domingo, 11 de agosto de 2019

Lendas da Jângal. OS sinos da Catedral.




Lendas da Jângal.
OS sinos da Catedral.  

                      Faz tempo... Muito tempo. Uma cidade no interior do sertão de Pernambuco. Nem sei como fui parar ali. Não foi pela minha empresa, acho que foi um golpe do destino, pois deveria ter ido a Sertânia e fui parar em Terra Santa. Pequena, menos de dez mil almas. Nem hotel tinha. Fiquei na Pensão das Esmeraldas de Dona Eufrásia. Para dizer a verdade a melhor cozinha que tinha conhecido. Almoço ou jantar era um manjar dos deuses. Acho que foi por causa dela e de Laninha que fiquei por cinco dias em uma cidade onde não tinha nada. Não tinha cinema, TV e as luzes eram desligadas a meia noite. Se Judas perdeu as botas em uma cidade acredito que foi lá que aconteceu. Na primeira noite durante o jantar alguns hóspedes conversavam sobre a lenda dos Sinos. Como um bom lobinho de orelha em pé prestei atenção. Estavam na cidade para ver os sinos da Catedral tocar. Diziam que a musica era divina. No dia seguinte seria noite de lua cheia e a tradição havia de acontecer. Vi que todos estavam ali atraídos pela historia da menina santa. A fama dos sinos ganhou mundo. Dormi pensando na história e no dia seguinte a cidade já recebia uma chusma de turistas.

                  Não sou cético, mas gosto de lendas e histórias e sempre tive a sorte de encontrar diversas. Dona Eufrásia me contou o que aconteceu. Desde que a Lobinha Laninha morreu há tempos os sinos tocavam a meia noite nas noites de lua cheia. – Lobinha? Perguntei. – Sim ela respondeu. Aqui tínhamos um Grupo Escoteiro. Melchior um rapaz dos seus vinte e oito anos um dia chegou à cidade e comprou a Farmácia do Beraldo. Junto estava a filha de quatro anos. Sozinho sem a esposa dizia ser viúvo. Nos três primeiros anos tornou-se conhecido e bem quisto por todos. Gostava de contar “causos” de quando foi Escoteiro. Melanino o Prefeito o incentivou a organizar um Grupo na cidade. A Prefeitura iria ajudar. Melchior animou-se. Pediu ao padre que convidasse pais interessados a colaborarem. No dia marcado muitos pais e mães. O primeiro passo foi dado. Quatro meses depois os primeiros escoteiros e os primeiros lobinhos.

                  O Grupo Escoteiro da Cidade foi um tremendo sucesso. Votaram para dar o nome do fundador da cidade Coronel Tibúrcio Belarmino. Melchior era o Chefe do Grupo. A diretoria ativa. Mariazinha a professora de português assumiu como akelá e com mais duas assistentes dirigia duas alcateias lindas. Os lobinhos amavam sua Chefe. Claro que Laninha foi uma das primeiras inscritas. Durante dois anos o Grupo Escoteiro fez história. Chegou a ter em suas fileiras duzentos participantes. Um dia alguém veio correndo dizer que Laninha caíra da torre da catedral. Nas últimas disse que tinha ido ver os sinos tocarem a Ave Maria. Eles estragados não tocavam há mais de dois anos. Ela na sua inocência segurou na corda perdeu o equilíbrio e caiu de uma altura de trinta e seis metros. No seu funeral a cidade em peso presente. Um Sênior tocou no seu clarim o toque de silêncio. Todos choravam. A Akelá Mariazinha estava inconformada.  Laninha era uma menina muito amada por todos.

                  O Grupo Escoteiro Coronel Torres Belarmino sofreu um choque com o acontecido. Muitos saindo. Chefes desistindo. Um ano depois o grupo fechou. Mais um ano e em uma noite de lua cheia para espanto da população os sinos começaram a bater e a tocar. Tocava uma musica suave, mas ninguém sabia o que era. Resolvi ficar ver e ouvir os sinos. Pedi autorização ao Padre Morato para subir até a torre e ver o que acontecia. Onze horas da noite subi devagar as escadas até o topo. Cheguei e sentei em um banquinho. Acendi meu cachimbo Irlandês e deglutindo um “blend” meu preferido. Esperei. Meia noite em ponto vi um vulto chegando em uma fumaça ou uma nuvem branca. Era uma menina vestida com seu uniforme de lobinha. Linda. Sorria. Nem olhou para mim. Não me deu uma palavra. Levantou os dois bracinhos e como se fosse uma grande Maestra os sinos começaram a tocar. Prestei atenção... Reconheci... Tocava a sonata de Schubert, (Franz Peter Schubert) “Sinfonia Incompleta”. Maravilhoso! Estava embasbacado. Era difícil de acreditar.

                A menina sorria. Um sorriso maravilhoso! Tentei falar com ela. Nada. Ela estava como se vivesse o seu momento único para aquela musica e eu francamente não entedia o seu amor por ela. Alí, no sertão de Pernambuco quem poderia gostar de Schubert? Cinco minutos depois a musica terminou. Agora era outra. Também conhecida. Agora tocava bem baixinho nada mais nada menos que a “Canção da Promessa”. Fechei os olhos e vi a força daquela orquestra sinfônica. Ela regia como se tivesse feito aquilo a vida inteira. Meu Deus! Qual o mistério? Nunca soube. Tentei conversar com o Padre Morato. Ele nada. Era um incrédulo. Tentei falar com o Chefe Melchior. Ele não acreditou em mim. Muitos dos turistas nem notaram a beleza da musica tocada. Estavam extasiados com o milagre.  

             Dona Eufrásia sorriu. – Olhe, vou lhe contar. Ninguém sabe e alguns não querem saber. Não querem acabar com este encantamento. A cidade todos os meses depende dos turistas que chegam. Chefe Melchior era violinista da Orquestra Sinfônica de Pernambuco. Quando sua esposa morreu vitima de Poliomielite ele desesperado veio parar aqui. De farmácia não entende patavina. Nunca mais pegou em um violino. Sua filha o admirava quando ele tocava. Quem sabe ela agora procura nos céu uma maneira de ouvir o pai? Coisas misteriosas e uma charada impossível de ser desvendadas. Enigmas que ninguém quer saber. Preferem o impossível.  Não sou bom nisto. Alí em Terra Santa eu tinha certeza que ninguém entenderia. Dona Eufrásia me olhou com um olhar “treteiro”. Meu amigo há mais mistérios entre o céu e a terra, do que toda a nossa vã filosofia. Puxa! Dona Eufrásia uma velhinha dos seus setenta e tantos anos, cabelos brancos é também versada em William Shakespeare?  

  

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