quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

Lendas Escoteiras. Consciência negra. A vida como ela é. Prólogo: - Eu tenho um sonho. O sonho de ver meus filhos julgados por sua personalidade, não pela cor de sua pele. Se soubesse que o mundo se desintegraria amanhã, ainda assim plantaria a minha macieira. O que me assusta não é a violência de poucos, mas a omissão de muitos. Temos aprendido a voar como os pássaros, a nadar como os peixes, mas não aprendemos a sensível arte de viver como irmãos. Martin Luther King. Amo o escotismo. Desde o primeiro dia que meu pai me levou para ser escoteiro. Devia ter sido lobinho, mas não fui. Não houve senão, desdém ou mesmo indiferença por parte dos escoteiros da minha Patrulha. Receberam-me com fraternidade e amizade. Cresci, fui para os seniores. Lá encontrei as meninas e algumas franziam o nariz quando havia um jogo, alguma tarefa com minha companhia. Já rapazote sabia do preconceito a minha cor. Era negro, e tinha orgulho em ser assim. Sabia dos preconceitos em relação à cor, a homofobia, o preconceito social, o machismo entre outros. Para mim sempre acreditei que no Escotismo somos todos irmãos. Quando fui para a chefia notei certo distanciamento por parte de alguns chefes. Era sempre bem recebido pelos jovens, mas alguns voluntários se julgavam melhores que os outros. Vi que para ser bem recebido tinha que me mostrar subserviente, servil e sempre com um sorriso nos lábios. Meu amor ao escotismo não me deixava desistir. Adorava minha tropa, amava meus monitores e daria minha vida aos escoteiros se fosse preciso. Honrava minha lei, minha promessa coisa que muitos que me olhavam de esguelha não faziam. Não era um discursante, um participante ativo no Distrito e na região. Fiz meu registro normalmente. Lutei e muito para “tirar” minha insígnia de Madeira. Em meu próprio grupo havia as turminhas dos vamos juntos e outra que me aceitava não sei se a contragosto. Manuela era mãe de Petra, uma Lobinha linda, loira e com cara de boneca. Ninguém aceitou a colaborar em um acantonamento e me ofereci. Manuela sorriu, seja bem vindo disse. Não me misturava com os lobos, poderiam achar que eu era um pedófilo e por ser negro poderia fazer maldades... Logo eu um Escoteiro de Coração. Na penúltima noite, após uma lamparada que eles chamavam de Flor Vermelha, fiquei eu e Manuela sentados em bancos de madeira e ela loquaz me contou sua vida. Ficamos amigos, ela divorciada e eu um solteirão, apesar de que quase casei com Carola, negra como eu mas preferiu seguir outros rumos. O disse me disse rodopiou na nata dos chefes do Grupo. Se alguns já me olhavam de esguelha, agora nem olhavam mais. Algumas mães tiraram lobinhos da alcateia. Manuela não desistiu. Conversamos muito sobre nosso relacionamento. Afinal ela loira, linda ainda na flor da idade dos seus 28 anos e eu um negro não poderia haver relacionamento no pensar dos chefes e alguns pais do Grupo. Um dia, em uma noite de luar, num acantonamento, os lobinhos dormindo a beijei e a pedi em casamento. – Aceita ser minha mulher? Sorriu e ali fizemos juras de amor. Timóteo o Chefe do Grupo me chamou em particular. Deu-me conselhos, disse que pisava em ovos e que muitos iriam tirar seus filhos do grupo. Que eu devia pensar o que iria fazer. Um absurdo! Sempre fui cordado, não discutia, não me metia a sabe tudo, pois amava minha tropa e era ela o meu ideal. Não discuti. Não comprei uma briga que não levaria a nada. Falei com Manuela, expliquei, disse o meu pensamento a respeito de tudo. Ela concordou. Amo você, disse. Se eles não nos quiserem sairemos. Dirce irá sentir muita falta, pois ela ama os lobinhos. Casamos, casamento simples, poucos chefes presentes apesar dos convites. Um mês depois o Chefe do Grupo me disse que tinha sido exonerado do meu cargo. Havia outro pretendente. Um baque surdo no meu coração. Manuela também recebeu o aviso de exoneração. Poderia ter insistido, brigado pelos meus direitos que conhecia muito bem, apesar de ser negro era estudante de Direito. Valeria a pena? A revolta, a insistência daria bons frutos? Saímos do grupo. Seis meses depois fundamos um grupo não pertencente à Associação Nacional. Pensei em devolver minha Insígnia, meus distintivos, mas não devolvi. Eu sabia que havia muitos lideres e chefes que não pensavam como aqueles do meu grupo, do meu distrito. Mas ali não era mais o meu lugar. Na paróquia onde atuamos o Padre Noel é um grande amigo. Está sempre presente, dando sua colaboração espontaneamente. Temos uma alcateia e uma tropa escoteira. Muitos da antiga tropa vieram me pedir para ser um de nós. Com seus pais autorizando foram aceitos. Eu Manuela e Dirce vivemos maravilhosamente a vida de casado. Manuela espera um filho meu, será minha suprema felicidade. Escotismo para mim é paz, amor, fraternidade e irmandade e nada mais. Onde isso não impera posso dizer que ali não tem escotismo. Às vezes me pergunto se o escotismo não é preconceituoso. Quantos chefes negros existem comparativamente com os brancos? Quantos receberam suas insígnia e condecorações comparativamente com os brancos? Vejo entre os meninos um numero bem menor de negros, seria este o escotismo verdadeiro onde a Lei e a Promessa são a base fundamental para a formação do caráter?



Lendas Escoteiras.
Consciência negra. A vida como ela é.

