Lendas
Escoteiras.
Vida
e morte de Arkansas Chamorro.
Ninguém pode fazer nada. Ele
escolheu seu caminho. Uns dizem que foi o destino outros que foi uma escolha
pessoal. Aconselhamentos, castigos, e brigas homéricas nunca adiantaram. Chamorro
sempre foi assim. Desde que começou a andar. Se dissessem que foi mal criado
não era verdade. O pai de Chamorro era um verdadeiro Diplomata, não na formação
acadêmica, mas no trato com as pessoas. Ninguem na repartição poderia dizer
nada contra ele. Era bem quisto, amado e ali qualquer um daria a vida por ele.
Dona Ana sua mãe era de uma humildade sem par. Sorria para todo mundo, uma das
forças nas filhas de Maria da Igreja do Bom Pastor. O Padre Nilton agradecia
sempre a Deus por ela estar por perto. Resolvia tudo. Se tivesse de pedir
pedia, se tivesse de varrer varria. Não era uma beata não, era uma senhora que
todos admiravam e servia de exemplo para as moçoilas do lugar.
Chamorro era filho único.
Cala-te boca, eu dizia para mim, mas ele devia ter morrido quando nasceu dentro
da carroça do Senhor Lourival. Ela começou a passar mal e não aguentava andar.
Prestativo o Senhor Lourival a levou a Maternidade Santa Rita aonde ela deu a
luz. Um parto simples, um menino bonito, não chorou e sorriu ao nascer. Ate os
dois anos ninguém previa o que Chamorro um dia viria a ser. Ninguem sabe como,
mas um dia ele soltou um rojão debaixo da Saia de Dona Mercês sua professora.
Suas partes íntimas ficaram de fazer dó. Durante um ano não cumpriu suas
obrigações como mestra na Escola José de Alencar. Culpar Chamorro? Ora ele
tinha quatro anos. Ouviu a preleção dos seus pais, de outros mestres e até do
delegado. Mas e daí? Seria que entendia o que diziam? – Quem botou fogo na
delegacia? Quem deu um tiro no trazeiro do Seu Tiago da Farmácia? Quem aos sete
anos assaltou o banco Ipojucan na luz do dia? – Devia ficar preso isto sim
dizia toda a comunidade de Alto da Serra.
Apareceu como não quer nada
na sede do Grupo Escoteiro naquele sábado chuvoso. – Disse para o Chefe: Este é
o melhor dia. Capim escorregando, todos molhados e eu fazendo das minhas. E
ria! – Não dá Chamorro, preciso conversar com sua mãe e seu pai. Depois vamos
ver se posso aceitar você aqui. – Chamorro olhou de alto a baixo o Chefe
Miltinho. – riu e como riu depois que foi embora. - Escoteirada! Gritou. A hora
e a vez de vocês vão chegar. E chegou. Da pior maneira. Quando apagaram o fogo
da sede não restou mais nada. A meninada chorava. Tudo perdido. Quem foi? Ninguém
viu, mas todos sabiam que era Arkansas Chamorro. Cutelo e Bate Volta dois
seniores da Cruzeiro do Sul não engoliram tudo aquilo. – Cutelo, este menino
precisa de uma lição não acha? Bate Volta balançou a cabeça e não disse nada.
Diziam que ele era mudo, mas não era só não gostava de falar.
Derem nele uma surra de
fazer dó. Seniores agindo assim? Sei não. Eu mesmo tive vontade muitas vezes de
esganá-lo. Chamorro sabia quem era Cutelo e Bate Volta. Não contou a ninguém os
hematomas e os olhos sarnentos com que ficou vários dias. Seu pai preferiu não
fazer o BO. - Para que? Chamorro não iria dizer e o delegado quem sabe daria
uma medalha. A sede foi reconstruída. A cidade colaborou com a compra dos
materiais. – Sorridentes os Cucus partiram para um acampamento de dois dias no
Vale do Eco. No dia seguinte voltaram sem nada, pelados e correndo pela
principal avenida da cidade. Entraram na delegacia e o delegado saiu na porta
vermelho e com um chicote na mão. – Desta vez em mato aquele menino! Matou
nada. Arkansas Chamorro sumiu da cidade por três meses. Onde estava? Seus pais
choravam e a cidade aplaudia.
Chefe Miltinho reuniu o
Conselho de Chefes – Não podemos continuar assim. Vamos coloca-lo no grupo. Em
uma patrulha. Pode ser a de Sansão. Ele é forte e dominador. Se não fizermos
isto ele destrói o escotismo no sertão. Não foi preciso. Ele aceitou o pedido e
disse que iria ser o monitor. Até que iam aceitar quando Francesca disse não.
Olhou para Chamorro e com sua vozinha meiga e amorosa disse para ele que teria
de lutar pelo seu lugar. Outros estavam à frente. Arkansas Chamorro tremeu.
Olhou para Francesca, seu coração disparou. Uma paixão enorme em um menino de
13 anos. Não deu outra. Um mês depois Francesca e Chamorro desapareceram de Alto
da Serra. A mãe de Francesca desesperada. A mãe de Chamorro não dizia nada. Um
ano depois Francesca chegou retornou a cidade com uma criança nos braços. – E
Chamorro? – Não sei falou chorosa. Dizem que ele agora é o dono da quadrilha de
pivetes de Alta Floresta. É a cidade ficou em festa o diabo mudou de lugar.
Cinco anos depois os
jornais estamparam em manchetes: - Chefe Escoteiro retorna a sua cidade natal. Alto
da Serra tremeu. Nunca pensou que ele iria voltar. Chefe Escoteiro? De onde?
Quem o aceitou? Chamorro chegou montado em um baio de pelagem branca impoluto
como sempre. Chapelão, faca e facão. Sorria, parou em frente ao Grupo
Escoteiro. Ninguem sorria com sua presença. Estavam admirados por ele estar
assim fardado. Chefe Miltinho levantou a mão e disse: - Chamorro volte para
onde veio. Aqui não é seu lugar. Procure Francesca, coitada luta com
dificuldade para criar um filho que é também seu. – Chamorro parou de sorrir,
foi até ao Chefe Miltinho, ajoelhou e pediu perdão. – Chefe estive preso, sofri
e aprendi. Mesmo nunca tendo me dedicado como um bom Escoteiro a lei ainda vive
em mim. – Levantou montou em seu cavalo e saiu devagar sem rumo definido.
Cada coisa tem o seu
tempo certo para acontecer, Chamorro mudou, hoje é um homem honesto, trabalha
em sua olaria e Durval seu filho ama seu pai. Francesca linda mostrava ser a
Chefe mais feliz do mundo. Dizem que as semanas andam e os anos voam. O destino
ninguém sabe e a vida é para ser vivida. Pois pensar positivo, ajuda e só Deus
sabe o que é melhor pra nós. Enfim tudo aquilo que tem que ser será...
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