quinta-feira, 30 de abril de 2020

Lendas Escoteiras. O sonho de Bob Longo.




Lendas Escoteiras.
O sonho de Bob Longo.

... - “Jamais humilhe ou deprecie alguém de seu Grupo ou sua Tropa perante os demais. Você pode demonstrar força e poder, mas aos olhos deles será visto com menosprezo. O génio de um bom Chefe é deixar atrás de si uma situação em que o bom senso, sem a graça de génio, possa continuar com êxito”. Sempre Alerta!

- Bob Longo era um homem não muito afoito a conversar. Preferia mais ouvir. Desde pequeno muito responsável. Bom estudante nunca repetiu de ano. Seus pais não tinham o que reclamar. Aos dezessete entrou para a faculdade. Futuro promissor todos diziam. Escolheu Engenharia Civil. Pensava em construir pontes, viadutos, tuneis, estradas e quem sabe um monte de arranha céus. Formou-se e um amigo de seu pai lhe ofereceu um emprego em uma repartição publica. – Supervisor, lá terá vinte funcionários sob suas ordens. Bom salário e futuro garantido. Bob Longo pensou e aceitou. No inicio se sentiu bem. Afinal seria um Chefe seu sonho. Nunca o chamaram de Chefe, mas quem sabe um dia? O tempo foi passando Bob Longo casou e sua casa iluminou com o nascimento de Roberta. Agora sim, tinha tudo que queria uma boa casa, outra na praia, um bom carro e uma boa esposa e uma filha que amava como nunca amou ninguém. Ficou esquecido na repartição. Não se filiou a nenhum partido e assim nunca teve oportunidades que muitos outros tiveram. Seu sonho de ser um Chefe foi passando...

Ele queria ser um chefe. Tinha qualidades competência e sabia decidir na hora certa. Oito anos e nada. Viu que ali nunca seria Chefe. Uma tarde Roberta pediu para ser Lobinha. Ele já tinha ouvido falar dos escoteiros, mas não entendia nada. Porque não? Pensou. Foi com ela até o Grupo Escoteiro. Estudou tudo que viu para deixar sua filha participar com eles. Conversou com Albert o chefão. Gostou do seu estilo. Tinha pose, voz empastada de politico experiente. Mandava e desmandava. Fazia sinal e meninada endurecia sem mexer nas intermináveis formaturas. Gostou de tudo que viu. Ia todos os sábados, ficou amigo, sabia que um dia iriam convidá-lo para ser Chefe. Aprendeu sozinho, comprou uma vasta literatura escoteira. Submisso fingia ser obediente para que os demais chefes pudessem acreditar que sabia tanto como eles. Notou que muitos chefes no Grupo gostavam de quem obedecia e não reclamava.

Bob Longo nunca foi Escoteiro. Estudou e aprendeu toda a filosofia, seu programa sua organização e seus métodos. Na repartição ninguém dava nada por ele. No seu tempo ocioso leu tudo que podia. Normas regulamentos e alguns livros do fundador. Passou a sonhar em ser um líder escoteiro. Sabia que podia brilhar dirigindo uma tropa. Quando o convidaram para ir em um acampamento viu que sua hora havia chegado. Afinal não iria confiar sua filha aqueles adultos que sorriam e diziam ser responsáveis. Sua filha era tudo que tinha e onde ela fosse ele iria também. Bob Longo sabia o que era aprender fazendo, sobre o jovem ser responsável pela sua autoeducação, sobre aprender a andar com suas próprias pernas. – Balela! Ele sabia que sua filha seria educada como pensava e não como os chefes dos escoteiros. Adorou o acampamento. Sentiu-se criança. Nem pensou na alegria dos jovens acampantes. Voltou com as mãos inchadas, cheias de calos. Fez pioneiria, se mostrou um expert em nós e amarras. Mostrou que tinha conhecimentos.

Fez todos os cursos possíveis. Achava-se um perfeito líder escoteiro. Disseram que o líder trabalha a descoberto, o Chefe trabalha encapotado. O líder lidera, o Chefe guia. Afinal era um Chefe ou um Líder? Para ele não havia diferença. Seu plano era ser Chefe de Tropa. Passava horas treinando em frente a um espelho a pose de chefão. Foi na Assembleia Regional. Viu tantos chefões, com medalhas, e poses bem estudadas. Todos mostrando sua posição no escotismo. Morreu de inveja dos chamados Velhos lobos. Sempre procurados bajulados e endeusados. Sorria para si próprio imaginando ser um deles. Passou a ler sobre os formadores, os diretores, os Insígnias de Madeira, sobre a Organização Mundial dos Escoteiros e um dia seu sonho se realizou quando convidado pelo Chefe Albert para chefiar a Tropa Escoteira.

Era seu caminho para o sucesso como dizia Baden-Powell. Iria mostrar suas qualidades. O Presidente e o distrital iriam ver que surgia um novo líder dos escoteiros. Foi apresentado a tropa. Brilhou na Bandeira, na formação, saudando os monitores, uma bela oração e uma perfeita inspeção. Passou dias escolhendo jogos, pois sabiam que eles eram o sucesso para fazer os escoteiros gostarem dele. Amou seu primeiro dia. Já fazia planos em partir para o campo com seus escoteiros correr pelas campinas, pelos vales, pelas montanhas e picos sem fim. Queria fazer o escotismo que não fez quando criança. Certas horas esquecia-se de Roberta, só pensava em si mesmo e em sua pose de chefão. Fingiu ser subserviente para ser amigo do distrital e dos presidentes da região e da EB. Seu sonho era chegar lá. Iria ser Chefe, um chefão. Já pensou? Dirigir um curso e fazer aquele monte de alunos lhe obedecer? Firme! Descansar! – Seria bom demais.

Foi ovacionado muitas vezes pelos chefes do seu grupo e do distrito. Sentiu-se realizado quando fez seu curso da Insígnia de Madeira. Quando lhe entregaram o Lenço ele chorou. Agora sim, começou a ser um chefão. Absorto no pátio viu quando surgiu um ancião. Ele não o conhecia. Não estava de uniforme, não tinha lenço e nem chapéu. Só uma bengala que fazia toc, toc no cimento do pátio. – Parou em sua frente. Sorriu e disse olá! – O ancião falava baixo, chegou mais perto. - Ouça meu filho a voz da razão e viva sem dores, ouça o coração e seja feliz. – Quando for complicado decidir... Não deixe a razão agir. Ouça seu coração falar, pois com ele nada falha. Não se esqueça que mesmo que não concorde com tudo isto, com os objetivos da sua associação, faça seus escoteiros felizes. Chefe não é aquele que pensa só e sim aquele que briga para a felicidade de todos.

