segunda-feira, 21 de março de 2016

O preço de um sonho.


Lendas Escoteiras
O preço de um sonho.

                   Qual o preço de um sonho? Afinal sonhar tem preço fixo ou paga-se em suaves prestações? Dizem os poetas que sonho não tem preço, mas realizar tem. Depende de cada sonho, têm os sonhos com valores simples, outros irrealizáveis dependendo do que foi escolhido para um pobre mortal que sonhou por sonhar... Ah Bianca! Quantos sonhos tinha aquela menina? Sua mãe muitas vezes sorria e dizia – Filha põe os pés nos chão. Você sonha demais. Quantas vezes na sala de aula ela se assustava com a Madre Genoveva a gritar em seu ouvido: - Acorde menina pare de sonhar. Você veio aqui para estudar. Fazer o que? Se ela tinha tudo sabia que não tinha nada. O pai um homem importante, rico, quase não ficava em casa. Sua mãe taciturna, a proibia de tudo e não lhe negava nada desde que com ela presente. No seu quarto não sabia quantos presentes recebeu. Era pensar e alguém comprava para ela.

                    Ela sabia que a inveja é um pecado capital. Nas aulas de religião o Padre Enzo ensinou. Mas ela invejava e muito Giovana, Lena e tantas outras. Pareciam livres, pareciam pássaros soltos no ar a voar em qualquer direção escolhida. Ela? Ela não. Um motorista ia buscar e trazer no colégio. Ir ao cinema com sua mãe e mais ninguém. Um dia ouviu o pai dizer que ela podia ser raptada. – Fica de olho mulher. É só ela que temos e não sei se aguentarei viver sem ela. Quando ouviu isto pensou por vários dias. Porque ele não fica comigo, não passeia, não conversa e só uma vez me deu um beijo no rosto no aniversário dos onze anos? Ainda bem que ela podia sonhar. Sonhava acordada em sair por aí, a passear, a ver rapazes e moças de sua idade na praça, em pequenos bailes que ela ouvia algumas amigas contar. Em casa se trancava no quarto. Chorava muito, mas depois dormia e então era hora de sonhar.

                    Um dia fez o que não podia. Um sábado não viu ninguém. Saiu pela porta e nem o segurança estava. Sua mãe também não. Vestindo uma blusa rosa, um jeans velho e sem agasalho resolveu dar a volta no mundo. Iria ser uma nova aventureira, porque não? Pela primeira vez se sentiu forte, valente, corajosa e agora sim era dona de si mesma. Andou devagar, virou várias ruas. Parou em sinais esperando o verde. Bom demais! Vibrava! Isto sim é que é vida pensou. Alguém no seu ombro pós a mão. – Olhou devagar. Isto nunca aconteceu – Menina! Eu tenho uma rosa, formosa, pode pagar qualquer tostão. É para minha patrulha, pois vamos todas acampar!  Bianca ficou surpresa. Na algibeira tinha vinte reais. Deu a menina sorridente, de uniforme com um lenço azul da cor do mar. A menina sorriu. – Obrigada, não é muito? Não preciso respondeu Bianca. Posso conhecer sua patrulha?

                    Lá foram elas de mãos dadas pela Rua das Flores e em uma casinha pequenina outras meninas como ela brincavam de esconde, esconde. – Quer participar? Foi demais. Nunca Bianca teve tal liberdade. Foram horas de felicidade. Sim, o tempo, ele separa a alegria do compromisso e não nos dá a liberdade de brincar. Quando sonhamos queremos o sonhado para ontem de preferência, mas o tempo da vida é muitas vezes completamente diferente do nosso tempo interno e é nesta hora que outros fatores começam a minar a nossa confiança no nosso poder de realização dos nossos sonhos. Bianca se esqueceu de tudo. Tudo estava bom demais. A tarde foi chegando mansamente. E eis que de repente dezenas de radiopatrulhas cercaram a casinha das meninas que espantadas não entendiam por que. O seu pai chegou apressado, sua mãe com expressão severa. – O que fazes? Não avisas? Nos deixa pensando o pior?

                    Bianca queria chorar, mas sua felicidade de horas foi tanta que resolveu sorrir. Se o tempo foi curto sua alegria foi demais. Agora tinha novos motivos para sonhar. Dizem que começamos a criar macaquinhos na nossa cabeça quando resolvemos sonhar. Sonhos que um dia poderão ser verdade, mas será que vai dar certo mesmo? Será que quando eu alcançar isso vou me sentir feliz novamente? Pensou em pedir ao seu pai, a sua mãe, mas sabia que não iriam deixar. Pense bem, meninas de ninguém, você lá de família nobre no meio de gente pobre. Bianca pensava. Será que vale a pena tanto esforço? E assim começava o seu processo de autossabotagem de um sonho que não ia realizar. Se observarmos a natureza, existe nela tempo para tudo, temos as quatro estações, hora de esperar – inverno, hora de recriar - primavera, hora de deixar ir - outono, hora de se expor – verão.

                        A natureza é sábia, devemos usar desta mesma sabedoria, no nosso tempo para realizar o nosso sonho, o importante é você reconhecer se é isso mesmo que você quer isso mesmo que você sonhou, com todas as cores e detalhes. Feito isso, se entregue ao tempo da natureza, ela sabe o melhor momento para ser e será o melhor tempo para você também. Bianca naquela noite foi franca na sala de estar: - Ou me deixem participar ou nunca mais serei ninguém. Amo vocês, mas quero ser amada também, de outra maneira não do que estão a fazer dos meus sentimentos. Foi então que sua vida mudou. Bianca ficou amiga de Lena, que era amiga de Erico, que amava Giovana, que respeitava Enzo que era irmão de Lorenzo. Agora tinha uma patrulha para brincar, sorrir cantar e o melhor ir para as paragens do campo, da vida ao ar livre de poder voar como pássaros.


                         Seja quem você é e não quem o mundo deseja que você seja. Lute pelo que acredita, faça dos seus sonhos realidade. Bianca se tornou a menina mais feliz do mundo. Um cantil na algibeira, um lenço preso no arganéu. Um cinto de couro marrom, saia pelos campos como se fosse borboletas no ar. Não há mal que perdure quando nossos sonhos e desejos mora bem dentro da gente. Bianca agora escoteira aprendeu a sorrir novamente. Chega um tempo na vida que a gente aprende que ninguém nos decepciona, nós é que colocamos expectativa demais sobre o que pensamos. Cada um tem seu destino e a vida está aí para nos oferecer aquilo de bom que ela tem para dar!

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