quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Lendas Escoteiras. O sol brilha para todos.



Lendas Escoteiras.
O sol brilha para todos.

Prefácio: - Agora que já vivi o meu caso posso rememorá-lo com mais serenidade. Não tentarei fazer-me perdoar. Tentarei não acusar. Aconteceu simplesmente.

                     O chamavam de Raoní. Seu nome era Anderson. Foi na patrulha que lhe deram este apelido achando que ele parecia com um cacique muito conhecido. Ele não se importava. Se a patrulha que amava queria assim que assim fosse. Ele tinha os Javalis no coração. Eram muito unidos. Fora das reuniões se reuníamos em frente à casa de cada um. Faziam tudo junto. Cinema, passeios, trabalhos escolares e até mesmo namoravam as mesmas meninas. Risos. O chefe admirava a união da patrulha e incentivava as outras a fazerem o mesmo. Dava os Javalis como exemplo, nos acampamentos, onde o seu campo sempre era o primeiro a ser montado. Eram os primeiros em tudo. Almoço, montagem de campo e jogos.

                Marcaram um feito no Livro da Patrulha onde os mesmos patrulheiros acamparam por 42 noites um fato inédito. Raoní caminhava para "tirar” a primeira classe. Faltava a prova de jornada bem adiantada pelo chefe Ivan. – Raoní, ele dizia. – Só tem treze anos, tem tempo meu jovem Escoteiro. Vamos realizar sua prova em fins de novembro. Raoní tinha tudo esquematizado. Local conhecido e Tavinho iria com ele. Como dizem por aí se a vida é um mar de rosas os espinhos tendem a aparecer. Na tarde de terça ele estava em casa só com sua mãe e seu pai. Vários policiais sem pedir licença invadiram sua casa e prenderam seu pai. Seu mundo caiu. Ele não parava de chorar. Sua mãe se desesperou. Os policiais arrastavam seu pai espancavam-no e o levaram até o Camburão. Os vizinhos chamaram um advogado conhecido.

               Só no dia seguinte ficaram sabendo da acusação. Alguém disse tê-lo visto seduzir Maria Sonia e ela foi encontrada morta a punhaladas em um matagal. Ele e sua mãe não tinham condições de pagar um advogado. O Grupo Escoteiro em polvorosa. Conheciam seu pai e sua honestidade. Seu pai não pode explicar onde estava. Tinha saído mais cedo e só voltou bem tarde para casa. Um misto de dúvida começou a pairar no ar. A loja que seu pai trabalhava recusou a indenizar sua saída. Cancelaram seu cartão de saúde e ficaram em uma situação desesperadora. Raoní não ia mais ao Grupo Escoteiro. Nunca foi abandonado pelos Javalis, sempre fieis. Não sabiam o quanto ele sofria quando contavam dos acampamentos e excursões.

             Sua mãe vendeu o carro que tinham e comprou uma Kombi. Tentou ao seu modo transformá-la em um Carro de Cachorro Quente. Iria começar vendendo como outras guloseimas. Raoní ficou do lado dela ajudando. No principio quase não ganharam nada, mas depois tudo foi melhorando. Aos domingos iam visitar seu pai na prisão. Os três quando se encontravam não paravam de chorar. Ele nunca contou seu sofrimento na prisão. Não tocava no assunto da morte da jovem. Um ano depois ele foi julgado e condenado a vinte e cinco anos de cadeia. Raoní ficou uma semana chorando sem parar. Na cidade muitos quando passavam diziam gritando que ele era filho de um assassino. O tempo foi passando o trabalho aumentando e sempre a patrulha a visitá-lo sem nunca esquecer.

                 Seu pai mudou muito na prisão. Um dia apareceu em sua casa, uma senhora, simpática, vestindo simplesmente, levando em tiracolo seu filho de onze anos. Educadamente contou para sua mãe que quando a jovem fora assassinada ele estava com ela o tempo todo. Sua mãe não acreditava. Ela contou que antes do casamento com ela eles viveram juntos e ficou grávida. Escondeu dele. Ela pediu que ele se afastasse, pois amava outro homem. Seu marido descobriu que era pai do meu filho, mas também tinha o Raoní com a senhora. Uma vez por semana ele a visitava para ficar junto ao seu segundo filho e ajudava nas despesas. Ela disse que não falou nada antes, pois era evangélica, e não queria se envolver. Sua mãe não condenou.

                 Interessante que enquanto elas conversavam Raoní fez amizade com Miltinho. A ideia de ter um irmão o fazia feliz. Agora muito mais, pois sabia que seu pai era inocente. Dois anos depois prenderam o verdadeiro assassino e soltaram seu pai. O delegado viu o erro cometido. Demorou cinco meses para o Juiz ordenar a soltura. Os vizinhos quando o viram chegar ficaram envergonhados, pois nunca ajudaram a mãe de Raoní. Seu pai estava um “trapo” quando retornou. A imprensa nada disse. Ele não era mais manchete. Mesmo injustiçado nunca condenou ninguém. Nem foi ao seu ex-emprego reclamar alguma coisa. Ofereceram a ele entrar com uma petição para exigir do Estado uma indenização. Ele também não quis. A vida continua. Isto fez parte do meu crescimento dizia. 

                 Sua mãe fez amizade com a mãe de Miltinho e eles sempre iam visita-lo em sua casa. Seu pai não comentou o porquê escondeu tudo. Raoní sabia que ele não queria prejudicar a mãe de Miltinho. Agora com seu pai compraram outra Kombi e em pouco tempo abriram um restaurante. Ele agora era outro homem. Mudaram para uma casa maior em outro bairro. Raoní pensou muito se voltaria ao Grupo Escoteiro. Ele sabia que a sua Patrulha sempre foi solidária, mas os outros não. Mesmo assim ele voltou com a cabeça erguida. Muitos chefes vieram abraça-lo e pedir perdão pelo julgamento infundado. Miltinho também entrou para o Grupo Escoteiro.  Agora eram uma família feliz. Deus soube conduzir seus destinos para que a verdade viesse à tona.                  

               Raoní sabia que perdoar era melhor que condenar. Um poeta uma vez escreveu: - “Ao julgar e condenar alguém, não se esqueça de que você também poderá estar suscetível ao mesmo erro, haja visto sua condição humana, portanto, pense e pese antes de constranger seu semelhante”. Agora vivem felizes. Seu irmão passou para os escoteiros. A Tiradentes sua patrulha e os Javalis que adotaram seu irmão tiraram o ar de derrota deles. Pois é o sol dizem é para todos e eles também tiveram sua parte de um amanhecer e um por do sol cheio de felicidade!



terça-feira, 30 de outubro de 2018

Lendas da Jângal. Lobo, lobo, lobo!


Lendas da Jângal.
Lobo, lobo, lobo!

Prefácio: Três pequenas histórias para contar aos lobinhos. Espero que eles sejam felizes e que como diz a lei, o Lobinho está sempre alegre!

As alegrias de Tião o Lobinho.
             Uma noite perto da estrada do Sol Nascente, Tião voltava da roça carregando como sempre sua enxada atrás de seu pai. Foi um dia cansativo e escaldante.  Nem na escola foi. Gostava de ir, era sempre uma alegria ver dona Elza ensinando e sorrindo para todos. Não que ele não amasse seu pai, nada disso, mas precisava trabalhar antes que as chuvas de setembro chegassem. Ao passar pelo Sítio das Esmeraldas ele viu uma cena inusitada. Não sabia quem eram ou o que faziam, mas eram meninas e meninos de sua idade, vestidos de azul com um lindo boné e um lenço verde e amarelo cantando e brincando. Seu pai parou e ele parou também para olhar. Uma menina morena de cabelos negros veio correndo e pegou na mão dele dizendo: Venha brincar conosco! Ele olhou para seu pai. – Pode ir filho quando terminar volte para casa.

