e despótico e Tolon ria. Achava-se o tal. – Não vou passar talquinho em ninguém – dizia. O Chefe Givaldo atento chamava sua atenção, mas o Chefe era um pai, uma mãe, um irmão. Nunca o vi de cara feia. Quando a situação apertava ele chamava Tolon em particular e tentava falar. Mas gaguejava mais do que falava.

                     A tropa o considerava muito. Respeitavam-no e tinham por ele uma enorme admiração. Se não era enérgico, dominante não importava. Bastava ele sorrir e a Tropa se desmanchava. Uma vez em uma atividade distrital Tolon se envolveu em um bate boca com o monitor de outro Grupo Escoteiro. Do conflito saíram para os tapas. Foi uma encrenca e até hoje os chefes das demais tropas evitavam participar em atividades onde estivessem os Touros, ou melhor, Tolon.

                       Tolon não se incomodava. – Dizia: - Comigo bateu levou. Se for para desculpar melhor não ser escoteiro! - Mas afinal o que tinha Tolon de tão interessante para seus patrulheiros confiarem nele e nunca terem pedido para sair? Ele não era feiticeiro, muito menos agradável. Aparência divina passou longe. Era inacreditável que se mantinham fieis a ele e a patrulha. Ele ambicionava ser um Lis de Ouro.

                    Ninguém colocava a mão no fogo para apoiá-lo. Não era preguiçoso, mas parecia ter mente curta para aprender e ter tudo que sonhava. O chefe Givaldo sabia que se fizesse o processo para pedir seu Lis de Ouro o distrito não iria aprovar. Quem sabe daí nasceu toda sua cólera, seu arroubo e rompante de levar tudo a ferro e fogo. Ainda bem que a patrulha no fundo gostava dele. Sem destempero e seu rompante era levado sem reclamação pelos seus subordinados.

                       Se havia alguma qualidade em Tolon eu nunca vi. Fiquei deverás preocupado com a maneira que Tolon tratava Robertinho. Era mau, intragável e humilhante. Robertinho não reclamava. Seu amor ao escotismo e a patrulha era maior que a prepotência de seu monitor. Durante mais de um ano e meio Robertinho foi subserviente, aceitava o mau humor mesmo não conseguindo seu sonho de conquistar o cordão Vermelho e Branco. Neste Período a patrulha perdeu Humberto e Laerte. E não foi por causa do monitor. Humberto foi morar em outra cidade e Laerte foi trabalhar como continuo nas Lojas Estrela. Interessante que entraram dois meninos que moravam na Rua de Tolon, e olhe que o conheciam de sobra no bairro.

                       Dizem que tudo nesta vida tem uma razão de ser. Tudo que acontece tem um motivo para acontecer. Eu sei que a vida não é tão simples como se pensa, mas se fosse, qual seria a graça de vivê-la? Destino ou não tudo aconteceu no acampamento de verão. Alegres, cantantes, lá iam eles empurrando a carretinha com as rodas de madeira cantando. Era um desafio fazer as rodas cantarem. Subindo e descendo todos ansiosos para mais um acampamento esperado por muitos meses.

                    Claro que Tonon não fazia força, só quando em subida íngremes. – Dizia gritando: - Eu já fiz muito isto agora é com vocês. Afinal são escoteiros ou ratos? E ele ria, dava gargalhadas e a patrulha seguia para seu acampamento tão esperado. Até hoje não sei como aconteceu. Estava ajudando a patrulha na descida segurando à carretinha quando vi um grito. Robertinho perdeu o equilíbrio e foi ao encontro da cerca de arame farpado a beira da estrada.

                        Eu sei que foi Tonon quem o empurrou. Logomarca da patrulha Onça parda confirmou. Todos correram para ajudar. O olho direito de Robertinho sangrava. Havia um buraco parecendo que uma ponta do arame rasgou parte do seu olho. Tolon ficou branco. Robertinho chorava, mas não acusava ninguém. O Chefe Givaldo tentando animar. Nicodemos tirou seu lenço amarrou em volta de sua cabeça e com outro lenço forçava o olho ferido de Robertinho. A Tropa ficou na estrada esperando a volta do Chefe Givaldo e Nicodemos que foram buscar socorro. Infelizmente o acampamento foi cancelado. Eles sabiam que o acontecido tinha um sabor de derrota. Dois meses depois Robertinho foi para a capital morar com sua tia e tentar uma operação que afinal nunca aconteceu. Ele ficou cego de um olho.

                           O tempo passou... Contaram-me que Robertinho já velho se encontrou com Tolon um dia na Rua do Ouvidor. Ambos pararam. Tolon abaixou a cabeça e começou a chorar. Robertinho não esperava aquela demonstração de fraqueza de Tolon também um Velho de cabeça branca. Fraqueza? Chorar é para os fracos ou para os fortes? – Robertinho abraçou Tolon sorrindo. Meu amigo, a vida passa e as magoas também. O que passou, passou. Hoje alguém no céu achou por bem que nos encontrássemos novamente. Isto não é bom? Afinal não temos muitas historias boas para contar dos nossos tempos de meninos escoteiros?

