Lendas Escoteiras.
O misterioso caso do Chefe Estrada.
A noite estava fresca e a
brisa começou a cair. Passava das onze da noite e a fogueira estava quase
apagando. Cansado do corre-corre dos escoteiros durante o dia pensei em dormir
logo. O programa do dia seguinte seria um grande jogo e eu sabia que iria dar
um trabalhão. Olhei as estrelas no céu e noite uma mais brilhante quem sabe me
trazendo alguma mensagem. Tudo no campo Escoteiro é possível e pelo sim pelo
não olhei novamente. Ali estavam anotadas muitas histórias que ouvi e contei
nos últimos 20 anos. Lembrei-me de um fogo igual a este em um acampamento no
Chile com dois grupos escoteiros amigos. Eu não tirava os olhos do Chefe
Leopardo. Em volta do fogo da fogueira eu e mais oito chefes cantavam e
contavam causos. Ele se levantou e perguntou se alguém já tinha ouvido falar no
Chefe Estrada. Ninguem conhecia. – Ele está aqui no campo, eu o encontrei
depois de anos e anos desaparecido. Fiquei intrigado. Quem seria o Chefe
Estrada?
- Eu o encontrei um dia em um acampamento regional, na cantina do campo –
continuou o Chefe Leopardo. Quando o vi ele sorriu e me abraçou. Nem sei por
que, pois não éramos tão amigos assim. Fui logo pergunto a ele porque
desapareceu do Curso da Insígnia da Madeira que fizemos juntos. Nunca esqueci.
Ele sumiu no terceiro dia. Quase cancelamos o curso por causa dele. Durante um
dia inteiro fizemos uma busca completa e até na delegacia fomos fazer um
boletim de ocorrência. No sexto dia ele retornou. Disse ao Diretor do Curso que
iria embora. Não seria honesto continuar. Pelo sim pelo não foi convidado a
ficar, mas sem receber o certificado. Não quis comentar com ninguém o que
aconteceu, e isto me encucou demais. Agora mais de vinte anos depois ali estava
ele. Não iria perder a oportunidade. Conversa vai conversa vem, me contou o que
fez nos últimos vinte anos. Trabalhou em uma multinacional Alemã, e como
engenheiro de minas passou uma temporada no Amazonas fazendo um levantamento
Topográfico nas margens do Rio Xingu. Procurava algum veio de minério muito
procurado ultimamente.
- Olhe Chefe foi
divertido – disse ele. Vinte dias na floresta sequestrado por uma tribo de índios
Caiapós, próximo a fronteira do Pará com o Mato Grosso. Estava acampado com
mais dois funcionários próximo ao rio Xingu. Havia uma grande jazida de bauxita
e eu mapeava tudo. Levaram-nos para sua aldeia que não era longe. Em uma oca
nos apresentou ao “Benadióro” uma espécie de cacique. Bom sujeito. – Disse em
mau português que ficaríamos ali até o homem branco da estrada de ferro fosse conversar
com ele. Eles queriam uma paga pela invasão do seu território pela ferrovia.
Disse a ele que não era funcionário deles. Não adiantou. Quando a FUNAI
apareceu, resolvi ficar. Valeu a pena. Aprendi com eles a caçar, pescar com
armadilhas e fizemos grandes jornadas na selva. O escotismo me deu uma bagagem
enorme e eu me divertia com isto. A meninada da tribo era divertida. Aproveitei
para fazer patrulhas e nos aventurarmos na selva. Mas eles nem aí com
formaturas só queriam se divertir.
Fiz uma grande amizade com o cacique Babitonga, gente fina. Cheguei a
casar com a Índia Guaraci. Adorável! Um dia tive que partir. Queria levá-la
comigo, mas ela irredutível não quis ir.
