terça-feira, 25 de junho de 2013

A história de Brian, culpado por suspeita.

Quem tem um amigo, mesmo que um só, não importa onde se encontre, jamais sofrerá de solidão; poderá morrer de saudades, mas não estará só.

Histórias que os Escoteiros não contaram.
A história de Brian, culpado por suspeita.

                              Uma vez eu li não sei onde que ser feliz não é
pecado. A felicidade é desprezada por muita gente. A pessoa feliz sofre o preconceito de parecer uma pessoa vazia, sem conteúdo. No entanto, algo ela tem, senão não incomodaria tanto. Será que é porque ela nos confronta com nossa própria miséria existencial? É irritante ver alguém naturalmente linda, rica, simpática, inteligente, culta, talentosa, apaixonada e, ainda por cima, magra! Nem sei por que estou citando tudo isto, mas quando conheci o Brian pela primeira vez ele era tudo isto. Ele conseguiu dar alma ao Grupo Escoteiro Ventos do Norte. Trouxe o sorriso que faltava e todos ali o amavam. Disseram depois que seu jeito, sua maneira de falar e andar, sua voz cheia de trejeitos poderia transmitir resultados danosos ao movimento Escoteiro. Isto não partiu do Grupo Escoteiro. Nem os pais nunca em tempo algum fizeram qualquer comentário.

                              Brian apareceu do nada e do nada se solidificou como pessoa importante na parte burocrática e em tempo algum alimentou seu sonho de um dia ser um Chefe Escoteiro ou de lobinho. Doutor Janilson o Diretor Técnico até hoje não soube explicar de onde ele veio. Não tinha filhos no Grupo e alguns o conheciam na cidade porque era gerente das Lojas Abil, famosa pelos seus vestidos feitos pelos maiores estilistas do mundo. Ali se encontrava um Gabriell Miuccia Prada, um Bonheur Chanel, um Christian Dior ou mesmo um John Galliano sem falar nas famosas bolsas Louis Vuitton. Era bem quisto pela sociedade local e muitas madames o procuravam diretamente e só queriam ser atendidas por ele. Mas Brian tinha um grande amor. O Escotismo. Como surgiu ninguém soube. Era incansável na colaboração ao Grupo Escoteiro. Conseguiu com suas amizades vultosas colaborações financeiras para o Grupo.

                              Nunca fez a promessa e quando isto acontecia ele corria para o cerimonial e ficava ali, olhando com olhos de inveja, de vontade de ser mais um sem poder ser pois sabia que nunca iriam lhe dar esta honra. Ele tinha certeza que no Grupo Escoteiro seus trejeitos eram considerados normais pois sabia que uma pessoa com preconceito é, uma pessoa que não merece respeito. E ele respeitava a todos. Mas não era o que pensava Jonny Vampuso. Ele mesmo se perguntou varias vezes se estava certo eles terem no Grupo Escoteiro um sujeito que era conhecido como um homossexual ou um sapatão. Verdade ou não ele descartava o que um dia um filosofo disse que devemos evitar toda “precipitação” e todo o “preconceito” ao analisar um assunto e só ter por verdadeiro o que for claro e distinto.

                               Uma das maiores alegrias de Brian foi quando a Akelá Sophia o convidou para ajudar no acantonamento distrital. Brian nunca se sentiu tão feliz. Parecia estar em casa ou melhor no paraíso. Os lobinhos o adoravam e os chefes passaram a ter por ele um carinho todo especial. Quando retornaram pensou que o Doutor Janilson o Diretor Técnico o convidasse para ser um assistente. Mas nada aconteceu. Ele não sabia mas seu algoz Jonny Vampuso já tinha feito sua cama não só com o Chefe do Grupo mas com boa parte do Distrito e região. É melhor não falar que eram preconceituosos, que julgavam ser conhecer pois a maioria dos preconceitos são reflexos de defeitos não revelados pelos preconceituosos (Alberto Pires).

                               Não se sabia o porquê de um dia o chamarem no Escritório Regional. O Doutor Janilson disse não saber e nem se ofereceu a ir com ele. Brian sentiu-se um cordeiro a mercê dos lobos a sua volta. Eram quatro. Sisudos. Cara feia. Nem um sorriso. Eram chefes Escoteiros zelando pelo bem e da moral escoteira.  Fizeram mil perguntas e no final da reunião um querendo mostrar ser boa praça o convidou para um café. Falava baixinho, sobre o que pensavam dele, sobre os resultados maldosos que o escotismo poderia ter com sua presença, chegou até a citar Paulo Coelho que disse que quem tentar possuir uma flor, verá sua beleza murchando.
Mas quem apenas olhar uma flor num campo, permanecerá para sempre com ela. – Você meu amigo ele disse, sabe que não o aceitam em todos os lugares, infelizmente este mundo nosso é cruel. Vamos evitar que façam uma demissão sua, pois você tem o registro anual e seria melhor você pedir demissão do seu cargo no Grupo Escoteiro. Isto evitaria rusgas e processos inúteis.