                 Ficou com eles até às oito da noite, foi convidado para o lanche, uma senhora simpática que todos chamavam Akelá deu-lhe de presente um lenço e um boné. Foi sorrindo para casa. Dormiu e sonhou com eles. No dia seguinte quando voltaram para a lide na roça eles não estavam mais lá. Ele ficou triste, lágrimas nos olhos. Seu pai o abraçou. – Filho seu dia vai chegar. Um ano depois antes de terminar a aula, Dona Elza contou uma novidade – Teremos em breve uma Alcatéia de lobinhos na escola. Quem quer participar? Tião não acreditava. Sentia-se o menino mais feliz do mundo. No dia marcado para começar ele viu a menina morena que o convidou com seu uniforme. – Sorriu para ele e lhe entregou um embrulho. Era o seu primeiro uniforme de lobo. Tião não sabia se sorria ou se chorava. Ele sabia sim que era o menino mais feliz do mundo!

Quando Ana voltou a ser feliz.
                    Ana nunca foi feliz. Desde pequena que não teve ajuda de ninguém para vencer as dificuldades que enfrentou. Cresceu em uma favela. Quase não conseguiu terminar o primeiro grau. Sua mãe adoeceu e morreu em pouco tempo. Com seus dezessete anos foi trabalhar de doméstica em uma casa do melhor bairro da cidade. Não era bem tratada. Era apenas uma empregada e nada mais. Um dia saiu de lá correndo por causa do dono da casa. Achou que ela era mulher de vida e tentou ataca-la na sala. Fugiu correndo sem levar seus poucos pertentes. Nem mesmo recebeu os proventos que tinha direito. Na rua não sabia aonde ir. Lágrimas corriam em seus olhos pensando na noite que ia chegar. Aonde ia se abrigar? Sentou na porta de uma lanchonete e a fome apertou. Não tinha dinheiro não podia pagar. Alguém colocou a mão em seu ombro. Assustou-se. Era um lindo rapaz de uniforme Escoteiro. – Estás com fome? Ela não queria contar e disse não.

                     Ele insistiu e ela aceitou um pequeno lanche. Ele tentava saber de sua vida e ela se fechava não contando para ninguém. Disse que ela poderia dormir na sua casa e ela riu pensando que era mais um querendo aproveitar. Ele ligou e logo chegou uma senhora de cabelos brancos e uma mocinha de seus treze anos, também uniformizados de Escoteiro. Não teve jeito ela aceitou. Ficou com eles por um mês. Fez tudo que pediram, mas eram educados demais para pedir. Ela não entendia porque o jovem a olhava diferente. Ela também sentia uma atração. Os meses passaram, Ana e Paulo se casaram. Ele a levou para o Grupo Escoteiro que sua mãe dirigia. Ela nunca sentia tão feliz. Tornou-se uma Chefe de lobinhos. Amava sua Alcatéia. As noites ela e ele sentavam na varanda e quase não falavam. Amavam-se através dos olhos de caricias feitas sem segundas intenções. A vida é assim, basta um segundo para nosso destino mudar. E o de Ana a vida trouxe para ela a felicidade que nunca pensou encontrar.

A saga de Poliana e a sede escoteira.
                      Todos estavam perplexos. O padre deu 30 dias para todos desocuparem a sede. Era ordem do bispo. Os vicentinos teriam prioridade. O Chefe Nonô com lágrimas nos olhos tentou argumentar com o padre e este foi irredutível. Fizeram um Conselho de Chefes, iriam fazer uma Assembleia. Sabiam que seria difícil reverter à posição do Bispo. Poliana estava inconformada. Afinal ela a Akelá o Balu a Kaa e todos os lobos ficaram cinco reuniões para fazer a Gruta do Conselho. Ficou linda num canto da sede. Poliana chamou Neco e Priscilla. - Não vamos perder nossa sede. Eu tive uma ideia. Vamos até o Palácio Episcopal no centro da cidade. O Bispo vai nos receber de um jeito ou de outro! Não participaram do cerimonial e não avisaram ninguém. Pegaram o ônibus e as três estavam na porta do palácio. Não foi difícil entrar, mas um vigia queria barrar a entrada até a sala do Bispo.

                          Os lobos não se deram por vencido. Deram uma quinada no vigia e subiram correndo as escadas. A policia foi chamada. Don Flávio assustado foi ver o que é. – Ora, ora, apenas três crianças e são lobinhos e vocês fazem um barulho deste? – Levou-os até seu escritório. Ouviu o que tinham a dizer. Mandou seu secretário buscar biscoitos e chocolates para eles. Poliana agradeceu e disse: Eminência, o padre vai tomar nossa sede escoteira. Disse que o senhor quem mandou. Como pode ser tão malvado? – Don Flávio quase caiu da cadeira. Não se lembrava disto, mas se estavam fazendo assim com os escoteiros ele iria tomar providencia. Mandou o secretário preparar o carro, pediu também para colocar bastante biscoito e chocolate para todos. Na sede foi uma festa. O bispo escreveu do próprio punho um documento. Enquanto houvesse um Lobinho ou escoteira a sede seria deles. Chefe Nonô e todos sorriam à lobada se divertia com os chocolates, o padre veio correndo e quase chorando pediu desculpas ao Bispo. É a males que vem para o bem. Enfim três lobinhos tomaram atitude de gente grande e resolveram à parada!

segunda-feira, 29 de outubro de 2018

Lendas Escoteiras O lindo Balão Azul do Escoteiro Zezé dos Pinhais.



Lendas Escoteiras
O lindo Balão Azul do Escoteiro Zezé dos Pinhais.

Prefácio: - Levei o dia todo, a minha tarde inteira, Não joguei futebol e até nem quis brincar de soldado e ladrão... Ajoelhado na sala, a minha brincadeira, foi cortar os papeis de cores, e os juntar. Fazendo o meu balão... Escoteiros sabem que balão mata, destrói famílias, destrói fabricas lojas e por isto evitam e não soltam balões.

             No meu tempo de menino eu adorava balões. Quantas vezes eu sonhei em voar pelo céu em um balão. No meu entusiasmo esquecia-me dos perigos que ele representava. Todas as vezes que Seu Nonô Baloeiro soltava seu enorme balão eu corria para lá. Meu pai me proibiu. Meu pai! Nunca me encostou um dedo. Chegava em casa e ele pacientemente dizia - Zezé balão mata. Muitos morreram assim queimados. Uma dor horrível. Quando não morrem ficam marcados para sempre!

             Mesmo sendo escoteiro no alto dos meus treze anos eu sabia do perigo, mas o que fazer? Eu amava os balões. Quando ele se elevava ao céu, quando os foguetes estouravam, quando a placa se desfraldava pulava de contente. Minha alegria era contagiante. Se pudesse eu ficava ali por toda a noite a ver os balões subirem aos céus nas noites estreladas de maio junho e julho. Um espetáculo que encanta toda criança que não mede o perigo que ronda os balões. Nas reuniões de Patrulha eu sugeria que fizéssemos um dia uma competição de patrulhas para ver quem soltava o mais lindo balão. Nunca aprovaram. O Chefe Valdez muito educado dizia – Balão só trás a infelicidade. Alegrias de uns tristezas de outros.

             Mas eu amava também os escoteiros. Nas reuniões de Tropa, nas excursões, nos acampamentos eu vibrava como se estivesse soltando balões. Para dizer a verdade eu não sabia daquela minha sina. Queria crescer para poder ficar junto ao seu Nonô Baloeiro, a fazer e a soltar os balões. Ele tinha dezenas de ajudantes que ali estavam sem nada a receber. Quando comentava com o Chefe Valdez, ele sorria e dizia – Zezé, eles sabem trabalhar em equipe, mas muitos deles gastam o que não tem para que o balão suba aos céus. Eles deixam suas famílias, sacrificam o pequeno salário que recebem e nem pensam que estão prejudicando a sí próprio. Fecham os olhos para as desgraças, as desventuras e a infelicidade dos queimados, a miséria por ter perdido seu ganha pão, sua casa.

