Lendas
escoteiras.
Paixão
além da vida.
Nota - Um amor impossível, uma
aceitação difícil entre duas almas que se amam. Viveram felizes por muito
tempo. História de vida que serve como exemplo para todos nós.
Três patrulhas. A quarta
só no ano seguinte. Tropa nova, com menos de um ano e seis meses de atividade. Paulo
Tostes era um Chefe novo, vinte e três anos. Resolveu um dia ser Escoteiro.
Nunca foi. Achou nos guardados do seu pai um livro chamado Escotismo Para
Rapazes de Baden Powell o fundador. Leu em uma noite. Gostou. Seu pai quase não
falava. Vivia em uma cadeira de rodas. A mãe morrera há anos. Ele arrimo da
família. Sempre pensou em ir embora de Lua Verde. Só conseguiu terminar o
segundo grau. Cidade pequena, menos de dez mil habitantes.
Sem perspectivas de
crescimento profissional. Não podia deixar seu pai. Para sobreviverem ele
montou uma quitanda. Pequena. Na frente de sua casa para não pagar aluguel.
Algumas verduras, frutas, doces, e quando pode comprar uma geladeira, refrigerantes
e algumas guloseimas geladas. Dava para seguir adiante a cada mês. O “fiado”
era a parte mais difícil. Como negar ao Seu Romerildo? A Dona Eufrásia e a
tantos outros? Eram como ele. Nem sabiam o que iam comer amanhã.
Paulo Tostes amou o livro. Releu diversas
vezes, pensou com seus botões. - Porque não ter uma Tropa Escoteira aqui na
cidade? Não seria tão difícil. E assim fez. Mãos a obra. Convidar meninos foi
fácil, a sede também não foi difícil. Ficaram num pequeno porão da Igreja
Matriz. Mas Paulo Tostes não entendia nada. Começou na raça, nem sabia que
existia autorização, alguém responsável acima dele.
Ele e os Raposas, os Tigres
e os Leões eram os escoteiros mais felizes do mundo. Amigos, irmãos, juntos
sempre. O populacho da cidade adorava vê-los correr pelos campos, parecia um
bando de meninos loucos a fazerem suas aventuras fantásticas. Paulo Tostes um
dia recebeu uma carta. Era do Grande Chefe Escoteiro da Capital. O convidava
para um curso. Todas as despesas pagas. Porque não ir? A quitanda deixou na mão
de Quinzinho e Marquinho. Dois Monitores que sempre o ajudavam nos sábados pela
manhã quando a quitanda estava cheia.
Partiu no trem noturno das
onze para a capital. Quinze horas de viagem. Na chegada se informou onde era o
Zoológico. Pegou o bonde. Desceu no final e dai seguiu a pé. Eram mais seis
quilômetros. Nada que assustasse Paulo Tostes. Quando chegou viu muitos chefes.
Bastante. Gostou do curso. Não gostou de alguns. Prepotentes, vaidosos, cheios
de arrogâncias. Pensou consigo se eles sabiam que pertenciam a uma
fraternidade. Não era assim que BP dizia em seu livro?
Aprendeu muito. Resolveu que
deviam ter uma Alcatéia. Mas quem convidar? No trem quando retornava pensava a
respeito. Uma jovem morena sentou ao seu lado. Paulo Tostes teve duas
namoradas. Pouco tempo com elas. Nunca pensou em casar. Novo apenas 23 anos
ainda tinha uma vida pela frente. Agora com seu pai entrevado não tinha esse
direito. Ela o olhou de cabeça baixa. Paulo Tostes viu que chorava. – Por quê?
Perguntou. Ela não respondeu. Acordou com ela dormindo em seu ombro. Reparou
que era muito bonita, mas tinha o olhar envelhecido por uma vida de lutas.
Durante todo percurso da viagem ela
chorou. Paulo Tostes insistiu. Ela nada dizia. Só disse que deveria ter morrido
e Deus quis assim. Que seja. - Vai para onde? Sem destino respondia – Sem
destino? Não tem amigos, parentes, nada? Não tenho. Quando chegou à estação de
Lua Verde tinha resolvido. Desça comigo. Ficará uns dias em minha casa. Ela
assustou – Descer? E sua família? Não se preocupe. Uns dias em Lua Verde você irá
colocar a cabeça no lugar e saberá aonde ir e o que fazer. Ela desceu. A cidade
inteira na janela vendo Paulo Tostes e a bela morena. Quem era? Ele casou? Ele
não disse nada.
Sua vida continuou. Seu pai
nem perguntou. Os escoteiros nada disseram e nem perguntaram, amavam seu Chefe
e sabiam que ele nunca tomava decisões erradas. Sua vida mudou. Madalena era
uma mulher perfeita. Cuidava da casa. Fazia tudo. Os olhos de seu pai brilhavam
quando ela sorria para ele. A cidade inteira comentando. E a Tropa? Alguns pais
querendo tirar os filhos. Os comentários não eram bons. Uma mulher da vida, só
podia ser.
Paulo Tostes resolveu casar
com Madalena. Ela disse não. Por quê? Você não tem ninguém. – Ela chorando contou
a verdade. Fora mulher de vida na capital. Gostava de um soldado. Ele prometeu
casar com ela. Morreu em tiroteio com bandidos. Chorou muito e o pior, pegou AIDS.
Sim, isto mesmo! Ainda em fase inicial. Ele
manteve seu pedido. Não importa. Quero você como minha mulher. Casaram-se na Igreja
de São Judas Tadeu. Cerimônia simples. Ele uma vizinha e as três patrulhas
escoteiras. Casou de uniforme.
Ela feliz. Sorria. Viveram
muitos anos. Madalena se tornou Akelá. Os lobinhos adoravam sua Chefe. Paulo
Tostes e Lena nunca fizeram sexo. Era um amor diferente. Madalena morreu com
quarenta e oito anos. No seu velório três patrulhas um Chefe e uma vizinha.
Dizem que virou santa. Não sei. Mas seus lobinhos hoje homens feitos nunca
esqueceram a Chefe que tiveram. Paulo Tostes chorou por muitos anos. Morreu com
sessenta e quatro anos vítima de um tumor no pulmão. Porque se nunca fizeram
sexo?
Conheci ambos. Sempre quando
vou a Lua Verde não deixo de fazer uma visita ao tumulo dos dois. Lado a lado.
Escreveram uma lápide simples. Nem sei quem escreveu. – “Aqui jaz, dois amantes
que nunca foram. Amaram o escotismo e com ele viverão para sempre no céu!”.
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