                         – Tolon ali no meio da rua, com dezenas de pedestres passando ajoelhou em frente a Robertinho: - Perdão meu amigo, perdão. Vivi todo este tempo amargurado. Porque fiz aquilo? Pedi a Deus para me perdoar, mas sabia que só seu perdão poderia me dar à paz que nunca tive. Pois é, ainda bem que ouve perdão. Nunca é tarde demais para mostrar que não existe mais rancor e ódio!

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Lendas Escoteiras. A última página do adeus.



Lendas Escoteiras.
A última página do adeus.

Nota -- Tem gente que passa em nossa vida, leva um pouco de nós mesmos, e deixa um pouco de si mesmo. Há os que levam muito, e há os que deixam muito, mas não há os que não deixam nada! – Raquel levou nossas saudades, mas deixou exemplos para nunca mais serem esquecidos.

                      Olhe eu nunca há esqueci. Seu sorriso, seu jeito matreiro de conquistar e fazer amigos, sua lealdade e sua honradez eram de tirar o chapéu. Não sei por que partiu. Se houve um motivo no grupo nunca fiquei sabendo. Todos ficamos consternados com sua partida. Partiu sem nenhuma explicação e assim como chegou se foi. Não despediu de ninguém. Vimos algum de estranho em seus olhos no sábado anterior. Parecia que chorava por dentro. Ela tinha estilo, pose de rainha, mas não era antipática démodé ou arrogante. Era simples, conquistava pelas palavras, pelo carinho pelo abraço e seu Sempre Alerta era demais! Chegou sozinha sem filhos a tiracolo, maneira corriqueira que sempre acontece com pais que chegam para ver e sentir onde seus filhotes estão e verem se vale a pena.

                 Raquel foi diferente. Adentrou na sede e disse que veio ajudar. Foi aceita sem maiores exigências. Disse que não teve a oportunidade de tornar seu sonho de ajudar os jovens e ali no escotismo poderia colaborar. Quando a conheci vi que era uma senhora de classe. Porque estava ali e sozinha? De onde tinha vindo? Quem seria? Acreditar no seu altruísmo no seu amor ao próximo, na benevolência e no seu bom coração sem nada saber de suas origens era um desafio para todos nós. Dizem que a ajuda ao próximo sem buscar qualquer recompensa é notável indicador de elevação moral, que eleva o ser humano, fazendo dele um ser superior digno de ser seguido. No Grupo todos nós ficamos encantados com ela.

                   Na sede ou no campo todos os jovens do grupo ficavam como abelha no mel em volta dela. Contava lindas histórias. Cantava lindamente. Era exímia em jogos e a criançada escoteira aplaudia. Os chefes pensavam se poderia existir alguém como ela. Nunca ouve ciúmes, maledicências, despeito ou mesmo uma rivalidade. Em meus pensamentos pensei que seria uma Santa que desceu do céu para ajudar nosso escotismo tão necessitado de pessoas assim. Não entrou em nenhuma sessão Escoteira. Chegava meia hora antes e saia meia hora depois. Neste tempo distribuía sorrisos, conversava motivando a todos, recebia pais e visitantes, encaminhava os novos para o Diretor Técnico e nunca interferiu nas sessões quando de suas atividades. Os chefes sempre a procuravam para um jogo, uma historia ou um conselho.

                  Todos a chamavam de Raquel. De que? Nunca soubemos e nunca ela falou. Ninguém sabia onde morava, onde trabalhava se tinha família ou não. Isto se tornou tabu para todos, pois não queriam ofendê-la e nem privar de sua amizade. Se ela não contou é porque não queria contar. Um dia procurou o Chefe e disse para ele que queria fazer a promessa. Todos se alegraram. Ela chegou naquele sábado esplendidamente uniformizada. Sua performance era incrível e seu garbo melhor ainda. Foi uma promessa inesquecível. Após o cerimonial vieram antigos Escoteiros, ex-Escoteiros, chefes do distrito e da região, pois ela conquistou uma legião de fãs. Ela mesma ofereceu um coquetel. Garçons de smoking serviam os mais gostosos salgados e quitutes de dar água na boca.  Eu a via pensando que ali estava seu mundo escoteiro, mas e seu mundo particular?

                        Nunca ficou um dia, um minuto um segundo sem o uniforme na sede e nas atividades Escoteiras. Ficamos boquiabertos quando disse que conseguiu um avião para levar todos do grupo para um Jamboree Nacional. Um avião? Quem ofereceu? Ninguém perguntou. A confiança nela era tremenda. Lá foram todos na aventura que marcou os jovens e adultos do Grupo Escoteiro por toda a vida. Olhe eu posso garantir que nunca faltou, nunca chegou atrasada e em menos de um ano nosso Grupo Escoteiro se tornou o mais conhecido da cidade. O prefeito e outras autoridades nos davam o maior apoio. Meu Deus! Quem era essa mulher? Porque ninguém sabia de nada de sua vida? Como ela conseguiu esconder de todos seu curriculum pessoal? Nada vi na mídia nada que pudesse desaboná-la. 

                      Foi um desastre aquela reunião do sábado. Chovia ninguém se preocupou com a chuva. Todos esperavam a chegada de Raquel com seu sorriso fantástico, um anjo dourado que Deus presenteou ao Grupo Escoteiro. Os lobinhos, Escoteiros, seniores guias e chefes entravam aos borbotões pelo portão de aço, pintado de branco, para receber um sorriso e um aperto de mão de Raquel. Onde estava ela? Ninguém sabia. Não veio? – Até agora não, disse alguém. Ficaram o tempo todo em reunião, mas sempre olhando para o portão vazio. Uma calmaria que assustava. Raquel não veio e nem nas três seguintes. O Grupo Escoteiro sentiu na pele aquela ausência. Ninguém queria acreditar no pior. Sempre sonhavam com ela adentrando com aquele sorriso dizendo: Sempre Alerta!