- E continuou: Um Chefe Kalapalo me disse – Não seja um homem solitário. Se você não pode ouvir o choro de uma ave então ouça o murmúrio do vento, deixe a chuva cair e perfumar a floresta do mundo. Quando chegar sua hora de morrer, não seja como aqueles cujos corações estão preenchidos de medo. Eles choram e rezam por um pouco mais de tempo para viverem sua vida novamente de uma forma diferente. Assim cante sua canção de morte e morra como um herói indo para casa! O “Chefe” Bob Longo estava estupefato. Não sabia o que dizer. O ancião se foi, ele não soube o seu nome. Aquele dia ele viu que ser Chefe é muito mais que pensava. Precisar dominar os outros é precisar dos outros. Ele agora sabia que um Chefe seria sempre um dependente dos outros e de si mesmo. Seus olhos vermelhos sabiam agora o caminho a seguir. Ele sabia que para ser Chefe ele sempre iria precisar dos outros. Aquele que quer aprender a ser Chefe tem de primeiro aprender a servir!

quarta-feira, 29 de abril de 2020

Lendas escoteiras. A lenda dos milagres de Sophia.




Lendas escoteiras.
A lenda dos milagres de Sophia.

... - Se Sophia era mesmo um espírito cheio de luz eu não sei. Se isto é coisa do diabo eu também não sei. Dizem que Deus sabe o que faz e como eu acredito nele a história de Sophia para mim poderia ser verdadeira. Afinal temos ou não uma só palavra? Apenas uma lenda, nada mais que isto.

                          Não conheci a escoteira Sophia. Se não tivesse participado do desfile do Sete de Setembro naquele ano a história dela nunca seria conhecida por grande parte do movimento escoteiro. Sei que muitos sabiam, mas tudo era contado à boca pequena sem chances de até mesmo o Arcebispo Joshua pensar que um dia ela poderia ser canonizada. Ele ficou impressionado com o relato do vigário Honório. - Verdade mesmo Honório? – Eminência, são mais de vinte meninos e meninas que assistiram tudo no acampamento que fizeram Na Lagoa dos Sonhos. Ela pegava peixes com as mãos, curou doentes, acendeu um fogo sem fósforos em segundos. E não foram só estes foram vários! – E adultos tinha algum? Perguntou o Arcebispo. – Não eminência, só uma vez Dona Filó e o Chefe Manolo assistiram um milagre dela. Foi o mais simples. - Eles viram-na se elevar no ar e beijar um periquito no ninho de uma árvore há mais de oito metros de altura!

                  Sei que o Vigário Honório ficou mais de cinco horas a narrar para sua Eminência o Arcebispo Joshua tudo o que viu e tudo que lhe contaram. Saiu do Palácio Episcopal mais de meia noite. Deixou o Arcebispo com a pulga atrás da orelha. Ele já tinha lido e conversado com muitos sobre o tema mediunidade. Quem sabe esta escoteira não era assim? Mas se elevar no ar? Isto não é mediunidade. Mais parecia que era sensitiva. Ver os mortos, visualizar o futuro e ter visões extraordinárias. Agora se elevar no ar? Isto não saia da mente do Arcebispo. No dia seguinte ligou para o vigário. Pediu a ele se podia trazer a escoteira até o palácio. Ele queria conhecê-la. Dona Fabíola mãe de Sophia não se opôs. Partiram em uma manhã de sábado. Daria prazo para ela participar da reunião escoteira da tarde, disto ela não abria mão. O Arcebispo ficou maravilhado e abobalhado. Ela na sua presença conversa como gente grande. Inteligentíssima. Conversou com ela em inglês, francês e italiano e ate abusou do latim. 

      Mas vamos voltar ao início se não vocês não vão conhecer Sophia e sua história. Monossílabo era sênior da Antares, uma patrulha antiga e quatro Sêniores e duas guias. Eu cansado de uma manhã do desfile da cidade, sentei-me no banco da praça e ele sentou ao meu lado. – Sabe Chefe, se Sophia a escoteira tivesse vindo este desfile seria inesquecível. – Fiquei encucado. – Quem é a escoteira Sophia? – Chefe! O senhor ainda não ouviu falar dela? – Claro que não Monossílabo, se não eu não teria perguntado. – Bem Chefe, ela está conosco há dois anos. Quando chegou à sede ninguém deu nada por ela. Mas no primeiro dia de reunião Loquinho o Monitor da Águia ficou boquiaberto com ela. Em uma base de nós, com os olhos fechados ele fez mais de vinte nós escoteiros e de marinheiro. Ninguém acreditava no que via. Precisava ver no acampamento. Cortava um galho em segundos. Parecia que o facão era mágico.

     Monossílabo ficou me narrou por horas. A princípio não acreditei nele. Havia muito floreio em tudo. Mas me lembrei de um fato ocorrido há alguns anos e só não lembrava se era ela a protagonista. Ela e sua mãe chegaram correndo a delegacia, mais de duas da manhã dizendo que um acidente grave aconteceu na estrada 45. Na curva da onça um ônibus despencou por sobre a ponte. Mais de vinte mortos. Pinduca o Sargento da guarda não acreditou. Foi preciso chamar o prefeito que relutante em acordar acompanhou todos até a ponte fatídica. Gemidos, gritos de socorro e o trabalho de ajuda começou. Um menino de três anos ensanguentado foi colocado por sobre uma manta e o enfermeiro disse que estava morto. Não estava, pois Sophia pegou na mão dele e ele se levantou. Dizem que ela deu vida a mais oito pessoas. As demais não, pois conforme disse era desígnio de Deus. Teria que ser assim.

               Sophia não era linda, nada disto. Tinha o rosto fino, nariz comprido, uma boca pequena e cabelos crespos que ela insistia em não pentear. Ficava diferente e ela gostava. Falava fanhoso e deixou todo mundo boquiaberto quando um dia falou como uma rainha. Na patrulha era bem quista e ninguém notava nada diferente. Nas atividades que o Chefe Manolo e a Chefe Malena faziam na maioria das vezes a patrulha dela não se evidenciava. Só uns meses atrás que tudo mudou. Ela parava durante alguma corrida dizendo estar vendo pessoas mortas. Garantiu ao Chefe Manolo durante uma cerimônia de bandeira que o Chefe Tonon estava presente. Chefe Tonon foi o fundador do grupo a mais de setenta anos. Morrera há quinze anos. Sophia começou a ser procurada por doentes, cadeirantes e a cidade começou a ter turistas de todos os lugares por causa dela. Quando ia para o Grupo Escoteiro a sede ficava superlotada de pessoas querendo falar com ela ou ser abençoadas.

      O vigário Honório correu a falar com o Arcebispo. Esqueceu-se de Don Antonio um Velho morador da cidade e Presidente do Centro Espirita Boa Vontade. Ele ria quieto em seu canto. Sabia que Aimée era um espírito superior e que os habitantes nunca podia imaginar quem ela fora no passado. Ele sabia que ela iria desencarnar aos quinze anos. Morte natural. Falar isto para o padre? Nem pensar. Comentou superficialmente com o Chefe Manolo. Um bom Chefe. Era evangélico e ficou incrédulo com tudo aquilo, mas o que vira em Sophia até que poderia ser verdade. Cinco meses depois chegou à cidade monsenhor Giuseph a mando da cúria papal. Era para averiguar e comprovar os milagres de Sophia. Não ficou dois dias. Quando a conheceu ela disse para ele – Senhor Monsenhor, daqui a dois anos o Papa Lozano III vai falecer e o senhor será eleito o novo papa!

