Lendas
Escoteiras.
Francisca das
Flores.
Prólogo: - A maior
perda da vida não é a morte, mas o que morre dentro de nós. Não tenha vergonha
de ser sentimental. Carregue isso com orgulho, porque prova que você é uma
pessoal especial e sensível em relação a tudo e a todos.
Moço! Quero ser como elas! – Chefe
Postal olhou de soslaio. Seu nome? – Francisca das Flores, da Rua dos Amores,
numero zero. E não disse mais nada. – Cadê sua mãe? Seu pai? – Meu pai morreu,
minha mãe está em uma cadeira de rodas lá em casa. – prá que? Quem quer entrar
sou eu e não ela! – Sem diálogo, curta seca e grossa. Conhecia a maneira dela,
Chefe vivido e não sabido sabia que ela não era como as outras, que chegavam de
mansinho dizendo para que vinham e o que desejavam. – Preencha esta ficha, vou
analisar e depois lhe chamar se necessário vou a sua casa conhecer sua mãe...
Posso? – E foi assim que a Patrulha Esquilo mesmo a contragosto recebeu uma
menina em suas hostes. Não houve palmas, alguns torceram o nariz, outros
sorriram por ver uma nova patrulheira junto a eles.
Nostradamus não disse nada. Como
dizem por aí macaco velho sabe onde pisa e onde põe o rabo. Monitor escolado
nunca duvidou que um dia uma menina adentraria na Patrulha e como dizia Juventino
Mulato o sub, seria o fim do mundo. Adeus liberdade! Não era bonita, mas tinha
um que de simpatia junto com um sorriso endiabrado que logo conquistou a
patrulhada. Chefe Postal achou interessante. Era a primeira, haviam liberado a
coeducação e ele coeducado abriu as portas da tropa para as jovens do pedaço do
bairro onde o Grupo habitava no seu habitat. Teve boa acolhida na visita a Dona
Dolores, progenitora de Francisca das Flores. Mino Carlo se apaixonou, Wantuil
Voleio se assustou. Calcino Nantes não sabia o que dizer. Francisca das Flores
se sentiu em casa. Rodeada de meninos logo aprendeu a ser mais uma na Patrulha
Esquilo que nunca teve uma menina a participar.
Um ano se passou. Das Flores
como era chamada promessou e uniformizou. Parecia outra, mais corada, mais
linda com seus cabelos negros revoados e olhe posso jurar que na Patrulha
ninguém sabia quem era menino e quem era menina, rosa e azul ali não tinha
lugar. Acampou lá na montanha, acampou no Vale Feliz. Acampou no Pico dos
Sonhos e dormiu abraçada a lua amada tantas vezes que até jurou que um dia iria
morar lá... Na lua que amava. Zé Roberto noviço se assustou em ver uma menina
patrulhada, mas logo se acostumou. Entraram outras, Roseli, Tatiana e uma
morena linda chamada Maria Teresa. Mas não se sabe como ninguém tinha olhos
para elas, no coração da escoteirada só cabia ela, a menina de rosa chamada de Francisca
das Flores. Não deu outra, dois anos e Nostradamus se foi. Investido Sênior ali
ficou a contragosto, mas como bom escoteiro aceitou as normas da idade, afinal
quinze anos no costado lá foi ele vivenciar novos rumos novos amores. Quem
fica? Quem assume? Eu você ou Francisca das Flores?
Danação, nem um nem outro. O
Chefe Postal chamou Genivaldo sub da Patrulha Javali para assumir a monitoria
da Esquilo. Revolta geral. Pode isso? Perguntou Juventino Mulato o sub. Se
podia ou não o Chefe Postal não deu satisfação. A quem recorrer? Nosso Senhor
Jesus Cristo não deve ser incomodado. E o comissário? – Quem manda é o chefe,
esbravejou. E agora José? Não que Genivaldo fosse antipático, mas não era da
Patrulha, não tinha esse direito. Reunião de Patrulha a torto e a direito.
Todos insatisfeitos. O pior aconteceu. Um tal de Caledônio aprendiz na Farmácia
do Antônio começou a esperar por ela no portão rosa da sede, e ela Deus do Céu
a ele entregou seu coração. Uma reunião, duas e todos viram que ela não viria
mais. Maldito Caledônio, o que ele tem que nós seus irmãos patrulheiros não
temos?
Chefe Postal foi a casa dela,
na portinhola orgulhosa, Francisca das Flores namorava Caledônio. – Sua mãe
está? Pode entrar Chefe, na sala de estar. Conversa vai conversa vem, a mãe
apoia a filha amada, afinal Chefe ela diz, o coração é dela! Volta para a sede,
todos avisados... Francisca da Flores não vem mais! Uma semana, um mês, dois um
punhado. Na Esquilo todos acabrunhados. Na derrota na tristeza, ninguém achava
uma beleza perder Das Flores para Caledônio. Um plano foi pensado. Uma surra? Uma
armadilha? Juventino Mulato discordou. Isto não é coisa de escoteiros, é coisa
de baderneiros. Temos uma Lei, fizemos uma promessa... Nada disso precisou. O
namoro terminou. Caledônio foi encontrado beijando Clodoaldo. O que? Ele não
era azul e agora virou rosa? A escoteirada aplaudia e eis que surge no portão
Rosa, pintado para ela nada mais nada menos que Francisca das Flores, aquela
dos grandes amores que volta para o seu antigo lar...
Posso garantir sem mentir
que Francisca das Flores nunca se casou. Paquerada pela Patrulha Esquilo até
nos seniores quando passou a admiração por ela continuou. Tirou o Lis de Ouro,
esnobou Escoteiro da Pátria. Gritava para o Chefe Sênior Botox que devia ser
Guia da Pátria. Sou rosa Chefe, não sou azul! De uma coisa eu sei, Francisca
das Flores tinha coração escoteiro, gostava de sair por aí com sua mochila e
seus amigos de promessa para um acampamento em qualquer lugar. Anos e anos
foram passando, um dia Francisca das Flores ficou viúva dos escoteiros. Seus
amigos e irmãos de farda se casaram. Ficou sozinha sem ninguém. Envelheceu,
amadureceu, se formou engenheira e saiu pelo mundo a fazer sedes escoteiras em
todo lugar... Sem cobrar... Mas tudo que é bom dura pouco. Francisca das Flores
morreu. Pudera noventa anos no lombo não dá para continuar.
Pouca gente naquela tarde
sombria no Cemitério Azul e Rosa. Num canto Nostradamus com Juventino Mulato
com semblante pensativo olhava com sentimentos ela que tanto amou a Patrulha
agora ia partir. Em volta da campa Zé Roberto e Wantuil Voleio choravam.
Próximo à cova Calcino Montes com os olhos rasos d’água rezava ao Bom Pai do
Céu por ela. Escorando na Bengala Chefe Postal queria demonstrar força, mas não
conseguia. Alguns gatos pingados, poucos a prantear Francisca das Flores, uma
bela escoteira que agora foi morar no céu. Uma revoada de pássaros quando o
esquife desceu devagar, para a ultima morada dela. Alguém jogou uma pétala,
outras caíram com seu último suspiro. Francisca das Flores se foi. Ali seu corpo
ficou, mas sua alma e seu espírito para os confins do universo se foi.
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