Como se fossem gardênias e jasmim
florindo em todas as partes, uma brisa gostosa vindo de todos os lugares, a
frescura do local, as canções de pássaros e insetos, ver as montanhas azuis ao
fundo, eu tenho as imagens mais linda e agradáveis que a natureza me deu. Vale
do Eco, nunca mais te esquecerei.
A incrível aventura do Chefe Gerônimo no Vale do Eco.
Não
conheci Gerônimo muito bem. Uma ou duas vezes para ser mais preciso. Deixava a
desejar como Chefe Escoteiro nas conversas com amigos se ele tinha algum é
claro, pois estava sempre com uma carranca de assustar qualquer um. Na última
vez que o vi acho que estava com uns vinte e seis anos. Sabia que sua família
lhe dava tudo e ele não dava nada em troca. Nunca foi bom nos estudos. Mas não
era mau sujeito. Não fazia mal a ninguém. Ria mais que falava. Quando o vi pela
primeira vez estava como Chefe de tropa Escoteira. Dizem que se queres conhecer
uma boa tropa, veja seu Chefe seus Monitores e como eles faziam o sistema de
patrulhas. Acho que o Chefe Gerônimo era perfeito. Melhor ainda a escoteirada
gostava muito dele.
Gerônimo
nunca foi bom aluno. Passou raspando e quase não chegou ao segundo grau. Entrou
como Escoteiro já com treze anos. Bem mandado não sabia mandar. Na Patrulha
todos gostavam dele. Como se diz – “Jerônimo é um bom companheiro”. Não gostou
muito dos seniores. Lá achavam que ele era parecido com um “Nerd”. Quando
surgiu as guias piorou tudo. Ele não se sentia bem com as piadas que faziam
dele. Começou a faltar às reuniões até um dia que não voltou mais. Nunca o
procuraram em sua casa a não ser Saulinho, um Escoteiro que foi seu amigo para
sempre. O grupo passou por uma fase difícil. A liderança do Diretor Técnico não
era das melhores. Muitos chefes voluntários que entravam ficavam pouco tempo. A
tropa Escoteira ficou sem Chefe. O Diretor Técnico não conseguiu ninguém. Na
Patrulha da Raposa alguém falou de Gerônimo. Os Monitores foram a casa dele.
Fizeram o convite. Gerônimo sorriu como se estivesse recebendo um presente.
Durante
um ano Gerônimo foi um bom Chefe de tropa. Conversava pouco, falava sempre com
os Monitores. Para dar exemplo terminou o segundo grau. Seus pais ainda
insistiam para ele tentar uma faculdade mesmo com vinte e seis anos. Depois de um ano os escoteiros começaram a
pensar que o Chefe Gerônimo não era o que pensavam. Nandi era o Monitor mais
antigo. Mais sensato. Mais comedido. Foi à casa do Chefe Gerônimo bater um papo
e quem sabe ver se ele poderia mudar no seu sistema de direção com a tropa.
Gerônimo só ouviu. Nada falou. Nadi comentou na Corte de Honra sua conversa com
o Chefe Gerônimo. Desde que foi a casa dele não voltou mais para a tropa. Os
pais de Gerônimo foram procurar por ele no grupo. Havia sumido há três dias. A
tropa ajudou nas buscas. A polícia achou que ele fez as malas e foi embora. Não
deram muita “bola”.
Durante dois meses o procuraram em todos os lugares, a cidade era
pequena, menos de sessenta mil habitantes. Chefe Gerônimo sumiu mesmo. Não deu
mais notícia. Seus pais correram meio mundo procurando. Desistiram e voltaram a
sua rotina. O trabalho dizem, faz a gente esquecer os dissabores e as tristezas
da vida. Os escoteiros ficaram sem Chefe. Ninguém para assumir. Os Monitores
não deixaram a peteca cair. Eles mesmos programavam e até que estavam gostando
das reuniões que as patrulhas davam. Um dia acharam que podiam acampar. Estavam
proibidos de sair da sede. Tanto falaram que convenceram o Diretor técnico.
Prometeram que iam ao Vale do Eco. Acamparam lá muitas vezes. Era um ótimo
local. Boa aguada, riacho raso, sem cachoeiras, mata pequena, muito capim
gordura e bambus à vontade.
Claro, havia um local perigoso. Os penhascos de Santa Maria. Mas era o
melhor local para se divertir. Lá em cima avistavam todo o Vale do Eco. A
garganta era profunda. Se alguém caísse era morte certa. Mas o eco era
fantástico. Ribombavam em paredes lisas de pedras e um grito ficava minutos a
minutos respondendo até que baixinho sumia. Uma festa. Fizeram mil promessas. O
Diretor Técnico consultou alguns pais. Eram a favor. Eles confiavam anos
filhos. Os preparativos foram grandes. Eram três patrulhas. A Patrulha Onça
Pintada ficou de conseguir transporte da Prefeitura. O Doutor Leopoldo o
prefeito fora Escoteiro. Nunca deixou de colaborar. A Patrulha Jaguatirica foi
até o Super Mercado do seu Nonato. Seriam quatro dias. Levaram uma lista. O que
ele desse estava bom demais. A Patrulha da Coruja foi até o empório do Senhor
Leonel. Precisavam de mais alguns materiais de sapa e lonas para toldos.
Durante duas semanas prepararam tudo. Na quinta feriado, às seis da
manhã estavam todos na sede. O caminhão da prefeitura já estava lá. Alguns pais
foram se despedir. O Diretor Técnico não apareceu. Não havia nenhum adulto do
grupo. Nandi o Monitor da Jaguatirica o mais velho dirigia tudo. Cantando e
dando adeus partiram na maior alegria. Às onze da manhã chegaram próximo ao
Vale do Eco. Iam acampar ali. Conheciam o terreno de cor e salteado. Fizeram um
programa simples. Uma Patrulha ia tentar encontrar um lobo guará e chegar pelo
menos a cinco metros dele tirando uma foto. Não era fácil. Eram uma Alcatéia
arisca que morava no estreito do nevoeiro no vale do eco.
