Lendas
Escoteiras.
Rio
Negro, a cidade das sombras!
... – Hoje me considerando um Chefe sem
memória para criar, enfiei a mão no fundo do baú e tirei esta história que
ainda não sei por que escrevi. E um conto sobrenatural, vale a pena contar? Rio
Negro a cidade das Sombras escrevi as duas da madrugada. Acordei com a historia
na cuca levantei liguei o micro e comecei. Terminei por volta de três da manhã.
Bem não vão dizer que é um conto comovente, cheio de amor e vida. Se não
gostarem me deem seus nomes. Peço ao Funério para fazer uma visita à meia noite
para conversar com vocês e convidar a conhecer Rio Negro. Rarará!
- Um telegrama simples. Dizia: “Gostaríamos
de contar com sua presença nas festividades do Grupo Escoteiro Enigma do Santo
Sepulcro. Será dia 02 de abril próximo em Rio Negro, a cidade das sombras. Despesas
por nossa conta”. - Alguma caçoada? Eu recebia sim muitos convites para
palestras e pequenos cursos escoteiros em várias cidades. Mas aquele convite
era extraordinário. Onde seria está cidade? Na internet não encontrei. Deve ser
alguma graçola pensei. Pitágoras o Comissário sempre fazia isto comigo. Liguei
para ele: - Não fui eu! Juro! Ele disse. Dei boas risadas, mas fiquei inquieto,
ou melhor, encucado com tudo aquilo.
Não dormi bem. Não tive sonhos e nem
pesadelos, mas acordei suando. Parecia que alguém dizia para eu ir à estação
Rodoviária comprar a passagem. Liguei para a região Escoteira para me
informarem se tinha algum grupo com este nome. Riram na minha cara. Fui até a
Rodoviária do Tietê. Nas escadas um homem de paletó roxo, chapéu enterrado até
os olhos, descalço, unhas enormes e com uma placa – Passagens para Rio Negro. –
Aproximei. Ele levantou o chapéu. Não tinha olhos. Só buracos que não via o
fundo. Um nariz comprido e afilado. Uma boca enorme cheia de dentes de ouro. Não
tinha orelhas. Nas mãos em cada uma dois dedos.
Tirou do bolso uma passagem. –
Mandaram-me entregar. O ônibus parte a meia noite. Terminal dois. O homem
desapareceu. Nos guichês perguntei sobre Rio Negro. Ninguém conhecia. Não
costumo me esconder de desafios. Iria lá nesta cidade fantasma. Afinal sou um
Escoteiro e o Escoteiro não foge dos desafios. À noite com minha mochila e o uniforme
social fui para a rodoviária. Por voa das duvidas coloquei minha boina preta
tipo Montgomery. Onze e quarenta da noite e vi o morto vivo a minha espera. Disse-me
– Siga-me. Seguimos um corredor escuro, um vento húmido e frio. Vi o ônibus.
Pequeno. Negro. Na placa Rio Negro. A porta aberta. Entrei. Sentei bem à
frente. Só tinha eu. Partimos. Alguém de voz grossa e cavernosa começou a
cantar a canção da Despedida. Dormi. Acordei com o dia amanhecendo. Uma bruma
cinzenta cobria a cidade. O ônibus parou. Desci. Um Chefe Escoteiro de uniforme
roxo me saudou. Usava um lenço negro com uma caveira desenhada atrás. Sempre
Alerta Chefe! Sou o Funério, disse. Venha comigo.
Um carro negro fúnebre com um caixão
nos esperava. Não vi o defunto. Ninguém nas ruas. Não havia barulho aves cães
ou qualquer outro animal. O carro parou. Olhei o motorista. Sempre de costa. Um
boné de couro preto. Abri a porta e sai. Estava em frente a um cemitério. Aqui?