           Zezé dos Pinhais ficava triste quando alguém lhe dizia do perigo dos balões. Mas ele gostava tanto que dizia: - O que os olhos não veem o coração não sente. Verdade ou não os balões e o escotismo eram os sonhos de Zezé. O acampamento anual se aproximava. Iam acampar no Rancho da Lagoa. Ele nunca tinha ido lá. Fosse onde fosse Zezé vibrava. Amava sua Patrulha Morcego. Vibrava com os jogos, com a montagem do campo, pioneirías e do fogo de conselho. Quando Zezé olhava para o céu estrelado pensava: Não poderia ter um enorme balão passando?

           Zezé não contou a ninguém. Em casa escondido construiu um lindo balão azul. Ele sonhava em fazer um. Sonhava em ver o balão coriscando nos céus em uma linda noite de inverno. Não haveria foguetes. Ele não podia comprar. Sabia que todos seus amigos na patrulha nunca iriam “vaquear” para comprar. Custou para comprar o papel, construiu devagar à cangalha e depois a tocha. Levaria para o acampamento escondido. Não mostraria para ninguém. Ele sabia que na segunda noite haveria um jogo noturno. Iria fingir ter dor de cabeça e zarparia para uma área descampada e então soltaria seu balão. Seus olhos cintilavam quando pensava no seu plano.

            Chegou o dia do acampamento. A sede escoteira lotada de pais e mães. Todos preocupados, entregando bilhetes ao Chefe, e pedindo cuidado com seus filhos. Dois ônibus e uma longa viagem. Chegaram à tarde. Um pequeno lanche e preparando o fogão suspenso para o jantar. As Barracas armadas rapidamente. Mesas, toldos e em pouco tempo o campo de patrulha já podia dar todo o conforto de uma casa na selva. Zezé gostava tanto que às vezes esquecia do seu balão. No segundo dia o grande jogo. Zezé falou ao Monitor que não se sentia bem e se podia ser dispensado. Está dispensado, disse o Monitor. Quando o Jogo começou Zezé saiu de mansinho nos fundos de seu campo de patrulha. Nas mãos o bornal com seu lindo balão azul. Sonhava! Sorria! Cantava canções de louvores. Avistou um belo campo e um rio que corria com suas águas tranquilas em direção ao mar.

            Zezé tirou o balão. Desdobrou. Pegou a cangalha e a tocha. Quando ia acender a tocha para que o gás espalhasse pelo balão ele ouviu um choro de criança. Não viu ninguém. Onde seria? Largou seu balão e foi até a barranca do rio. Sentado em um tronco uma menina de cinco anos chorava em prantos. Ela estava toda queimada. Zezé sentiu o cheiro de carne viva queimando. Zezé não sabia o que fazer – Venha comigo, vou levar você até o acampamento. O Chefe vai lhe ajudar – Ela não respondia, mostrava sua casa toda queimada. Zezé viu saindo da casa um Velho e uma velhinha também queimados. Saíram gritando. Uma dor terrível. – Meu Deus! Pensou Zezé. O que foi? O que foi? – Corra menino o Velho dizia. É um balão nos céus. Matou minha família. Destruiu minha casa, queimou minha plantação de milho!

            Zezé acordou dentro da barraca. Lembrou do Sonho terrível. Agora fazia a mesma pergunta para ele: Eu poderia destruir uma família com meu balão? No ultimo dia Seu Pataxó, um índio que morava próximo ao rio contou a história do Velho Manequinho, Dona Valquíria e sua filha Martinha e que morreram no ano passado. Um balão caiu na plantação de milho, que atingiu sua casinha de sapé e não deu tempo para fugir. Morreram todos. Os olhos de Zezé se encheram de lágrimas. Poderia ter sido o meu balão pensou. Eu poderia ter matado todos eles! Juro meu Deus! Nunca mais, mas nunca mais mesmo vou tocar em um balão.

           Assim como Zezé tem muitos jovens que sonham com balões. Que está historia sirva de lição. Não é uma lenda. Todos os anos centenas de casos como este acontecem. Morrem adultos e crianças, perdem-se plantações que foram plantadas com o suor de quem precisa viver. "Balão no céu, perigo na terra". Todo mundo já deve ter ouvido essa frase em algum lugar, mas as pessoas não costumam dar muita atenção a ela. Os incêndios causados por balões podem ser bastante graves e podem destruir as casas, indústrias, plantações e até mesmo causar mortes. Seja um bom Escoteiro. Nunca solte balões!

quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Lendas Escoteiras. 50 anos depois...



Lendas Escoteiras.
50 anos depois...

Prefácio: - O tempo não apaga o que é verdadeiro, assim como a distância não é o fim para quem ama. Quem parte também fica partido. Eu quero estar nos seus braços, segurar sua mão, sentir sua respiração, ouvir o seu coração... Eu quero estar com você. Uma história impossível. Um Escoteiro que nunca esqueceu o grande amor de sua vida. Voltou sim as suas origens que um dia deixou para trás.

                    Parei o carro em frente à pensão Estrela. Fora uma nova pintura nada mudou. A Praça Dom Giovani era a mesma. Somente às árvores cresceram. Novos canteiros de Tulipas, Rosas brancas que Jânio o Velho jardineiro tão bem cuidava. A Poeira fina que o vento trazia do Morro dos Vaqueiros era a mesma. Uma velha mina de ouro abandonada. A Rua do Outono e a Ambares que tantas lembranças eu tinha eram como se fosse um retrato do passado. Moradores nas janelas vendo quem chega e quem vai. A saudade não vê mudanças e tudo permanece como queremos lembrar. Porque voltei? Não tinha jurado nunca mais voltar? Era como poema quem alguém escreveu: - Querido passado, obrigado por tudo que me ensinou... Querido futuro, pode vir! Seria isto mesmo? Afinal 50 anos se passaram e sonhei em abrir um consultório e morrer em paz.

               As paredes da prefeitura descascadas. Saudades do Benevides um prefeito amigo dos escoteiros sempre pronto a ajudar. Resolvi sentar no Banco da Praça para recordar. Valeria a pena? Um perfume de jasmim brotava no ar. Duas senhoras passaram me olhando espantadas. Eu sabia como era. Cidade pequena com os mesmo costumes que nunca mudam. A Macaxeira cresceu. Sua sombra era um convite para dormitar. Senti uma pontada no peito. Eu nunca perdi as esperanças. A gente nunca sabe o que o amanhã vai nos trazer. Fechei os olhos e deixei a memória viajar no tempo. Era como se menino Escoteiro ainda estivesse ali vendo-a correr entre as flores do jardim, colhendo rosas, tulipas vermelhas... Além dela meu pensamento me fez recordar de Zezito. Meu amigo, meu Submonitor da Patrulha Morcego. Sorria ao lembrar as aventuras na Serra do Lagarto, nas Montanhas do Falcão, nas várzeas do Quati. Lágrimas caíram. Lembrar não me fazia bem.

                  E os meus sonhos impossíveis com Ana Luzia? Ah! Casar morar em uma casinha branca de janelas azuis, muitas flores e quem sabe um Jequitibá para sombra e descansar? Levantar cedo, ir para o meu consultório e ajudar os doentes mais humildes que não podiam pagar. Voltar ver a chaminé com sua fumaça cinzenta, sinal que ela fazia o jantar. Ela sorridente chegaria à varanda, com seu vestido de chita azul, me daria um beijo apaixonado e um sorriso entre palavras: - Meu amor, o jantar está pronto! Sonhos de menino Escoteiro, sonhos que nunca se realizaram. Passei a sonhar com ela noite e dia. Nos meus novos sonhos acabaram-se os acampamentos, as aventuras e jornadas a procurar novos rumos para explorar. Até mesmo Zezito meu amigo do peito sumiu nas sombras de minha mente. Eu só tinha pensamentos para Ana Luzia. Sempre acreditei que um dia ela seria minha princesa e seriamos felizes para sempre como nos contos de fadas.