Prólogo: - Eu tenho um sonho. O sonho de ver meus filhos julgados por sua personalidade, não pela cor de sua pele. Se soubesse que o mundo se desintegraria amanhã, ainda assim plantaria a minha macieira. O que me assusta não é a violência de poucos, mas a omissão de muitos. Temos aprendido a voar como os pássaros, a nadar como os peixes, mas não aprendemos a sensível arte de viver como irmãos. Martin Luther King.

                              Amo o escotismo. Desde o primeiro dia que meu pai me levou para ser escoteiro. Devia ter sido lobinho, mas não fui. Não houve senão, desdém ou mesmo indiferença por parte dos escoteiros da minha Patrulha. Receberam-me com fraternidade e amizade. Cresci, fui para os seniores. Lá encontrei as meninas e algumas franziam o nariz quando havia um jogo, alguma tarefa com minha companhia. Já rapazote sabia do preconceito a minha cor. Era negro, e tinha orgulho em ser assim. 

                              Sabia dos preconceitos em relação à cor, a homofobia, o preconceito social, o machismo entre outros. Para mim sempre acreditei que no Escotismo somos todos irmãos. Quando fui para a chefia notei certo distanciamento por parte de alguns chefes. Era sempre bem recebido pelos jovens, mas alguns voluntários se julgavam melhores que os outros. Vi que para ser bem recebido tinha que me mostrar subserviente, servil e sempre com um sorriso nos lábios.

                              Meu amor ao escotismo não me deixava desistir. Adorava minha tropa, amava meus monitores e daria minha vida aos escoteiros se fosse preciso. Honrava minha lei, minha promessa coisa que muitos que me olhavam de esguelha não faziam. Não era um discursante, um participante ativo no Distrito e na região. Fiz meu registro normalmente. Lutei e muito para              “tirar” minha insígnia de Madeira. Em meu próprio grupo havia as turminhas dos vamos juntos e outra que me aceitava não sei se a contragosto.

                              Manuela era mãe de Petra, uma Lobinha linda, loira e com cara de boneca. Ninguém aceitou a colaborar em um acantonamento e me ofereci. Manuela sorriu, seja bem vindo disse. Não me misturava com os lobos, poderiam achar que eu era um pedófilo e por ser negro poderia fazer maldades... Logo eu um Escoteiro de Coração. Na penúltima noite, após uma lamparada que eles chamavam de Flor Vermelha, fiquei eu e Manuela sentados em bancos de madeira e ela loquaz me contou sua vida.

                              Ficamos amigos, ela divorciada e eu um solteirão, apesar de que quase casei com Carola, negra como eu mas preferiu seguir outros rumos. O disse me disse rodopiou na nata dos chefes do Grupo. Se alguns já me olhavam de esguelha, agora nem olhavam mais. Algumas mães tiraram lobinhos da alcateia. Manuela não desistiu. Conversamos muito sobre nosso relacionamento. Afinal ela loira, linda ainda na flor da idade dos seus 28 anos e eu um negro não poderia haver relacionamento no pensar dos chefes e alguns pais do Grupo.

                              Um dia, em uma noite de luar, num acantonamento, os lobinhos dormindo a beijei e a pedi em casamento. – Aceita ser minha mulher? Sorriu e ali fizemos juras de amor. Timóteo o Chefe do Grupo me chamou em particular. Deu-me conselhos, disse que pisava em ovos e que muitos iriam tirar seus filhos do grupo. Que eu devia pensar o que iria fazer. Um absurdo! Sempre fui cordado, não discutia, não me metia a sabe tudo, pois amava minha tropa e era ela o meu ideal.

                             Não discuti. Não comprei uma briga que não levaria a nada. Falei com Manuela, expliquei, disse o meu pensamento a respeito de tudo. Ela concordou. Amo você, disse. Se eles não nos quiserem sairemos. Dirce irá sentir muita falta, pois ela ama os lobinhos. Casamos, casamento simples, poucos chefes presentes apesar dos convites. Um mês depois o Chefe do Grupo me disse que tinha sido exonerado do meu cargo. Havia outro pretendente. Um baque surdo no meu coração. Manuela também recebeu o aviso de exoneração.  

                              Poderia ter insistido, brigado pelos meus direitos que conhecia muito bem, apesar de ser negro era estudante de Direito. Valeria a pena? A revolta, a insistência daria bons frutos? Saímos do grupo. Seis meses depois fundamos um grupo não pertencente à Associação Nacional. Pensei em devolver minha Insígnia, meus distintivos, mas não devolvi. Eu sabia que havia muitos lideres e chefes que não pensavam como aqueles do meu grupo, do meu distrito. Mas ali não era mais o meu lugar.

                             Na paróquia onde atuamos o Padre Noel é um grande amigo. Está sempre presente, dando sua colaboração espontaneamente. Temos uma alcateia e uma tropa escoteira. Muitos da antiga tropa vieram me pedir para ser um de nós. Com seus pais autorizando foram aceitos. Eu Manuela e Dirce vivemos maravilhosamente a vida de casado. Manuela espera um filho meu, será minha suprema felicidade. Escotismo para mim é paz, amor, fraternidade e irmandade e nada mais. Onde isso não impera posso dizer que ali não tem escotismo.

                            Às vezes me pergunto se o escotismo não é preconceituoso. Quantos chefes negros existem comparativamente com os brancos? Quantos receberam suas insígnia e condecorações comparativamente com os brancos? Vejo entre os meninos um numero bem menor de negros, seria este o escotismo verdadeiro onde a Lei e a Promessa são a base fundamental para a formação do caráter?     

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Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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