                  Ninguém soube do fato e eu mesmo não sabia como Monossílabo sabia. Bem o final da história é que a Cúria Romana até hoje discute se Sophia era possuidora de receber o título de santa. Mesmo após sua morte ocorrida na aventura Sênior distrital que a tropa participou na Serra dos Órgãos eles continuaram investigando. Ainda investigam. Quem sabe teremos a primeira santa escoteira? Vai ser o máximo. O escotismo terá dado um enorme salto para o sucesso de marketing. Procurei saber como foi à morte de Sophia. Sua Patrulha jura de pé junto que ela se despediu de um por um e disse para não se preocuparem. Sua mãe já sabia que era hora de ir. Ninguém acreditou quando uma forte luz a levou. Seu corpo sumiu e até hoje não foi encontrado. A policia fez de tudo para ver se não havia outra história, mas teve que se contentar com a fantástica explicação dos seniores que estavam com ela. O delegado já saiba de seus poderes sobrenaturais e deu o caso como encerrado.

       Monossílabo me jurou que nas noites de acampamento, quando os seniores se reúnem em volta de um fogo para jogar conversa fora ela aparece e fica com eles por horas contando como são os escoteiros que moram no céu. Don Antonio o espírita tem boas relações com dona Fabiola mãe de Sophia. Conversam muito. A cidade não sabe o que conversam. Se Sophia é mesmo um espírito cheio de luz eu não sei. Se isto é coisa do diabo eu também não sei. Dizem que Deus sabe o que faz e como eu acredito nele a história de Sophia para mim é verdadeira. Afinal temos ou não uma só palavra?

terça-feira, 28 de abril de 2020

Contos ao Pé do Fogo. Evelyn anjo ou demônio?




Contos ao Pé do Fogo.
Evelyn anjo ou demônio?

... - Os que riram hoje choram, os que debochavam hoje respeitam, os que não acreditavam hoje procuram o caminho, o que estava morto foi ressuscitado. Fica fácil quando cada chave é colocada em sua devida fechadura. Nada como um dia após o outro dia. Tudo faz sentido, quando a motivação é o amor...

                     E daí se gostam de mim ou não? Não estou nem ai! – Michel tremeu de ódio. Permaneceu calado para evitar dizer uma saraiva de palavrões e ofensas. Leo que estava próximo pensou em interferir. Melhor não pensou. Não era só ele, toda a Patrulha Antares queria vê-la longe. Não entendiam a Chefe Sophia e o Chefe Montana que sempre aconselhavam relevar, pois ela um dia iria melhorar. Evelyn foi levada a Corte de Honra e a Tropa Sênior por diversas vezes se auto-convocou para um conselho de tropa. Por quê? Claro, Evelyn. Pensando bem Evelyn era uma jovem bonita, olhos negros incrivelmente belos. Mas sua apresentação era péssima. Vestia mal, nas inspeções ela sempre “enterrava” a Patrulha com sua uniformização sem garbo e boa ordem.

                    Ninguém explicava porque ela insistia em continuar como Guia. Quando entrou falou para Dante: - Olhe Escoteiro, as montanhas da vida não existem apenas para que você chegue no topo, mas para que você aprenda o valor da escalada. Viva sua vida e deixe-me viver a minha “- e quer saber”? Eu entrei nos escoteiros sem precisar de ninguém. Nem de minha mãe. Eu não preciso de você para ser feliz, eu sei como me alegrar todos os dias sem contar com nenhum de vocês. Evelyn era só amargura. Parecia não amar ninguém e não queria que os outros também gostassem dela. Porque tão mal educada? Essa grosseria seria uma defesa? Mas defender de que? Natanael o Monitor disse a Chefe Sophia que a Patrulha tinha votado para ela não ir ao acampamento. – Chefe, ninguém da Antares gosta dela. Acha-se a melhor, reclama e no acampamento de Julho ela foi um estorvo. A Senhora lembra que por dois dias ficamos em último lugar.

                   Chefe Sophia tinha uma alma e um coração de anjo. Nunca aprendeu a tomar atitudes firmes que precisavam ser tomadas. Sempre achou que deveria ter um caminho uma solução. Evelyn naquela sexta feira chegou como sempre emburrada e dizendo: Eu vou, mas não vou servir ninguém. Cada um que se vire! E deu aquela gargalhada de sempre. Rui o Sub pensou no que viu quando foi à casa de Evelyn. Não comentou com ninguém. Queria ver de perto. Nicolas um amigo do Colégio morava na mesma rua. Ficaram por horas conversando. Soube do seu padrasto, homem mau, de Sininho com seus dois anos que era mais paparicado do que Evelyn, soube também que na rua ninguém gostava dela, que sua mãe não se importava, não lavava louça e nem limpava casa. Evelyn fazia o mesmo.

                    Pensou em conversar com a Patrulha e colocar ao par tudo que viu e ouviu. Iria dizer que a vida pode ate derrubar, mas que escolhe a hora de levantar é você mesmo. Engraçado, diferente dos outros acampamentos Evelyn ao seu modo ajudou a Patrulha, mas sempre arredia. Lídia no segundo dia há encontrou chorando próximo ao Riacho das Flores. – Sentou ao seu lado, não disse nada. Ela sem olhar para Lídia disse baixinho: Na vida eu encontrei três tipos de pessoa. Aquelas que poderiam mudar minha vida, aquelas que querem predicar minha vida e ainda não encontrei aquela que será a minha vida. No terceiro dia um grande jogo foi realizado. Evelyn gostava de um grande jogo. Achava-se a melhor, resolvia sozinha, não dava satisfação a ninguém. Na subida do Morro do Macaco ela sumiu. Não era a primeira vez. A Patrulha se reuniu e discutiram em voltar e procurar ou seguir em frente e achar o Tesouro escondido.

                  Eles já tinham decifrado todas as pistas e sabiam onde estava o Tesouro. Poderiam ganhar o jogo, o que não acontecia há meses por causa de Evelyn. Uma revolta grande. Achar o tesouro ou voltar para encontrar Evelyn? Os artigos da Lei são aqueles que dão o tom para escoteiros de verdade. Vestir o uniforme nada significa se o coração não bate pela ajuda ao próximo. Era uma Patrulha unida, que se preocupava. Voltaram por aonde vieram. Vasculharam cada barranco, cada ladeira, cada ribanceira e o talude do Cristo.  Já iam desistir e chamar a tropa para ajudar quando ouviram um gemido. Na rampa havia duas trilhas e um enorme buraco. Viram Evelyn chorando. Desceram. Uma fratura exposta na perna e no braço. Ela devia estar sentindo dores terríveis.