                 Raquel desapareceu. Ninguém sabia onde morava, ninguém tinha seu telefone, ninguém sabia onde trabalhava e nem as autoridades que ela fez amizade sabiam de sua vida particular. O coração partido, os olhos lacrimejados mostraram um Grupo Escoteiro à deriva. – Muitos diziam alto com rancor o porquê daquele abandono. Outros reclamavam por ela oferecer amor e carinho e desaparecer como uma nuvem levada pelo vento. Lembro que eu mesmo chorei com sua partida. Anos depois sem querer vi na internet uma noticia que me estarreceu. Era de 40 anos atrás. Eu não podia entender e compreender. – Dizia: -  

- Dentre os mais de cento e oitenta passageiros que morreram na queda do Avião da Swissair ocorrido hoje, próximo a Kaduna, uma figura simples que labutava no Hospital St. Nicholas na capital da Nigéria, a Irmã Raquel, considerada uma Santa vai deixar saudades. O Vaticano estuda até hoje sua canonização. Seu trabalho na cruz vermelha na Monróvia, Libéria vai deixar uma lacuna difícil de ser preenchida. O Padre Romulo sempre dizia que ela partiu para estrelas para nunca mais voltar! Olhei a foto com atenção. Mesmo preta e branca e opaca era dela, da nossa querida Chefe Raquel!

Existem chefes que deixam saudades. Existem pessoas que marcam e ficam no coração da gente para sempre. Cada um de nós conhecemos pessoas assim. Sei que Raquel nunca mais iria voltar. Sua missão havia sido cumprida. Partiu para outra missão, pois uma alma evoluída não pode ficar no mesmo lugar. Sempre guardei lembranças enormes de Raquel em meu coração. Nunca vou esquecer seu sorriso, sua voz seu jeito gostoso de ajudar e que transformou o Grupo mostrando que a fraternidade não tem hora e nem lugar!

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Contos de Fogo de Conselho. O enigma da Cruz 451 da Colina dos Anjos.



Contos de Fogo de Conselho.
O enigma da Cruz 451 da Colina dos Anjos.

Nota - Toda estrada tem espinhos, pedras no caminho, mas mesmo assim eu vou meu coração mandou. Quem sabe assim sozinho cruze o meu caminho um anjo protetor, meu verdadeiro amor. Zezé de Camargo.

                            Da sede a Colina dos Anjos eram menos de duas léguas. Em quilômetros onze mais ou menos. Era um bom lugar para acampamentos. Boa aguada bambus e um bosque bem fechado que imitava perfeitamente uma floresta. Acampávamos muito lá. Era fácil, pegar uma estradinha atrás da Igrejinha do Bomfim no final da Rua Sete de Setembro e seguir em frente. O bom da caminhada era porque atravessava uma pequena floresta e isto dava sombra o tempo todo.

                         Perdi a conta que fui lá acampar com os Lobos. Era uma delicia empurrar à carretinha na subida da colina e descer até a nascente do córrego Pingo d’água. Antes da subida saímos da estradinha principal e através de uma tronqueira aberta pegávamos a trilha correta da colina. Não foi que todos se assustaram ao ver ao lado da tronqueira uma área florida com uma cruz de madeira envernizada escrito o numero 451. Era uma sepultura. De quem? Nunca soubemos de alguém morrer ali.

                        Era lindo o jardim sobre a sepultura. Begônias, madressilvas e belas rosa brancas enfeitando o jazigo de um desconhecido que não conhecíamos. Interessante que três dias depois no retorno, o jardim estava enfeitado com bromélias, um pequeno pé de jacarandá Paulista e muitas flores do campo. Como? Como em três dias tudo replantado e florido? Fomos para casa encucados. Tentei saber na prefeitura, com o Delegado Paredes e o cabo Bruno. Ninguém sabia de nada. Morte? Perguntaram... Quem morreu? O mistério da cruz 451 ficava no ar.

                        Dois meses depois convidei Rael para ir lá comigo. Fomos de bicicleta. Rápido, menos de 30 minutos e chegamos. Incrível, o jardim aumentou em volta da sepultura. Nunca vi tantas margaridas e rosas brancas juntas em um só lugar. Uma nova cruz substituía à velha. Sempre escrito 451. Uma semana depois cortando o cabelo na barbearia do Seu Manoel ouvi alguém dizer: Roubaram a Cruz do Malaquias no Cemitério da paz. Encuquei. Quem era Malaquias?

                       Como bom escoteiro lá fui eu investigar. Morava na Rua Peçanha, atrás do Grupo Escolar Paulo de Tarso. Menino dos seus 12 anos tinha a graça dos milagres. Dizia a todos que quando seu milagre 451 acontecesse ele iria morrer. Fieis batiam em sua porta noite e dia. Curou cegos, paralíticos, doentes incuráveis, mas nunca curou ninguém que merecesse o que acontecia em sua vida. Carma de Jesus dizia! Morreu seis meses depois com seu milagre 451.

