Lendas Escoteiras.
A escoteirinha foi morar no
céu!
Ela nem se lembrava como fora parar ali. Sentia falta de visitas inclusive sua
família que a visitava poucas vezes. Nati e Andi duas enfermeiras faziam o
papel de mãe e pai. Ela amava as duas mais que seus próprios pais. Ela também
tinha dois tios que a faziam rir e sonhar que um dia poderia voltar para casa,
correr na escola, abraçar amigos. Joshua o Contador de Histórias e Titio
Aquiles, que se vestia de pirata ou palhaço eram tudo para aquela garotada
naquela Ala C do hospital. No inicio sofreu muito. Seus pais não explicaram a
ela o que tinha, e um dia a levaram para o hospital e ela nunca mais saiu de
lá. Custou a entender o que lhe aplicavam três vezes por semana. Depois soube
que se chamava quimioterapia e Dona Alma uma enfermeira sua amiga disse que só
assim um dia ela podia voltar para casa. Ela chorava nos dias que precisava
fazer a tal quimioterapia. Vomitava, gritava de dor e muitas vezes teve que ser
levada a força. Seis meses e nada de melhorar. Tinha saudades de mamãe Eulália
e do papai Alfredo. Filha única ela tinha tudo e agora não tinha nada.
Aconteceu em um domingo quando aqueles dois meninos e duas meninas de uniforme
escoteiro disseram que iriam formar ali na ala C, uma tropa de Escoteiros. Ela
riu quando disseram isto. Não sabia o que eram os Escoteiros e nem tampouco uma
tropa. Os quatros eram formidáveis. Riam, cantavam, faziam jogos e ensinavam as
técnicas Escoteiras. Maryany passou a ver sua vida de outra forma. Agora ia
para a Quimio mais alegre mesmo sabendo que ia sofrer. Disseram para ela que os
Escoteiros não tem medo, que sorriam nas dificuldades. Eram doze naquela ala do
hospital. De vez em quando um ia embora e Nati ou Andi diziam que ele tinha partido
para uma estrela no céu. Maryany ficava imaginando quando fosse chegar seu dia,
se era longe ou perto demais.
Miro o Monitor dos Escoteiros não sabia ficar sério. Sempre sorrindo e
brincando. Alencar sorria também, e Lena e Tatiana eram uns amores. Ficaram
muito amigas de Maryany. Em pouco tempo a Tropa Escoteira Dos Guerreiros da Ala
C aprendeu tudo para fazer a promessa. Adoravam quando um deles fazia um jogo,
ensinavam um nó, cantavam uma canção. E a lei dos Escoteiros? Maryany sabia de
cor. Naquele sábado de setembro ela sentiu no peito uma enorme pressão, calor
falta de ar e uma dor enorme, mas não disse nada a ninguém. A quimio fazia
efeitos terríveis. Mesmo assim participou de tudo que os meninos escoteiros
fizeram. Sempre batiam palmas quando cantavam a canção das panelas. Riam demais
pensando como seria lavar panelas. – Quando terminarem as provas, disse Miro,
eu vou chamar o Chefe para fazer a promessa de vocês! – E o uniforme Miro? –
Vamos trazer para cada um. Todos sorriam e ficavam esperançosos em vestir o
uniforme dos Escoteiros.
Nati e Andi as enfermeiras sentiam-se felizes com os escoteiros. Choravam
quando alguém era levado às pressas para a UTI. Elas sabiam que de lá não
voltariam nunca mais. Mesmo amando aquelas crianças escondidas em um lugar
qualquer do hospital deixavam uma lágrima correr pela face. O Doutor Pascoal
sempre cobrando para endurecer o coração, mas era impossível. O câncer é
terrível e nas crianças é mais terrível ainda. Na Ala C todos os médicos e
enfermeiras sabiam que não tinha volta. Só um milagre para voltar novamente
para casa. Todos sabiam que era terrível compartilhar com aquela doença e nas
crianças era pior ainda. Vê-los sorrir, chorar, cabeça raspada, uma bata branca
Sabiam que a esperança dificilmente faria morada na Ala C.
Aconteceu em um domingo. Miro disse a Maryany que ela Ia fazer a promessa.
Prometeu trazer o uniforme dela no domingo seguinte. Disse que o Chefe e toda a
Tropa Escoteira estariam presentes. Nunca se viu um sorriso como o dela. Nunca
uma alegria foi tão forte naquela menina. Nem bem eles foram embora à dor no
peito quase a levou. Foi uma semana onde Laura e Emília partiram para morar na
Estrela do céu. Apesar de rotina todos sabiam que as experiências mesmo as mais
difíceis são provas para que possamos crescer mais espiritualmente e aprender
com os erros e entender a vida como ela realmente é.
Maryany na quarta gemia de dor. O doutor Pascoal pediu a Nati e Andi que a
levassem para a UTI. Ela não iria sobreviver por mais do que uma semana. Com os
remédios ele sabia que a dor seria menor e só com o um coma ela iria aguentar
ate seu último dia. Seus pais não tinham mais esperanças. Tudo foi explicado a
eles. Quando Maryany viu que ela seria levada para a UTI seu mundo desabou.
Gritou, chorou, implorou que a levassem na segunda. - Doutor Pascoal! Vou fazer
a promessa no domingo, é meu sonho! – Se for sei que nunca mais iria voltar.
Preciso fazer a promessa. Irei dizer a Deus e a Pátria que serei uma boa
Escoteira na Estrela do céu onde vou morar. Prometeu com água nos olhos que não
iria chorar de dor. O doutor Pascoal nunca ficou tão emocionado. Aplicou nela
uma dose extra de um forte analgésico para ela aguentar até domingo.
Não foi fácil para Maryany sobreviver àqueles dias. Sua força de vontade era
tão grande que quando viu adentrarem na Ala C os Escoteiros ela esqueceu a dor
que sentia. Quando Lena e Tatiana vestiram nela o uniforme ela chorava de alegria.
Queria levantar e não conseguia. Estava fraca demais. Miro tirou seu lenço e
amarrou na base onde estava colocado o soro e prendeu seu braço mais alto para
que ele fizesse o sinal Escoteiro quando de sua promessa. Formaram em volta dos
meninos e meninas da Ala C que acreditam em um milagre. Miro falou disse ao
Chefe – Chefe! Apresento Maryany, uma Escoteira que está pronta para fazer a
promessa. – Todos fizeram o sinal Escoteiro. Uma Bandeira Nacional foi
desfraldada.
Quando o Chefe ia dizer para
ela repetir ela carregada de emoção começou – Prometo pela minha honra, fazer o
melhor possivel para – Cumprir os meus deveres para com Deus e a minha
Pátria... Maryany não terminou. Seu semblante sorria, seus lindos olhos negros
fitavam o infinito. Seu espirito havia partido. Ela não estava mais ali.
Um silêncio sepulcral tomou conta da Ala C. O Chefe foi até ela e colocou o
lenço. Miro o Monitor colocou nela o distintivo de promessa. A tropa cantava
baixinho a Canção da Promessa. Maryany partira, mas sabia o que estava
acontecendo. Amparada por anjos escoteiros estava feliz e orgulhosa com seu
uniforme. Finalmente ela descansou. Foi morar na estrela que escolheu. Todos
ali na Ala C sabiam que Maryany foi para o céu!
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