                    Rui e Hélio voltaram para trazer socorro. Natanael, Rui Michel e Nair viram que não podiam esperar muito tempo. Ela estava perdendo muito sangue e pálida desmaiava e acordava. Michel no alto dos seus conhecimentos de Socorrista fez duas talas largas para não machucar. Amarrou uma na perna outra no braço. Ela desmaiada nada sentiu. Os lenços foram amarrados onde o sangue jorrava aos borbotões. Fizeram uma maca com dois bastões e com muita dificuldade arrastando morro acima a maca com uma corda chegaram ao topo. O tempo passou um dois três meses e num belo dia de sol, Evelyn retornou ao Grupo. Mancava da perna que ainda não tinha cicatrizado. No cerimonial de Bandeira ela pediu a palavra: - Olhou nos olhos de cada um e disse: - Não sei o que dizer sempre me disseram que o maior problema em acreditar nas pessoas é que um dia você acaba não acreditando em mais ninguém. Sei que é difícil o perdão de todos, mas a partir e hoje serei outra Evelyn. Vou provar que posso ser amiga e irmã de todos vocês!

                    Quem esteve lá naquele dia nunca esqueceu. Um silencio sepulcral quando ela falava, quando parou a tropa parecia não entender bem suas palavras. Maria Eduarda batendo palmas foi até ela e a abraçou. Todos correram para fazer o mesmo. Chefe Sophia sorrindo olhou para o alto e falou baixinho para ninguém ouvir: - “E tudo ficou tão claro, o que era raro, ficou comum. Como um dia depois de outro como um dia, um dia comum”!

segunda-feira, 27 de abril de 2020

Uma história uma lenda. A árvore das folhas rosa.




Uma história uma lenda.
A árvore das folhas rosa.

“Queria ser Cerejeira rosa, alta e frondosa, enchendo o chão de sombras e os galhos de passarinhos, que nela, aos pares, construíssem ninhos, lançando aos ventos sonoros pensamentos. Então, a minha sombra à tarde, abrigaria namorados, trazendo juras de amor tão puras e ternas, que parecessem eternas. Como as flores rosa de meus galhos”. (Sonia Quartin).

... - Apenas uma arvore não uma qualquer... Era uma cerejeira em flor, na beira do caminho. Nunca tinha visto uma cerejeira igual. Florida, folhas e flores rosa destoando da natureza ao seu redor. Só ela, ali, imponente e ao seu lado um pequeno riacho de águas claras. Visão maravilhosa. Um oásis dos deuses do paraíso naquele campo seco. Uma historia simples, mas para não esquecer jamais.

                   Bela caminhada na Estradinha do Neco Pastor. A Patrulha sorria mesmo com o sol inclemente. Era a primeira vez que arriscávamos a passar por ali. Eis que uma visão incrível apareceu... Assim do nada. Muitos disseram que seria lembrada por toda a vida. Dizem que só os escoteiros têm o privilegio de ver e ouvir coisas, pois eles têm o dom de enxergar de outra maneira a natureza hoje perseguida de maneira implacável pelos homens. Acredito piamente que isto é real. Éramos seis amigos escoteiros a seguir na pequena estrada. JG e Palestro seguiam juntos à frente, Nico Landi, Portentoso e Calango mais atrás dando risadas, devia ser uma boa piada escoteira. Eu olhava os pássaros a procura de um Bem ti vi cantante. Cortamos caminho para chegar ao Tanque dos Afogados. Não morreu ninguém lá e nem é um tanque. Uma represa pequena, dócil, rasa, de águas cristalinas que por duas vezes ali estivemos acampando. Sempre passamos pela estrada do Marquês mais de doze quilômetros. Não lembro quem deu a ideia de cortar caminho passando por um vale entre duas montanhas. Eu sabia que nem sempre as boas ideias prevalecem. Passava da uma da tarde. Um sol a pico e queimando. Quase quatro horas de caminhada. O suor escorrendo pelo rosto, os olhos vermelhos e o chapelão de três bicos faziam às vezes de um protetor carinhoso, mas que pouco ajudava.

                  Um local descampado, sem árvores, quem sabe para pasto do gado que ao longe pastava calmamente. Pensei em parar, mas sempre um animando dizia: - Vamos chegar! Vamos chegar! É só encontrar o riacho das Vertentes. E a sede chegando e o riacho não chegava. Uma fome brava. Nem um biscoitinho a solta. Já respirava com dificuldade quando avistei o paraíso. Um riacho e uma árvore. Não uma árvore qualquer. Era enorme. Incrivelmente linda! Incrivelmente bela! Nunca tinha visto uma cerejeira igual. Florida, folhas e flores rosa destoando da natureza ao seu redor. Só ela, ali, imponente e ao seu lado o pequeno riacho de águas claras. Visão maravilhosa. Um oásis dos deuses do paraíso naquele campo seco. Incrivelmente maravilhosa. Molhei o rosto calmamente. A sombra da cerejeira nos dava uma sensação de calma silenciosa e gostosa. Uma brisa fresca soprava de este para oeste. Sentamos embaixo próximo ao tronco. Pés levantados. Dizem ser bom para a circulação. Dez minutos, quinze, vinte. Uma hora. Ninguém animava em partir. Estavam todos no mundo dos sonhos coloridos que só os escoteiros possuem.

                 A tarde chegou mansamente. O sol estava se despedindo e prometendo voltar amanhã. Vermelho atrás das montanhas verdejantes. Ainda de olhos fechados lembrei que tinha lido não sei onde – “A flor de cerejeira cai da árvore na primeira brisa mais forte, mas não dizemos que ela nunca viveu. Uma flor que só dura um dia, não é menos bonita por isso”. Não queria abrir os olhos. Não queria partir. Eu tinha encontrado o paraíso. Não disseram que o tempo é relativo? Que a flor da cerejeira, por exemplo, dura apenas uma semana e mesmo se durasse mil anos ainda seria efêmera? Flor tão bela como ela não merecia durar eternamente? E o que é eterno se não o que dura com tamanha intensidade? Dormi. Não queira acordar. Agora a cerejeira não dava mais sombra. Não precisava, a noite chegou escura, mas logo o clarão das estrelas no céu dava o seu espetáculo a parte.

                Reunião de Patrulha. Partir? Cinco a zero para ficar. Um foguinho. Uma sopa, um café na brasa. Cantávamos baixinho a Árvore da Montanha. O céu estrelado ainda dando seu espetáculo maravilhoso. Um cometa passou correndo deixando um rastro brilhante. Fiz um pedido. Que a cerejeira em flor durasse para sempre! Aos poucos alguns dormiam. A cerejeira das folhas rosa era nossa barraca. O tempo passou. Ao lado anjos velavam o sono dos escoteiros. Abri os olhos mansamente, uma réstia de luz aportava lá por trás das montanhas distantes. Era a madrugada chegando. O novo dia chegava sem fazer alarde. O orvalho caia de mansinho. A brisa eterna amiga não nos deixou. Um acalanto para nos dar um novo vigor no dia que chegava sem fazer ruído. O riacho ao lado parecia cantar canções de ninar. Pequenos peixinhos nadavam como a nos dizer bom dia!  Mochila as costas. Olhares e sorrisos vontade danada de ficar. Eis que o Monitor chama: - Escoteiros avante! Pé na estrada, pois o sol agora já estava firme no horizonte. Nosso destino? O Tanque dos Afogados. E lá fomos nós, em marcha de estrada sorrindo, mas saibam que nunca mais, em tempo algum, nós nos esqueceríamos da árvore das folhas rosa. Cerejeira em flor. Um amor, uma lembrança que ficou marcada para sempre!

sábado, 25 de abril de 2020

Lendas da Jangal. A lenda de Sasquatch, o lobo solitário da Montanha de Cristal. Uma história para lobinhos e escoteiros.




