Moralto.
- Em toda minha vida eu só o vi
uma única vez. Na verdade aquele foi um dia especial, não me perguntem por quê.
Notei sua figura surgindo na estrada do Alencar, a pé, com um cajado simples,
mas com passadas belas sem se mostrar cansado. Ele não me disse quem era e nem
eu perguntei. Quando se aproximou de mim senti um brilho em sua figura e
inexplicavelmente ele se transformou. Juro que ao longe estava com uma bata
branca e ali na minha frente estava agora com um lindo uniforme Escoteiro. Como
ele podia fazer aquilo? Era mágico? Se fosse o truque era perfeito. Não usava o
chapéu e eu sei que naquela áurea brilhante o chapéu tiraria toda sua pose
badeniana. Quem seria? Ele sorria para mim, um sorriso gostoso, dentes alvos
olhos negros, cabelos castanhos compridos.
Havia parado ali para
descansar um pouco da minha jornada e fazer um café. Precisava. A Árvore da
Colina já era minha velha conhecida. Pequena, mas com uma folhagem que em todo
seu redor fazia uma sombra invejável. Não havia nascente, não havia rios e nem
tampouco regatos por perto. Somente a árvore para nos dar o descanso devido.
Pensava em chegar ao acampamento da patrulha ao entardecer. Uma obrigação com
meu pai me obrigou a ir depois deles. O destino não era longe. Após a curva do
Falcão já se podia avistar a mata pequena, a cascata e o bambuzal. Tirei a
mochila, pendurei meu chapéu em um galho e duas achas facilitarem o Tropeiro
que iria fazer. Na mochila tinha café e pó. Meu canecão militar serviria para
esquentar a água.
Levantei e disse bem vindo!
Ele sorria. Não era bonito, mas tinha algum especial que encantava a todos em
seu redor. Em vez de sapatos usava sandálias. Calado se assentou a sombra junto
ao tronco. Fechou os olhos e parecia rezar. Passei o café e ofereci uma caneca a
ele. Olhou meu cantil, estava cheio pela metade. Passei para suas mãos e ele
bebeu devagar, parecia sorver o líquido com carinho de quem tem sede. Tomou o
café me olhando nos olhos. Minha caneca de esmalte parecia brilhar em suas
mãos. Fechou os olhos e dormiu por alguns segundos. Acordou sorrindo e
levantou. Colocou a mão em minha cabeça e disse – “Que a paz esteja convosco”.
Partiu sorrindo acenando com a mão e ao longe vi que estava de novo com a bata
branca e seu cajado.
Fiquei só naquela sombra da
Árvore da Colina meditando. Quem seria? De onde veio e para onde iria? O sol já
ia se por na Montanha do Cavalo. Era hora de partir. Ainda havia mais duas
horas de jornada. Conhecia o caminho. Limpei o fogo, joguei uma pitada de água
do meu cantil nas brasas, mochila nas costas e parti. Não olhei para trás. A
Árvore da Colina tinha o dom de não deixar ninguém partir. A noite chegou mansa
e calma. Meu caminho estranhamente era claro, uma estrela no céu jorrava raios brilhantes
na estrada. Nunca tinha visto nada igual. Do alto da Colina avistei a curva do
Falcão. Estava perto. Meus pensamentos giravam entre chegar e lembrar-se
daquela figura tão simples, com um sorriso inesquecível e com uma áurea
brilhante que me encantou para sempre.
Nunca soube quem era. Não
perguntei. Acho que ele sabia que um dia eu iria lembrar-se dele e saber que
ele veio do céu. Porque eu não sei. Eu era apenas um Escoteiro a ir para seu
acampamento. Meu café ele tomou sorrindo sinal que não era ruim. Nunca contei
esta história para ninguém. Eu sabia que a partir deste dia o meu mundo se
transformaria pra sempre. Sabia que agora a paz morava em mim. A harmonia e o
amor reinavam. A paz de um sorriso predominava. Agora eu sabia que naquele dia,
naquela Árvore da Colina, Jesus me deixou entrar em seu coração!
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