                      Fui até o Cemitério da Paz. Conversei com Julião o coveiro. – Vado Escoteiro, o jazigo dele sumiu. Pluft! Assim num estalar de dedo. Contei para ele da sepultura na subida da Colina dos Anjos. Ele me olhou como se não acreditasse. – Porque não vai comigo domingo que vem?  Fomos. A sepultura não existia mais! Fiquei com cara de bobo. Voltamos e não falei mais disso. Até que um dia a Patrulha foi excursionar no Pico da Coruja. Na subida do Morro das Pedras lá estava ela, a sepultura bem no alto, florida, bonita, flores incrivelmente belas. A cruz novinha, lustrada, limpa, envernizada e escrita a fogo: - 451!

terça-feira, 11 de setembro de 2018

Lendas Escoteiras. O Tesouro de Cachorro Louco.



Lendas Escoteiras.
O Tesouro de Cachorro Louco.

Nota – Apenas uma história de Tesouro. Quem nunca sonhou em encontrar um deles? Sentem-se, apreciem a história do Tesouro de Cachorro louco.

                  - Orelhudo! Explique direito. Isto está parecendo uma invenção de Luar do Sertão. – Orelhudo não se fez de rogado – Gente! Eu estava esperando o Padre Goya para me confessar. Andei pecando um bocado esta semana e achei que precisava desanuviar minha cabeça de tanta besteira que fiz. A patrulha calada. Todos conheciam Orelhudo, um dos melhores intendentes que uma patrulha pode ter. Eu conhecia Luar do Sertão. Era sacristão na Igreja do Bom Pastor. Gente boa, meio afeminado, mas ninguém nunca provou nada contra ele. Soube inclusive que dez anos depois se tornou padre, mas esta é outra historia. – Ele abriu um mapa. Bem feito de couro de boi e prensado a fogo na brasa. Quem fez acreditava realmente no tesouro. Tesouro? Isto mesmo. Orelhudo disse que Luar do Sertão lhe garantiu que era um tesouro de Cachorro Louco. – Nossa! Já tinha ouvido falar nele.

                     Quando a estrada de ferro estava sendo construída ninguém queria trabalhar lá. Era mosquito, era malária, eram os índios e ainda por cima centenas de bandidos a saquear qualquer um. Cachorro Louco era tão ruim que enterrou até o pescoço o Padre Gentil em plena Praça de Ipaba. Deixou só a cabeça para fora e ele morreu de inanição rogando pragas e assistido por centenas de moradores que nada puderam fazer. O bandido matou tantos que perdeu a conta. Foi encurralado na Ponte de Ferro de Derribadinha pela policia de captura do Capitão Raios que o Parta. Contam que deram nele mais de mil tiros outros contam que ele pulou no Rio Doce saiu do outro lado e hoje é Pagé em uma aldeia de Botocudos entre Crenaque e Conselheiro Pena. Orelhudo nos mostrou onde ele enterrou o tesouro. Não havia nomes só riscos e rabiscos. Ficamos duas semanas na sede tentando achar um caminho para saber onde estava o tesouro.

                        Foi Dente Cariado quem deu a luz. – Olha acho que é Ipaba. Veja quantos lagos e córregos, sabem o que é Ipaba? É Tupi, quer dizer IPA (água) e BA (muito) isto porque o arraial foi formado entre muitas nascentes rios e lagos. Dente Cariado não perdia a oportunidade de mostrar seus conhecimentos. A cidade hoje fica entre Cachoeira Escura e Ipatinga. Veja este desenho, é do Rio Piracicaba, ele passa na Mata do Parque e é lá que está escondido o tesouro. Uma injeção de ânimo aconteceu. Estávamos naquela condição de marasmo, sem ideias, vontade de acampar, mas sem saber onde. – A luz da aventura e de mais uma atividade aventureira surgiu entre os Lobos. Preparativos mil e marcou-se uma data nas férias de julho. Iriamos demorar para explorar toda área e tudo tinha de ser bem planejado. Um tesouro é coisa de doido. Descobrir e “enricar” é demais. Eu rico? Mamãe e Papai viajando para a Capital? Eu ria a mais não poder.

                       Partimos pela manhã no Expresso do meio dia. Duas horas depois chegamos. Identificamos a lagoa mostrada no mapa. Grande demais. Passamos toda a tarde fazendo uma boa jangada para explorar onde o rio marcado desaguava na lagoa. Ficou ótima. Bem amarrada com Cipó de Corda e ainda tinha muito Cipó de Cobra, Cipó Correlha, e não faltou o Cipó Titica que não quebra nunca. No dia seguinte começamos nossa exploração. As mochilas foram bem presas na jangada. Lá tinha barraca, material de sapa e claro nossa matutagem para refeições. Antes das duas achamos o rio. Apoitamos e passamos a noite em volta assando uma bela traíra que Dentinho pescou. Ficamos até altas horas da noite em volta de uma fogueira para espantar os mosquitos e os lobos que uivavam sem parar. Cedo partimos rio acima. A jangada ficou presa em um galho forte de uma aroeira. Foi fácil a subida. O mapa dizia 2+1. Achamos que seria léguas e uma légua são seis quilômetros.