Lendas da Jangal.
A lenda de Sasquatch, o lobo solitário da Montanha de Cristal.
Uma história para lobinhos e escoteiros.

Era uma vez... Esta é uma história de um lobo, um lobo solitário que nas madrugadas vagava pela Montanha de Cristal com seu uivo sinistro como a pedir à ajuda que nunca teve. Dizem que ele chorava que em seus olhos negros havia sempre uma lágrima a cair. Não é uma história de um final feliz. Sei que os lobos nas montanhas andam em matilhas, o mais forte protege o mais fraco, mas quando ele está Velho, sem condições de sobrevivência é deixado pelos demais e morre uivando de fome sede e frio. Mas deixe-me contar a vocês a história de Sasquatch. Foi Sandra quem o apelidou assim. Sandra foi outra que viu seu mundo desmoronar. Não vamos avançar a história. Melhor narrar parte por parte para que vocês conheçam melhor tudo que aconteceu com Sandra e Sasquatch, o lobo solitário da Montanha de Cristal.

Sandra tinha trinta e seis anos quando Otávio seu marido faleceu. Durante quatro anos agonizou em um hospital do SUS até que Deus o levou e quem sabe para melhor. Sandra não chorou. Chorou sim quando soube que ele tinha uma grave doença pulmonar e que não sobreviveria por muito tempo. Viveu quatro anos dos mais felizes em sua vida com ele e o tratando com o maior carinho. A doença consumiu tudo que tinham. Gastaram todas suas economias. Vendeu sua casinha que compraram com muito sacrifício. Não tiveram filhos. Otávio no primeiro ano de casado resolveu assim. Seis meses depois da morte de Otávio, Sandra ainda morava só. Uma irmã no nordeste escreveu para ela para ir morar com ela. Sandra não quis e resolveu ficar. Sua tristeza quando chegava à noite em casa do seu trabalho era enorme. Lia um livro, um programa de TV e ia dormir sonhando com Otávio ao seu lado.

A vida de Sandra era uma rotina. Foi Amélia sua colega de trabalho quem mudou tudo. – Preciso de uma assistente. E você vai me ajudar disse. – Sandra riu e aceitou. Quem sabe o Escotismo lhe daria um novo caminho? O tempo passou. Amélia casou e saiu do Grupo. Sandra ficou em seu lugar. A Alcateia passou a ser um pouco sua vida. Dedicava de corpo e alma aos seus lobinhos. Adorava os meninos e as meninas. Fez curso, aprendeu muito em outras alcateias que visitou e acantonou. Tonho e Marilda eram suas assistentes. Baloo e Bagheera. Os lobinhos e as lobinhas tinham verdadeira adoração por eles. Sandra já não mais se sentia só. O escotismo deu a ela nova motivação e uma filosofia de vida que ela nunca esperava.

Tudo aconteceu em julho. Anualmente sempre faziam um acantonamento no Rancho Fundo do Seu Leôncio. Seu Ruan proprietário adorava os lobos e dizia enquanto fosse vivo aqui será um rancho de lobos! Atrás da casa sede tinha uma montanha. Linda. Muitos bosques e uma nascente. Sandra quando ia ali ficava horas e horas a olhar para ela. Chamavam-na de a Montanha de Cristal. Sandra não sabia por que, mas no dia da viagem para o acantonamento bateu uma enorme saudade de Otávio. Três anos sem ele e ela não entendia aquela melancolia, logo agora em um acantonamento. Quem sabe por que ia só e os seus dois assistentes iriam à noite. Duas mães foram juntas para ajudar na cozinha e limpeza diversas. Chegaram, arrancharam, e logo começou as atividades. Iam ficar três dias.

À tarde do primeiro dia enquanto os lobos arrumavam suas tralhas para a noite e o banho Sandra olhava para a Montanha. Assustou quando avistou um Lobo parado em uma pequena trilha olhando para ela. Não sabia o que fazer. Entrou correndo na casa sede. Olhou pela janela. O lobo se afastava. Mancando. Notou que sua perna direita estava quebrada. Sentiu pena dele. Sem perceber o chamou de Sasquatch. Nada há ver com a história do homem de neve que contam por aí. Ela saiu de novo da casa. O lobo parou e voltou. Ela notou seus olhos tristes. Parecia que lagrimas caiam. Não era possível. Ela devia estar enganada. Lobo não chora. Viu que ele se aproximou dela. Lambeu seus pés. Ela foi até a cozinha. Cortou um pedaço da carne do almoço do outro dia e deu para ele. Ele olhou para ela com os olhos húmidos e balançou a cabeça como a agradecer. Não comeu a carne. Pegou entre os dentes e subiu a trilha que levava ao alto da Montanha de Cristal.

Sandra acordou várias vezes. Jurava ouvir uivos enormes. Acordou pela manhã e alguém uivava lá fora. Era ele. Sasquatch. Sempre mancando. Sandra aproximou dele e ele deixou que ela o acariciasse. Viu que a perna estava curta e tinha sinal de perfuração de bala. Um caçador malvado só podia ser. Ela o olhou nos olhos, viu o brilho firme a encará-la. Foi de novo buscar alimentação para ele. Ele ajoelhou e balançou a cabeça. Deu um enorme uivo pegou a carne com os dentes e de novo seguiu a trilha da montanha. Vários lobinhos viram o lobo, tentaram se aproximar, mas ele mancando corria. Só com Sandra ele se deixava acariciar. Assim foram os três dias. No último ele fez um sinal para ela. Parecia saber que ela ia embora. Andava em direção à trilha, parava e olhava para trás. Sandra o seguiu. Não andou muito e ele entrou em uma pequena caverna.

Sandra ficou com medo de entrar lá. Por diversas vezes Sasquatch chegou à entrada e fez o sinal para ela entrar. Resolveu segui-lo. O que viu foi de estarrecer. Dois lobinhos recém-nascidos mortos e dois vivos entre a vida e a morte. Tinha carne junto deles, mas não conseguiam comer de tão fracos. Olhou de novo para Sasquatch. Viu que ele era um lobo macho. A femea devia ter morrido, mas ele não abandonou os lobinhos. Filhos dele? Sandra não sabia o que fazer. Ele olhava para ela com carinho como a pedir que o ajudasse. Ajudar como? Ela tinha de ir embora. Sentia enorme pena dos lobinhos e sabiam que eles iam morrer. Fazer o que? Saiu da caverna. Olhou para o céu e perguntou a Deus o que devia fazer. Viu em uma nuvem Otávio a sorrir para ela. Era alucinação, ela não acreditava nisto. Resolveu voltar ao Rancho. Olhou para trás, Sasquatch ajoelhado uivava. Um uivo dolorido, choroso, e lágrimas caiam de seus olhos.

