Conversa ao pé do fogo.
Um monitor a beira de um ataque dos nervos.
Era uma vez... - É sempre gostoso contar histórias de escoteiros.
Histórias como do Monitor Visconde e do Escoteiro Anthony Lambert existem
milhares por aí. Se acheguem, imaginem que estão em volta do fogo, comendo uma
banana assada deliciosa. E vamos viajar nas asas do tempo e da imaginação...
Pois é Chefe,
foi isto mesmo que aconteceu. Se para outros monitores fosse normal para mim faltou
pouco para desistir de ser Escoteiro. Quer saber? Se não fosse minha promessa e
minha lei deixaria o cargo de Monitor para outro. Bem, eu tinha treze anos e
nenhuma experiência de liderança a não ser aquela vivenciada na Patrulha. Não
era um pata-tenra como monitor isto não, assumira no ano passado quando Nonô
foi embora com seus pais. Como ele chorou Chefe. Marcou-me muito sua saída. Todos
nós tínhamos por ele uma enorme amizade e o considerávamos um irmão. Por ser
muito emotivo não fui à estação despedir dele, depois mandei uma cartinha que
contribuiu durante anos para uma troca de cartas mensalmente.
A patrulha me
recebeu bem. Não esperava ser escolhido. Jairo o Submonitor seria a escolha
certa. Mas ele mesmo me indicou e disse que não gostaria de ser monitor. Nem
sempre éramos os primeiros, mas também nunca fomos os últimos. Saímos bem em
qualquer acampamento. Quando assumi no acampamento de julho no Vale dos Sinos ficamos
dois dias em primeiro lugar. Um orgulho danado Chefe. Mas tudo que é bom dura
pouco. Com a saída de Nonô a patrulha ficou com seis. Abriu-se uma vaga e o
Chefe Djalma me chamou na sala da chefia. - Visconde outros estão na lista de
esperava, mas resolvemos dar preferência ao menino Anthony Lambert, filho do
meu Chefe na fábrica que trabalho. Pediu-me a vaga. Eu não podia negar. No
próximo sábado será apresentado à patrulha. Preciso de você para conversar com
a patrulha e explicar o motivo da escolha. Diga a verdade. Não sei o que vai
acontecer, mas abri uma exceção e não pretendo abrir outra.
Não disse nada, afinal a escolha era do Chefe.
Fiz minha parte e a patrulha ficou ansiosa para conhecer o novo membro. Pois é
Chefe ninguém estava preparado nem eu. O menino era um chato, exigente, pensava
ser o dono da patrulha. No primeiro dia pegou o bastão da monitoria e disse que
seria dele a partir daí. Tomei dele educadamente e saiu chorando procurando o
Chefe. Era sempre assim. Se sentisse tolhido corria chorando para o Chefe. Um
mês depois a patrulha se reuniu e pediu a saída dele. E agora? O que fazer? Mas
eis que ele chegou naquele sábado com uma pasta cheia de papéis. – Monitor! No
próximo acampamento quero fazer estas pioneiras. Tirou da pasta um amontoado de
desenhos que nem sei se foi ele quem desenhou. Não disse nada. Já pensava como
aguentar o dito cujo por três dias na Fazenda Aconcágua de Dona Iraci.
Chefe não sei
se o senhor passou por isto, mas eu passei e não quero passar de novo. Falei
para o Chefe Djalma para prevenir seus pais sobre o que seria. Mas sabe o que ele
me disse? – Seu pai deu ordens para ele ir. Colocou a caminhonete da empresa a
disposição. Caso ele não goste ou se sinta mal, eu devia trazê-lo de volta! Ele
tem de aprender a ser homem! – Chefe! O senhor aceitou? – Fui obrigado. Vamos
dar um crédito. Afinal quem sabe tudo acaba bem? No dia da partida lá estava
sua mãe com uma lista enorme. – Chefe Djalma dizia ela – Ele deve tomar tais e
tais remédios. Ele deve comer quatro vezes por dias nos horários certos. Ele
não gosta disto e daquilo. Se tomar sopa ele vomita tudo. Gosta de dormir tarde
e levantar depois das dez... Fiquei pensando no que ouvia. Por mim não vai ter
folga. Ou come o que comermos ou passa fome. E tem mais vai levantar as seis em
ponto!
