A história
é a verdade que se deforma, a lenda é a falsidade que se encarna.
O lobisomem de Onda Verde e o valente Escoteiro Pedrito.
Debora
Bottcher uma poetiza sintetizou de uma maneira estupenda como seria as lendas
que correm pelo mundo. Ela tem um poema lindo, que parte dele diz: - “Sou
lenda, porque a lendas correm livres junto ao vento, buscando as vozes da
memória para que alcancem as histórias perdidas no tempo”. Não que Pedrito o
cozinheiro da Patrulha Coruja fosse o “faloreiro”, ou melhor, um garganta na
cidade de Onda Verde. Afinal Onda Verde no interior de São Paulo era
considerada uma cidade com o melhor ar do mundo. Onde se podia sentir o aroma
das flores, onde se podia ver a relva verde como se fosse uma onda espalhada
sem mar. Calma, pacífica, menos de vinte mil habitantes era um paraíso para os
que nasceram lá. Mas o Escoteiro Pedrito nascido e criado lá não era fácil.
Contava “patacas”, valentias e até criava histórias impossíveis, e que ele
sempre era o herói. Seu Chefe de tropa sempre disse a ele do primeiro artigo da
lei. Uma só palavra. – Pedrito deixa de ser garganta! Dizia sempre. Ainda bem
que todos sabiam que sua imaginação era fértil, e compreendiam.
Mas eis que um fato aconteceu e tudo mudou
de repente. Um boato surgiu do nada e serviu de motivo para que todos
habitantes não saíssem à noite. Contava-se a boca pequena que alguns moradores
juraram ter visto um lobisomem rondando a cidade na ultima semana. Até os
escoteiros que tinham o costume de ir às sede a noite na Rua Garça ficaram com
medo e só saiam em patrulhas e nunca sozinhos. Sempre tinha os mais entendidos
que diziam que o perigo era só nas noites de lua cheia e em uma encruzilhada. “Aí
então era um Deus nos acuda” O monstro passava a atacar animais e se não tivesse
atacava os homens ou as mulheres. Diziam que ele adorava sangue humano. Só
volta ao normal quando vem o raiar do sol.
Naquela quinta
a lua era quarto crescente. Na sede da Rua Garça todas as patrulhas estavam
reunidas com o Chefe Naldinho e o Assistente Renato. Lá estavam os águias, os
corujas, os touros e os elefantes. Ninguém faltou. Sabiam do grande jogo e
ninguém queria perder. Seria uma “Busca ao Tesouro Perdido” na cidade. Achavam
que seria um jogo estupendo. Seis pistas espalhadas pelos quatro cantos de Onda
Verde. A primeira seria uma espécie de carta prego. Cada Patrulha deveria abrir
em determinada hora em um ponto da cidade. O que não estava agradando a todos
era o horário do jogo. O Chefe tinha determinado que fosse de seis da tarde às
dez da noite. Assim ele disse o jogo seria mais difícil e para encontrá-lo
seria preciso olhos de coruja. Claro os Corujas também não ficaram muito
animados. A conversa de esquina do lobisomem amedrontava a todos. Menos
Pedrito.
Para mostrar
coragem ele dizia que ia achar o tesouro e “caçar” o lobisomem. Mostrava os
braços estendidos fazendo pose de como ia derrubar o Lobisomem com um soco
somente. No meio da testa. A Patrulha se reuniu para discutir sobre o jogo. Mas
Lavério um Escoteiro antigo entrou com o assunto do lobisomem. Disse que fizera
uma pesquisa sobre Lobisomens e que ele se originou de uma lenda antiga.
Segunda a lenda, o lobisomem seria o sétimo filho após uma sequência de filhas
mulheres. Ele seria um homem normal, que se transforma em meio lobo meio homem
durante as noites de lua cheia. A lenda dizia que as Quartas feiras de cinzas e
a Sexta feira santa seriam os dias mais propícios para o aparecimento do
lobisomem. Quando ele aparece para se saciar de sangue humano, dizia Lavério.
Todos deveriam
tomar cuidado, continuou Lavério, quando os cães ficassem agitados, não
parassem de latir, pois eles poderiam ter avistado o Cachorro grande que nada
mais nada menos seria o lobisomem. A Patrulha ficou muda. Ninguém dizia nada.
Pedrito logo se levantou. Se ele aparecer me chame, dou um jeito nele! Todos riram.
Naquela noite foram para casa juntos. O ultimo a chegar seria Pedrito. Quando
Nando ficou na casa dele ele sozinho, começou a ficar com medo. Agora sem
ninguém na esquina da Peçanha ele pensava se topasse com o Lobisomem. Nem
pensar! Que Deus me ajude! Saiu correndo virou a próxima esquina e entrou em
sua casa espavorido.
