Lendas
Escoteiras.
O
lendário bandido Casca Grossa e sua prisão por escoteiros.
Ele sentiu uma pancada na nuca. Foi uma
pancada leve sem muita força que nada significava se não fosse o saco de
linhagem que enfiaram em sua cabeça. Tropeçou e caiu. Outra pancada e desta vez
ficou zonzo a ponto de perder as forças. Amarraram suas mãos por traz e os dois
pés. Amarra quadrada e forte. Feita por quem sabia fazer. Sentiu várias mãos
arrastando-o até uma caixa ou outra coisa qualquer. Depois viu que era uma
carrocinha puxada por alguém. Ele não era gordo, mas chegava pela sua altura a
uns 90 quilos. Calculou que o arrastaram na carrocinha por uns três ou cinco
quilômetros. Pararam e ele ouviu cochichos a distancia. Tentou falar e não
conseguiu. Alguém havia colocado um enorme esparadrapo na sua boca. As vozes
eram irreconhecíveis, mas ele se assustou. Eram vozes de crianças.
Jogaram-no ao chão e ele
sentiu uma dor no ombro direito. Alguém pediu desculpas. Uma voz de uma menina.
Raptado por meninos e meninas? Ele não acreditava, nunca pensou que seria assim
um dia. Alguém passou uma corda embaixo de suas axilas. Sentiu-se arrastado
morro acima. Não era fácil para eles, pois não deviam ser muitos. Por mais de
uma hora o puxavam e paravam para descansar. Agora suas costas ralavam em
pedras e viu que entravam em uma gruta ou caverna. Parece que chegaram ao ponto
desejado. Eles o ajudaram a sentar. Alguém tirou o saco de aniagem de sua
cabeça. Olhou assustado. Cinco meninos e duas meninas. Viu que estavam de
uniformes e sorriu por dentro em saber que eram escoteiros. O que eles
pensavam? Que era um grande jogo? Que ele estava ali para brincar? Ele lembrou
que foi um deles por alguns anos, mas sua vida mudou muito. Agora nem mais
acreditava naquela causa do General Inglês que um dia amou.
Uma menina dos seus doze
anos se aproximou. – Pediu desculpas pelo acontecido, mas ele tinha de ficar
preso. Um menino da mesma idade completou: - Já passamos um telegrama para a
Policia Federal na capital. Em breve virão buscá-lo Outro menino se adiantou e
disse: O Delegado Gastão viajou e o cabo Ursolino estava bêbado, assim não o
levamos para a delegacia. Eles sentaram-se juntos nas pedras da gruta. O
olhavam espantados, mas não estavam com medo. Ele queria falar, mas o esparadrapo
na boca não deixava. Estava com sede. Tentou fazer um sinal, mas eles não
entendiam. Alguém chegou espavorido. Trazia uma mochila e dentro lanches e um
cantil. – O mais Velho dos seus treze anos se apresentou: - Sou o Monitor me
chamam de Morcego. Não queremos seu mal, mas não podemos deixa-lo solto.
Sabemos que é um bandido perigoso e cruel. Vou tirar o esparadrapo de sua boca
e você só pode responder o que perguntarmos. Se falar outra coisa colocaremos
de novo.
Sentiu uma sensação de ar
puro quando tiraram. Era até bom, pois se lembrou de quando quase morreu nas
mãos do Delegado Corsino. Ele o deixou preso a uma raiz de uma árvore sem
comida e agua e com a boca seca. Quase morreu. Pediu água. A menina levou o
cantil até sua boca. Bebeu com sofreguidão. Um menino um frangote de seus onze
anos lhe deu um pedaço de linguiça frita. Comeu e repetiu várias vezes. A
menina pediu desculpas. Vamos embora. Voltamos amanhã e se a policia federal
não chegar trazermos mais comida e água. Partiram não sem antes colocar o
maldito esparadrapo em sua boca. Ele estava acostumado com a forma que o
prendiam. Não se apertou. Encostado e amarrado a uma pedra ele dormiu. Não
sonhou. Não era de sonhar. Sabia que sua vida agora era outra. Não era ladrão
nem assassino, era sim um caçador de recompensas e perseguido por bandidos e
policias de todos os estados. De novo de caçador virou caça.
Acordou com os
escoteiros chegando. Ainda de uniforme. Turminha Caxias. Ele riu para si próprio.
No fundo gostava deles. Lembrou-se de sua promessa de seus acampamentos, do seu
Chefe e dos patrulheiros da sua patrulha. Como ela se chamava mesmo? – Patrulha
do Condor. Não falaram nada. Devem ter lido sobre como conversar com bandidos
prisioneiros. A lábia dele é grande e se soltar morrem todos! Bebeu agua, comeu
um pão com manteiga. Chegaram a ponto de levar outro cantil com café. Gostoso
demais. Sentia falta de um café quente. Tiraram o esparadrapo. – O monitor
gentilmente disse que desistiram de tudo. Queriam soltá-lo, mas tinham medo. A
menina escoteira com os olhos cheios de lágrimas disse que um jornal comentou
que ele era bom, nunca matou ninguém. Foi condenado porque entregou um filho de
deputado a um polícia, que queria a todo custo acabar com a vida dele. Quase o
mataram, mas se defendeu e jogou o filho do deputado em um barranco.
Outro menino
Escoteiro pediu desculpas e disse que queria apertar sua mão, pois soubera que
ele fora Escoteiro. – o monitor disse: - Como soltar você? E se nos matar? Ele
sorriu. Bem que aquela turminha merecia. Ele fora aquela cidade para prender um
fazendeiro que policia nenhuma queria prender. O dinheiro comprava tudo. Se ele
prendesse o fazendeiro e o levasse até o estado do sul ganharia um bom
dinheiro. Lá era procurado e com a cabeça a prêmio. Ele continuou calado apesar
de estar sem o esparadrapo na boca. A menina pegou a faca escoteira. Ele se
assustou. - Agora esta? Pensou. Ela cortou as cordas e ele ficou livre. Todos
correram para o canto da gruta. Enroscaram-se de medo. Muitos tremiam como
varas verdes soltas ao vento. Ele sabia que não ia fazer nada. Foi até eles.
Deu a mão esquerda para cada um. Não esqueceu o sempre alerta. Sumiu na descida
do morro onde ficou preso por dois dias.
O Doutor
Lucrécio da Policia Federal queria saber quem foi que enviou o telegrama. Nele
dizia que a Patrulha Condor (a mesma do bandido) prendeu Zeca Casca Grossa
procurado por todo Brasil. A patrulha Condor no canto de patrulha sorria.
Colocaram no telegrama Condor, mas eles eram os Gaviões Negros. Não havia
patrulha Condor. O Chefe conversou com o Doutor Lucrécio por muito tempo. Ele
partiu sem saber quem passou o telegrama. A patrulha foi para casa unida.
Moravam na mesma rua. Na esquina da Rua do Convento com a Santo Antônio viu
alguém acenar e sorrir. Uma voz forte falou sem gritar: - Obrigado. A alegria de fazer o bem é a única felicidade
verdadeira. Vocês mostraram que são realmente escoteiros. Prometo mudar de vida
e podem acreditar, o Escoteiro tem uma só palavra e sua honra vale mais que sua
própria vida! Ele sumiu e ninguém nunca mais ouviu falar dele. Um dia Anita ao
entrar em um banco foi recebida por um senhor de barba e muito educado: - Seja
bem vinda escoteira ao nosso banco, afinal na Gruta me deste água e eu nunca
mais esqueci! – Nossa! Era ele?
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