                     Um dia ela se foi. Fiquei arrasado. Zezito contou que ela fugiu com Capistrano. Logo ele? Um mau caráter, marginal nunca foi Escoteiro nunca foi amigo de ninguém. Porque Zezito ela fugiu com ele? Será que ela não sabia do meu amor? Da minha paixão, dos meus sonhos construídos do nada para fazer dela a mulher mais feliz do mundo? Ah! Que saudades do seu beijo e do seu abraço que nunca tive saudades do seu sorriso do seu cheiro, meu Deus quantas saudades dela. Esqueci minha patrulha, meu cordão dourado os sonhos da Lis de Ouro. Isto agora não tinha mais importância. Meu mundo ruiu, acabou. Minha mãe nem ligava e nem queria saber o que eu sentia. Meus Deus! Que burrice que eu fiz. Peguei minha mochila, meu cantil, minha capa negra e parti sem rumo. Só por causa dela? Um benfeitor invisível me dizia: - Escoteiro você ainda tem uma vida pela frente um futuro incrível, sua estrada nunca terá fim!

                        Parti sem dizer adeus a ninguém. Nem mesmo a Zezito. A estrada foi minha morada por muitos meses. Um ano depois parei. Sentei na beira do caminho e chorei. Por ela? Por minha mãe? Por Zezito ou meus amigos escoteiros? Eu chorava por todos. Perdi os sentidos e cai na beira do caminho. Um Velho passou a cavalo e me socorreu. Acordei em um catre em sua cabana. Havia me alimentado. Ele sorrindo me perguntou quem eu era. Engasgado com o choro na alma não sabia responder. – Você pode ficar aqui enquanto quiser. Aqui sempre terá um lar. Eu estava magro, osso puro e quase não comia, mas aos poucos as recordações foram ficando para trás. Morei com ele quase três anos. Recuperei minhas forças, resolvi partir. Um dia antes ouvi um tossido forte, corri até ele. Levou a mão no meu peito e falou baixinho: - Sempre há outra chance, uma outra amizade, um outro amor. Para todo fim, um recomeço. Em seguida morreu em meus braços. O enterrei no sopé da montanha ao lado de Marta sua esposa que morrera anos atrás.

                    Parti rumo ao Rio de Janeiro. Trabalhei duro como ajudante de pedreiro, ajudei a construir arranha-céus, pontes avenidas. Não deixei de estudar. Com trinta anos me formei em medicina. Vez ou outra avistava escoteiros em ônibus, estradas, shoppings e me batia uma saudade enorme. Pensei em me apresentar, mas tinha vergonha do que fiz ao deixar minha patrulha ao léu. Um dia conheci Maria Bonita, casei, dois anos depois fugiu com um bancário e nunca mais voltou. Clinicava dia e noite. Muitas vezes sem cobrar. Fiz milhares de amigos. Os anos foram passando e resolvi voltar. A saudade de Ana Luzia era demais. Quem inventou a distância nunca sofreu a dor de uma saudade. Teria este direito? Ainda teria amigos? Amigos da clinica choraram quando parti. Eu sabia que não haveria volta. Um vulto sentou ao meu lado no banco da praça. Barbas brancas enormes. Cabelos grisalhos. Um boné amarelo um sorriso que me lembrou alguém. Olá Juvenal ele disse. Olhei para ele. Meus olhos piscaram, era Zezito meu Sub Monitor.

              Incrível este reencontro! Choramos abraçados. Contei para ele minha vida, ele contou a sua. – Vai para minha casa até achar um lugar para morar. - E o escotismo? Perguntei. – Até hoje mora no meu coração. Mas desde que você partiu, ele não foi o mesmo. – Me convida a visitar? Perguntei. Ele sorriu. Bem vindo Doutor. Primeiro matar as saudades. Tenho a chave da sede. Vai ver que nada mudou. Queria perguntar, mas não sabia como. Não sei se ele iria entender. – Ele me olhou. Abaixou a cabeça e disse – Sei o que está pensando. Sim Ana Luzia voltou cinco anos depois que você partiu. Nunca perguntou por você. Nunca perguntou por ninguém. Ela hoje vive na Casa de Repouso Dom Martinho. Lugar simples, doente dos pulmões não se lembra de ninguém. Pedi a ele que me levasse lá. Ele sorriu novamente. O passado não perdoa. Olhei para ele e nada disse. Bons amigos não fazem perguntas.

               Um novo momento um novo recomeço iria dar forma em minha vida. Não foi por isto que voltei? Não sei se o futuro seria melhor e nem pensava nisto. Meu pensamento era só ela. Um grande amor ressurgiu das sombras para o meu presente que sempre sonhei. O sol estava se pondo no Morro dos Vaqueiros. O mesmo sol de antigamente. Quem sabe um novo sol em minha vida? O futuro? Só Deus para dizer. A distância pode impedir um beijo, um toque, um abraço. Mas não pode impedir um sentimento. Eu queria ser feliz e tinha este direito!

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

Lendas Escoteiras. A saga de um Troféu.



Lendas Escoteiras.
A saga de um Troféu.

Prefácio: - Sempre tenho firmeza em minhas atitudes e persistência em meus ideais, mas sou paciente. Não quero que tudo me chegue de imediato. Há tempo pra todo propósito! E tudo que é meu virá em minhas mãos no momento oportuno... Confio em Deus, pois aprendi a esperar. Uma competição de tirar o folego. Qual patrulha seria a melhor?

                  Tomé o monitor da Touro ficou meses planejando o Acampamento no Vale do Beija Flor. Preparou seus patrulheiros como nunca e agora sabia que era uma questão de vencer e nunca perder. Nunca achou ser superior a nenhum dos outros monitores, para eles as patrulhas eram como se fossem irmãos. Mas o tempo vai demonstrando que nem tudo são rosas e que elas não dão em qualquer lugar. Durante todo aquele ano ele lutou com seus amigos da patrulha bote a bote, passo a passo, luta a luta para nos estertores de sua passagem na Tropa para os seniores, que conquistassem o Troféu Javali. Não era um simples troféu. O Chefe Muralha quando no inicio do ano mostrou a todos o troféu não ouve um que não ficasse sonhando em ganhar tamanha honra de ser o melhor do campo.  O troféu era lindo. Feito de couro marrom, tiras foram cortadas fazendo um belo entrelaçado para ser colocado no bastão guia. Tomé sonhava todos os dias com ele.

                 Liceu da Lobo não queria ser o segundo, para ele ou o primeiro lugar ou nada. Sabia do valor das demais patrulhas menos a Maçarico cujo monitor Tonon ainda estava verde e aprendendo a crescer na técnica e formação escoteira. Ele sabia que Tomé da Touro era páreo duro. Sabia também que Murilo da Corvo não ficava atrás. O troféu só poderia ser de um deles e de mais ninguém. Os pontos anuais foram anotados. Foram diversos acampamentos e em todos o empate da Coruja, dos Touros e da Corvo acontecia. Ninguem ligava para Tonon, pois não era páreo para eles. Liceu riu quando ele quase empatou no Acampamento do Rio das Pedras. Mas o último do ano seria diferente. Seria uma luta de gigantes, de monitores experientes, velhos mateiros que brincavam de acampar a muito e muitos anos. Todo ano uma patrulha era a primeira, uma disputa em busca do êxito que ninguém nunca pensou em desistir. Ele tinham que ser os primeiros e não havia para eles o segundo lugar.

                Murilo da Corvo sabia que não seria fácil. Mas ele também sonhava dia e noite com o Troféu Javali. Era bonito demais, escrito a fogo “O Sucesso é para os fortes” fazia dele um sonhador, mas ele sonhava com os pés no chão. Quantas reuniões? Quantas atividades no Chapadão da Montanha? Quantas novas pioneirías, quantas artimanhas e engenhocas eles haviam treinado em segredo para ninguém das demais patrulhas verem? Ele conhecia de cor e salteado as normas e exigências de campo. Uniforme sempre a mão limpo e passado. Sapato limpo, meias com estrias retas, lenço bem dobrado, fivela do cinto brilhando. Isto no campo nunca foi empecilho. Nunca poderia faltar o lenço de bolso e o pente. Eles aprenderam e sabiam como fazer. Ele sabia que nos dois primeiros dias as pioneirías bases seriam construídas. Não importava o estilo e sim o acabamento. Eram peritos na arte do encaixe e as amarras feitas só com três voltas. O difícil era a partir do terceiro dia. Tinham que criar novas pioneirías principalmente às engenhocas e artimanhas. Fáceis de fazer, mas teria que ser uma surpresa para o Chefe.