Os dias foram
passando. A Patrulha se encontrando e se preparando para o grande jogo. Na
sexta feira seria entregue aos Monitores uma carta prego dando a primeira
pista. Sabiam que no envelope só estaria escrito o local e o horário aonde eles
os Corujas deveriam abrir. As instruções só quando abrissem. Conheciam as
cartas prego. Não era segredo, mas ninguém sabia como era a primeira pista. Naquele
dia era noite de lua cheia. Não ficaram na sede até tarde como era costume. Só
comentaram sobre a carta que tinham recebido e “diabos” o local para abrir seria
na Rua Balalaica, em frente ao portão do cemitério! Caramba! Pedrito não
gostava dali. Claro seria às seis da tarde, mas mesmo assim ele não gostava do
cemitério. Jurava ter visto um dia uma alma do outro mundo voando baixo em cima
das catacumbas.
Pedrito
naquela noite não pensava em assombração, capetas, ou mesmo o tal lobisomem que
por sinal estava sendo esquecido por toda a cidade. Assoviava baixinho uma
linda canção Escoteira que aprendera no último acampamento e pensava como
seriam lindo as montanhas e lagos existentes na canção. Disseram que assim
cantavam os caçadores de peles daquele país, no passado, quando não conseguiam
caçar nada e voltavam em seus caiaques cantando tristonhos e saudosos de suas
famílias que há tempos não viam. Ao virar a esquina da Rua do Papagaio, viu um
vulto correndo em direção ao Matadouro do seu Luizão. Para dizer a verdade em
outras épocas Pedrito teria corrido sim em direção a sua casa, mas, como estava
sem histórias para contar, resolveu correr atrás do vulto. Nem olhou para trás
e quando olhou era tarde de mais.
Viu o vulto passar pelo matadouro e entrar no
cemitério. Nove da noite ele começou a tremer e deu meia volta. Deu de cara com
o Lobisomem. Enorme, parte de cima peluda, dentes enormes, olhos vermelhos
chamejantes, unhas dos pés e das mãos enormes. O bicho o pegou pelo lenço Escoteiro
e o levantou no ar. – Quem é você magrelo papudo? Perguntou. – Pedrito tremendo
e já molhando sua calça curta respondeu chorando – Sou o Pedrito Senhor
Lobisomem! – Pare de borrar de medo e seja homem! Falou o Lobisomem. – Mas sou
um menino Senhor Lobisomem, bom Escoteiro da Patrulha Coruja, bom filho, bom
aluno. Solte-me pelo amor de Deus! – O lobisomem chegou sua boca fedida no seu
rosto e disse – Vou lhe dar uma mordida na orelha, se gostar vou tirar todo seu
sangue, se não gostar quebro seu pescoço e o deixo ir embora! – Pedrito estava
quase desmaiando de medo. Sem perceber quando o Lobisomem ia morder a sua
orelha ele foi mais rápido. Deu uma dentada na orelha dele. O bicho berrou!
Maldito disse. E o soltou levando a mão na orelha.
Ninguém
soube explicar, mas a Patrulha toda apareceu para ajudar Pedrito, estavam com
seus bastões e o Lobisomem tentou correr e caiu na calçada bem em frente ao
portão do cemitério. Ao cair a mascara de lobisomem se soltou e todos viram que
era “Seu” Chulápio, o coveiro do cemitério. – Então é o Senhor o Lobisomem não
“Seu” Chulápio, fingindo e assustando todo mundo. “Seu” Chulápio choramingando
pediu pelo amor de Deus que não contassem para ninguém. Ele não tinha diversão
nenhuma no cemitério. Nem mesmo uma alma do outro mundo ou um fantasma apareciam
mais. Deixaram-no sozinho, pois tinha mais de seis meses que não morria ninguém
na cidade.
A
patrulha ficou com pena do “Seu” Chulápio. Prometeram não contar nada. Mas o
Pedrito, ora, ora. O Pedrito contava para todo mundo da mordida que deu na
orelha do Lobisomem. Todos riam e olhe, Pedrito fazia questão de passar em
frente ao cemitério todas as noites de lua cheia. A cidade passou a admirar sua
coragem. O Lobisomem apareceu outras vezes e não deixou de fazer alguns
habitantes correrem feito loucos. Alguns juraram de pé junto que viram muitas
vezes em noite de lua cheia, o Lobisomem abraçando Pedrito. Quem não gostou foi
à mãe de Pedrito. Teve que dar muitas lavadas na calça de Pedrito. O jovem
Escoteiro valente tinha “borrado” ela de tal maneira que quase teria sido
melhor comprar uma nova.
Bem, deixa
o Lobisomem para lá. O jogo da Caça ao Tesouro Perdido foi um sucesso. Melhor
para Pedrito que junto a sua Patrulha acharam a sexta pista fácil. Claro, com a
ajuda do “Seu” Chulápio que viu o Chefe colocando o tesouro no Mausoléu da
família Crispim. Ninguém soube da ajuda e nem Pedrito contou para ninguém. O
Tesouro? Oito canivetes suíços. Lindos. Valeu. Certo ou errado, Pedrito era um
bom escoteiro. E como caçador de Lobisomens e Vampiros sua fama correu mundo.
Mundo? Claro, mundo de Onda Verde, a cidade que ele viveu e morreu amando para
sempre.
E quem quiser que conte outra...
Sou Lenda,
porque as lendas são envoltas em Mistérios e
Magias.
São uma criação dos caminhos da mente, da vaga
imaginação da liberação dos silêncios da alma...