Disse-me que os homens brancos não se conhecem, são estranhos e ela não
se sentia bem com eles. O Chefe Estrada se levantou para ir embora. Levantei
também. – Chefe – Não pode ir embora sem me contar o que houve do seu
desaparecimento do curso. Até hoje isto não me saiu da cabeça. Ele sentou
novamente. Sorriu para mim. Vou contar a você o que nunca contei a ninguém. Se
duvidar paciência. Contarei a verdade só a verdade e o Escoteiro tem uma só
palavra. – Prestei a máxima atenção. Até pedi uns salgados acompanhado de um
vitamina que faziam na hora. – Ele começou: - Tudo iniciou quando fui ao
banheiro após a sessão do Chefe Nonato, ao pegar a trilha vi um brilho intenso.
Fui elevado no ar e perdi o sentido.
Acordei deitado em
uma espécie de prato de aço, brilhante e ao meu redor pessoas estranhas,
pareciam formigas gigantes com duas pernas. – Encarei o Chefe Estrada, mas não
sorri. Verdade ou não precisava ouvir sua versão. – Ele continuou – Eu tinha
sido abduzido. Já tinha lido sobre isto, mas acreditar? Nunca. Vi que era uma
grande nave que fazia um zumbido constante. Onde estava? No espaço? Os
estranhos me olhavam e vi que tinha agulhas por todo o corpo. Eu os ouvia
falando, mas suas bocas não mexiam. Parecia que os ouvia com o cérebro.
Enviavam-me mensagens telepáticas me tranquilizando dizendo que em breve
voltaria. Contaram-me que moravam em um planeta distante mais de vinte milhões
de anos luz, e que suas tecnologias faziam com que cruzassem o espaço em
velocidades que a mente não pode medir. Disseram-me que estavam há mais de um
mês no espaço, mas na terra significava poucos dias.
- Eu olhava para o chefe
Estrada e não sorria. Poderia ser verdade. – Ele continuou: - Levaram-me até um
local envidraçado. Um espetáculo. A nave parecia estar parada e milhões de
estrelas passavam como um raio, uma profusão de luzes brilhantes e cintilantes,
em um panorama incrível. Ver tudo aquilo compensava todas minhas pequenas dores
que ainda sentia pelo corpo. Fui até um salão, sem móveis, se despediram e
disseram que não me preocupasse que iriam apagar tudo da memória e eu não ia lembrar-me
de nada. Pedi que não fizessem aquilo. Não podia esquecer. Eles não tinham esse
direito. Entreolharam-se e balançaram a cabeça concordando. Minha mente ficou
nevoada. Desmaiei. Acordei no mesmo local. Daí para frente você sabe o fim da
historia. Não podia contar a ninguém. Tinha prometido isso a eles.
- A
historia do chefe Estrada foi emblemática. Tinha ouvido historias assim, mas
não acreditava. Agora não. Ele era um Escoteiro desde criança. E o escoteiro tem
uma só palavra e sua honra vale mais que sua própria vida. Ele se calou. – O
Chefe Leopardo se calou. – Abruptamente me olhou e disse – Olhe depois disso
ele sumiu. Procurei e nada. Não sei onde
anda, se está vivo, ou se voltou para sua amada Guaraci. Se ele voltou deve
estar lá se divertindo, fazendo o seu escotismo que ama junto a índios amigos.
Olhe, eu o invejo. Hoje estou aqui, sem respirar o ar puro da mata, sem ver a
força de um rio caudaloso, sem poder ver o sol nascer atrás de uma montanha.
Daria minha vida para mudar tudo isso.
- Voltei novamente ao presente.
Um silêncio inquietante. Eram mais de onze da noite. Preparei-me para ir
dormir. Tudo que acontece tem um motivo, o porquê abduziram o Chefe Estrada eu
não sei. Entrei em minha barraca de duas lonas e dormi como se estivesse em
viagem pelas estrelas abduzido por um povo de uma estrela distante que queriam
fazer em seu planeta um Grupo Escoteiro! Quem sabe eu poderia ajudar?
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