Lendas
Escoteiras.
“O Tambor”.
Eu ouvia latente nos
ouvidos e sorria... Até gostava. Sabia que o som logo iria parar. Maestro Munir
ia escutar e uma bronca ele iria levar. Nas palavras do Velho Chefe havia amor
naquelas batidas, nem tanto sonoro e sem nenhum clamor musical. Era um dum, dum
sem eira nem beira, mas que encantava o aprendiz de tamborista. Quem um dia não
sonhou em marchar com o esquadrão, à tropa, como uma legião de valentes
soldados ou escoteiros a caminhar em passos firmes para muito além do que
poderia imaginar? Buriti sorria, com a baqueta batia leve na pele de carneiro
que emplumava a base de metal. Fazia tudo desordenadamente. Ainda não sabia as
diversas etapas que o Maestro aprendeu com o Sargento Ramires, da banda do
Sexto Batalhão de Infantaria. Para ele as marchas e contra marchas tinham
trilhas musicais. Mas aquele som! Era demais. Se Buriti fosse um maestro de
sinfônicas famosas e não famosas, veria que seus ouvidos só escutavam a
primeira sinfonia de Beethoven a tocar sua
“Sonata ao Luar"!
Como eu ele tinha
apenas seis meses de tropa. Nos lobos sabia que nunca seria um tamborista, um
batedor na Banda do Maestro Munir. Nunca pensou em tocar um clarim, ou
tamborilar uma caixa clara e para ele um Bumbo nem existia. Mas nunca deixou de
sonhar, em marchar levando um Tambor, quem sabe um Surdo Mor escorado no
joelho, jogado para o ar como muitos faziam nos maravilhosos desfiles que só os
escoteiros sabiam fazer. Nunca esqueceu seus quatro anos, quando se desgarrou
dos seus pais e sumiu na multidão dos marchantes que exibidos se punham a
mostrar seus dotes na Avenida principal sob os aplausos dos políticos, do
popolucho que lá estava a vibrar também com a banda, com os escoteiros, com os
soldados e até mesmo com a garotada do Colégio Mercês ou o Ginásio Tomaz Flores
e até mesmo alguns Grupos Escolares que se dispunham a participação da
celebração do Sete de Setembro, data que ele nem sabia existir. Buriti era
sorriso, alegria contentamento ali na frente da bateria infernal, da banda numero
um da cidade, marchava com seus passos miúdos acreditando que era mais um a
desfilar. Quando seus pais o acharam ele batia palmas para agrado geral da
escoteirada.
Nem bem fez seis anos e
meio chorou meio mundo para entrar nos escoteiros. Nem sabia o que era lobinho,
ele só queria marchar e tocar seu tambor... Seu sonho seu amor. Com seus irmãos
lobos correu pelas estradas, andou nas trilhas de Mowgli entrou na caverna de
Shery Khan, nadou no Waingunga e aprendeu a contar estrelas nas noites sem luar
nas matas de Seeonee. Conheceu seu novo herói, seu novo exemplo seu amigo e seu
irmão, Balu para ele era tudo, sua vida seu futuro e até esqueceu um pouco seu
tambor! Viu que enquanto não fosse escoteiro seria apenas um sonho marchar
pelas ruas da cidade batendo seu tambor. Quando nos desfiles portentosos,
celebrando uma data que nem sabia, lá estava ele na sua Matilha Cinza marchando
como se estivesse com seu tambor. Um dia ouviu que iria pular a trilha, subir
os Montes Venturosos da Jângal e encontrar sua nova morada... Seria um
escoteiro, um homem desgarrado de sua alcateia seu antigo lar. Mesmo com os
olhos molhados, foi apresentado aos Morcegos, novos amigos escoteiros que
disseram ser seus novos irmãos.
E o tambor? Onde está o
meu? Bitiboca o Monitor não riu e nem deixou a Patrulha rir. Buriti, primeiro a
marcha na trilha da aventura, dormir na sua barraca, comer a comida de Mindinho
o Cozinheiro, construir pioneirías como Zecacortez o nosso construtor. Vais
aprender a nadar, pescar, seguir a pista da onça do queixada do Bicho Preguiça.
Se for um bom escoteiro serás um segunda classe e vai ralar para ser um
primeira classe. Isto se passar na prova de Jornada! Tudo bem, Buriti aprendeu
a amar tudo aquilo, já entendia o nascer e o por do sol. Gostava de seguir uma pista
de gente de bicho, ou seja, lá o que for. Fez amizade com um pintassilgo, correu
léguas atrás de um tatu e o deixou fugir, pois sabia que era amigo dos animais
e das plantas. E o Tambor? Ele nunca esqueceu. Com treze anos deu seu nome ao
Maestro Munir dizendo que queria ser mais um dos pretendentes e que seu sonho
era bater um tambor... Ser um tamborista sim Senhor Maestro Munir!
Seis meses depois foi
chamado. Mandaram ficar em posição de sentido por uma hora, não foi fácil nem
difícil. Na quinta seguinte foi à vez de fazer seu corpo e sua mão como um
cata-vento. Se for uma prova para ter seu tambor Buriti nem pestanejou. Maestro
Munir era treteiro. Poderia ter sido um Chefe, um voluntário de horas vagas,
casado com Chiquinha pai de Dorinha e Rolimã um escoteiro. Munir amava sua
banda, sempre sonhou em tocar nos Fuzileiros e levar para os Escoteiros o que
aprendeu por lá naquela fanfarra fenomenal. Era sim um Maestro, aprendeu os
movimento com sua “batuta” mágica ensinado pelo Capitão Barbosinha, vivia a
bateria, comia com os olhos enquanto com sua “batuta” fininha escrevia o dó ré
mi! Viu nos olhos de Buriti um substituto a altura. Se passasse nas provas de
classe para ingressar na Banda ele lhe daria a maior atenção. Porque não
começar com um tambor? E depois um Surdo Mor? Se tivesse embocadura lhe daria
um clarim e por ultimo iria ensinar a ele os toques do Rataplã do arrebol, as
batidas do tarol as marchas e contra marchas que aprendeu. Faria dele seu
sucessor, um dos maiores maestros escoteiros que o mundo já conheceu!
No dia do seu batismo,
Maestro Munir sorrindo separou o seu tambor preferido. Queria ver o sorriso de
Buriti, escoteiro que admirava que já conquistara seu coração e a sua segunda
classe correndo para picotar nas trilhas da Mata do Tenente sua nova aventura
sua jornada para ser um primeira classe. Deram-lhe a notícia... Buriti foi
internado as pressas no Hospital Pantaleão. O pulmão não ajudou, seu coração
parou. Doutor Lineu não deu esperança. Maestro Munir chorou. Rezou... Ajoelhado
na porta do hospital e com ele Bitiboca da Morcego acompanhado de dezenas de
escoteiros pediram a Deus pela vida de Buriti, aquele que seria o maior
tamborista que o mundo já conheceu... Não ouve festa, não houve tambor e nem um
toque de clarim. Joshua Corneteiro perdeu a embocadura de tanto chorar. Naquela
sombra tardia no Cemitério do Amor, tentaram cantar o adeus da despedida o que
não aconteceu. Ninguém sabe ninguém viu e o som fúnebre de um tambor tocou... E
naquela tarde modorrenta pela primeira vez na cidade de Ouro fino o Sol e A Lua
se encontram no entardecer pela ultima vez!
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