Lendas Escoteiras.
Minha inesquecível Chefe Rosinha.
Muitos
escoteiros e escoteiros não entendiam a Chefe Rosinha. Tinha no rosto a
bondade, o sorriso e a amizade estampada em toda sua aparência. Não vou dizer
que era a mais bem uniformizada da Tropa feminina, mas ela fazia na sua
apresentação algum que sentíamos ser uma forma de elegância e simplicidade. Eu
mesma no principio achei aquilo démodé, careta, fora de moda e inadequado para
uma Tropa escoteira. Hoje já casada e com dois filhos sou gratíssima a ela.
Deu-me nova visão da vida, principalmente quando comecei no meu primeiro
emprego. Ainda me lembro do sorriso enigmático dos meus diretores quando
conversavam comigo. Um deles até me perguntou se eu era de família tradicional
e ascendência europeia. Eu ria por dentro sem demonstrar presunção ou
esnobismo.
Nunca
esqueci meu primeiro dia na Tropa. Já com meus onze anos, menina sapeca, sorria
mesmo sem saber por que sorria. Não tinha modos para assentar nem andar.
Parecia um espantalho que adquiriu vida e agora saia pelo mundo pensando que
ele era meu. Adorei aquele dia. Ela me recebeu com um abraço sem afetação, me
disse baixinho que eu era bem vinda e que contava comigo para ajudá-la. Aquilo
me marcou. Ela queria minha ajuda? Porque não? A patrulha Coruja era minha
segunda família. Todas as Escoteiras pareciam anjos caídos do céu para fazerem
um escotismo que até hoje considero uma dos melhores momentos da minha vida. No
principio estranhei a forma como a Chefe Rosinha tirava dez ou quinze minutos
para falar em etiqueta, apresentação e educação me deixou inquieta. Pensava que
o escotismo me daria muitas descobertas, aventuras, acampamentos e tantas
outras coisas que sempre sonhei ter.
-
Felícia, aqui você vai ter tudo isto e até mais. Mas espero que não me
critique, pois ninguém nasce sabendo a maneira ideal de comportar-se em cada
momento. Se fosse assim o mundo seria chatíssimo. Ela dizia isto e sorria. Um
sorriso que conquistava a todos nós. – A elegância e a educação é um dom
pessoal, como o talento, é a única forma de beleza permitida a todos nós. Eu
sei que ninguém nasce assim e, portanto acredito que o escotismo pode
complementar esta parte que está faltando em muito na nossa juventude. Feche os
olhos e imagine comigo: - Se você tentar possuir uma flor verá sua beleza murchando. Mas se você apenas olhar
uma flor num campo, permanecerá para sempre com ela. Eu franzia a testa e não
entendia muito bem. Mas o tempo ajuda a transformar nossa maneira de ser e
pensar se tivermos auxilio de alguém. Minha mãe era exigente e meu pai também.
Mas a Chefe Rosinha era totalmente diferente. Com ela era muito fácil aprender.
Nossos acampamentos eram
demais. Tínhamos liberdade para conversar agir atuar e construir. Nosso campo
de patrulha não deixava nada a desejar. Eu adorava fazer uma pioneiria, bem
feita ou não e ao terminar olhar com olhos de lince o que tinha feito. Dizem
que a mais nobre paixão humana é aquela que ama a imagem da beleza em vez da
realidade material. O maior prazer está na contemplação. E como eu gostava de
contemplar minhas obras primas. As horas deliciosas do tempo livre, do almoço
jantar ou mesmo nas conversas ao pé do fogo eram repletas de alegrias, sorrisos
mil, éramos como se estivéssemos vivendo uma nova vida que o escotismo estava
ali para nos oferecer. A Chefe Rosinha dizia sempre: - Seja você quem for, seja
qual for à posição social que você tenha na vida, a mais alta ou a mais baixa,
tenha sempre como meta muita força, muita determinação e sempre faça tudo com
muito amor e com muita fé em Deus, que um dia você chega lá. De alguma maneira
você chega lá.
Eu fazia tudo na
patrulha com amor. Uma vez acampamos com outras patrulhas e achei que eles e
elas não prezavam a boa civilidade. Muitos palavrões falta de apresentação
pessoal ou mesmo até nas horas mais sublimes os seus sorrisos destoavam de tudo
aquilo que aprendemos com a Chefe Rosinha. - Escoteiras! Ela dizia sempre: Uma pessoa é considerada chique quando se veste com apuro e bom gosto e
se destaca pela elegância respeito e ausência de afetação. De novo, uma questão
de atitude e não de indumentária. Lembrem-se se não houver frutos, valeu a beleza das flores; se não houver
flores, valeu a sombra das folhas, se não houver folhas, valeu a intenção da
semente. Isto minhas amigas eu chamo de caráter de um homem ou uma mulher
em sua maneira habitual de ir à caça da felicidade. Primeiro fazemos nossos
hábitos, depois nossos hábitos nos fazem.
Quando
recebi meu Lis de Ouro foi como se o mundo se reverenciasse aos meus pés.
Quando minha mãe me abraçou eu chorei de felicidade. Eu olhava a Chefe Rosinha
que na sua expressão de bondade me fazia sentir como a escoteira mais feliz do
universo. Sempre me lembrando de suas palavras: Se você for educada e simpática, as pessoas ficam dóceis e
obedientes. Assim, a polidez faz com a natureza humana o mesmo que o calor faz
com a cera. Tentei sorrir quando fui para Guia. Não conseguia segurar minhas
lágrimas. Afinal era outra escola, outra maneira de viver e aprender. Se vives
de acordo com as leis da natureza, nunca serás pobre; se vives de acordo com as
opiniões alheias, nunca serás rico e eu nos seniores me sentia pobre. Eu não ia
deixar apagar o que aprendi com a Chefe Rosinha. Eu sei que existem
pessoas que se acostumam com seus próprios erros, e em pouco tempo confundem
seus defeitos com virtudes. Isto nunca iria acontecer comigo.
Foi custoso
para viver com outros que não tiveram a oportunidade de aprender a ser
educados, gentís, entre outras necessidades de um ser humano que acredita na
forma de viver mais voltada para os outros. Eu podia ter dito nas Reuniões ou
Conselhos de Tropa o que diferia a Tropa escoteira dos Seniores ou das Guias.
Poupar as pessoas de situações involuntariamente vexaminosas é prova de muita
educação e civilidade. Palavras que não me esquecia da minha Chefe amada. Aos
poucos sem forçar a própria Tropa aprendeu a me respeitar e um dia sem querer
disse a um monitor que era muito comum em chegar atrasado: - Monitor, fazer
alguém esperar sem uma desculpa séria, sem um motivo importante e,
principalmente sem um telefonema no meio do caminho para justificar o atraso, é
uma prova de arrogância e falta de civilidade. Ele me olhou espantando e quis
retrucar, mas daí em diante nunca mais chegou atrasado.
O tempo passou. Fiquei mais alguns anos como Chefe. Cresci me formei e hoje não me arrependo de tudo que aprendi com a Chefe Rosinha. Ela me deu uma nova vida, uma nova maneira de pensar e se não fosse ela eu não seria a mulher que sou hoje. Com a Chefe Rosinha eu aprendi que deveríamos ser gratos a Deus por não nos dar tudo que lhe pedimos, mas nos ter dado o que precisamos para ter uma vida feliz.
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