O pecado de
todos nós.
Disseram-me uma
vez que ser feliz não é pecado. A felicidade é desprezada por muita gente. É
irritante ver alguém naturalmente lindo, rico, simpático, inteligente, culto,
talentoso, apaixonado e, ainda por cima feliz! Estou citando isto porque quando
conheci Diego pela primeira vez ele era quase tudo isto. Ele conseguiu dar alma
ao Grupo Escoteiro Ventos do Norte. Trouxe o sorriso que faltava e todos ali o
amavam. Um invejoso comentou que seu jeito, sua maneira de falar e andar, sua
voz cheia de trejeitos poderia trazer resultados danosos ao movimento
Escoteiro. Diego apareceu do nada e do nada se solidificou como pessoa
importante na parte burocrática e em tempo algum alimentou seu sonho de um dia
ser um Chefe Escoteiro ou de lobinho. Doutor Janílson o Diretor Técnico não
sabia de onde ele veio. Não tinha filhos no Grupo e alguns o conheciam na
cidade porque era gerente das Lojas Abil, famosa pelos seus vestidos feitos
pelos maiores estilistas do mundo. Ali se encontrava um Gabriell Miuccia Prada,
um Bonheur Chanel, um Christian Dior ou mesmo um John Galliano sem falar nas
famosas bolsas Louis Vuitton.
Era bem quisto pela
sociedade local e muitas madames o procuravam diretamente para ser atendidas
por ele. Diogo tinha um grande amor. O Escotismo. Como surgiu ninguém soube.
Era incansável na colaboração ao Grupo Escoteiro. Conseguiu com suas amizades
vultosas colaborações financeiras para o Grupo. Nunca fez a promessa e com seus
olhos brilhantes admirava quando alguém no cerimonial jurava a Deus e a Pátria
Ele sonhava em fazer a promessa, mas sabia que no Grupo Escoteiro seus
trejeitos eram considerados anormais havia muito preconceito por pessoas como
ele. Ele respeitava a todos. Mas não era o que pensava Jonny Vampuso. Ele mesmo
se perguntou varias vezes se estava certo eles terem no Grupo Escoteiro um
sujeito que era conhecido como um homossexual ou um sapatão.
Uma das maiores
alegrias de Diogo foi quando a Akelá Sophia o convidou para ajudar no
acantonamento distrital. Ele nunca se sentiu tão feliz. Parecia estar em casa,
ou melhor, no paraíso. Os lobinhos o adoravam e os chefes passaram a ter por
ele um carinho todo especial. Quando retornaram pensou que o Doutor Janílson o
Diretor Técnico o convidasse para ser um assistente. Mas nada aconteceu. Ele
não sabia que seu algoz Jonny Vampuso já tinha feito sua cama não só com o
Chefe do Grupo e com boa parte do Distrito e região. A gente sabe que pessoas
preconceituosas, são reflexos de defeitos não revelados por eles mesmos. Não se
sabia o porquê de um dia o chamarem no Escritório Regional. O Doutor Janílson
se desculpou e não foi com ele. Diogo sentiu-se um cordeiro a mercê dos lobos.
Eram quatro dirigentes.
Sisudos. Cara feia. Nem um sorriso. Eram chefes Escoteiros zelando pelo bem da
moral escoteira. Fizeram mil perguntas e
no final da reunião um querendo mostrar ser boa praça o convidou para um café.
Falava baixinho, sobre o que pensavam dele, sobre os resultados maldosos que o
escotismo poderia ter com sua presença, chegou até a citar Paulo Coelho que
disse que quem tentar possuir uma flor, verá sua beleza murchando. Mas quem
apenas olhar uma flor num campo, permanecerá para sempre com ela. – Você meu
amigo ele disse, sabe que não o aceitam em todos os lugares, sei que isto é
cruel. Aceite meu conselho peça demissão e vá embora do Grupo Escoteiro. Vamos
evitar rusgas e processos inúteis.
Diogo foi para
casa com a alma ferida. Ele sabia o que não era o que pensavam e que a vida o
obrigou a fingir o que não era. Chorou no ônibus, e a tristeza o invadiu por
muito tempo. Pediu demissão de um cargo que não tinha e saiu do Grupo Escoteiro
Ventos do Norte. Ficava aos sábados sonhando com seu passado Escoteiro que para
dizer a verdade nunca existiu e nunca iria existir. Ele sabia que as nuvens das
tristezas são como o vento. Quando elas desaparecem o dia fica mais lindo.
Pensava em enfrentar os maledicentes, dizer que eles não eram os donos da
verdade. Falava para si mesmo que nunca devia deixar de fazer algo de bom que
seu coração pede. Se isto acontecer o tempo poderá passar e as oportunidades
também.
Quando
naquela tarde Jonny Vampuso entrou na loja com sua noiva para comprar um
vestido de noiva ele pensou em não atendê-lo. Afinal ele sabia que o dedo duro
foi ele. Porque fizera isto? Ele nunca lhe tinha feito nenhum mal. Ele sabia
que seu coração não podia odiar. O atendeu até melhor que muitos que ali
estiveram. A noiva de Jonny Vampuso se encantou com Diogo. Na saída Jonny
Vampuso num impulso de bom Escoteiro foi até ele e lhe pediu desculpas. Diogo
pensou consigo se aceitaria seu pedido. Ainda tinha uma mágoa guardada em seu
peito. Sabia que Jonny Vampuso errara e não lhe negaria o perdão. Pensou mesmo
em não apertar sua mão. Mas quando viu que ele lhe dera a esquerda, aquela que
dizem ser do coração ele aceitou. Quando Jonny Vampuso foi embora as lagrimas
desceram novamente.
A vida escoteira
de Diogo se encerrou ali. Naquele mesmo dia dois menores entraram para roubar e
deram um tiro certeiro em Diogo. Morreu na hora. A sociedade em peso tristonha,
mas não participativa não foram as suas exéquias. As Madames que ele sempre
atendia com presteza e que sempre o trataram como um cão fiel também não foram
lá. Ele sabia o que as madames queriam. Ele sempre elogiava dizendo: Eu posso
reconhecer a senhora entre mil. Os seus passos têm a magia das grandes
senhoras. A sua voz Madame é o sinal maior do meu momento feliz e às vezes
Madame, vocês não precisam nem falar, eu sei o que querem!
Eu fui ao
enterro de Diogo. Simples. Nenhuma Madame presente. A sociedade não perdoa
bajulação sem motivo. Escoteiros? Uns cinco lobos e a Akelá chorosa. Doutor
Janílson apareceu para dizer olá e se foi. Jonny Vampuso também apareceu e
ficou pouco tempo. Quando a terra sagrada o cobriu avistei uma senhora
magrinha, vestida simplesmente, com um menino nos braços e em uma das mãos uma
menina de uns oitos anos chorando. Não tendo mais ninguém lá elas se
aproximaram da última morada de Diego. Fiquei curioso. Aproximei-me. – Vocês o
conheciam? – A menina chorando e soluçando disse – Era meu pai! A Senhora me
contou que era sua esposa. Ele fez um trato com ela quando casaram. Tenho meu
amor que fingir o que não sou. Meu trabalho me obriga. A sociedade que eu
atendo sente-se satisfeita com minha voz, meus trejeitos e sabe, um dia vamos
embora daqui.
Que vida, pensei. O
acusaram de ser o que não era. Mas de quem seria a culpa? Dele? Dos que viveram
a sua volta? Ou dos preconceitos que norteiam uma sociedade que não aceita os
direitos dos que se acham possuídos dele? Que os anjos estejam com você Diogo.
Para sempre!
Nenhum comentário:
Postar um comentário