Lendas escoteiras.
Lis de Ouro, o sonho de Lord Jim.
Lord Jim era um
sonhador. Desde que entrou para os escoteiros ele sonhava. Sonhava com
acampamentos, com excursões, com a Patrulha, com as viagens enfim, Lord Jim
gostava mesmo de sonhar. Havia uma diferença em Lord Jim, ele sonhava com os
pés no chão. Emocionou-se no dia de sua promessa. A tropa em posição de
Alerta! Mino o Monitor ao seu lado, o
Chefe Maílson o olhando nos olhos e ele dizendo a Promessa Escoteira sem errar.
Lembrou ali na ferradura quando entrou na tropa. O abraço do Chefe, do Monitor
e de todos os patrulheiros da Patrulha Gavião. Ele ainda não conhecia estas
provas de amizade. Nunca tinha visto. Diziam que os escoteiros são fraternos. No
primeiro acampamento ele sentiu a verdadeira felicidade de viver como um herói
das selvas. Aprendeu rápido. Até como cozinheiro ajudou.
Quando começou na
Patrulha Gavião o batizaram como Lord Jim. Seu nome era Stefano. Gostou do
apelido. Quando leu que Baden Powell também foi Lord seu orgulho mudou para
melhor. Agora seu sonho era outro. Correu atrás do Cordão Verde e amarelo. Não
foi difícil. Em um ano e meio conseguiu. Melhor ainda recebeu a segunda Classe
em uma noite de lua cheia, no Acampamento das Vertentes, ascendendo o fogo do
conselho com um palito e pulando as chamas três vezes para receber também seu
nome de guerra. Apesar de que a tradição rezava ser um nome indígena ele pediu
para continuar sendo Lord Jim. Seu Monitor o abraçou. Todos deram um enorme
grito de guerra da tropa. – Viva Lord Jim! O Chefe Maílson entregou o cordão
Dourado e ele se derreteu todo. Não perdia um acampamento, nenhuma excursão.
Era um dos primeiros a chegar à sede para as reuniões. Não tinha sonhos de ser
Monitor, seu sonho agora era ser um Escoteiro Correia de Mateiro. Deixou as
especialidades, já tinha muitas delas.
As provas foram
feitas paulatinamente. Recebeu do seu Monitor como deveria ser e as datas. Ele
mesmo procurou o Capitão Lamartine dos bombeiros para que aprendesse a prova das
especialidades de Bombeiro e Socorrista. Acampador tirou facilmente. Em dois
anos na tropa já tinha mais de trinta noites de acampamento. Comprou um caderno
de duzentas folhas e ali anotava tudo. Datas, onde, quando, tempo e as partes importantes
que lá aconteceram. Agora estava se preparando para a jornada. Ainda era
realizada na Tropa e era a apoteose. Todos que fizeram eram respeitados e até
endeusados na tropa. Todos queriam ouvir os contos aventureiros da jornada.
Aprendeu a ler mapas, tirava de letra os pontos cardeais, colaterais e sub.
colaterais, sabia o que era um azimute, graus, aprendeu com facilidade a fazer
um esboço de Giwell e seu passo Escoteiro e passo duplo eram perfeitos. Nunca
em tempo algum ele errou no seu passo duplo. A quilometragem não tinha erros.
O dia da jornada
chegou. Ele e Leôncio que ele mesmo convidou partiram rumo ao Vale do Roncador.
Não conhecia, nunca tinha ido lá. O Chefe e o Assistente distrital Escoteiro
tinham conversado antes. Um ônibus o levou até a estradinha do Sitio do
Marcondes. Sua mochila estava perfeita. Nada de mais nada de menos. O farnel o
de sempre. Um macarrão, uma batata, um arroz, sal, alho e um vidrinho de
gordura. Sabão e mais nada. Não estava pesada. Queria levar a velha Silva de
guerra, mas os seniores estavam com ela. Sobrou uma Prismática. Tudo bem. Ele dominava
as duas com perfeição. Na porteira abriram o mapa. Na mosca. Era ali mesmo. Ele
contava os passos e Leôncio anotava o que via por ali. Dois pintassilgos, um
Anu do Brejo, beija flor voando longe, dois macaquinhos pregos no pé de Jaca.
Às seis e meia da
tarde chegaram ao sitio do Marcondes. Não havia duvida. Duvida ouve na senhora
que os recebeu. Parecia que não sabia o que eles queriam, mas disse que eles
poderiam usar o riacho e acampar a vontade. Uma sopa deliciosa, lavar
vasilhame, limpar bem a barraca para evitar animais peçonhentos, e após uma
vista no relatório e uma oração foram dormir. Levantaram cedo. Um café,
biscoitos nova arrumação e pé na taboa. Agradeceram à senhora e partiram.
Sabiam que deviam atravessar a Mata do Canarinho, mas disseram que não eram
mais de quatro quilômetros dentro dela.
Engano. Meio dia, uma hora e não saiam de dentro da mata. Voltaram.
Foram até o sitio. Perguntaram. O mapa não ajudava. A senhora disse que eles
erraram, se voltassem pela serra eles veriam o caminho.
Duas da tarde.
Combinaram de chegar à sede às cinco da tarde. Isto se o ônibus não atrasasse. Agora
sim o caminho estava correto. O mapa voltou a funcionar. Só às sete da noite
chegaram ao ponto de ônibus. Demorou. Chegaram à sede as onze da noite. O Chefe
Maílson muito preocupado. O Assistente distrital não quis esperar. Foi embora.
Disse que não daria a prova como realizada. Se não tem responsabilidade com
horários não merecem a Primeira Classe, disse. Dito e feito. Foram reprovados.
Lord Jim não chorou e nem desistiu. Ele tinha têmpera de escoteiro. Seis meses
depois repetiu a jornada. Desta vez conseguiu fazer tudo no horário. Lord Jim
fez do seu sonho realidade. Pediu ao Chefe Maílson para que o Liz de Ouro fosse
entregue também no Fogo de Conselho. Claro que sim o Chefe disse.
Noite escura, raios, trovões,
o fogo aceso. O Chefe queria voltar para o campo. Começou a cair uma tempestade
que encharcava a todos. Lord Jim chorou. Preciso receber agora Chefe! Não posso
esperar outro acampamento. Terei feito quinze anos e serei Sênior! A chuva caia
aos borbotões. A tropa ficou de pé. Em posição de sentido. Trovões ribombavam
pelo ar. Lord Jim ali em pé em frente ao Chefe. Era mesmo um vendaval dos bons.
O vento soprava forte. Mino o Monitor colocou a mão no seu ombro. - Você está
pronto Lord Jim? Sim ele disse. O Chefe entregou o Distintivo Liz de Ouro. Ele
fez questão de refazer a promessa. Deu um enorme sorriso. Um raio assustador
atravessou os céus. A luz que ele produziu mostrou um rosto de um Escoteiro
orgulhoso e valente. Agora era um Escoteiro Liz de Ouro! Agora tinha muitas
histórias para contar! Com ribombos e assombros da chuva que caia intermitente,
a tropa ainda em posição de sentido cantou o Rataplã. Todo o hino. A selva
recebia com orgulho aquela chuva intermitente e o cantarolar dos escoteiros!
Ah! Sonhos! Como é bom sonhar e os ver realizados. Viva Lord Jim. Um Escoteiro
Lis de Ouro para sempre.
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