sexta-feira, 11 de março de 2016

O destemido Chefe Vulcão.


Lendas Escoteiras.
O destemido Chefe Vulcão.

                    Era considerado um Chefe durão. Não perdoava ninguém. Levava tudo na base do grito com sua voz forte e assustadora. Os monitores tremiam ao chegar perto dele. Os pequeninos que vinham da Alcatéia choravam querendo ir embora. Muitos pais tiravam os seus filhos quando viam o que ele fazia. – Isto não são modos, afinal não é assim se faz escotismo; – diziam. Mas o Chefe Vulcão tinha um que diferente. Ninguem soube explicar como muitos dos meninos que ficaram na sua Tropa não queriam sair. Ele nas reuniões de chefes do Grupo ouvia o que não queria dos demais chefes. Sempre o condenavam pelas atitudes que tomava. Também aí neste meio ninguém falou para ele sair. No fundo no fundo gostavam dele. O Distrital não concordava. Por diversas vezes em atividades distritais ou regionais olhava feroz para ele quando se acerbava com a Tropa.

                   Quem não o conhecia matinha distância. Nos cursos que fazia permanecia calado. Um Formador um dia lhe perguntou ao final de uma sessão: - Aqui sempre caladão, mas na sua Tropa adora gritar, por quê? Chefe Vulcão não queria responder. Dizia para si mesmo que quem conversa muito dá bom dia a cavalo. O Formador insistiu: - Olhe Chefe, ficar de boca fechada é melhor. Nunca vi tamanha baboseira que ensinam aqui. E olhe, sabia que o Senhor nem Tropa têm? Com que direito me critica? – O Formador ficou possesso. Falou com o diretor do curso. Exigiu que ele fosse reprovado. Mas por ter se mantido calado, sem criticar nas outras sessões recebeu seu certificado. Ele não tinha amigos. Eram poucos que se aproximavam. Trabalhava em uma Editora e lá diziam que era um primor de funcionário. Até mesmo um livro ele estava escrevendo.

                    Tinha uma namorada. Poucos sabiam. Nunca o viram de mãos dadas ou dando beijinhos aqui e ali. Fabiano era seu monitor mais antigo. Adorava sua maneira de dirigir, mas quando ele gritava com sua patrulha imitando o Chefe, recebia uma reprimenda do Chefe Vulcão. – Fabiano, não faça o que eu faço, faça o que eu mando. Um conselho às avessas. Chefe Trovão nunca foi assim bravo e gritador com seus meninos. Ouve uma época que como assistente foi mais ponderado e mais educado com o trato com os jovens. Mas o desgostava ver a saída dos meninos. Em um ano saíram nove e entraram seis. A Tropa diminuía. Nos acampamentos ninguém respeitava ninguém. Ele calado não dizia nada. Em um acampamento uma patrulha deixou o campo sem dizer nada. Para ele uma afronta. O Chefe na época ficou possesso. - Onde foram? Quem deixou? Cinco horas depois chegaram molhados e sorridentes. – Chefe nós fomos nadar na Lagoa dos Peixes!

                   Chefe Vulcão ficou uma fera. O Chefe da Tropa educadamente disse para não fazerem mais aquilo. – Só isto? Ele perguntou ao Chefe. – Só e basta, eles não vão repetir. Respondeu. – E se alguém tivesse se afogado? Como o senhor iria levar o filho morto no colo e entregar aos pais? O Chefe não disse mais nada. Seis meses depois pediu demissão para casar e nunca mais voltou. Contra a vontade o Diretor Técnico o nomeou Chefe da Tropa. Não se sabe como ela deu uma guinada de 90 graus. Poucos saíram. A Tropa cresceu. Os meninos se tornaram outros. Uma disciplina invejável. Disciplina a troco de gritos? Pensavam os outros chefes. Isto não está certo, ele não pode ficar em nosso grupo de maneira nenhuma. Fofocas corriam de boca em boca no Grupo Escoteiro.

                     Interessante que o Chefe Vulcão não se incomodava com as fofocas. Quando na corte de honra algum monitor comentava ele nada dizia ou então respondia: Porque devo me preocupar? Palavras são palavras e o vento as leva para nunca mais voltar. Atos permanecem para sempre. Sinceramente eu não concordava com os gritos do Chefe Vulcão. Ele não berrava não, só chamava a atenção com duas ou três palavras, mas em uma altura que doía nos tímpanos. Interessante que em casos específicos que ele não estava presente a Tropa se reunia, fazia seu programa e tudo andava bem. Eram educados uns com os outros, respeitavam ordens dos monitores, sabiam conversar e trocar ideias. Que eu saiba era a única Tropa na região que acampava sozinha. Um assombro para os outros grupos. Numa reunião do distrito um Chefe mais Velho achou um absurdo. – Hora, vejam bem, com a criminalidade que temos e a Tropa do Vulcão que sai muita fumaça acampa sozinha?

                        Ele calado. Outro implicava e ele nada dizia. – Quando Don Perilone, um diretor técnico famoso pelos seus quatro tacos entrou na conversa ele falou baixinho para só os que estavam ao seu lado ouvir. – Onde estão seus escoteiros que vocês sabem criticar os outros, mas nada deixaram de valor ao escotismo na comunidade? – Todos olharam para ele. Vontade de trucidar, mas o Chefe tinha razão. Agora gritar? – Topogijo um chefe da região resolveu intervir – Pelo que eu o saiba não fica gritando o tempo todo. – Não? Perguntaram todos. E as reclamações que chegaram aqui? Nesta hora educadamente Chefe Vulcão foi até o distrital, cumprimentou com a esquerda e se retirou. Quem ficou se sentiu ferido em seus brios por um Chefe que tinha um rompante de sargentão do exercito.

                          Os tempos passaram. Quantos meninos passaram pela Tropa do Chefe Vulcão e nunca o esqueceram. Bonifácio um novo presidente de uma grande multinacional foi um deles. – Convidado a fazer uma palestra sobre métodos e programas ele fugiu do seu tema e começou a contar a historia do Chefe Vulcão. Alguns souberam dele outros não. – Um grande Chefe meus amigos, Poucos sabiam que ele tinha na garganta uma espécie de verruga que o impedia de falar mais baixo, só conseguia gritando. Quem sabia entendia seus gritos, mas quem viveu ao lado dele sabia também que foi um mestre que sabia ensinar e dar exemplo. Não sei por que ele não comentou isto com os demais chefes. Quem sabe era reservado e preso em si mesmo na sua maneira de agir.


                      Não tenho o dom da sabedoria. Julgar o Chefe Vulcão nunca. Afinal pelo que eu saiba deu exemplo de honradez palavra e caráter. Seus meninos que se tornaram homens nunca o esqueceram. Não digo para todos fazerem o mesmo, não senhor. Educação faz parte da sociabilidade entre nós. B-P dizia que os resultados aplaudem os métodos. Não sei se referia ao Chefe Vulcão. Pelo sim pelo não, sei que hoje ele ainda vivo trabalha em um asilo de idosos sem nada cobrar. Será que ainda dá seus gritos?       

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