                         Enfrentamos uma subida de uma cachoeira, umas hordas de mosquitos Gigantes que não mordem mais zumbem demais. Achamos a entrada do penhasco que Dente Cariado disse ser o local do tesouro. De novo escureceu. Uma chuva leve e intermitente durou a noite toda. Armamos só um toldo e ali ficamos até o amanhecer. Um café quente, um biscoito de polvilho e pé na taboa. Entramos na lateral do penhasco. Não mais que dois quilômetros e vimos doze arvores plantadas em linha milimetricamente. Coisa de homens que plantaram calculamos. Elas tampavam uma encosta e claro seria a entrada da gruta onde se guardava o tesouro. Difícil passar por elas. Coladas entre si e deitadas no barranco não dava para ver nada. Com muito custo que nos levou mais de um dia com uma machadinha e dois facões abrimos um buraco entre elas. Gente a visão era demais. Uma pequena gruta que não cabia mais que oito escoteiros em pé, mas no canto um Couro enorme de Boi Guzerá tampava o tesouro de Cachorro Louco.

                Milhares e milhares de notas. A gente pulava, sorria, gritava de alegria. E os planos? Uma sede nova, material de patrulha dos melhores para todo mundo. Uma parte para cada uma das famílias dos escoteiros. O Hospital da Zulmira (uma senhora humilde que em um galpão improvisado ajuda a tudo e a todos). Cada um pegou seu saco de dormir que não era mais que um saco de estopa preparado para colocar capim e virar um colchão. Enchemos até a boca com as notas maiores. Tivemos que fazer duas macas trançadas com cipó para colocar os sacos de dinheiro. Um dia e meio para chegar a Ipaba. Gritos e mais gritos quando chegamos à nossa cidade. O Grupo Escoteiro cheio de gente. A Alcateia, a Tropa os seniores e os pioneiros rindo a valer. O Grupo São Jorge Enricou! Vamos levar todos para o Jamboree Mundial. Já pensou? Eu lá apertando a mão dos escoteiros da estranja?

                  Doutor Ludovico pai de Pé de Chulé gerente do Banco da cidade foi ver as notas que trouxemos. – Sorriu! O grupo calado esperando saber quando daria aquilo em dinheiro de hoje. Alguns já pensavam em comprar uma jardineira para levar a turma acampar. Uma não, umas três. Ele olhou para um lado, para o outro nos deixando em um suspense desesperador. – Escoteiros! Falou como se Fosse o Prefeito Porco do Mato. Escoteiros! Repetiu, sinto muito são notas de mil reis. Não tem nenhum valor hoje. As notas só servem para ascender fogo e mais nada!

                  Hoje eu me lembro de tudo com saudade. Quando leio o que disse o poeta ainda dou risadas: - O dinheiro pode nos dar conforto e segurança, mas ele não compra uma vida feliz. O dinheiro compra a cama, mas não o descanso. Compra bajuladores, mas não amigos. Compra presentes para uma mulher, mas não o seu amor. Compra o bilhete da festa, mas não a alegria. Paga a mensalidade da escola, mas não produz a arte de pensar. Você precisa conquistar aquilo que o dinheiro não compra. Caso contrário, será um miserável, ainda que seja um milionário. E a patrulha continuou como sempre foi. Pobre mas feliz!

domingo, 9 de setembro de 2018

Contos de Fogo de Conselho. Lendas que ficaram na memória.



Contos de Fogo de Conselho.
Lendas que ficaram na memória.

Conta certa lenda na Alcatéia de Seeonee, que estavam duas lobinhas patinando num lago congelado. Era uma tarde nublada e fria. As lobinhas brincavam despreocupadas.

De repente, o gelo quebrou e uma delas caiu, ficando presa na fenda que se formou.
A outra, vendo sua amiguinha presa, e se congelando, tirou um dos patins e começou a golpear o gelo com todas as suas forças, conseguindo por fim, quebrá-lo e libertar a amiga. Quando os bombeiros chegaram e viram o que havia acontecido, perguntaram à lobinha: - Como você conseguiu fazer isso? É impossível que tenha conseguido quebrar o gelo, sendo tão pequena e com mãos tão frágeis! Nesse instante, um ancião que passava pelo local, comentou: - Eu sei como ela conseguiu. Todos perguntaram:
- Pode nos dizer como? - É simples: - respondeu o velho. - Não havia ninguém ao seu redor para lhe dizer que não seria capaz.

Pois é Einstein ao escrever esta história sabia que se não dermos liberdade ao jovem para andar com suas próprias pernas, nunca conseguiremos atingir o sucesso que se espera na formação escoteira. Clarice na sua frase preferida diz: Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania, depende de quanto e como você me vê passar. Não segure a criatividade do jovem. Há mais pessoas que desistem do que pessoas que fracassam. O que você deve escolher?

Não esqueço Tomaz Edson que disse: - O maior elogio que ouvi em toda minha vida de inventor foi: - Nunca vai funcionar. Pois é, e melhor funcionou. Afinal viver é a coisa mais rara do mundo. A maioria das pessoas apenas existe seguindo sem rumo sem saber aonde chegar. Siga sua intuição, deixe o jovem fazer e aprender errando. Você sabe como é primeiro eles te ignoram, depois riem de você, depois sabem que sua maneira de agir os deixou vencer.

