Lendas
Escoteiras.
Zezito
Sansão... Você é um ladrão!
Zezito Sansão, você é um
ladrão! - O Delegado Paredes olhava-o com um olhar sem piedade e sem compaixão.
Já não sabia mais o que fazer, pois não era e nem seria a última vez que Zezito
Sansão iria parar em sua delegacia. O que fazer com este menino? Ele pensou.
Olhou novamente para Zezito Sansão. Doze anos, magro, pele morena curtida por
viver a maior parte de sua meninice na rua a espera de alguém para roubar. Se pudesse
o colocaria por uns dias atrás das grandes, mas sabia que não podia fazer isto.
Ligou para Nonato Praxedes o responsável do Conselho Tutelar. Já sabia a cara
de enfado que ele faria. – Delegado! – Porque o senhor mesmo não o leva para
sua casa? O senhor sabe que não tem outro jeito, disse Nonato. Não tinha mesmo.
Sempre a mesma ladainha. A mãe dele dona Tiana vivia em uma cadeira de rodas,
enxergava mal e o pior estava ficando surda. Conseguia aos trancos e barrancos
lavar a roupa deles, passar e cozinhar, isto quando Zezito Sansão trazia algum
alimento para casa.
O delegado Paredes o pegou
pelo braço, apertou e disse: - É a última vez. Na próxima vou levar você para a
capital. Lá eles sabem o que fazer com você. Dona Tiana estava acostumada.
Ouviu tudo que o delegado disse. Ela sabia que também não podia fazer nada.
Esperou o delegado sair e olhou com olhos rasos d’água para seu filho. Não
disse nada, fez um sinal e o ele chegou mais perto. Ela o beijou no rosto. Ela
sabia que se ele fosse para a capital ela iria morrer em dois dias. Não tinha o
que comer e nem como comprar. Se não fosse seu filho ela já teria morrido há
tempos. Chefe Enzo chegou à casa cansado. Um dia difícil no trabalho e queria
um banho, jantar e descansar. Priscilla sua esposa sorriu para ele. Ao tirar a
roupa no quarto deu falta de sua carteira. Onde foi que deixei? No serviço não
foi, pois se lembrou de ter pago a passagem do ônibus. Refez o trajeto. Lembrou-se
de esbarrar em Zezito Sansão. Poxa! Só podia ter sido ele. Conhecido ladrãozinho
por todo mundo.
Contou para Priscilla. Vou lá
a casa dele. Tem documentos que não posso perder. Era perto, três quarteirões.
Ao chegar viu a porta aberta. Entrou sem bater. Iria dar uma carraspatana no
menino ladrão. Na cozinha viu Zezito Sansão dar comida a sua mãe. Ela não podia
mexer os braços. Ele paciente colocava uma colher de sopa em sua boca, e sorria
e ela sorria também. Em cima da pequena mesa viu sua carteira. Zezito Sansão
fechou a cara. Encolheu-se de medo. Muitos entraram ali e batiam nele a valer. Chefe
Enzo se desarmou. A cena era demais para ele. Sabia que o menino era ladrão,
mas fazer o que? Na carteira faltava dez reais. O resto estava intacto. Chefe Enzo
olhou para ele, olhou para ela e viu as sombras do medo nos olhares dos dois.
Sabia que não podia fazer nada. Uma ideia surgiu do nada e ele falou – Zezito Sansão
quero você na reunião do Grupo Escoteiro neste sábado. As duas em ponto. Se não
for vou falar para o delegado.
Priscilla o abraçou e disse
que ele não tinha outro caminho. Se o Escoteiro é amigo de todos e faz todos os
dias uma boa ação, era sua vez como Chefe fazer uma também. Mas e os
resultados? Afinal era um menino ladrão. Roubou todo mundo na cidade e até
mesmo o Juiz Juvenal não escapou e nem o Padre Antonino. Que seja, se ele não
ajudasse quem iria ajudar? – Sábado, às duas da tarde Chefe Enzo chegou à sede.