Sandra voltou. Colocou os dois lobinhos no colo. Iria levá-los com ela. Não tinha outra saída. Desceu com Sasquatch a acompanhando. O ônibus chegou e a lobada cantando tomou seus lugares. Brincavam com os lobinhos que já estavam recuperando suas forças. Sandra deu leite para eles que beberam sofregamente. Ao entrar no ônibus deu uma última olhada em Sasquatch. Ele uivava e ela não sabia se de alegria ou tristeza. Sabia que não podia levá-lo. Não tinha condições. O ônibus foi saindo devagar pela estrada vermelha. Sasquatch tentou acompanhar, não conseguiu. Coxeava muito. Sua perna quebrada não deixava. Uivou muito e Sandra ouvia chorando baixinho. Quando o ônibus chegou à estrada asfaltada ele olhou pela ultima vez a Montanha de Cristal. Parecia que uma luz brilhante pairava sobre ela. Mas viu a figura novamente de Otávio sorrindo. Tranquilizou-se.

Dizem que durante muitos anos Sandra cuidou dos dois lobos. Um ela chamou de Lobo Gris e o outro... Sasquatch. Por onde andava os dois lindos e enormes lobos a acompanhavam. Um de cada lado. Disseram-me que ela voltou muitas vezes a Montanha de Cristal. Foi até a caverna onde os lobos nasceram. Levou Gris e Sasquatch e eles uivaram por muito tempo como a lembrar de seu pai que deu a eles um grande carinho e amor e porque não a vida. Ao retornar ouviu bem no alto da montanha um uivo enorme. Sabia que era ele. Olhou para lá, não viu nada. Mas sentiu um calafrio. Não era ele em vida, mas ali estava seu espirito como a agradecer o belo gesto de Sandra. E posso garantir as mil e uma historia que um dia irei contar, Sandra viveu feliz para sempre na companhia dos dois lobos. Sei que ficaram amigos para sempre! E contam até hoje que uma estrela brilhante paira todas as luas cheias por cima da caverna da Montanha de Cristal. 

terça-feira, 21 de abril de 2020

Lendas Escoteiras. O pecado de todos nós.




Lendas Escoteiras.
O pecado de todos nós.

... - O corpo e a alma precisam de novos caminhos para se unir harmoniosamente. “O futuro bate à nossa porta, e todas as ideias - exceto as que envolvem preconceitos - terão chance de aparecer e serão valorizadas pelas pessoas”.

- Disseram-me uma vez que ser feliz não é pecado. A felicidade é desprezada por muita gente. É irritante ver alguém naturalmente lindo, rico, simpático, inteligente, culto, talentoso, apaixonado e, ainda por cima feliz! Estou citando isto porque quando conheci Diego pela primeira vez ele era quase tudo isto. Ele conseguiu dar alma ao Grupo Escoteiro Ventos do Norte. Trouxe o sorriso que faltava e todos ali o amavam. Um invejoso comentou que seu jeito, sua maneira de falar e andar, sua voz cheia de trejeitos poderia trazer resultados danosos ao movimento Escoteiro. Diego apareceu do nada e do nada se solidificou como pessoa importante na parte burocrática e em tempo algum alimentou seu sonho de um dia ser um Chefe Escoteiro ou de lobinho. Doutor Janílson o Presidente não sabia de onde ele veio. Não tinha filhos no Grupo e alguns o conheciam na cidade porque era gerente nas Lojas Abil, famosa pelos seus vestidos feitos pelos maiores estilistas do mundo. Ali se encontrava um Gabriell Miuccia Prada, um Bonheur Chanel, um Christian Dior ou mesmo um John Galliano sem falar nas famosas bolsas Louis Vuitton.

Era bem quisto pela sociedade local e muitas madames o procuravam para ser atendidas por ele. Diogo tinha um grande amor. O Escotismo. Como surgiu ninguém soube. Era incansável na colaboração ao Grupo Escoteiro. Conseguiu com suas amizades vultosas colaborações financeiras para o Grupo. Nunca fez a promessa e com seus olhos brilhantes admirava quando alguém no cerimonial jurava a Deus e a Pátria Ele sonhava em fazer a promessa, mas sabia que no Grupo Escoteiro seus trejeitos eram considerados anormais havia muito preconceito por pessoas como ele. Ele respeitava a todos. Mas não era o que pensava Jonny Vampuso. Ele mesmo se perguntou varias vezes se poderia estar no meio escoteiro um sujeito que era conhecido como um homossexual ou um sapatão.

Uma das maiores alegrias de Diogo foi quando a Akelá Sophia o convidou para ajudar no acantonamento distrital. Ele nunca se sentiu tão feliz. Parecia estar em casa, ou melhor, no paraíso. Os lobinhos o adoravam e os chefes passaram a ter por ele um carinho todo especial. Quando retornaram pensou que o Doutor Janílson o convidaria para ser um assistente. Mas nada aconteceu. Ele não sabia que seu algoz Jonny Vampuso o condenava no grupo e boa parte do Distrito e região. Sabemos que pessoas preconceituosas, são reflexos de defeitos não revelados por eles mesmos. Um dia foi chamado no Escritório Regional. O Doutor Janilson se desculpou e não foi com ele. Diogo sentiu-se um cordeiro a mercê dos lobos.

Eram quatro dirigentes. Sisudos. Cara feia. Nem um sorriso. Eram chefes Escoteiros zelando pelo bem da moral escoteira.  Fizeram mil perguntas e no final da reunião um querendo mostrar ser boa praça o convidou para um café. Falava baixinho, sobre o que pensavam dele, sobre os resultados maldosos que o escotismo poderia ter com sua presença, chegou até a citar Paulo Coelho que disse que quem tentar possuir uma flor, verá sua beleza murchando. Mas quem apenas olhar uma flor num campo, permanecerá para sempre com ela. – Você meu amigo ele disse, sabe que não o aceitam em todos os lugares, sei que isto é cruel. Aceite meu conselho peça demissão e vá embora do Grupo Escoteiro. Vamos evitar rusgas e processos inúteis.

Diogo foi para casa com a alma ferida. Ele sabia quem era e o que pensavam dele. Chorou no ônibus, e a tristeza o invadiu por muito tempo. Pediu demissão de um cargo que não tinha e saiu do Grupo Escoteiro Ventos do Norte. Ficava aos sábados sonhando com seu passado Escoteiro que para dizer a verdade nunca existiu e nunca iria existir. Ele sabia que as nuvens das tristezas são como o vento. Quando elas desaparecem o dia fica mais lindo. Pensava em enfrentar os maledicentes, dizer que eles não eram os donos da verdade. Falava para si mesmo que nunca devia deixar de fazer algo de bom que seu coração pede. Se isto acontecer o tempo poderá passar e as oportunidades também.

