Lendas Escoteiras.
Apenas uma patrulha escoteira...
... – Apenas uma Patrulha. Touro era seu nome. Bonifácio Luz era o
monitor. Tomé Lindolfo o sub. José Nonato o intendente. Flávio Rosado o
Cozinheiro. Tomás Lívio Bombeiro e lenhador. Eu Wantuil Leal o Escrevente e
Construtor. João Quaresma o novato virou Faz Tudo e nas horas vagas socorrista.
Amávamos a patrulha Touro e o nosso Chefe Lontra. A Patrulha tinha história
para contar. Vinte anos de vida! Sabiamos os nomes dos monitores que passaram
por ela de cor. Alguns sumiram da cidade outros permanecem lá até hoje. No
oitavo livro da Patrulha tudo que importasse era anotado. Havia historias de
acampamentos, especialidades, e jornadas incríveis dos primeira classe. Os
acampamentos, as excursões às viagens, os distintivos conquistados e até mesmo
as estrelas de atividade. Ela tinha um lema: - O que é de um é de todos! O
grito de Patrulha simples, mas que viveram no coração de todos que nela
participaram: – Qui, que, code, com o Touro ninguém pode!
A Patrulha chegou a ter oito escoteiros. Agora seis e o mais novo Tomé
Lindolfo já tinha dois anos e meio na patrulha. Todos grandes amigos. Se um visitava
outro tinha que ficar para o almoço ou o jantar. Ninguem era rico, Flávio
Rosado o cozinheiro era o mais bem aquinhoado. Seu pai Escrevente do cartório
ganhava razoavelmente bem. Tomé Lindolfo o sub o mais pobre. Negro, morava na
Favela do Chico Bento. Ali era seu lar e o nosso também. Chefe Lontra quando
chegava apertava a mão de cada um e perguntava: - E aí turma, como foi à semana?
Sempre a mesma coisa entra sábado sai sábado fora quando íamos acampar. Chefe gente
fina, nosso herói. Podíamos procurá-lo a qualquer hora do dia ou da noite e ele
sempre com aquele sorriso de amigo e irmão mais velho prestativo nos atendia
com um sorriso nos lábios.
- Ferroviário o Chefe Lontra com seus trinta e poucos anos,
funcionário da Vale do Rio Doce conseguia passagens de primeira classe para
onde quiséssemos ir. Um dia nos convidou para um passeio até Baixo Guandu em um
comboio com quatro locomotivas e mais de duzentos vagões de minério. Foi
demais. Estávamos em reunião de patrulha quando ele se aproximou: – Dá licença?
– A casa é sua Chefe! – Este é João Quaresma. Pensei em colocar na Patrulha de
vocês! Bonifácio comentou – Ele é bem vindo Chefe! - Chefe Lontra sorriu e o
apresentou a todos nós.
João Quaresma era alto e forte. Tenho doze anos. Ninguém acreditou.
Parecia ter quatorze. Sorridente, aspecto de sabe tudo. – Quem é o monitor?
Perguntou. Sou eu disse Bonifácio Luz. Ele olhou Bonifácio de cima em baixo.
Tem eleição para ser monitor? – Não tem. O Chefe indica a patrulha opina. Foi
seu primeiro dia. Cada um olhando o que ele fazia e como fazia. Dizem que o
primeiro dia do novato é madeira de dar em doido. Mesmo exigindo dele aos
poucos fomos nos acostumando com João Quaresma. A Patrulha tinha quatro
segundas classes e dois primeira. Não havia noviços. João Quaresma foi o
primeiro noviço a chegar à patrulha.
Fiquei em duvida. Será que ele queria se mostrar? Mostrar o que?
Escotismo não dá serve para isto. Nos jogos ele dava a alma e a vida para
ganhar. Acostumamos a jogar em equipe. Quem ganha é a Patrulha e não o patrulheiro.
João Quaresma queria ganhar sozinho. Na Reunião de Patrulhas comentamos e ele
não deu bola. Fizemos um Conselho de Patrulha e ele concordou em trabalhar como
equipe. Um dia procurou o Chefe Lontra para dizer que estava pronto para ser um
primeira classe. Chefe Lontra o levou até a sede. Conversaram sobre isso. –
João tem uma escada. Primeiro a promessa o demais depois.
Na quarta reunião chegou uniformizado. Bonifácio tentou contornar e
ele não ligou. Na ferradura durante a inspeção quando ele ficou em posição de
sentido e mostrou às mãos limpas e unhas cortadas o Chefe não disse nada. Ao
dirigirmos ao canto de Patrulha Bonifácio disse que o Chefe queria falar com
ele. – Foi embora naquela tarde revoltado. O Chefe o mandou de volta. Sabiamos
que uniforme só na promessa! No portão deu uma banana para todos e disse que
nunca mais ia voltar. Mas voltou. No sábado seguinte de cabeça baixa pediu
desculpas.
A partir desse dia João Quaresma mudou. Obediente, disciplinado,
cumpridor de ordens. No acampamento na Foz do Rio Iguaçu ele nos surpreendeu. Acordamos
fora do horário. Tinha a física as seis, o café as sete e a inspeção as nove.
Acordamos por volta de sete e meia. Na noite anterior antes de dormir fizemos
um Conselho de Patrulha. Decidimos o que cada um devia fazer. Nossa pontuação
deixava a desejar. João Quaresma levantou no horário, tinha feito o café,
renovou as amarras das pioneirías e o vasilhame estava um brinco. João Quaresma
parecia entender do riscado. Na inspeção o Chefe sorriu. O campo ficou nos
trinques.
Não ficamos em primeiro lugar e sim em segundo que era bom demais. O tempo foi passando e João Quaresma mostrava
suas qualidades como escoteiro. Agora já era um dos nossos. Foi uma festa sua
promessa na Gruta da Caucaia. Alguns meses depois recebeu sua segunda classe.
Fez jus as especialidades que conquistou. Nunca nos convidou para ir a sua
casa. Quase um ano de Tropa e não sabíamos quem era seu pai e sua mãe. Ficamos
sabendo que morava no Bairro do Toledo e só. Um dia no Conselho de Patrulha nos
fez um convite. Quero que vocês almocem domingo comigo. Não reparem casa
simples e singela. Ele morava em um barraco de madeira. Na porta ele e sua Avó,
sorrindo. Não tinha pai e nem mãe. Um almoço de primeira. Sua avó quase não
podia andar e se aproveitava de uma bengala simples.
João Quaresma a partir daquele dia selou para sempre a amizade com
todos os patrulheiros. O tempo passou, Crescemos e viramos homens sem perceber.
Na Patrulha novos escoteiros. Bonifácio Luz virou prefeito da cidade. José
Nonato foi para o Acre atrás de ouro que o faria rico. Tomé Lindolfo abriu uma
casa de material de construção. Flávio Rosado tinha o melhor restaurante da
cidade. Tomas Lívio virou bombeiro e já era capitão. João Quaresma casou com
uma dama rica e foi morar na capital. Anualmente nossa patrulha se encontra para
um papo gostoso em algum lugar. E eu? Eu continuo o mesmo, Escoteiro, aprendiz
de sonhador. É o tempo passou e nem mesmo sei
nesse momento quem sou. Enfim, sei quem eu era, quando me levantei hoje de
manhã, mas acho que já me transformei várias vezes desde então. Fraternos
Abraços!
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