Lendas
Escoteiras.
Poliana,
saudades...
Um poeta escreveu que o tempo
é muito lento para os que esperam muito rápido para os que tem medo, muito
longo para os que lamentam, muito curto para os que festejam, mas, para os que
amam, o tempo é eterno. Para mim ele é eterno. Eu nunca esqueci Poliana. Nunca.
Sei que o tempo foi longo, que ele não volta, ele
passa rápido demais e você acaba envelhecendo com a culpa de que não viveu.
Acaba mergulhando nas poucas lembranças que tua mente gravou, relembrando ...
Ri e chora. Você não tem mais a flexibilidade, disposição e idade para fazer o
que gostaria. A vida, passa e o tempo é curto. O passado? Já passou, esqueça-o,
esqueça as mágoas, os conflitos, as desavenças ... Perdoe pelo menos a quem
deixou apenas saudades.
Zé Ricardo sorriu para mim e
disse: - Encontrei Poliana. Está internada na Casa de Repouso Joventino Beato.
Levantei de um salto na cadeira onde estava. A procurei por mais de sessenta
anos. Rodei estados, cidades, fui aonde nunca pensei em ir. Sempre uma pista
aqui outra ali e Poliana sumia como o vento forte de uma tempestade de verão.
Porque não a esqueci? Porque não tentei encontrar outra cara metade e dedicar a
ela a minha vida, pois Poliana não acreditou que eu a faria feliz?
A pé fui manquejando rumo à
Casa de Repouso Joventino Beato. Sabia que quem se interna lá não tem volta.
Doenças do pulmão, do coração, de câncer ou mesmo doenças que a gente nem
sequer imagina e pede a Deus para não acontecer com você. Era uma casa de
Repouso solitária. Poucas visitas. Muitos a viam como uma necrópole ou um santo
repouso, que nada mais era um Cemitério onde a morte será o lugar de cada um de
nós quando a hora chegar. Não era longe e eu não tinha escolhas. Perdi tudo que
tinha, vendi os parcos pertences para custear a busca que não me deu nada em
troca.
As lembranças batiam forte.
Não tanto como minhas passadas curtas, trôpegas, um coxo que perdeu tudo na
vida até sua vontade de viver. Parecia um quadro em exposição, um trailer de um
filme que nunca teve fim. Lá estava eu, sorrindo, mochila nos costados, meus
companheiros amados, indo para a aventura de acampar em lugares desconhecidos.
Quando a vi na janela colorida, azul e branco de uma casinha no subúrbio não
sei por que meu coração quase explodiu. – Eu a conheço! De onde? Não sabia. Ela
era meu desencontro de menino que quase esqueceu a aventura que ia acontecer.
Pensei em dizer que não ia, tinha de ficar e desvendar o mistério da Menina
Loira, olhos azuis sorriso pendente nos lábios cor de mel...
Foi a primeira vez que
fizemos um acampamento de duas semanas. Planejado, costurado aqui e ali com
planos impossíveis para sete escoteiros que nada tinham a não ser o sonho de
costurar estradas sem fim, encontrar serras alcantiladas, arvorar uma bandeira
onde ninguém nunca arvorou. É... O tempo passa rápido demais, não há tempo para
ser perdido com escolhas em podemos nos arrepender... O relógio não é
responsável pelas horas, ele só revela o tempo que vai passando rápido
demais...
Quando no alto da serra do
Escarlate, quando na subida do Pico do Coqueiro, quando atravessamos as
corredeiras do Rio Largo, meu pensamento era só para ela. Quando a tempestade
nos pegou de pronto na curva do Boiadeiro, um lamaceiro formado, caindo pelas
tabelas e todos sorrindo meu pensamento era só para ela. Voltamos. Chegamos.
Corri na Rua dos Açores até a casa da janela azul e branco e não a vi. Bati na
porta, uma matrona de cara amarrada gruiu para mim. – Custei para saber que seu
nome era Poliana, morava na cidade de Águas Calientes, passou por ali de carona
se foi e nem disse adeus quando partiu.
Quinze anos. Idade dos sonhos,
da vontade de crescer e correr atrás de um amor que nunca aconteceu. Dois anos
depois, levado por um amigo até Teremim, um pequeno arraial onde havia um
casamento, lá estava eu de caqui e chapelão nos meus dezessete anos contados, e
no salão de baile lá estava ela, linda com seu vestido de chita, cabelos soltos
ao vento, dançando como uma bailadeira, parecendo uma escoteira correndo em um
jogo qualquer. Quase fui ao chão. Aproximei-me, sorriu, um abraço, um chiado
nos pés do rolado a dançar um sonho que nunca pensei existir.
Sem perceber me disse que ia
sair, mas ia voltar. Como a Gata Borralheira nas doze badaladas da meia noite
se foi... E nunca mais voltou. Meu coração em frangalhos a procurou. Ninguém
sabia quem era de onde veio e para onde foi.
Santana, Pedro Cruz, Monlevade, Pratilongas, Barra Longa e Silvério dos
Reis. Corri mundo, rodei estradas, mochileiro não mais sabia o que fazer. Agora
ia eu ver alguém depois de tanto tempo que nem sabia calcular mais. Na curva de
Santana, a casa de repouso surgia entre matos fechados como se ninguém cuidasse
da entrada.
- Minhas passadas diminuíram, a
bengala caiu na terra seca. Meu ar sumiu. Minha cabeça rodou. As forças que
mantinham em pé desapareceram. Cai de bruços no chão. Eu sabia que há um tempo
para partir, mesmo quando não há um lugar certo para ir. Não havia volta.
Poliana ficou nos sonhos que não se concretizou. O Velho Escoteiro que amou
partiu sem poder dizer adeus. Em uma estrela distante ele sabia que iria
encontrar seu grande amor. Que de novo ia voltar e sabia que muitas vidas iriam
passar até que pudessem os dois ter o direito de viver para sempre uma história
de amor...
Nota - - Essa coisa
chamada "história de amor" requer um certo tempo para ser construída,
e as que dão certo são aquelas vividas com paciência, com o espírito aberto, e
geralmente com qualquer um que consiga romper nossas defesas e nos fazer feliz.
Um conto uma historia cujo amor nunca floresceu.
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