quarta-feira, 30 de março de 2016

Os irmãos de Mowgly. A saga de Kaa, Baloo, Bagueera e o Lobo Gris.


Os irmãos de Mowgly.
A saga de Kaa, Baloo, Bagueera e o Lobo Gris.

                          Aconteceu há muito tempo. O povo de Seeonee era chamado de Povo Livre. Eles tinham organização, leis e uma grande fraternidade. Sabiam se identificar uns com os outros e se necessário projetar-se neles. Estavam prontos a sacrificar sua própria vida por todos os irmãos da Alcatéia. Lobo Gris era um lobo ativo, prestativo que fazia questão de se mostrar o mais forte sem ser superior aos outros lobos. Não aceitava quem quisesse superá-lo em destreza e na caça ao gamo. Exercia na Alcatéia seu direito de voto, e fazia questão da disciplina e obediência principalmente em proveito coletivo. Quando naquela tarde de sol poente aquela coisinha de pele lisa apareceu ele se assustou. Nunca imaginou que estava chegando ao Povo livre de Seeonee um novo membro que ia ser seu amigo para sempre. Preparou-se para uma luta de morte quando Chery-Khan rompeu a entrada da Gruta e exigiu que os lobos entregassem a ele aquela coisinha miúda.

                        Foi ali que passou a amar o menino, que agora tão franzino não sabia se defender. Foi ali que pela primeira vez disse a ele: - Pele lisa, filhote de homem, um dia tu serás o Senhor da Jângal, agora filho de Raksha, será meu irmão de caverna. Saiba que seu caminho será sempre o meu caminho. A tua caça será a minha caça e se houver uma luta de morte será a minha luta também! Os novos caminhos para Mowgly estavam agora junto aos dele e de todos os seus irmãos lobos. Aceitou Balu o urso gordo como amigo de Mowgly, aceitou Bagheera a Pantera Negra como defensora do menino da selva. Nunca pensou que Mowgly seria aquele que poria para correr o Tigre Manco, comedor de gente e que todos odiavam. Shery Khan era um tigre enorme e robusto e mesmo com toda sua força nunca atacava pela frente, sempre esperando o melhor momento para atacar pelas costas dar seu bote mortal.  Nunca viu falar de Messua, a verdadeira mãe de Mowgly até quando ele cresceu e nos Tempos das Falas Novas sumiu da Jângal por muitas luas.

                   Nunca esqueceu quando Tabaqui atrás de restos de comida satisfazia-se com restos deixados por outros animais. Era por isto que o chamavam de Lambe-Pratos. Pai lobo nunca o deixou entrar na caverna. Dava-lhe as sobras de ossos em um canto da fora da caverna. Naquele dia Tabaqui contou que Shere Khan o tigre manco caçava nestas paragens. Pai lobo ao saber ficou indignado, pois de acordo com a lei da selva ele não podia caçar ali. Se o fizesse teria antes que avisar.  Shery Khan agora uivava de dor porque caiu nas brasas de uma fogueira e saiu rosnando furioso. Foi quando avistou o filhote de homem, uma criaturinha humana nuzinho em pelo. Acostumado a lidar com seus filhotes o levou junto a Mãe Loba, Raksha. Esta acolheu o menino com todo carinho e o aconchegou-se para aquecer. Foi neste dia que Shery Khan exigiu a Alcatéia sua caça. – Ela me pertence – Uivou alto. A entrada da caverna era pequena e o Tigre Manco não pode entrar. Foi naquele dia que o Lobo Gris se orgulho da Alcatéia ao ouvir a voz firme do Pai lobo que dizia ao Tigre: - Somos um povo livre, não recebemos ordens de ninguém além do seu Chefe. O filhote de homem procurou abrigo aqui e aqui vai ficar seguro.