                       No terceiro dia de campo o empate era reconhecido por todos. Esqueceram-se da Maçarico de Tonon que os perseguia bem de perto. Na corte de honra feita a noite novas regras foram introduzidas. O Chefe Muralha disse que a contagem dos pontos seria diferente. Seriam seis itens somente. Dez ponto por item. Máximo de sessenta. Limpeza de campo, Oleamento e afiação das ferramentas de corte e sapa. Uniformes limpos e com garbo, Fogão Suspenso firme e pronto para usar, Apresentação pessoal com os objetos individual limpos e passados e finalmente a disposição à alegria e o espírito Escoteiro. O Chefe Muralha ia fazer a última inspeção sozinho. Desta vez os Monitores ficariam na patrulha. Foram dormir às onze e meia da noite. Dormir? E quem conseguia? Uma vontade enorme de levantar e começar a varrer o campo, passar sapólio e Bombril nas panelas, correr o campo de cima abaixo a procura de um objeto estranho.

                       As normas eram inflexíveis, não era permitido levantar antes das seis. Seis e cinco todos deviam estar no campo de patrulha fazendo a física habitual. Depois sim, liberado para café e preparação do campo. Eles no tempo livre do almoço, do banho e do jantar reviram tudo que podiam. Cada um sabia que nem uma agulha seria encontrada. Sabiam que o material individual estaria bem dobrado, do maior para o menor e tudo limpo. As barracas arejadas e peças molhadas no secador. À tarde do dia anterior ficaram horas lavando cada peça e deixando secar para depois passar a moda escoteira. O café foi engolido as pressas. Cada um tentava ver ao longe se alguma das patrulhas tinha feito alguma engenhoca ou artimanha nova. As amarras e as costuras da mesa, dos bancos, das camas, do fogão suspenso, do porta treco, da intendência foi revisada e novamente fixada. As fossas incrivelmente livres de bichos e mosquitos. O WC estava um brinco. O lenheiro bem montado. O Chefe foi recebido com honras Escoteiras. Revisou rapidamente patrulha por patrulha. Cenho franzido, um pequeno sorriso e lá foi ele para o campo de chefia terminar a contagem.

                       Cada patrulha tinha o coração nas mãos. Suspiros, pensamentos bons e maus. Cada um perguntava ao outro: - Será que ele achou alguma coisa? Os três toque do chifre do Kudu foi dado. Chamada geral. Patrulhas em forma cantando em direção ao campo do cerimonial. Bandeiras a postos. Patrulha de Serviço pronta para dar inicio ao civismo de campo. Tropa firme! Bandeira em saudação! Firme! Descansar... Um burburinho no ar. A Tropa ainda formada em ferradura. Gastão faz a oração. Como sempre linda. O vento sul sopra devagar. O Chefe toma posição na ferradura. Um Pica-Pau trabalha em um galho próximo e seu som se faz ouvir. – Escoteiros! Era a voz do Chefe Muralha. Uma surpresa, a Lobo, a Touro e a Corvo empataram. A maçarico foi a melhor. – Maçaricos formados em linha! Gritou o Chefe. Sorrisos no ar. O Troféu Jabuti foi entregue. Tonon chorava de contente. Todos se abraçavam.

                    Liceu, Tomé e Murilo não estavam tristes. Abraçaram a cada um dos valorosos patrulheiros da Maçarico. Fizeram questão de dar com eles o grito de patrulha. Às vezes a gente ganha e às vezes a gente perde. Faz parte, ninguém é invencível. Não vamos rezar para uma vida fácil, vamos rezar por forças para suportar uma difícil. Não é a forma do gotejar da água que fura a pedra, mas sim a persistência incansável desta ação. Ninguem nunca pensou que os Maçaricos podiam ganhar, mas eles calados, trabalhando e sorrindo chegaram lá. Eles sabiam que Tonon era um grande monitor que agora reconheciam seu valor. Afinal o segredo do sucesso é a positividade, paciência, persistência e claro... Fé em Deus!

domingo, 21 de outubro de 2018

Lendas Escoteiras. Chefe João Soldado o imortal.



Lendas Escoteiras.
Chefe João Soldado o imortal.

Prefácio: - Chefe João Soldado! O vento sussurra-me algo ao pé do ouvido. Chefe você é imortal. – Eu falo com esperança de um dia ser como você.  Eu sei que entendes as cantigas do vento, disseram que no Fogo de Conselho você os invocava com sabedoria. Mas Chefe, ah! Se eu pudesse falar a língua dos ventos teria a audácia de mandar-te um beijo um abraço um sempre alerta e nada mais. Apenas uma história, uma lenda que ficou para sempre na memoria dos escoteiros.

                 Carlito e Rosana dois pioneiros eram os responsáveis no transporte ida e volta do Chefe João Soldado até a sede neste sábado. O grupo fazia uma vez por mês uma reunião especial onde comparecia boa parte dos antigos escoteiros. No final um encontro social com comes e bebes levados por eles. Chefe João Soldado era especial. Quase todos conheciam sua história, sua saga no grupo. Ele sempre foi saudado como o pai de todos. Ouve outros, mas ele foi o único que ficou desde a fundação. Oitenta e três bem vividos escoteirando. Tudo surgiu com o Padre Rocco e apoiada pelo Doutor Moscato Diretor do Colégio São Pedro. Ele tinha ouvido falar dos escoteiros. João Soldado tinha na veia o sonho militar. Quantas vezes sumia de casa e ia até o Tiro de Guerra, marchando com os recrutas. Foi adotado como mascote. Quando o grupo começou foi o segundo a se matricular na Alcateia. Ficou na fila nove horas. Não parava de falar. Falava na escola, em casa, na mesa de refeições e até dormindo falava. Adotou o escotismo para sempre.

                      Foi escolhido com mais seis lobos, oito escoteiros. Nos lobinhos aprendeu o que era democracia. Escondido atrás de um biombo viu os diretores escolherem o nome do Grupo Escoteiro. Sentiu-se importante. Lembrou de que toda noite sua mãe lhe dava boa noite e dizia: - A estrela cadente me caiu ainda quente, na palma da minha mão! Sorria e dizia dorme com Deus. Repetiu o verso. Todos os diretores o olharam espantados. Poucos acreditavam quando contava esta história. João Soldado na primeira reunião ainda se chamava João Francisco. Foi Mosqueteiro quem o chamou assim. Ficaram amigos para sempre até que aos setenta e nove anos Mosqueteiro morreu. Poderia escrever um livro de mil páginas da sua vida como escoteiro. Tinha histórias para contar. Nunca esqueceu o seu segundo acantonamento. Barracas armadas próximo ao Riacho da Raposa choveu, uma enchente enorme carregou tudo. Voltaram para casa chorando e pensando como iam ter um novo material de campo.

                    Akelá Tereza era única. – Vamos em frente ela dizia. - Quando um lobo não encontra a si mesmo, não encontra nada! – Em menos de cinco meses conseguiram substituir tudo que perderam. Não chorou ao passar para Escoteiro. Diziam que na cidade dos homens eles falavam: - Se cair levante se deslizar se segure, mas nunca pense em desistir. Quanto mais amarga for sua queda mais doce será sua vitória. Devorou livros, nada ficou sem ele conquistar. Distintivos, comendas enfim era um Escoteiro que não sabia o que era a palavra desistir. Foi um Sênior que sempre dizia: - Eu não sou nada e talvez tenha tudo. Fora isto eu tenho todos os sonhos do mundo. Não houve uma montanha uma planície ou um vale que ele não viajou com sua mochila que ele mesmo fez. No Clã era um camarada amigo e fraterno. Ficou pouco tempo, assumiu a Tropa Cauã. Era a segunda do Grupo. Seu sorriso era contagiante. Religioso fazia questão de dizer que Deus é tudo e que não existe escotismo sem ele.