E não importa a cor do céu. Quem faz o dia bonito é você... Se souber agir como amigo e irmão e não um sabichão. Vivemos preocupados com a formação. Às vezes criamos o que não queríamos criar. Estamos sempre procurando bons exemplos, temos o que precisamos em nossas mãos e infelizmente não conseguimos enxergar. Esqueça os seus defeitos, não somos donos da verdade e lutamos para atingir a perfeição sem sermos perfeitos.

Olhe para dentro de você, fique quieto e pense, pelo menos uma vez na vida faça isso. Tente se conhecer melhor, você não é um gênio de si mesmo. Deixe de habitar este mundo como se ele fosse só seu. Esqueça as imperfeições, pare e pense, a vida é bela, se ela acaba você morre. Portanto se quer mesmo ser um Chefe Escoteiro, lembre-se que às vezes você se levanta da cama de manhã e pensa: - Será que eu vou conseguir? Se isto acontece ria, cante, lembre-se de quantas vezes você já se sentiu assim.

Você tem uma vida, sua e quem sabe de outros ao seu redor. Os jovens que orienta precisam de você, precisam aprender a caminhar. Deixe-os aprender a fazer fazendo. Não esqueça o que disse nosso Líder Robert Baden-Powell: - “Sempre me pareceu um absurdo que um homem, ao morrer, leve consigo toda a sabedoria que adquiriu na vida enquanto semeava loucuras da mocidade ou vitoriosos sucessos. E deixe que seus filhos, ou seus irmãos mais moços, passem pelos mesmos trabalhos de aprender tudo de novo e adquiram a experiência a própria custa. Porque não pode aquele passar a estes essa experiência prática, de forma que já comecem a vida com seu cabedal de conhecimentos, e assim alcancem, rapidamente, uma escala mais alta de eficiência e de bom senso?

sábado, 8 de setembro de 2018

Lendas escoteiras. E a vida continua...



Lendas escoteiras.
E a vida continua...

Nota - Para mim ela sempre foi uma grande amiga. Apaixonou-se por alguém que não lhe daria o que ela merecia. Diziam nas patrulhas que eu seria seu grande amor, mas não fui. O tempo não explica nossos sonhos de menino. O final foi triste e doloroso, mas a vida é assim, a vida continua para quem precisa viver!

                  - Você a conheceu? Olhei para Lisbela. Sim... Foi minha melhor amiga. Tive muitas amizades com uma jovem foi à primeira. Quando ela adentrou na sede naquele sábado chorando não dei nada por ela. Ela gritava chorava que não queria e sua mãe praticamente a arrastava. Usava um vestidinho comprido rosa, cabelos presos em um rabo de cavalo. Pensei comigo: Outra chorona? O Akelá Flavio Antunes me apresentou. Esta é Ruth, vai ser Lobinha da sua matilha.

                  – Olhei para ela... Parou de chorar. Olhou-me espantada e me deu um sorriso. Sorri também. Ali tudo começou. – Lisbela perguntou: - E como foi que tudo aconteceu? – Não respondi de imediato. Lembrar doía muito. Foi um golpe do destino. Meus pensamentos se misturavam. - Ruth confiava em mim. Na matilha sempre ao meu lado. Nos jogos nos acantonamentos aonde ia ela ia também.

                   - A Akelá não via com bons olhos. Ruth cresceu. Eu também. Muitos interpretavam mal aquela amizade. Eu amava Ruth como uma grande amiga e irmã. Eu era o único que ela sorria e conversava. Fiz a passagem para a Tropa e ela não. Como chorou. – Gritava e dizia: - Não vá! Não sei viver sem você! Sem você não serei mais Lobinha. Após o Grito da Patrulha olhei para ela no círculo de parada. Chorava. No final da reunião tentei consolá-la. Impossível.  

                     Um ano e veio me contar: - Vou fazer a trilha, breve estaremos juntos outra vez. Não demonstrei afeto. Aprendi a ficar longe dela para esquecer. Mas sentia enorme falta. Criticaram-me pela proteção que dava a ela. Pedi ao Chefe para ficarmos na mesmo Patrulha. Disse não sem explicar. Ruth cresceu, ficou uma moça bonita e chamava atenção dos demais. Eu sentia ciúme como amigo e não como namorado. Era uma irmã que nunca tive. Morava no meu coração.

                      Brincamos, acampamos em atividade de sede ou fora. Ia com ela ao cinema ao Shopping, fomos passear de trem e ficava admirado em ver seu sorriso sua vivacidade olhando pela janela voando como se tivesse asas. Fui para os Seniores e logo me avisou que já iria fazer a Rota Sênior. – Olhei para Lisbela. Vi que ela sofria na medida em que contava sobre Ruth. Eu também estava emocionado. Era cruel essa lembrança. Sabia que do destino ninguém foge.

                        Quando ela me disse que ia partir, não acreditei. – Meu irmão vou-me embora. – Embora? Sua família vai mudar? – Seus olhos encheram de lágrimas. – Conheci alguém. Apaixonei-me perdidamente. Os pais dele não aceitam minha mãe acha que sou nova. Acho que sou bastante madura para tomar uma decisão. - Encontrei um grande amor e não vou deixá-lo para trás.

                      – Não perguntei quem era. Não tinha esse direito. Não me disse quem era só me abraçou me deu um beijo na face, segurou minha mão esquerda com a dela, apertou e disse: - Adeus! Partiu naquela tarde de setembro sem dar adeus aos que dela gostavam.

