Lendas
Escoteiras.
Camélia.
Olhei para ela e não
acreditei no que via. Era ela disto tinha certeza. Mas estava tão diferente,
mais velha, magra com manchas no rosto e seu sorriso nem era sombras do
passado. Pensei em abordá-la, cumprimentá-la e quem sabe abraçá-la para dizer
que era eu, seu monitor. Quem sabe dar a ela um sorriso e dizer àquela palavra
que ela amava e gostava de dizer: - Oi! Sou eu! Escoteira Camélia das campinas,
não me reconheceu? – Ela nem me olhou passou direto com andar vacilante, como
se estivesse perdida errante caminhando por uma trilha que nunca passou. Porque
isto? Porque o destino desconhece o que pensamos ser? Pois é, me lembrei que um
dia ela me disse: Mano Monitor, o que for teu desejo, assim será tua vontade. O
que for tua vontade, assim serão meus atos. O que forem teus atos, assim será o
teu e o meu destino...
Quando ela chegou na Patrulha
não houve festa, mas todos a receberam com alegria, transformaram uma reunião
comum em uma reunião especial. Ninguém tirava os olhos dela, sabia que era
admirada e mesmo assim não se tornou pedante nem esnobe era a fina flor colhida
em um dia de verão que chegou para nos fazer feliz. Aprendemos a tirar o chapéu
em sua homenagem. Aprendemos a cantar “Amigos para Sempre”, pois ela irradiava
seu interior de maneira inteligente e menos farsesca, pois era como chegar no
fim de uma jornada, beber água da fonte e sentir o frescor de uma tarde,
mormente enluarada. Nunca vi sua mãe seu pai e quer saber? Nem sabia onde
morava. Torcia para chegar os sábados, para revê-la, ouvir sua voz suas
palavras...
Enquanto ela esteve na
patrulha não atrasava, todos querendo ser os primeiros a chegar. Ela com seu sorriso
maroto nos acampamentos dizia: - Escoteirada, deixa que eu me sirva, deixe em
fazer também. Não sou princesa nem rainha e mesmo sabendo que me querem bem,
preciso caminhar para aprender a não cair. Não era um peso morto, mesmo com sua
beleza e formosura. Ficávamos tristonhos por ver suas mãos macias em bolhas de
sangue ao usar o facão e deixar marcas caludas e enormes. E ela? Sorrindo dizia
para nós: Marcas de um trabalho honesto. Disse-me certa vez que queria ser Lis
de Ouro e iria fazer tudo para conseguir. Destino incerto e não sabido. Eu
sabia que da vida mesmo sonhando nem sempre se consegue o que quer. Ela teve
tudo que almejou, mas seu Lis de Ouro ficou perdido em um sonho que não se
realizou. Pensei que aquela conquista nunca a faria feliz.
Um dia não apareceu. Ficamos
surpresos porque não dizer perplexos e eu atônito não sabia o que dizer ou
fazer. Parecia que a patrulha tinha perdido seu rumo seu caminho, sua trilha e
não sabia mais aonde ir ou chegar. Apoite teu barco monitor, se não vai ficar a
deriva no mar traiçoeiro... E eu fiquei. Um mês dois três e ela nunca mais
voltou. Aos poucos a patrulha foi voltando ao normal. Mesmo assim as lembranças
eram doídas demais.
Patrulheiros mercantes a
zumbir suas barracas nos montes errantes em acampamentos tristes que o cantar,
o som de uma viola não existia mais. E eis que cinco anos depois, já Pioneiro,
avante Escoteiro de outras eras a vejo sair de um ambulatório perdido em um
bairro tristonho e ela passa por mim sem ao menos dizer olá! Quando me dei
conta tomei a decisão de abordá-la, ela sumiu nas curvas da Rua dos Perdidos e
não há vi nunca mais...
Menina escoteira onde
escondeste tua formosura e personalidade? Eu quero morar na sua rua, me diga o
número de sua morada, pois você deixou saudades... Mudei de rumo e segui o meu
destino. Cada um tem o seu. Camélia era agora uma sombra do passado. Fui para
casa tentando arrumar as lembranças para que ficassem somente às boas e as
ruins deixei guardadas em um canto da mente. Eu aprendi que quando sentir
saudades de alguém que já partiu e nunca mais voltará, não devemos nos
revoltar. Apenas recordar os bons momentos que ficou preso no passado e fazer
dele uma lembrança gostosa... Apenas para recordar...
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