sexta-feira, 21 de julho de 2017

Poliana, saudades...


Lendas Escoteiras.
Poliana, saudades...

                 Um poeta escreveu que o tempo é muito lento para os que esperam muito rápido para os que tem medo, muito longo para os que lamentam, muito curto para os que festejam, mas, para os que amam, o tempo é eterno. Para mim ele é eterno. Eu nunca esqueci Poliana. Nunca. Sei que o tempo foi longo, que ele não volta, ele passa rápido demais e você acaba envelhecendo com a culpa de que não viveu. Acaba mergulhando nas poucas lembranças que tua mente gravou, relembrando ... Ri e chora. Você não tem mais a flexibilidade, disposição e idade para fazer o que gostaria. A vida, passa e o tempo é curto. O passado? Já passou, esqueça-o, esqueça as mágoas, os conflitos, as desavenças ... Perdoe pelo menos a quem deixou apenas saudades.

                 Zé Ricardo sorriu para mim e disse: - Encontrei Poliana. Está internada na Casa de Repouso Joventino Beato. Levantei de um salto na cadeira onde estava. A procurei por mais de sessenta anos. Rodei estados, cidades, fui aonde nunca pensei em ir. Sempre uma pista aqui outra ali e Poliana sumia como o vento forte de uma tempestade de verão. Porque não a esqueci? Porque não tentei encontrar outra cara metade e dedicar a ela a minha vida, pois Poliana não acreditou que eu a faria feliz?

                  A pé fui manquejando rumo à Casa de Repouso Joventino Beato. Sabia que quem se interna lá não tem volta. Doenças do pulmão, do coração, de câncer ou mesmo doenças que a gente nem sequer imagina e pede a Deus para não acontecer com você. Era uma casa de Repouso solitária. Poucas visitas. Muitos a viam como uma necrópole ou um santo repouso, que nada mais era um Cemitério onde a morte será o lugar de cada um de nós quando a hora chegar. Não era longe e eu não tinha escolhas. Perdi tudo que tinha, vendi os parcos pertences para custear a busca que não me deu nada em troca.

                  As lembranças batiam forte. Não tanto como minhas passadas curtas, trôpegas, um coxo que perdeu tudo na vida até sua vontade de viver. Parecia um quadro em exposição, um trailer de um filme que nunca teve fim. Lá estava eu, sorrindo, mochila nos costados, meus companheiros amados, indo para a aventura de acampar em lugares desconhecidos. Quando a vi na janela colorida, azul e branco de uma casinha no subúrbio não sei por que meu coração quase explodiu. – Eu a conheço! De onde? Não sabia. Ela era meu desencontro de menino que quase esqueceu a aventura que ia acontecer. Pensei em dizer que não ia, tinha de ficar e desvendar o mistério da Menina Loira, olhos azuis sorriso pendente nos lábios cor de mel...

                  Foi a primeira vez que fizemos um acampamento de duas semanas. Planejado, costurado aqui e ali com planos impossíveis para sete escoteiros que nada tinham a não ser o sonho de costurar estradas sem fim, encontrar serras alcantiladas, arvorar uma bandeira onde ninguém nunca arvorou. É... O tempo passa rápido demais, não há tempo para ser perdido com escolhas em podemos nos arrepender... O relógio não é responsável pelas horas, ele só revela o tempo que vai passando rápido demais...

                  Quando no alto da serra do Escarlate, quando na subida do Pico do Coqueiro, quando atravessamos as corredeiras do Rio Largo, meu pensamento era só para ela. Quando a tempestade nos pegou de pronto na curva do Boiadeiro, um lamaceiro formado, caindo pelas tabelas e todos sorrindo meu pensamento era só para ela. Voltamos. Chegamos. Corri na Rua dos Açores até a casa da janela azul e branco e não a vi. Bati na porta, uma matrona de cara amarrada gruiu para mim. – Custei para saber que seu nome era Poliana, morava na cidade de Águas Calientes, passou por ali de carona se foi e nem disse adeus quando partiu.

                Quinze anos. Idade dos sonhos, da vontade de crescer e correr atrás de um amor que nunca aconteceu. Dois anos depois, levado por um amigo até Teremim, um pequeno arraial onde havia um casamento, lá estava eu de caqui e chapelão nos meus dezessete anos contados, e no salão de baile lá estava ela, linda com seu vestido de chita, cabelos soltos ao vento, dançando como uma bailadeira, parecendo uma escoteira correndo em um jogo qualquer. Quase fui ao chão. Aproximei-me, sorriu, um abraço, um chiado nos pés do rolado a dançar um sonho que nunca pensei existir.

                 Sem perceber me disse que ia sair, mas ia voltar. Como a Gata Borralheira nas doze badaladas da meia noite se foi... E nunca mais voltou. Meu coração em frangalhos a procurou. Ninguém sabia quem era de onde veio e para onde foi.  Santana, Pedro Cruz, Monlevade, Pratilongas, Barra Longa e Silvério dos Reis. Corri mundo, rodei estradas, mochileiro não mais sabia o que fazer. Agora ia eu ver alguém depois de tanto tempo que nem sabia calcular mais. Na curva de Santana, a casa de repouso surgia entre matos fechados como se ninguém cuidasse da entrada.


                - Minhas passadas diminuíram, a bengala caiu na terra seca. Meu ar sumiu. Minha cabeça rodou. As forças que mantinham em pé desapareceram. Cai de bruços no chão. Eu sabia que há um tempo para partir, mesmo quando não há um lugar certo para ir. Não havia volta. Poliana ficou nos sonhos que não se concretizou. O Velho Escoteiro que amou partiu sem poder dizer adeus. Em uma estrela distante ele sabia que iria encontrar seu grande amor. Que de novo ia voltar e sabia que muitas vidas iriam passar até que pudessem os dois ter o direito de viver para sempre uma história de amor...

Nota - - Essa coisa chamada "história de amor" requer um certo tempo para ser construída, e as que dão certo são aquelas vividas com paciência, com o espírito aberto, e geralmente com qualquer um que consiga romper nossas defesas e nos fazer feliz. Um conto uma historia cujo amor nunca floresceu.

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