                         - Olhe Lisbela parecia que o amor abandonado era eu. Não parecia amizade, mas sim uma história de amor. Amor? Eu fui seu irmão seu melhor amigo. Meses depois fiquei sabendo por quem se apaixonou. Rodney Sacramento. – Não acreditei. Tinha vinte três anos e ela quinze. Sua mãe me disse que ela partiu com a roupa do corpo. Saiu chorando dizendo que não iria mais voltar. Mãe eu amo Rodney, não importa sua idade, vai ser com ele que irei viver. – Olhei para a mãe dela chorando e suas lágrimas não paravam de cair. O Sênior que eu era nunca compreendeu e nunca quis compreender.

                           - Fiquei sabendo Lisbela que ela voltou. Acho que você também sabe e por isso me perguntou. Você é a mulher da minha vida. Nossos filhos são tudo que um homem como eu pode desejar. Mas verdade seja dita eu a procurei sim, vi que ela precisava de ajuda. Está internada no Sanatório Santa Maria. Meu Deus! Não era a escoteira que conheci. Magérrima, olhos escamoteados, rosto cortado e cheio de rugas. Poxa Lisbela. Ela não tinha mais do que 23 anos.

                            - E Rodney aonde anda. O que fez para maltratá-la deste jeito? Estava tuberculosa. Era tarde demais para a cura. Deixaram-me vê-la em seu quarto que repartia com mais seis outras mulheres. Abriu os olhos quando cheguei. Tentou sorrir, não era mais o sorriso de outrora. Surrando disse: – Eu sei que é você! – Ficamos mudos eu e ela. Recriminações não era hora e nem lugar.

                             - Sabe Lisbela, acredite. Eu sempre te amei e tentei esquecer e não consegui. Você fez de mim outro homem. Agradeço demais por isso. Vieram me contar que ela morreu. Não deixou testamento. Não escreveu sua história. Fui à sua campa. Vazia... Não havia ninguém. Era uma desconhecida, sem amigos, sem pais e foi enterrada em um buraco de terra. Mandei e paguei para fazer uma sepultura descente. Hoje fui lá, ajoelhei e chorei. Precisava chorar. Rezei pedi ao Pai que desse a ela a alegria dos tempos da Lobinha que conheci. Tempos que se foram destino traçado, ruídos da noite que marcaram uma vida.

                            As coisas passam, os dias mudam, os ventos da alegria irão chegar. A vida continua não há como mudar. Sonhamos com a felicidade. Alguns realizam outros não. Alcançar a felicidade é fugir das dificuldades do dia a dia. Como disse o poeta: - E assim a vida continua, ganhando, perdendo, sorrindo e chorando... Procuramos desculpas no passado para alimentar melhoras futuras e nos esquecemos de que o momento de se viver é agora, no presente, com todas as emoções e situações possíveis... Viva!

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Lendas Escoteiras A felicidade não se compra.



Lendas Escoteiras
A felicidade não se compra.

Nota – Qual Escoteiro ou Escoteira não sonha em ir a um Jamboree? Alguns têm a felicidade de ir outros ficam nos seus sonhos e outros lutam pra conseguir. Esta é a história de Gino que um dia foi a um Jamboree!

                          Gino era um jovem humilde. Seu pai carpinteiro tinha o hábito de beber vez ou outra. Quando bebia costumava ficar pelas calçadas jogado como um cão sem dono. A mãe de Gino uma senhora simples aceitava o marido, pois o amava. Ela fazia questão de ensinar a Gino ser bom e honesto. Gino nunca pensou o pior para seu pai e o amava também. Sentia-se feliz com a vida que tinha.

                        Gino era escoteiro da patrulha Corvo. Bom escoteiro fazia suas boas ações diariamente. Na sua patrulha era amado e bem considerado. Gino adorava ser escoteiro. Não era fácil. Gino só conseguiu ser um escoteiro por uma bolsa oferecida pelo Grupo Escoteiro. O pai de Gino era trabalhador, mas ganhava pouco e mal dava para as despesas da casa. Ele e Gino quase não conversavam por causa da bebida.

                        Gino nunca disse a ninguém que seu pai bebia. Isto o entristecia muito. Um dia sem esperar ele apareceu na sede pensando que era dia de festa. Estava bêbado, quase caindo e Gino não sabia onde se esconder. Seu pai não deu vexame, mas o Chefe da Tropa notou e olhou de maneira embaraçosa para Gino. Naquele dia Gino quase morreu de vergonha.

                       Foi nos avisos no final da reunião que seu Chefe falou do Jamboree Brasileiro daí a dois anos. – Será o maior acampamento já realizado no Brasil falou. Gino disse para sí mesmo: - Agora é minha vez. Neste eu vou se Deus quiser. Afinal chega de ver os amigos retornando e contando seus casos. Ele também iria contar os seus. Não tinha este direito? Tristeza na alma e sorriso nos lábios chega, ele pensava.

                      Quem quer anda quem não quer manda pensava. Iria nesse Jamboree de qualquer jeito. Gino era excelente nas técnicas Escoteiras e todos seus amigos o admiravam. Seu Monitor prometeu que ia fazer dele um Lis de Ouro. No entanto ele tinha outro sonho. Participar de um Jamboree.

