sábado, 29 de julho de 2017

Chefe Falcão Maltês. Um perfeito cavalheiro.


Lendas escoteiras.
Chefe Falcão Maltês. Um perfeito cavalheiro.

             Porque o apelido eu nunca soube e nem perguntei. Nunca disse seu nome. Eu sei que foi um grande amigo enquanto estivemos juntos. Disse-me um dia que fora Chefe do Grupo Escoteiro Estrela Cadente. Nunca tinha ouvido falar. Mas acreditem ou não o Chefe Falcão Maltês era um perfeito cavalheiro. Como se diz hoje uma figura que merece um lugar entre os homens de honra deste país. Um digno Escoteiro. Nunca deixou alguém mais velho que ele em pé no ônibus. Ninguém sentava sem antes ele arrumar a cadeira e olhem, as chefes adoravam. Pagar despesas? Nem pensar. Se ele não pudesse pagar não iria. Dizia sempre que os homens devem ser boníssimos com as mulheres, pois são elas que carregam o fardo mais pesado.

             O que eu admirava mais no Chefe Falcão Maltês era seu modo de falar e dar exemplos aos escoteiros. Uma vez estávamos em marcha de estrada indo acampar no Vale da Tartaruga, e caiu um pequeno papel de bala na trilha onde percorríamos. Ele parou toda a tropa. Chamou a todos. Disse – Sabem que somos invasores? A escoteirada não entendeu nada. – Porque Chefe? Disse um deles. Porque a relva, as árvores, os pássaros, o rio e as montanhas estavam aqui antes de nós. Portanto eles são os donos. Vocês são intrusos. Vocês gostariam que alguém entrasse em suas casas, sem pedir e jogassem papeis de bala na sala? Ninguém disse nada. Um Escoteiro foi até lá e pegou o papel e guardou na mochila. E nos acampamentos? Sua inspeção era rigorosa. Não perdoava nada. Nem fossa mal tampada. – Escoteiros! – dizia ele, porque deixar que a abelha os beija flores, os pássaros do céu sintam o mau cheiro? Não é certo, não é mesmo?

           Um dia estávamos sentados na porta da barraca, um pequeno fogo crepitava e ele começou a cantar uma linda canção. Todos acorreram para perto dele. Ele parou e os escoteiros ficaram intrigados. – Vou continuar, aguardem. Só quero aproveitar a oportunidade para dizer a vocês, que as músicas, canções tudo que existe é belo. Sabendo cantar e sabendo ouvir. Se um dia vocês ouvirem uma musica clássica, ou mesmo uma ópera em um lugar qualquer sei que não irão gostar. Mas se assistirem a um conserto de uma Orquestra sinfônica ao vivo, ou mesmo a uma ópera em um teatro tenho certeza que irão adorar. A Musica para se gostar tem de ter sentimento. Existem músicas e músicas para cada momento da vida. As clássicas relaxam e fazem sonhar, musicas de trilhas sonoras são lindas. As românticas para quando se tem um grande amor. 

            Temos, continuou ele – Que aprender tudo que possamos absorver. As músicas de hoje cantadas ou não desde que não tenham segundas intenções em suas letras, são válidas. Mas existem outras e um Escoteiro deve estar preparado para descobrir, ouvir e sonhar com todas elas. Não é o barulho estridente da música que nos toca o coração. Ouvir boa música faz parte de nós escoteiros que vivemos nas montanhas vivenciando o vento o ar e os acampamentos.

          Era assim o Chefe Falcão Maltês. Repetia sempre que o Escoteiro é um cavalheiro, um fidalgo. – Lembram-se do que diziam da mulher de César? Assim somos nós, ele dizia. Não basta mostrar que somos, temos que se portar como tal. – Que tal dar a vez a um amigo? Abrir a porta para ele? Que tal dividir o doce, o farnel, seu cobertor, que tal dividir sua alegria, sua felicidade com quem não a tem? – Chefe Falcão Maltês deixou saudades. Sempre acreditei que todos nós chefes escoteiros devemos ser uma espécie de Chefe Falcão Maltês.

           Alguns dos nossos jovens precisam aprender boas maneiras ele dizia. Sei que é função dos pais. Mas não estamos ali para colaborar? – Um dia ele me disse – Chefe Vado hoje muitos se apegam a entender o jovem como ele é e a justificar. Concordo até certo isto. Mas existem normas, direitos e deveres que são sagrados. Um pai nunca vai dizer ao filho se ele quer ir escola, se ele quer sentar a mesa para as refeições ou se ele pode escolher a hora para dormir. Isto faz parte da família. É sagrado. Temos de ser assim.

             Entendi perfeitamente seu recado. Não é porque os tempos mudaram que as boas maneiras, a educação, o cavalheirismo deve deixar de existir. O respeito aos mais velhos, o respeito ao meio ambiente, o respeito com as pessoas, o direito de um e o de outro nunca devem ser olvidados. Seria bom, seria bom mesmo que existem muitos chefes Falcão Maltês por aí. Acho que tem muitos jovens que se chamam de escoteiros e escoteiras que poderiam ouvir suas palavras e aprender.



               Já faz anos que não vi mais o Chefe Falcão Maltês. Soube que ele mora em uma capital do nordeste. Nem sei se anda escoteirando por lá. Quando me lembro dele penso em um novo Cavaleiro da Távola Redonda. Um Sir Lancelot filho do rei Ban de Benwick e da rainha Elaine. Ele foi o primeiro cavaleiro promessado pelo rei Arthur e nunca falhou em gentileza, cortesia e coragem. O Chefe Falcão Maltês nunca teve uma armadura de aço, mas tinha um coração enorme. Ele repetia sempre sem se cansar que não existe hora e nem lugar para ser educado e ter honra. Que ele seja feliz. Ensinou-me muito. Tem chefes que são e tem outros que dizem ser. Eu até hoje ainda não me situei. Que Deus me ajude a cumprir minha missão, claro se eu tiver uma para cumprir.

Prefácio: - Desculpa se eu prezo o romantismo e o cavalheirismo, mas pra mim isso é fundamental. Afinal eu ainda sou um escoteiro a moda antiga e ser Cortez educado e amigo faz parte de uma época que ser cavalheiro era uma obrigação para todos nós escoteiros.

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