                     O tempo passou. O amor ao seu grupo nunca terminou. Nunca se esquecia de dizer nas tropas, nas alcateias que era uma pessoa feliz. – Amo a vida, e dela sou aprendiz. – Tenho várias paixões e o escotismo é minha filosofia e minha inspiração. Mas não se esqueçam eu também possuo imperfeições. Se os caminhos que percorro não forem os que eu quero pelo menos luto por eles. A cada dia me procuro tornar melhor. Nunca assumiu a chefia do Grupo. Insígnia agradeceu convites de ser formador. Amava seu grupo, mas amava mais ainda o escotismo. Era sua filosofia de vida. Nunca pensou em se aposentar e quando se tornou o mais antigo do grupo, quando Mosqueteiro foi morar nas estrelas, resolveu diminuir as atividades. Acampava de vez em quando, e nunca deixou de acantonar com os lobos. O Grupo Estrelas Cadente tinha vida própria. Ele nunca interferiu. Sorria e lembrava-se do poeta: - O meu ideal politico é a democracia. Torço para que todo homem seja respeitado como indivíduo e que ninguém seja reverenciado e idolatrado.

                       No verão passado fazia um céu azul tão límpido, que parecia saudar a entrada do Chefe João Soldado na sede do grupo. Todos estavam a sua espera. Havia um sorriso no ar. Impossível ver tanta alegria. João Soldado sorria. Seus 89 anos o deixou quase sem voz. Gesticulava pouco e seu sorriso nunca desapareceu. Muitos antigos escoteiros sabiam que a suprema felicidade da vida é a convicção de ser amado por aquilo que você faz e aquilo que você é. Sua cadeira estava lá. Não caminhava mais. Queria contar causos e não conseguia, mas estar ali junto a quem amava bastava para reviver uma vida cheia de felicidade. Dizem que a gente não precisa buscar a felicidade fora, ela está dentro de você. Se insistir em sair por ai é possível que nunca vai encontrá-la. O Chefe do cerimonial educadamente olhou para todos, por último em João Soldado. Ambos sorriram. A ordem foi dada:

- Escoteiros firme! A bandeira em saudação! Um frêmito de sons de braços estendidos fazendo a saudação. João Soldado quis levantar, mas não conseguiu. O vento jorrava saudades de um passado que se foi. As bandeiras farfalhavam. – João Soldado sem ninguém ouvir falou para si mesmo: - Vento, ar que respiro ventania tempestade que vivo. Flores... Que me fazem respirar. - Firme descansar! O Chefe do cerimonial olhou para o Chefe João Soldado. Ele sorria seus olhos abertos, mas seus braços inertes. Rosa Linda uma Lobinha deu três passos à frente. Chorava. Cantou em forma de poesias o canto noturno do cisne, daqueles que deixam saudades; - Chefe João Soldado! O vento sussurra-me algo ao pé do ouvido. Chefe você é imortal. – Eu falo com esperança de um dia ser como você.  Eu sei que entendes as cantigas do vento, disseram que no Fogo de Conselho você os invocava com sabedoria. Mas Chefe, ah! Se eu pudesse falar a língua dos ventos teria a audácia de mandar-te um beijo um abraço um sempre alerta gostoso e nada mais.

João Soldado o Chefe imortal estava morto. Uma estrela Cadente apareceu no horizonte, brigando com aquele céu azul que brilhava intensamente. Todos com seus bastões fizeram a saudação do adeus para seu Chefe que viveu e morreu com o escotismo no coração. – Alguém baixinho falou: - Para viver não precisamos ser melhor que ninguém, nossas ações falam por si.  Do pó viemos ao pó voltaremos!


sábado, 20 de outubro de 2018

Lendas Escoteiras. A Arara azul da Princesa Lorena.



Lendas Escoteiras.
A Arara azul da Princesa Lorena.

Prologo: - Apenas uma historia simples para ajudar a passar a noite de sábado. Abraço fraterno a todos meus amigos e irmãos do Escotismo.

                                 Rio da Prata nunca esqueceu aquela tarde que uma revoada de pássaros sobrevoou a cidade fazendo acrobacias e com seus chilros e cantos assustando todos os habitantes que se refugiaram em suas casas. Foi realmente algum fantástico. Muitos tiraram fotos e outros gravaram os sons. Havia cinco meses que uma seca infernal não dava trégua à cidade. Vivendo somente de plantações e grande exportadora de tomate o prejuízo aumentava dia a dia. Quase todos os oito mil habitantes dependiam da cooperativa para sobreviver. Romarias, procissões e até os que faziam magia negra corriam em todas as esquinas da cidade. Nada adiantava. Na Tropa Escoteira feminina Kalapalo havia três meses que não saiam para atividades fora da sede. Os pais achavam que não deviam, pois uma queimada poderia produzir acidentes que seriam impossíveis de prever os resultados.

                       A Princesa Lorena, apelido carinhoso dado pela sua patrulha tentava entender o porquê não podiam acampar. O programa de atividades para o ano já fora quase tudo cancelado. Quando a noite ia dormir, ajoelhava ao pé de sua cama e pedia a Deus para trazer as chuvas que não estavam caindo. Um dia ela leu que se você rezar por chuva por bastante tempo, ela fatalmente cai. Se você rezar para que enxurradas se acalmem, elas fatalmente o farão. O mesmo acontece na ausência de preces. Assim A Princesa Lorena todas as noites rezava de joelhos ao pé de sua cama. Ela rezava a oração de um cantor já falecido (Luiz Gonzaga) e dizia: Senhor, eu pedi para o sol se esconder um tiquinho, eu peço pra chover, mas chover de mansinho. Pra ver se nascia uma planta no chão. Oh! Deus, se eu não rezei direito o Senhor me perdoe, Eu acho que a culpa foi desse pobre que nem sabe fazer oração Meu Deus, perdoe eu encher os meus olhos de água e ter-lhe pedido cheinho de mágoa pro sol inclemente se arretirar.

                       A Princesa Lorena acreditava nas suas orações. Ela conversava muito com Kika, uma arara azul que a tropa acolheu em um acampamento na Serra do Pintassilgo. Encontraram-na desfalecida as margens do Riacho Florido. Lorena levou-a para seu campo de patrulha, enrolou-a em um pano maior e viu que a Arara piscou os olhos várias vezes. Durante os três dias de acampamento a Princesa Lorena cuidou da Arara e a chamou de Kika. Foi amor à primeira vista. Quando após o cerimonial de bandeira e o debandar, ela foi conversar com sua Chefe se podia levar Kika para a cidade. – Tudo bem Princesa – disse ela. Mas você vai levar para sua casa? – A princesa Lorena pensou que a Arara não era só sua. Todos cuidariam. Conversou com a patrulha. As Escoteiras assumiram a responsabilidade de cada dia uma delas iria até a sede e alimentá-la. Assim foi feito. Kika passou a ser mais uma da tropa Kalapalo. Kika adorava. Aprendeu a gritar Sempre Alerta, aprendeu a gritar Melhor possivel e chamar os lobos para o grande uivo.

                   A Princesa Lorena aprendera com sua Chefe Nádia que se você fala com os animais eles falarão com você e vocês conhecerão um ao outro. Se não falar com eles você não os conhecerá, e o que você não conhece você temerá. E aquilo que tememos, destruímos. A vida de Lorena mudou muito depois de Kika. Ela tinha três amores na vida, sua família, sua Chefe e sua patrulha. Um dia sem ninguém esperar um homem adentrou no pátio da sede Escoteira a procura do Chefe do Grupo. Apresentou a ele um papel onde estava escrito: O IBAMA recolhe a Arara por não ter registro de um criador autorizado. Foi um susto enorme. Tentaram explicar que a Kika foi achada quase morta. Não adiantou. Ninguém acreditava no que estava vendo. A Princesa chorava há mais não poder. Os lobos as Escoteiras e os Escoteiros fizeram um circulo em volta de Kika. - Não vamos deixara gritaram. Os seniores e os pioneiros ameaçaram o Fiscal do IBAMA. A Chefe Nádia acalmou todos. Kika foi levada em um carro e desapareceu na esquina da Rua Mercedes.

