“Vitória”.
Você me pediu que não saísse
sozinha. Mas eu tinha de ir. Era sábado e você sabe que eu vou lá faça chuva ou
faça sol. Sei que és minha neta querida, que deixou seu lar para morar comigo
dizendo que iria tomar conta de mim. Foi uma felicidade ter você ao meu lado, e
vendo você sempre contente ao chegar do trabalho e me abraçar. Você me dizia
que não eu não era mais criança. Afinal cheguei aos oitenta anos tempo demais
para viver. Deixei o celular na mesa. Seu recado estava lá. Parti para minha
excursão na Praça das Recordações. Gostava de ficar lá. Sentada naquele banco
azul, eu sabia que eles logo iriam chegar. Nunca me apresentei a eles como
escoteira. Foi um belo tempo, mas meu sonho acabou. Ainda amo e faço dele minha
filosofia de vida. Adorava ver os lobos saltitantes a sorrirem e gritarem alto
Melhor Possível Akelá.
Nunca me senti sozinha ali na
praça. Os lobos me faziam rejuvenescer. Somente um dia um chegou perto de mim,
olhou, piscou seus olhinhos sorriu e saiu correndo a contar para a matilha que
viu uma velha no banco da praça. Eu sorria e chorava. Meu coração sangrava ao
lembrar. Fui importante um dia. Tinha fama, respeitada, tacos pendurados, todos
fazendo saudação. Diziam-me que breve teria o Tapir, e eu sorria de emoção.
Foram tantas comendas que orgulhosamente usava na minha farda querida. Não o
culpo quem sabe a culpada foi eu. Achei que o amava e ele também. Eu solteira e
ele casado. Vivíamos apaixonados escondidos por aí. Um dia alguém nos viu, a
cidade comentou o escotismo não me perdoou. Disseram que eu o seduzi que era
prepotente, imaginosa, metida a bondosa, mas com coração de pedra. Lembranças
que machucam lembranças que não quero lembrar, mas não desaparecem da minha
mente.
Na matriz as seis badaladas
diziam que devia voltar. Minha neta vai chegar e eu preciso de um abraço. Era
sempre assim. Meu coração sangrava das lembranças que devia tentar esquecer.
Chorava baixinho, precisava de um abraço, meu Deus que vontade de abraçar
alguém! Sei que vou chorar a noite toda, eu sei que fui culpada, que mereci a
exoneração. Mas Deus, quantas saudades, que vontade de voltar no tempo e tudo
poder mudar. Eu sei que em um instante tudo muda. O passado nos leva ao
desconhecido. Não existe mais futuro. Não se pode recusar e voltar aos velhos
hábitos. Mas eu me contentava em dizer para mim, que não devia me prender ao
passado, pois assim o futuro poderia nunca vir.
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