Outra Patrulha programou fazer
uma ponte pênsil, usando bambus e cipós. Levariam dois dias no mínimo. A
terceira Patrulha programou construir um Ninho de Águia onde coubessem todos
participantes. Mais dois dias. Prepararam três jogos noturnos, e uma noite só
para desafios do Quebra Coco e a ultima o Fogo de Conselho. Tinham também
vários jogos para o dia não ficar monótono. Muitos escoteiros iriam testar na
cozinha para a especialidade de cozinheiro, outros queriam de primeiros
socorros e uma meia dúzia de acampador. O programa estava completo. Claro que
sempre à tardinha todos iriam até a os Penhascos de Santa Maria. Perto. Menos
de trinta minutos de subida. Mas a diversão era garantida. Cada um improvisava
um grito. Outro em sequencia e parecia que centenas de vozes iguais repetiam lá
no fundo da garganta.
Foi no
segundo dia quando estavam descendo que avistaram uma fumaça bem no meio do
Vale do Eco. Próximo à curva do Vento. Estava escurecendo, mas sabiam que no
dia seguinte os Monitores iriam até lá para saber quem estava acampando ali. A
noite foi uma delicia. O jogo da caça a coruja deixou todos vibrando e a
Patrulha da Onça Pintada campeã cantava a mais não poder. Sempre lá pelas dez
da noite, acendiam um fogo e ficavam até onze ou meia noite conversando entre
si. Uma cafezinho ou um chocolate quente era mantido em um bule grande
esquentado na brasa. Não faltava o Nonô da Patrulha Coruja com sua flauta
mágica.
Nandi
tinha combinado com os Monitores que logo após a inspeção, passariam ao cargo
au submonitor e eles iriam ver quem estava acampado ali. Sabiam que não eram
outros escoteiros. Iriam camuflados. Não sabiam o que iam encontrar. Tinham
experiência em camuflagem. Chegaram à garganta e foram bem devagar no riacho
que estava bem seco. As chuvas do verão ainda não tinham chegado. Menos de meia
hora avistaram uma cabana. Simples. Feita de sapé com madeira cortada nas
imediações. Uma rede de cipó embalava um homem. Estaria morto? Parecia. Não se
mexia. Melhor chegar para ver. Um susto! Impossível! Era o Chefe Gerônimo.
Abatido, sem forças e barbudo. Parecia que não se alimentava há dias. Tentaram
reanima-lo. Difícil. A fraqueza era muita. Nonato voltou ao acampamento para
buscar mais escoteiros. Fizeram uma maca.
Antes do
meio dia chegaram. Algum cozinheiro já tinha preparado um caldo de feijão bem
forte. Tiveram que colocar em sua boca. Deram um banho nele com uma toalha
velha. Ficou na Barraca da Coruja. Eles tinham duas. Apertando uma só caberia
os sete escoteiros. O programa da tropa mudou. Sempre uma Patrulha para ficar
com o Chefe Gerônimo. Impossível buscar socorro na cidade. Ficava a mais de cem
quilômetros. Melhor é tratar dele no acampamento e esperar o dia do retorno. No
terceiro dia Chefe Gerônimo levantou. Olhou para todos. Viram que seus olhos
encheram de lágrimas. Quis falar, mas não conseguiu. No quarto dia ele já
andava bem, mas pouco falava. Pediu para participar do Fogo do Conselho. La
pela tantas fez um sinal. Pediu para falar.
Não
sei o que me deu. Uma névoa tomou conta da minha mente. Peguei minha mochila,
coloquei alguns víveres e em uma carona em uma caminhonete cheguei próximo
daqui. Fui subindo córrego acima. Parei na curva do Pássaro Preto encontrei um
descampado. Vocês me encontraram lá. Cinco dias depois meus víveres acabaram.
Não sei como vivi esses dois meses que ali fiquei. Não me lembro de nada. Sabia
que as noites alguém me alimentava. Quem nunca soube. Um dia resolvi voltar
para casa. Estava com saudades dos meus pais. Não consegui. As pernas não
obedeciam mais. Fiz a rede de cipós e ali passava as noites e os dias. Acordei
aqui com vocês. Não sei o que houve o que fiz e quem me ajudou.
A tropa
ficou calada. No ultimo dia voltaram à cidade. Os pais do Chefe Gerônimo
fizeram uma festa para o retorno dele. Cinco meses depois ele voltou ao Grupo
Escoteiro. Outro Chefe Gerônimo. Mais ativo, mais falante, mais inteligente.
Retornou a tropa. Aceito por todos. Assumiu cinco anos depois como Diretor
Técnico. O Grupo mudou muito. Vários chefes novos. Uma diretoria atuante. Chefe
Gerônimo se formou em Letras. Professor na Escola Técnica logo foi eleito
vereador. Nunca saiu do Grupo Escoteiro. Dizem que casou não sei. Mas sei que a
tropa Escoteira até hoje, com os jovens daquela época já adultos sempre contam
uns para os outros a grande aventura que tiveram no Vale do Eco. São coisas
assim que marcam os escoteiros. Cada um sempre tem uma história para contar e a
do Chefe Gerônimo será lembrada para todo o sempre!
"Que um dia possas ter a percepção necessária
para saberes onde estiveste que um dia
possa ter a visão
necessária para saberes para onde vais e
o
discernimento necessário para saberes quando estas
a ir longe demais.”
“Escreve na areia aquilo que doaste,
grava sobre a rocha o que recebes.”.
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