                Foi então que a seca tomou conta do sertão. A cidade de Rio da Prata sofria com a falta de chuva. Um mês se passou desde que levaram Kika. Havia uma revolta no ar e foi então que uma revoada de pássaros apareceu sobre a cidade. Não era milhares eram milhões ou mais. O céu ficou escuro. Foi Gualberto da Patrulha Onça Parda quem disse que eles atacavam onde Kika e outros pássaros estavam presos. Arrebentaram tudo. Gaviões enormes, Araras gigantescas, Águias formosas, urubus-reis eram tantos que nem dava para imaginar porque faziam aquilo. Trovões ribombaram no céu. A chuva chegou forte e não deu trégua. O que restava do Centro de Triagem dos animais foi destruído pela enchente do Rio da Prata. Os pássaros presos desapareceram fazendo uma revoada enorme sobre a cidade. Duas horas depois o céu clareou apesar da chuva fina e intermitente. A patrulha Javali da Princesa Lorena fez uma busca onde Kika vivia prisioneira. Não encontram nada.

                Dois meses depois, mesmo sabendo que Kika agora vivia solta e junto a outros pássaros como ela, a tropa ainda se mantinha tristonha. Naquele sábado quando o Chefe pediu a Patrulha de serviço para hastear a bandeira ouviram uma voz estridente - “A bandeira, em saudação!”. Olharam para o alto do mastro e lá estava nada mais nada menos que Kika. Uma algazarra geral. Palmas gritos e então notaram que ao lado da Arara Azul estava um lindo Papagaio Verde e Amarelo. Foi ele quem gritou – “Sempre Alerta”! Escoteirada. Foi à conta, um festival de vivas, sorrisos, bem vindos partiam de todas as sessões presentes naquele grupo. Não demorou muito os pais souberam do retorno de Kika e seu namorado. A sede ficou cheia de gente. Kika desceu até o ombro da Princesa Lorena – Bicou-a de leve em seu nariz. Mexendo com a cabeça Kika falou – Adeus Escoteira, diga adeus a todos. Estou partindo para a Floresta Encantada onde moram os pássaros amigos. Não chore com minha partida, pois irei sempre vir aqui visitar você e esta turma maravilhosa. Logo Kika e o Papagaio Verde e Amarelo subiram aos céus e em um mergulho enorme sobrevoaram a sede do grupo e sumiram com o sol que estava se ponto na Montanha do Quati.

               Até hoje conta uma lenda que na cidade de Rio da Prata todo ano uma revoada de pássaros se faz presente. Tornou-se um atrativo turístico. Dizem que nesta data os Escoteiros e lobos de outras cidades sempre estão lá acampando e quando a revoada termina milhares de Araras Vermelhas, Verdes e Azuis acorrem nos acampamentos gritando alto para todos os acampadores. – Rataplã do Arrebol! Sempre Alerta! Prometo pela minha honra e muitas outras palavras. Todos sabem que foi Kika quem ensinou. Ela nunca esqueceu a Princesa Lorena, pousa em seu ombro, bica seu nariz e parte voando com seus amigos para a imensidão do céu azul. Quando conto esta história lembro-me o que um Velho índio me ensinou: – Conheça a si próprio. Saiba que ninguém faz seu caminho por você e à estrada é sua somente. Acredite que seus amigos andam ao seu lado, mas ninguém anda por você!

sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Lendas Escoteiras. Rataplã Chico Fumaça. Nós te amamos para sempre!



Lendas Escoteiras.
Rataplã Chico Fumaça. Nós te amamos para sempre!

Prefácio: - Um conto simples. Simples demais. Quem sabe alguém vai gostar e comentar? Não sei. Se pelo menos entenderem a mensagem fico feliz. Fraternos abraços.

                       Ele não entendia por que. Aonde ia estavam sempre gritando e dizendo – Chico Fumaça, o bobão! – Ele ficava triste porque não tinha feito nada com ninguém. Desde pequeno sempre fora assim. Ficou pouco tempo na escola. Seus colegas na classe sempre jogando bolinhas de papel e dizendo – Chico Fumaça, o bobão! Fizera no mês anterior doze anos. Sua mãe e seu pai comemoraram com uma festa para ele. Mas convidar quem? Sabiam que ninguém iria à festa do “bobão”. Chico Fumaça até que não se incomodava.

                      Como falava pouco e nunca gritava deixava que falassem. Não ligava mais. Mal dizia algumas palavras a sua mãe e seu pai. Ele um carroceiro que fazia mudanças e entregas, ela uma simples lavadeira que passava os dias na beira do Rio Canário com duas ou mais trouxas de roupa.

                       Chico Fumaça vivia mais em casa. Deixou a escola. Não dava para ficar lá. A Diretora concordou. Não podia controlar os alunos. Do pouco que aprendeu ele desenvolveu uma grande facilidade em escrever e ler. Ia ao Pingo D’água, onde despejavam o lixo da cidade e lá encontra muitos livros. Já havia feito uma coleção de mais de sessenta livros. Ele os limpava encadernava e guardava em um pequeno guarda roupa que tinha. Quando não estava ajudando o pai ou a mãe Chico Fumaça lia. Aprendeu a ler com rapidez e através das leituras começou a compreender o mundo. Chico Fumaça sentia falta de amigos. Muito mesmo.

                       Um dia indo até a Quitanda do Seu Afonso, uma molecada correu atrás dele e gritando Chico Fumaça bobão. Agora chamavam ele também com nomes feios. Jogavam pedras. Ele correu, mas eles não o deixavam em paz. Ao virar uma esquina deu de cara com muitos escoteiros. Duas patrulhas. Escondeu-se atrás deles. Os meninos calaram. Os escoteiros já sabiam quem ele era. Um deles, moreno forte, alto quase da sua idade disse aos moleques que eles não deviam fazer aquilo. Era errado. Ele era um só e eles muitos. Era covardia. Daquele dia em diante disse, Chico Fumaça seria protegido dos escoteiros. Quem fizesse qualquer coisa com ele teria de se haver como toda a tropa dos escoteiros.  Foram embora e preocupados. Agora Chico Fumaça era amigo dos escoteiros. Não ia ser fácil rir dele.

                           Convidaram Chico Fumaça para ir visitá-los. Ele foi. Adorou tudo que viu, mas sabia que não dava para ficar com eles. Não podia comprar e nem pagar nada. Fizeram um conselho de Patrulha e logo em seguida os Monitores se reuniram em Corte de Honra. Chefe Marcondes presente. Deliberaram que todos iriam ajudar. Chico Fumaça seria aceito. Sua mãe e seu pai foram lá. Choraram de emoção pela bondade dos escoteiros.

                         No primeiro dia recebeu de graça uma camiseta vermelha com o símbolo de uma Águia no peito e nome do grupo. Até você fazer sua promessa disseram. Em duas semanas ele foi a uma excursão. Amou tudo que fez e viu. O incrível aconteceu. Ninguém conhecia e nem tinha visto um Escoteiro como Chico Fumaça. Vários passarinhos fizeram amizade com ele e ficavam em volta quando não pousavam em seu ombro. Ele ria e cantava de alegria.

                           No dia de sua promessa, uniforme novo, chapelão ele estava orgulhoso. A sede Escoteira ficou escura. O que seria aquilo? Então viram no céu uma nuvem de pássaros de todas as cores, gorjeando e cantando canções desconhecidas. Um bem-te-vi amarelo e um beija flor dourado ficaram em seu ombro durante a promessa. Foi emocionante! No final quando o lhe entregaram o distintivo e o lenço milhares de pombas, gaviões vermelhos, tucanos verdes e amarelos, além de inúmeros pássaros pretos fizeram voos rasantes na sede.