Quando naquela tarde Jonny Vampuso entrou na loja com sua noiva para comprar um vestido ele pensou em não atendê-lo. Afinal ele sabia que o dedo duro foi ele. Porque fizera isto? Ele nunca lhe tinha feito nenhum mal. Ele sabia que seu coração não podia odiar. O atendeu até melhor que muitos que ali estiveram. A noiva de Jonny Vampuso se encantou com Diogo. Na saída Jonny Vampuso num impulso de bom Escoteiro foi até ele e lhe pediu desculpas. Diogo pensou consigo se aceitaria seu pedido. Ainda tinha uma mágoa guardada em seu peito. Sabia que Jonny Vampuso errara e não lhe negaria o perdão. Pensou mesmo em não apertar sua mão. Mas quando viu que ele lhe dera a esquerda, aquela que dizem ser do coração ele aceitou. Quando Jonny Vampuso foi embora as lagrimas desceram novamente.

A vida escoteira de Diogo encerrou ali. Naquele mesmo dia dois menores entraram para roubar e deram um tiro certeiro em Diogo. Morreu na hora. A sociedade em peso tristonha, mas não participativa não foram as suas exéquias. As Madames que ele sempre atendia com presteza e que sempre o trataram como um cão fiel também não foram. Ele sabia o que as madames queriam. Ele sempre elogiava dizendo: Eu posso reconhecer a senhora entre mil. Os seus passos têm a magia das grandes senhoras. A sua voz Madame é o sinal maior do meu momento feliz e às vezes Madame não precisam nem falar eu sei o que quer!

Eu fui ao enterro de Diogo. Simples. Nenhuma Madame presente. A sociedade não perdoa bajulação sem motivo. Escoteiros? Uns cinco lobos e a Akelá chorosa. Doutor Janilson apareceu para dizer olá e se foi. Jonny Vampuso também apareceu e ficou pouco tempo. Quando a terra sagrada o cobriu avistei uma senhora magrinha, vestida simplesmente, com um menino nos braços e em uma das mãos uma menina de uns oitos anos chorando. Não tendo mais ninguém lá elas se aproximaram da última morada de Diego. Fiquei curioso. Aproximei-me. – Vocês o conheciam? – A menina chorando e soluçando disse – Era meu pai! A Senhora me contou que era sua esposa. Ele fez um trato com ela quando casaram. Tenho meu amor que fingir o que não sou. Meu trabalho me obriga. A sociedade que eu atendo sente-se satisfeita com minha voz, meus trejeitos e sabe, um dia vamos embora daqui.

- Que vida, pensei. O acusaram de ser o que não era. Mas de quem seria a culpa? Dele? Dos que viveram a sua volta? Ou dos preconceitos que norteiam uma sociedade que não aceita os direitos dos que se acham possuídos dele? Que os anjos estejam com você Diogo. Para sempre!

segunda-feira, 20 de abril de 2020

Lendas escoteiras inesquecíveis. Não é proibido chorar.


Lendas escoteiras inesquecíveis.
Não é proibido chorar.

Obs. Baseado no meu conto o Ultimo por do sol, fiz um resumo da história de Waldo, meu escoteiro, que o câncer pegou de jeito e ele já nos seus últimos dias com aquele espírito indolente me pediu para ir ao seu último acampamento. Sonhava levar para o céu a visão incrível do ultimo por do sol nas Escarpas Cintilantes. Estava no programa da Tropa. Seus pais relutaram, e eu insisti que fosse. Não poderia negar. No segundo dia de campo vi que ele quase não participava das atividades, mas ajudava na cozinha e capengando buscava água na nascente do Rio das Flores. Fez uma bela cadeira. Sentava e fechava os olhos. Seus lábios entreabertos pareciam sorrir. No penúltimo dia vi que ele respirava com dificuldade. – Waldo, eu vou levá-lo para sua casa. – Chefe nem pensar. Me leve agora até as Escarpas Cintilantes. Meu tempo está se esvaindo. – Chefe! Será meu último por do sol! Danado de menino, meu coração sangrava e uma vontade enorme de chorar.

Fui sozinho com ele. Em principio foi andando depois o vi fraquejar. O coloquei no colo. Uma palha de tão magro. Em menos de meia hora chegamos. Sentei junto com ele na barranca que dava para todo o Vale dos Sinos. Um espetáculo a parte. Deviam ser umas cinco e meia da tarde. Chefe eu posso fazer meu último pedido? Claro meu jovem irmão escoteiro. E ele com a respiração difícil falando com dificuldade me disse: “Quando eu estiver ido para a terra dos meus ancestrais no campo santo, eu não quero que cantem a canção da despedida. Cantem todas aquelas alegres que sempre cantávamos, para que eu tenha boas lembranças”. O sol foi aos poucos se escondendo atrás das montanhas do Grilo Feliz. Waldo sorria. Não tirava os olhos. Eu engasgado. Danação! Eu não era como ele. Estava difícil aguentar. Queria chorar e não podia. Não podia chorar naquele instante. Não podia! Eu sabia que eram seus últimos momentos. Waldo me olhou. Piscou os olhos e me disse – Chefe foi a maior alegria que já tive. Vou levar para sempre esta lembrança comigo. Obrigado Chefe. Obrigado. E no seu último suspiro me deu um Sempre Alerta. Foi aos poucos deitando no meu colo. Esticou suas perninhas secas. Waldo morreu sorrindo no meu colo naquele anoitecer frio de junho ali no seu sonho... As Escarpas Cintilantes. Ficou imóvel como se estivesse dormindo.

Fiquei estático tremulo e chorando por muito tempo abraçado ao corpo de Waldo. Alguém bateu no meu ombro. Olhei e não vi ninguém. Lá onde o sol se pôs vi uma nuvem branca brilhante que logo desapareceu. Desci as escarpas com ele no colo. Uma eternidade até chegar ao acampamento. Uma dor profunda. Toda a tropa chorava. Voltei para a cidade. Não chorava mais. Meu coração estava partido. Minha vontade não era minha. Naquele momento achei que eu também tinha morrido com o Waldo. No dia seguinte estávamos todos na sua exéquias. Cantamos ao som de um violão maravilhosamente dedilhando pela Escoteira Martinha o Stoldola, Avante Escoteiro, A árvore da Montanha, Lá ao longe muito distante e tantas outras. Todos cantavam com vigor escoteiro. Muitos choravam. Eu também. Não dava para segurar. Os anos passaram. Nunca me esqueci de Waldo. Nunca me apareceu em sonhos. Nunca falou comigo em espírito. Deve estar feliz, muito feliz em Capella, a terra dos seus ancestrais.

domingo, 19 de abril de 2020

Lendas escoteiras. Vida e morte de Arkansas Chamorro.




Lendas escoteiras.
Vida e morte de Arkansas Chamorro.

... - Quem foi Arkansas Chamorro? Dizem que foi o maior marginal de Alto da Serra, outros dizem que se redimiu e se tornou um dos maiores Escoteiro do Brasil. Eu que não acredito em fadas sei que sua história tem muita fantasia. Dele só quero distância mesmo que seja o maior arrependido do mundo!

