Contos ao
redor da fogueira.
Quando o fogo
aquece a alma.
... – Este conto é uma
homenagem ao chefe Alexandre Fejes Neto, mais conhecido como chefe Lecão e
grande escritor escoteiro. Em dezembro de 2016 tive a honra de conhecer e
conviver com ele por algumas horas em seu grupo escoteiro em uma agradável
conversa ao pé do fogo que deixou saudades. A ele meu Anrê e sei que lá no céu
ainda está fazendo escotismo dos bons, uma de suas maiores escolhas desde que
entrou para o Movimento Escoteiro.
- Uma noite como as
outras... Na grande cidade não se via estrelas, cometas e a lua não deu sinal
de vida. Ventos calmos sopravam de leste para oeste. A chama pequena da
fogueira tinha toda a atenção dos Chefes Cabeças Brancas e do Escoteiro a sua
volta. Vez ou outra surgia um caso, um conto um pedaço de alguma lembrança. Despretensioso o fogo não se importava quando
alguém com um pequeno galho mexia e remexia nas suas brasas e ele danado
soltava fagulhas no ar. Sem alarde um Cabeça Branca contou a história de Minarã,
pois diziam que só ele possuía o fogo. Dizia à lenda que os Caingangues sabiam
do valor da luz e o calor vindo do sol. Os alimentos ainda eram comidos crus.
Minarã um índio de raça estranha, egoísta guardava para si os segredos do fogo.
Sua cabana era constantemente vigiada e sua filha Iaravi era quem mantinha o
fogo sempre aceso. Os Caingangues, porém, não desistiam de possuir o fogo
também. Precisavam para sobrevivência e não se conformavam com a atitude
egoística de Minarã.
Os Cabeças Brancas
sentados em volta do fogo e o jovem Escoteiro olharam para o narrador que
sentado com pernas cruzadas à moda índia, tirava pedaços quentes da lenda que
nunca foi contada. Fiietó um inteligente e astuto jovem da tribo, decidiu tirar
de Minarã o segredo do fogo. Transformou-se em gralha branca, apelidado Xakxó e
partiu voando para o local da cabana e viu Iaravi banhar-se nas águas do
Gôio-Xopin, um rio largo e translucido. Fiietó lançou-se no rio e se deixou
levar pela correnteza ainda disfarçado de gralha. A jovem índia fez o que
Fiietó previa. Pegou a gralha e a levou para dentro da cabana e ainda molhada
sentaram em frente ao fogo. Quando secou suas penas, a gralha pegou uma brasa e
fugiu... – Um interesse momentâneo surgiu no piscar das sobrancelhas dos
Cabeças Brancas e do Escoteiro.
Minarã, sabendo do
ocorrido perseguiu a gralha que se escondeu em um toca entre as pedras. Minarã
tocou na toca até que viu a vara ficar manchada de sangue. Pensando que havia
matado, Xakxó regressou contente à sua cabana. Esperto Fiietó esmurrara seu
próprio nariz para enganar o índio egoísta. Saiu do esconderijo voou até um
pinheiro. Ali reascendeu a brasa quase extinta e com ela incendiou um ramo de
sapé, levando-o no bico. Mas com o vento o ramo incendiou-se e pesado caiu do
bico de Xakxó. Algumas brasas caídas propagaram fogo nas matas e florestas
distantes. Veio à noite e tudo continuou claro como o dia. Foi assim dias e
dias. Os índios das tribos próximas nunca tinham visto tamanho espetáculo e
cada um levou brasas e tições para suas palhoças.
Um dos Cabeças Brancas
levantou e atiçou novamente a fogueira. Um outro tossiu provavelmente pelo
orvalho da noite. Até o Escoteiro calado pensou qual seria o final do conto, da
fábula que acabava de ouvir. Um dos cabeças brancas do Ar, falou com voz rouca
para todos ouvirem: “Somos da terra... A terra somos... Todo dia é nosso... Os
nossos somos todos... Precisamos usar nossa flecha da sabedoria com o arco da
esperança e reconquistarmos o que éramos”. Seria uma conotação do fogo? De suas
origens? Ou seria do seu “escoteirismo” tão vivido e que hoje não era
mais? E eis que lá no cantinho da Serra
da Cantareira avistaram a lua surgindo, e ele saudoso dos seus tempos de
Aeroplano, terminou assim: - “Procure conhecer-se, por si próprio. Não permita
que outros façam seu caminho por você. É sua estrada, e somente sua. Outros
podem andar ao seu lado, mas ninguém pode andar por você”!
E o fogo apagou o dia e
a noite dos Cabeças Brancas e do Escoteiro. Dizem que um deles hoje mora no
céu, alguns outros sobreviveram para contar esta história. Para um deles o
Decano, foi seu último fogo do conselho até hoje lembrado e nunca esquecido.
Saudades que ficam saudades que se vão saudades que não deixa a gente esquecer
jamais!
Nenhum comentário:
Postar um comentário