                          A cidade viu aquela revoada de pardais indo para a sede dos escoteiros e muitos foram lá para ver. Ninguém sabia explicar o que significava. Disseram que Chico Fumaça falava com eles. Ele dizia que não. Era somente um amigo.

                          O tempo passou. Chico Fumaça foi para os seniores. Foi ali que descobriu que podia escrever contos, historias tudo porque participou pela primeira vez em um concurso de Contos Escoteiros do distrito. Escreveu um conto lindo. “A revoada dos pardais de Serra Dourada”. Seu conto fez sucesso. Dai para o primeiro livro foi um pulo. “O besouro verde apaixonado”. Alguém se ofereceu para publicar. Virou um Best-seller nacional. Traduzido em vários idiomas bateu recordes e recordes de venda no mundo inteiro. Chico Fumaça se tornou um escritor famoso. Nunca deixou o Grupo Escoteiro.

                         Rico ajudava a todos que o procuravam. Recebeu dos escoteiros a medalha de gratidão ouro. Foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. Ficou conhecido no mundo todo. Só se apresentava de uniforme escoteiro. O prefeito da cidade em solenidade especial na praça lhe deu a Ordem do Cruzeiro do Sul. Então o incrível aconteceu. Ninguém até hoje soube explicar. Um mistério para os habitantes daquela cidadezinha. Quando colocaram medalha em seu peito, Chico Fumaça chorando, todos emocionados viram que a cidade ficou escura de uma hora para outra, no céu milhares de pássaros escreveram:

“RATAPLÃ CHICO FUMAÇA NÓS TE AMAMOS PARA SEMPRE”!                  

quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Contos de fogo Conselho. O enigma do Velório do Chefe Bento.



Contos de fogo Conselho.
O enigma do Velório do Chefe Bento.

Prefácio: - “Conta-se uma lenda Celta que existe outro Mundo essencialmente espiritual onde moram os mortos (nossos ancestrais)”. Conta-se que “ali vivem como deuses de puro espírito. É um mundo perfeito e belo, onde não há dor, ou tristeza. É uma terra paradisíaca, onde há fartura de comida e bebida. A lenda conta que não é um mundo exclusivo. Os vivos podem visitar os mortos e para que isto aconteça alguém tem de sacrificar sua vida para renascer de novo onde escolheu morar”.

                     Eu conheci Aurora quando morei próximo à cidade de Buritis nas Barrancas do Rio São Francisco. Os amigos me disseram que ela tinha mais de cem anos. Vez ou outra eu a procurava na sua tapera, para um cafezinho no ponto e ouvir suas histórias de menina que me fascinavam. Os contos dela me faziam recordar do meu Escotismo que sempre amei. Ela jurou uma vez que foi escoteira em Cruz das Almas por muitos anos. Acreditei!

                     A historia do Chefe Bento Gonçalves ela me contou quando pescava nas margens do Velho Chico, aproveitando as chuvas torrenciais e as aguas barrentas. Disse-me que bastava uma Corvina para o jantar. Era a melhor época para pescar mandis, bagres e Corvinas. Quando cheguei colocou a varinha de bambu em um suporte, tirou debaixo do banco uma garrafa de café e me convidou para tomar. Como sempre delicioso, um café do Jacu que ela plantava, colhia e torrava. Inigualável!

                     - “Sinhô Osvardo”, nossa tropa Escoteira começou com vinte e seis e nunca passou de vinte e oito. Ninguém entrava ninguém saia. Chefe Bento fazia milagres. Raquítico, mancava da perna direita e mesmo assim era o primeiro a gritar “avante” nas longas jornadas que fazíamos. Vibrava nos acampamentos e a gente o amava não só pelo grande Chefe que era, mas pelas histórias que contava ao pé do fogo em um acampamento qualquer.

                       Nos jogos, nas inspeções, nas técnicas mateiras que ensinava aos monitores o fazia de uma maneira única que a gente nunca mais esquecia. Eu era a Monitora da Patrulha Uirapuru a única menina que chegou lá. Os outros monitores quando fui eleita diziam que nossa Patrulha estava no “papo”, mas não foi isso que aconteceu. Não vou entrar em detalhes, só vou contar um acampamento feito nas margens do Rio Bacuri.

                     - No ultimo dia quase terminando o Fogo de Conselho ele nos contou uma lenda que seus ancestrais faziam para fazer ressuscitar seus mortos. Só para os mais especiais. Foi tétrico, sinistro, nos assustamos demais. – Na noite escura com a fogueira quase apagando só dava para ver as brasas e pequenas fagulhas levadas pelo vento. – Escoteiros! Ele falava baixinho... Leve o corpo do defunto até o primeiro poço, jogue-o de cabeça para baixo, espere dois dias e o procure entre as pedras do riacho mais próximo.

                      Ninguém achou graça no que ele contou. “Seu Osvardo” uma semana depois eu estava na sala de aula e a professora chorando disse que o Chefe Bento tinha acabado de morrer. Retirava seu pequeno salário no Banco da cidade e sofreu um AVC fulminante. Levado ao hospital chegou morto. Deus do céu! Foi para mim o fim do mundo! Ele era o pai que nunca tive o marido que nunca iria ter e o avô que nunca conheci. Sai cambaleante da escola e fui até o Pé de Jequitibá Rosa, onde a Patrulha deveria estar reunida. Todos estavam lá aos prantos sem saber o que fazer.

                     Foi Dudu Intendente chorando quem disse: - Vamos ressuscitá-lo! – Assustamos... Como? - Ele relembrou a historia do Chefe Bento no último fogo de Conselho. Fizemos um plano. Não foi fácil, éramos sete e precisávamos de outra Patrulha para ajudar. A Patrulha Garça Prateada se prontificou. Pegamos “emprestado” de nossas casas três lençóis de casal para forrar a maca. Ele estava sendo pranteado no Velório do Oscar. A melhor hora para pegar seu corpo seria entre três e quatro da madrugada. Todos estariam dormindo. Não foi difícil, difícil foi segurar seu corpo já frio e o medo apossou de todos nós.

                   Até o poço do Cemitério das Almas eram mais de dois quilômetros. Mundico apareceu com a carretinha. Os pés do Chefe Bento ficaram para fora. Quatro da madrugada. Dez meninos e quatro meninas de uniforme escoteiro empurravam a carretinha em silêncio pelas ruas da cidade. O poço ficava próximo ao Mausoléu do Comandante Palácios morto na revolução. Segurar os pés do Chefe Bento na boca do Poço foi demais. Francisca rezou um Pai Nosso e os demais o soltaram. Uma eternidade se passou até ouvirmos o barulho da água do poço recebendo o corpo do Chefe Bento.

                   Voltamos correndo para casa. Sábado sem escola corri até o Riacho Grande e lá estava a nossa Patrulha e a Garça Prateada. Todos calados. No silencio um redemoinho se formou, o vento engrossou. No céu nuvens negras apareceram. Tremendo descemos o riacho a procura do Chefe Bento. Ele sentado na Pedra do Moinho sorria. – Meninos! Estou indo para o céu. Virei sempre ver vocês! E sumiu nas nuvens antes da chuvarada que caiu.

                   - Ficamos chorando e chamando por ele. - Chefe, Chefe, não se vá! Ele se voltou e disse: - Meus caros amigos escoteiros. Chegou a hora de ouvir as palavras de Caio Vianna Martins. Agora terão de andar com suas próprias pernas. Isto não será fácil, mas com a união de todos irão continuar a sina dos escoteiros. Avante, não desistam. Sigam os caminhos da verdade e estarão comigo sempre. Sumiu nas nuvens e nunca mais voltou.

                     Aurora se calou. Sua varinha entortou. Um peixe foi fisgado, ela me olhou e sorriu: - “Seu Osvardo”, fique para o jantar. Aceita ser meu convidado?

Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

Bem vindo ao Blog As mais lindas historias escoteiras. Centenas delas, histórias, contos lendas que você ainda não conhecia....