Perguntei. Ele se virou. O rosto sem pele só ossos. Não se preocupe Chefe. A
sede do grupo é linda. Foi toda construída pelos habitantes do lugar. O Senhor
vai gostar. Bragg! Comecei a tremer! Onde fui me meter? Ele me pegou pela mão
como se eu fosse uma criança. Fui com ele. Não tinha outra saída. Catacumbas e
mausoléus enormes. Nomes estranhos. Aqui jaz – Baldassari um rei que perdeu a
cabeça, morreu por falta de sangue – Em outro dizia: Aqui jaz, Narkissa, a
princesa beijada pelo Vampiro Damien. Meu Deus! O lugar era amedrontador.
Fechei os olhos, um medo
terrível. Abri. Lá estava a sede. Em letras góticas uma enorme placa: Grupo Escoteiro
Enigma do Santo Sepulcro. Enormes caixões com caveiras sentadas em cima
enfeitavam o teto da sede. Um belo esquife branco na porta e dentro um Chefe
bem velho morto com bigode e cabelos branco uniformizado. A tropa, Alcatéia e
os seniores formados na bandeira. Eram bandeiras negras com escritos em grego e
latim e desenhos de zumbis e cadáveres. Um Chefe se aproximou. Bem vindo Chefe!
Estamos tristes com sua chegada. Mas não estão alegres? Falei espantado. Aqui
Chefe é o contrário. Olhei a escoteirada. Todos de uniformes negros e os
lobinhos de roxo. Ninguém sorria. Era como estivessem mortos. Vi que nenhum dos
jovens tinha olhos. Só um buraco fundo. Putz! Onde fui me meter? Porque
aceitei? Não havia volta. Um zumbido e um grito e as bandeiras negras com
símbolos vampirescos começaram a ser içadas. Vampiros enormes voavam sobre
nossas cabeças. Olhei em uma catacumba mais alta e chacais davam uivos áulicos
e lamurientos. Achei que um deles o mais forte poderia ser Duamutef, o filho de
Hórus. Abraçaram-se todos os escoteiros e lobinhos e deram o grito do grupo
chorando. Acho que todos se lamentavam por haver morrido. Morrido? Eram mortos
vivos? Pensei em correr dali.
Um Chefe me deu a mão.
Levou-me até um mausoléu enorme. Em volta um jazigo cheio de ossos. Em cada
catacumba, em cada mausoléu, em cada cova uma mão, uma cabeça e logo uma
multidão de mortos zumbis em minha volta. Eram milhares. O Presidente do Grupo me
pediu para fazer a palestra. Disse que todos aguardavam ansiosos este momento.
Que palestra quer que eu faça? Nada sei de mortos vivos e nunca fui ao Grande Acampamento.
A última vez que fui a um enterro faz anos! – Gritei alto, chamem Baden Powell.
Ele entende disto melhor que eu! Não
Chefe, nada disto. Todos aqui querem saber como funciona a Escoteiros do
Brasil. Querem nomes dos grupos dos chefes para visitarem a meia noite. Que eu
explicasse sobre a Assembleia Nacional. Eles teriam candidatos. Deus do céu!
Que era aquilo? Ajuda-me Baden Powell! Socorre-me almas escoteiras do outro
mundo!
Ouvi vozes. Monitores me convidando para
jantar. Acordei. Abri os olhos. Obrigado meu Deus. Era apenas um sonho. Um
pesadelo. Estava com meus escoteiros num lindo acampamento sentado na beira do
Córrego de Águas Correntes. Vi o sol se pondo no horizonte. Bendito sol! Era um
lindo regato de águas límpidas que adorava. Vi um peixinho pulando nas
corredeiras. Graças a Deus. Graças a Deus. Ainda bem. Levantei-me. Espreguicei.
Dei um enorme sorriso de felicidade. Havia cochilado no tempo livre enquanto
eles preparavam as refeições. Fui até o córrego lavar o rosto e me refrescar. Cantarolava
o Rataplã. Bom demais estar ali. Que dia maravilhoso! Pensei... Levantei peguei
a toalha para enxugar. Do outro lado do córrego, lá estava Funério o morto vivo
da rodoviária. – Com voz grossa fúnebre e cavernosa me saudou: - Sempre Alerta
Chefe, à meia noite venho te buscar!
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