Quando
chegamos ele todo serelepe queria escolher o campo da patrulha. Ameaçou pegar
um berreiro se não fosse com os monitores. Pela primeira vez vi o Chefe Djalma perder
a paciência. Ele correu e se escondeu atrás das árvores. Preveni o Jairo para
não dar folga. No primeiro dia foi bem. Ajudou nas pioneiras, fez sozinho as fossas
de liquido e detrito que se abriam a um simples toque de pé ou mão. Mas nem bem
escureceu me procurou. – Monitor, quero ir embora, a comida do almoço foi uma
droga. Aqui tem muito mosquito. Vou e volto amanhã, chame o Chefe para me
levar! Chefe Djalma gritou: - Você come aqui, dorme aqui, vai fazer tudo que os
outros fazem e se chorar amarro você naquela árvore e vai dormir ali toda
noite.
É... O Chefe
estava arriscando seu emprego. Podia ser demitido. Seria ruim, pois teria de
mudar de cidade para arrumar outro. Mas Anthony Lambert nem aí. Gritou,
esperneou, chorou tanto que muitos acreditaram nele. Lá pelas nove da noite me
pediu um pouco de comida. Flávio o cozinheiro tinha guardado para ele. Ficou
manso, sentou-se a mesa de patrulha e comeu com gosto. Tinha de comer, fiz
questão de limpar sua mochila dos doces chocolates e biscoitos que sua mãe
colocou lá. Chefe, Anthony Lambert mudou e como mudou. Na chegada sua mãe veio
correndo abraçar o seu filhinho. Ele disse: Mãe espere tenho de ajudar a
patrulha a descarregar o material e guardar. – Seu pai gritou: - Que o Chefe
Djalma o faça você vai pra casa! Ele respondeu para o pai: - Aqui sou
Escoteiro, vá gritar com seus empregados. Só vou quando terminar e saiu de
perto carregando uma barraca!
Olhe Chefe,
nunca vi uma mudança tão rápida. Precisava ver o novo Escoteiro Anthony
Lambert. Eu mesmo não acreditava no que via. O melhor é que ficamos amigos. Ele
ia a minha casa e eu na dele. A patrulha fazia muitas reuniões em sua casa. Sua
mãe era ótima nas guloseimas e fazia questão de fazer no lugar de Lourdinha a
cozinheira. Quando passei para os seniores ele me disse: - Visconde me espere,
breve estarei lá com você! E o tempo passou, cresci estudei e hoje sou o
Gerente na Fabrica de Anthony Lambert! – Olhei para Visconde. Estava eu ele JF
e Juliano sentando em volta de um fogo amigo, na montanha do Grilo. Passava da
meia noite. Todos os escoteiros já tinham ido dormir. Visconde! Perguntei, e
onde anda Anthony Lambert? Chefe! Oh Chefe! Ele hoje mora em Paris. Casou com a
Duquesa de Windsor, vive bem, tem mais cinco fábricas na Europa. Fez questão de
me fazer sócio e depois me vendeu sua parte! Olhe me garantiu que viria aqui
fazer uma visita. Saiu de Paris as três e deve estar chegando no seu jatinho
particular.
Um farol iluminou a estrada dos Afonsos. O
carro não podia prosseguir, pois não havia mais estradas. Meia hora depois ele
chegou respirando fundo. Em carne e osso Anthony Lambert. Gordo, barrigudo, mas
com um sorriso encantador – Preciso voltar ao escotismo disse: - Deu um abraço
apertado em cada um. Sentou na beira do fogo, pegou uma banana assada, no
caneco tomou um cafezinho. - E então? Vamos continuar a prosa?
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