Todos parados olhando para Zezito Sansão. Ninguém sabia por que ele estava ali.
Ronaldinho o Diretor Técnico veio correndo – Ele disse que foi você quem
mandou, é verdade? Ele não disse nada. Não havia o que dizer. Sabia que toda a
chefia não ia entender. Ele se lembrou das palavras de São Francisco de Assis:
- Comece fazendo o que é necessário,
depois o que é possível, e de repente você estará fazendo o impossível. Iria
até as últimas consequências para ajudar Zezito Sansão o ladrão de Santa
Helena.
Zezito Sansão sabia que ele tinha três oportunidades.
Se ele roubasse três vezes seria defenestrado do grupo. Ninguém dos Escoteiros jamais
o ajudariam. Nunca ninguém se entregou ao escotismo como Zezito Sansão. Um amor
enorme, uma vontade de morar ali com eles, viver com eles, respirar o mesmo ar
que eles diziam ser sagrado em um acampamento. Mas e sua mãe? Como iria viver? Onde
iria comer? Sem perceber roubou o relógio de Monserato o monitor. Vendeu barato
e comprou mantimentos para sua casa. No sábado seguinte Chefe Enzo o olhou. – Uma
vez se foi Zezito. Dei um relógio para Monserato o Monitor. Você tem mais duas
oportunidades. Só duas lembre-se bem. Zezito chorou muito aquele noite em sua
casa. Pensou que seu amor aos Escoteiros nunca seria como estava sendo. Mas não
teve jeito. Roubou uma barraca da Patrulha Tigre e não achou ninguém que a
comprasse. Mesmo assim foi um roubo. Devolveu. Sabia que só teria uma só
oportunidade. Ele sabia disto.
Chefe Enzo me
olhou com os olhos cheios de lágrimas. Chefe Vado, ele nunca mais roubou. Ajoelhou
aos meus pés e disse que nunca mais faria isto, mas sabia que sua mãe iria
morrer. Ela não tinha o que comer! – E você Chefe Enzo, o que fez? Chamei a
tropa, expliquei sem humilhar Zezito Sansão. Cada um tinha obrigação de ajudar.
Por muitos anos todos os meses uma campanha do quilo se fez para Zezito Sansão.
Ele entrou para a escola. A diretora queria recusar, mas a insistência minha
foi grande. Responsabilizei-me. Se ele roubar eu substituo ou pago. Fã de São Francisco
eu sabia que ele disse um dia que ninguém é suficientemente perfeito, que não
possa aprender com o outro e, ninguém é totalmente destituído de valores que
não possa ensinar algo ao seu irmão. Consegui com meu Chefe o colocar
como ajudante na área de transporte. Doze anos Enzo? Não podemos. – Eu me
responsabilizo e pago seu salário. Não foi preciso. Ele surpreendeu a todos.
Zezito Sansão
nunca mais roubou. Não sei se foi o escotismo, se foi o dia que jurou a
bandeira ser um homem de bem, que iria cumprir a lei, que seria um exemplo para
todos e que nada é difícil quando se quer vencer. Não me considero um Chefe herói,
pois não sou melhor que ninguém. Sou um simples ser humano que um dia resolveu
ajudar alguém. - A vida nada mais é que, um grande livro de onde nos são
apresentadas lições diárias. Agradeço por tê-las. Eu sei que onde há
amor e sabedoria, não tem temor e nem ignorância e isto é um fato. Chefe Vado,
nunca me esqueço das palavras de São Francisco de Assis: - “Faço tudo o que
posso, tento fazer o possível e lá na frente quando olhar pra trás vou ver que
fiz o impossível”.
Chefe, só para terminar,
Zezito Sansão, cresceu se formou e hoje tem uma esposa, três lindos filhos que
são a alegria de quem um dia nada teve e nunca pensou em ter.
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