Lendas
Escoteiras.
O céu pode
esperar.
Prólogo: - Tentei
segurar sua mão, queria dizer prá ela: - Lara o seu companheirismo e amizade
foram os pontos marcantes e dignos de nossa admiração. Muito obrigado por tudo.
Recitei para mim mesmo: - “Senhor, uns tem e não podem, outros podem, mas não
tem. Nós que temos e podemos agradecemos ao Senhor”. Chorei, copiosamente... Engasgado
na minha saudade não tinha mais nada a dizer!
Ela me procurou
no final da reunião. Nem bonita nem feia. Nem um belo sorriso tinha. Falava
pouco, mas tinha um olhar encantador. Pela maneira de vestir devia ser pessoa
simples daquelas que levantam cedo para trabalhar e só vão dormir quando a lua
autorizar. Entrou como se entra em um
santuário que merece todo respeito. Não me olhou nos olhos, de cabeça baixa me
perguntou: - Quanto? – Não entendi moça... Quanto vocês cobram para entrar?
Agora me olhava como se eu fosse um santo ou quem sabe Papai Noel.
Expliquei. Não
sei se entendeu. - Começo quando? Foi assim que tudo começou. Lara era de uma
obediência canina. Sim senhor, sim senhor era assim que me respondia. Perguntei
quantos anos e ela me disse que passara dos vinte e cinco, mas não tinha
certeza. Era a primeira a chegar e a última a sair. Não se enturmou com nenhum
dos chefes. Para sentir até quando ficaria lhe dei o cargo de colaboradora. Não
discutiu nem perguntou. Até hoje não sei por que não fiz sua ficha de
inscrição. Quem sabe pensei que no dia seguinte e ou nos próximos ela não
voltaria mais.
Um mês, dois seis
meses e ela firme nas suas obrigações. Sabia preencher questionários, fazia
atas, montou um arquivo perfeito. Todo fim do mês lá vinha ela com sua
mensalidade. Pontual no horário e nos pagamentos. No sétimo mês chorando me
disse que não ia mais voltar. Sua hora havia chegado. – Que hora Lara? Não
estou entendendo... – Melhor não entender Chefe, como disse o tal de
Shakespeare? – “Há mais coisas entre o céu e a terra do que pode imaginar nossa
vã filosofia”... Não despediu de ninguém, pois ninguém notou sua participação
no Grupo Escoteiro por todo aquele tempo.
Um mês que ela se
foi. Dois três e comecei a sentir sua falta, ou melhor, saudades... Olhei nos
arquivos, não tinha sua inscrição, não sabia onde morava, se trabalhava se era
casada ou solteira. De uma coisa eu sei às vezes ela olhava os meninos no pateo
com um olhar de amor, de paz, e orgulho em saber que ela era mais um. Um dia
pensei em dizer a ela que quanto maior a admiração, maior é o respeito e o
amor. Mas ela entenderia? Que falta eu sentia dela. Enorme, brutal, incrivelmente
saudosa.
Tibúrcio não
gostava de ser chamado assim. – Chefe prefiro Tim Tim. Porque não? Procurou-me
naquela tarde e displicentemente me perguntou se eu sabia o que aconteceu com
Lara. – Olhei para ele espantando, nunca demostrei afeto além da fraternidade e
amizade escoteira por ninguém. – Ela faleceu Chefe. Há dois meses. Trabalhava
como gari no Bairro Resplendor. Entendi. Longe, nunca passei por lá.
Sincronizando minhas palavras perguntei de que? Câncer Chefe. No pâncreas. – E
como você sabe? – Chefe eu trabalho no posto de saúde daquele bairro, ela
sempre aparecia lá quando sentia fortes dores.
Nina a Lobinha
Cruzeiro do Sul, Tonico da Pardal e Laerte da Avanhagá
esperavam a minha
ordem. Já haviam se apresentado: - Chefe! Bandeira pronta! Meus pensamentos
estavam longe. Coriolano Diretor Financeiro me cutucou: - Chefe a turma tá
esperando há tempos! Acordei das minhas recordações. – Grupo Escoteiro Estrela
Cadente, firme! A Bandeira em saudação!
Naquele domingo
chuvoso fui até o Cemitério da Saudade. Nicanor o coveiro me mostrou onde ela
foi enterrada. Não levei flores, levei apenas o sonho de um dia ter conhecido e
apertado sua mão. Ajoelhei, antes de rezar fechei os olhos e parecia vê-la
ainda triste sem um sorriso a me olhar com satisfação. Baixinho falei... Lara,
você se importa se eu te olhar um pouco? Quero me lembrar do seu rosto para os
meus sonhos. Ela sorriu. Foi sumindo em uma tênue nevoa branca que atingia
aquela parte do campo santo.
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