                     Foi para casa sorrindo e fazendo planos. Desta vez estarei lá. Tinha que juntar mais de mil reais. Só a taxa seria de setecentos. Sonhou que era possível. Um Jamboree Nacional? Incrível! Uma apoteose! O Máximo que ele podia pensar. Milhares de escoteiros e escoteiras. Ele jurou a si próprio que não iria perder essa. 

                        Comentou com seu pai e sua mãe. Eles balançaram a cabeça concordando e tristes por não poderem ajudar. Ele ia conseguir. Começou a economizar. Lutou para juntar um dinheiro lavando carros, limpando quintais e fazendo tudo que os vizinhos pediam. O tempo passou. Faltavam seis meses para a partida ao Jamboree. Gino já economizara mais de setecentos reais. Faltavam somente uns trezentos para o transporte e alimentação.

                     Gino tinha um uniforme antigo desbotado e sabia que não poderia fazer outro. Ia com ele mesmo. Escoteiro trabalhador já tinha comprado seu chapéu de abas largas, sua faca, sua bússola e seu cantil. Iria se apresentar garboso, não ia envergonhar ninguém. Aguardava o Chefe avisar o dia para pagar a inscrição.  

                     Naquele sábado ao final da reunião foi com amigos da Patrulha ver um jogo de Basquete em uma quadra perto de sua casa. Viu seu pai chegando. Assustou. Outra vez pensou? Já havia meses que ele não bebia. Tinha prometido parar. Mas não era o que pensava, não estava bêbado. Seu pai o procurava. – Filho sua mãe estava muito mal e no pronto Socorro o médico deu uma receita enorme. Não tenho como pagar. Sei do seu sacrifício para ir ao Jamboree, mas só você pode ajudar. Só você pode salvar sua mãe. O mundo de Gino caiu sobre ele. Ele amava sua mãe.

                    Gino não iria negar nunca. Foi com o pai e deu toda sua economia. Oitocentos reais. Seu sonho acabou. Jamboree, adeus! Gino não chorou, mas por dentro sentia que não merecia viver. Sonho? Ele sabia também que sua mãe valia muito mais que um sonho.

               Durante cinco dias sua mãe ficou entre a vida e a morte. Numa manhã ela sorriu. Bom sinal pensou. O sorriso de sua mãe foi um balsamo para a tristeza dele. Tentava esquecer o Jamboree. Tinha de esquecer. Agora era esperar eles voltarem para ouvir os amigos contarem como foi. Quando no sábado o Chefe avisou do pagamento da taxa, Gino chorou. Quando o chamaram ele só disse com voz miúda: - “Chefe eu não vou mais”! A patrulha não acreditou. Sabiam que tinha ajuntado todo o dinheiro. Gino com a garganta engasgada não disse mais nada.

                 Gino foi para casa pensando como a vida era ingrata. Não tinha escolha entre o Jamboree e sua mãe ela vinha em primeiro lugar. Sonhou tanto com esse Jamboree e o sonho morreu. Em casa não sorria e não chorava. Tinha sempre para ela um sorriso amargo. No seu quarto chorava, mas entendia sua vida. Sua mãe diversas vezes o abraçava e isto ainda era um consolo para ele.

                      O sábado dia da partida amanheceu com sol e um céu de brigadeiro. Gino foi para a janela ver o ônibus da tropa passar. Calado e taciturno não sorria e não chorava mais. Não adiantava. Deus dizia dai-me força. Vai ser difícil sair dessa fossa! Gino foi para o quintal e sentou embaixo de uma mangueira frondosa.

                      Dormiu e sonhou com um anjo a lhe dizer sorrindo: Gino, você vai conseguir. Você vai ao Jamboree! Acordou assustado. O ônibus buzinou na frente de sua casa. Ele viu seu Chefe seu pai e sua mãe sorrindo. Vá se preparar meu filho, você vai para o Jamboree! Falou sua mãe. Foi demais. Ele não estava acreditando. O chefe da tropa contou que todos se cotizaram.  Souberam do seu ato de grandeza. Um escoteiro assim não ia ficar para trás. Gino deu um salto. Gritou alto. Viva! Ainda tenho sonhos e eles estão sendo realizados.

                    Brincou e cantou na viagem. No Jamboree todo pomposo cumprimentava a todos e dizia: Eu? Sou de Mira Flores e você? E assim ia abraçando a escoteirada. Canadá, Estados Unidos, México, Inglaterra, muitos países. Gino nunca soube quantos. Quando do último dia, os olhos de Gino encheram-se de lagrimas. Desta vez de alegria. Uma grande cadeia da fraternidade. Cantada em vários idiomas.

     O ônibus, a chegada, a mãe e o pai esperando. Gino gritando – Mãe! Consegui! Mãe eu fui ao Jamboree! Mãe, oh mãe, me abrace, sou o menino mais feliz do mundo! Seus pais choravam de alegria. É. Gino conseguiu. Ficou marcado para sempre em sua vida. Seu sonho foi realizado. Ele pensava e dizia em voz alta – Eu não fiquei olhando a montanha. Eu a escalei. Vi o outro lado. Gino sabia. A chave da felicidade é sonhar. A chave do sucesso é fazer dos sonhos a realidade. O mais importante na vida não é o triunfo, mas a luta para alcançar.

Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

Bem vindo ao Blog As mais lindas historias escoteiras. Centenas delas, histórias, contos lendas que você ainda não conhecia....