                   Amou Raksha que completou: - O filhote de homem é nosso. Viverá e correrá pelos campos e caçará junto com nossos filhos. Vai-te embora ó Lungri (era assim que ela o chamava por ter nascido manco de um pata). Pai Lobo e Raksha decidiram que Mowgly, que na linguagem dos lobos significa Pequena Rã, iria ser criado junto com todos os filhos da Alcatéia dos lobos. Todos conheciam a Lei da Jângal que dizia que os filhotes desmamados são levados ao Conselho, na noite de lua cheia e lá são apresentados na Roca de Conselho e a toda a Alcatéia. Isto feito começam a viver livres para caçar onde quiserem. Lobo Gris nunca esqueceu aquela noite de lua cheia, quando o pai lobo e a mãe loba levaram Mowgly para a Roca do Conselho. Em cima de uma pedra alta Akelá o Velho lobo solitário e respeitado por sua força e astúcia apresentou um a um os filhotes e dizia: - Vós conheceis a Lei! Olhai bem o lobo! Olhai bem! E quando chegou a vez de Mowgly Pai Lobo o empurrou para dentro do circulo e antes de falar novamente Shery Khan gritou alto na porta da caverna: - Este filhote de homem é meu, o que tem o Povo livre com este filhote de homem?

                     Um pequeno tumulto se formou. Sabia-se que em caso de dúvida manda a lei que para alguém ter o direito de ser admitido na Alcatéia tem de ter dois votos ao seu favor. – Quem se apresenta para defender o filhote de homem? Perguntou Akelá. Foi então que Baloo usando seu direito na Palavra do Conselho disse: - Sou a favor do filhote de homem, não vejo mal nenhum ele permanecer entre nós. Faltava mais um voto e eis que surge Bagheera a Pantera Negra. Todos tinham por ela enorme respeito, pois conheciam sua força e astucia. – Ela disse – Akelá, direito eu não tenho de falar neste Conselho, mas a Lei da Jângal diz que na duvida quanto à vida de um filhote, ele pode ser comprado por um certo preço. Eu ofereço esse preço pela vida do filhote de Homem! É uma vergonha matar um indefeso filhote de homem, que mais tarde pode ser de grande utilidade para todos nós! – Completou Baloo. Bagheera continuou: - Ofereço pela sua vida um touro gordo que acabei de matar a uma milha daqui. Aceitam minha proposta? Um clamor enorme na Alcatéia. Shery Khan urrando de raiva e despeito saiu rosnando: - Urra, urra! Urra que o tempo virá que esta coisinha pequena te fará urrar noutro tom!

                       Os tempos passaram. Mowgly cresceu. Lobo Gris sempre ao seu lado.  Nunca esqueceu os Tempos das Falas Novas, na Embriaguez da Primavera quando Mowgly sentindo-se só partiu sem rumo pela floresta da Jangal. O Lobo Gris foi o único que foi atrás, pois os demais aproveitavam a primavera para correr e cantar e uivar pelos montes e campos. Nunca esqueceu quando Mowgly quase chorando dizia: - Porque não morri nas garras dos dholes? Gemeu Mowgly. Minha força esvaiu-se e não foi veneno. Dia e noite ouço um passo duplo no meu caminho. Quando volto à cabeça sinto que alguém se esconde atrás de mim. Procuro por toda parte atrás dos troncos, atrás das pedras, e não encontro ninguém. Chamo e não tenho resposta, mas sinto que alguém me ouve e se guarda de responder. Se me deito, não consigo descanso. Corri a corrida da primavera e não sosseguei. Banho-me e não me refresco. O caçar enfada-me. A flor vermelha está a ferver em meu sangue. Meus ossos viraram água. Não sei o que...

                     E assim a história vai chegando ao fim. - Para que falar? Observou Baloo. Akelá disse que Mowgly levaria Mowgly para a alcatéia dos homens outra vez. Também eu o disse, mas que ouve Baloo? Bagheera, onde está Bagheera? Esta noite se foi? Ela também sabe disso, é da lei. - Quando nos encontramos nas Tocas Frias, homenzinho, eu já o sabia acrescentou Kaa. Homem vai para homens, embora a Jângal não o expulse. - A Jângal não me expulsa, então? Sussurrou Mowgly.

- O Lobo Gris e seus três irmãos uivaram furiosamente: - Enquanto vivermos ninguém, ninguém ousará...

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