                                Brian foi para casa com uma emoção profunda. Ele sabia o que era e a vida o obrigou a fingir o que não era. Chorou no ônibus, e a tristeza o invadiu por muito tempo. Saiu do Grupo Escoteiro Ventos do Norte. Ficava aos sábados sonhando com seu passado Escoteiro que para dizer a verdade nunca existiu e se isto tivesse acontecido agora não existia mais. Ele sabia que as nuvens das tristezas são como o vento. Quando desaparecem o dia fica lindo. Pensava em enfrentar a todos os maledicentes, aos preconceituosos que a verdade não é só deles. Falava para si mesmo que nunca devia deixar de fazer algo de bom que seu coração pede. Se isto acontecer o tempo poderá passar e as oportunidades também. Ele já sabia o que iria fazer.

                                  Quando naquela tarde Jonny Vampuso entrou na loja com sua noiva para comprar um vestido ele pensou em não atendê-lo. Afinal ele sabia que o dedo duro foi ele. Porque fizera isto? Ele nunca lhe tinha feito nenhum mal. Pensou e pensou mas seu coração não sabia odiar. O atendeu até melhor que muitos que ali estiveram. A noiva de Jonny Vampuso se encantou com Brian. Na saída Jonny Vampuso num impulso de bom Escoteiro foi até ele e lhe pediu desculpas. Brian pensou consigo se o pedido de desculpas resolveria toda a mágoa que tinha guardado em seu peito. Sabia que Jonny Vampuso errara e será que ele não merecia o perdão? Pensou mesmo em não apertar sua mão. Mas quando viu que ele lhe dera a esquerda, aquela que dizem ser do coração e que o próprio Mestre Baden Powell disse que só os valentes entre os valentes podem se saudar assim, ele aceitou. Quando Jonny Vampuso foi embora as lagrimas desceram novamente.

                                As flores não murcham na primavera mas a vida de Brian se encerrou ali. Naquele mesmo dia dois menores entraram
para roubar e deram um tiro certeiro em Brian. Morreu na hora. A sociedade em peso tristonha mas não participativa. As Madames que ele sempre atendia com presteza ele sempre soube que para elas era como se ele fosse um cão abnegado. Como se elas gostassem que ele disse sempre – Sabe Madame! Eu sou aquele que sempre lhe espera. O som de seu carro tem para mim o valor especial. Eu posso reconhecê-lo entre mil. Os seus passos têm timbre de magia e eles são música para mim. A sua voz Madame é o sinal maior do meu momento feliz e às vezes Madame, vocês não precisam nem falar, eu sei o que querem!

                                 Eu fui ao enterro de Brian. Simples. Não vi lá nenhuma Madame. Talvez a sociedade não perdoasse tal bajulação. Escoteiros? Vi poucos. Uns dez lobos e uma Akelá chorosa. Doutor Janilson apareceu para dizer olá e se foi. Jonny Vampuso também apareceu mas ficou pouco tempo. Quando a terra sagrada o cobriu avistei uma senhora magrinha, vestida simplesmente, com um menino nos braços e em uma das mãos uma menina de uns oitos anos todos chorando. Não tendo mais ninguém lá elas se aproximaram da última morada de Brian. Fiquei curioso. Aproximei-me. – Vocês o conheciam? – A menina chorando e soluçando disse – Era meu pai! A Senhora me contou que era sua esposa. Ele fez um trato com ela quando casaram. Tenho meu amor que fingir o que não sou. Meu trabalho me obriga. A sociedade que eu atendo se sente satisfeita com minha voz, meus trejeitos e sabe, um dia vamos embora daqui.

                                 Que vida, pensei. Ninguém deu nada por ele. O acusaram de ser o que não era. Mas de quem seria a culpa? Dele? Dos que viveram a sua volta? Ou dos preconceitos que norteiam uma sociedade que não aceita os direitos dos que se acham possuídos dele? Não diziam e não dizem que meu direito começa onde termina o seu? Dizem eu não sei que um dia isto vai mudar. Se alguém demonstra respeito, se demonstra caráter e se tem ética este alguém não deve ser visto como um homem ou uma mulher de bem? Eu sei que no escotismo não estamos preparados para isto. Conheço muitos que dizer ser sem terem sido. Mas quem sou eu para julgar? Se um bom trabalho é realizado merece toda nossa consideração. Melhor parodiar Paulo Coelho quando disse – “Daqui por diante, o Universo vai boicotar as pessoas preconceituosas. A energia da terra precisa ser renovada constantemente. O corpo e a alma precisam de novos caminhos para se unirem harmoniosamente. O futuro bate à nossa porta, e todas as ideias - exceto as que envolvem preconceitos - terão chance de aparecer e serão valorizadas pelas pessoas”.

Faça o que for necessário para ser feliz. Mas não se esqueça de que a felicidade é um sentimento simples, você pode encontrá-la e deixá-la ir embora por não perceber sua simplicidade.



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