                   Ninguém pode fazer nada. Ele escolheu seu caminho. Uns dizem que foi o destino outros que foi uma escolha pessoal. Aconselhamentos, castigos, e brigas homéricas nunca adiantaram. Chamorro sempre foi assim. Desde que começou a andar. Se dissessem que foi mal criado não era verdade. O pai de Chamorro era um verdadeiro Diplomata, não na formação acadêmica, mas no trato com as pessoas. Ninguém na repartição poderia dizer nada contra ele. Era bem quisto, amado e ali qualquer um daria a vida por ele. Dona Ana sua mãe era de uma humildade sem par. Sorria para todo mundo, uma das forças nas filhas de Maria da Igreja do Bom Pastor. O Padre Nilton agradecia sempre a Deus por ela estar por perto. Resolvia tudo. Se tivesse de pedir pedia, se tivesse de varrer varria. Não era uma beata não, era uma senhora que todos admiravam e servia de exemplo para as moçoilas do lugar.

                     Chamorro era filho único. Cala-te boca, eu dizia para mim, mas ele devia ter morrido quando nasceu dentro da carroça do Senhor Lourival. Ela começou a passar mal e não aguentava andar. Prestativo o Senhor Lourival a levou a Maternidade Santa Rita aonde ela deu a luz. Um parto simples, um menino bonito, não chorou e sorriu ao nascer. Ate os dois anos ninguém previa o que Chamorro um dia viria a ser. Ninguém sabe como, mas um dia ele soltou um rojão debaixo da Saia de Dona Mercês sua professora. Suas partes íntimas ficaram de fazer dó. Durante um ano não cumpriu suas obrigações como mestra na Escola José de Alencar. Culpar Chamorro? Ora ele tinha quatro anos. Ouviu a preleção dos seus pais, de outros mestres e até do delegado. Mas e daí? Seria que entendia o que diziam? – Quem botou fogo na delegacia? Quem deu um tiro no trazeiro do Seu Tiago da Farmácia? Quem aos sete anos assaltou o banco Ipojucan na luz do dia? – Devia ficar preso isto sim dizia toda a comunidade de Alto da Serra.

                  Apareceu como não quer nada na sede do Grupo Escoteiro naquele sábado chuvoso. – Disse para o Chefe: Este é o melhor dia. Capim escorregando, todos molhados e eu fazendo das minhas. E ria! – Não dá Chamorro, preciso conversar com sua mãe e seu pai. Depois vamos ver se posso aceitar você aqui. – Chamorro olhou de alto a baixo o Chefe Miltinho. – riu e como riu depois que foi embora. - Escoteirada! Gritou. A hora e a vez de vocês vão chegar. E chegou. Da pior maneira. Quando apagaram o fogo da sede não restou mais nada. A meninada chorava. Tudo perdido. Quem foi? Ninguém viu, mas todos sabiam que era Arkansas Chamorro. Cutelo e Bate Volta dois seniores da Cruzeiro do Sul não engoliram tudo aquilo. – Cutelo, este menino precisa de uma lição não acha? Bate Volta balançou a cabeça. Diziam que ele era mudo, não era só não gostava de falar.  

                   Derem nele uma surra de fazer dó. Seniores agindo assim? Sei não. Eu mesmo tive vontade muitas vezes de esganá-lo. Chamorro sabia quem era Cutelo e Bate Volta. Não contou a ninguém os hematomas e os olhos sarnentos com que ficou vários dias. Seu pai preferiu não fazer o BO. - Para que? Chamorro não iria dizer e o delegado quem sabe daria uma medalha. A sede foi reconstruída. A cidade colaborou com a compra dos materiais. – Sorridentes os Cucus partiram para um acampamento de dois dias no Vale do Eco. No dia seguinte voltaram sem nada, pelados e correndo pela principal avenida da cidade. Entraram na delegacia e o delegado saiu na porta vermelho e com um chicote na mão. – Desta vez em mato aquele menino! Matou nada. Arkansas Chamorro sumiu da cidade por três meses. Onde estava? Seus pais choravam e a cidade aplaudia.

                    Chefe Miltinho reuniu o Conselho de Chefes – Não podemos continuar assim. Vamos coloca-lo no grupo. Em uma patrulha. Pode ser a de Sansão. Ele é forte e dominador. Se não fizermos isto ele destrói o escotismo no sertão. Não foi preciso. Ele aceitou o pedido e disse que iria ser o monitor. Até que iam aceitar quando Francesca disse não. Olhou para Chamorro e com sua vozinha meiga e amorosa disse para ele que teria de lutar pelo seu lugar. Outros estavam à frente. Arkansas Chamorro tremeu. Olhou para Francesca, seu coração disparou. Uma paixão enorme em um menino de 13 anos. Não deu outra. Um mês depois Francesca e Chamorro desapareceram de Alto da Serra. A mãe de Francesca desesperada. A mãe de Chamorro não dizia nada. Um ano depois Francesca chegou retornou a cidade com uma criança nos braços. – E Chamorro? – Não sei falou chorosa. Dizem que ele agora é o dono da quadrilha de pivetes de Alta Floresta. É a cidade ficou em festa o diabo mudou de lugar.

                         Cinco anos depois os jornais estamparam em manchetes: - Chefe Escoteiro retorna a sua cidade natal. Alto da Serra tremeu. Nunca pensou que ele iria voltar. Chefe Escoteiro? De onde? Quem o aceitou? Chamorro chegou montado em um baio de pelagem branca impoluto como sempre. Chapelão, faca e facão. Sorria, parou em frente ao Grupo Escoteiro. Ninguém sorria com sua presença. Estavam admirados por ele estar assim fardado. Chefe Miltinho levantou a mão e disse: - Chamorro volte para onde veio. Aqui não é seu lugar. Procure Francesca, coitada luta com dificuldade para criar um filho que é também seu. – Chamorro parou de sorrir, foi até ao Chefe Miltinho, ajoelhou e pediu perdão. – Chefe estive preso, sofri e aprendi. Mesmo nunca tendo me dedicado como um bom Escoteiro a lei ainda vive em mim. – Levantou montou em seu cavalo e saiu devagar sem rumo definido.

                        Cada coisa tem o seu tempo certo para acontecer, Chamorro mudou, hoje é um homem honesto, trabalha em sua olaria e Durval seu filho ama seu pai. Francesca linda mostrava ser a Chefe mais feliz do mundo. Dizem que as semanas andam e os anos voam. O destino ninguém sabe e a vida é para ser vivida. Pois pensar positivo, ajuda e só Deus sabe o que é melhor pra nós. Enfim tudo aquilo que tem que ser será...


sábado, 18 de abril de 2020

Sem crônicas, sem lendas, sem nada... Hoje não têm Crônicas e nem historias...




Sem crônicas, sem lendas, sem nada...
Hoje não têm Crônicas e nem historias...

- Não tem. Ando meio desencantado com minhas escritas. Resolvi fazer um recesso. Dar um tempo. Contei historias demais. Hoje escrevi uma historia e depois um artigo. Não gostei. Apaguei do meu pensamento, é nele que configuro as personagens e vivencias da história. Os temas não foram do meu interesse e não seria de ninguém que me segue nas mágicas páginas onde costumo escrever. Era sobre um Escoteiro que cantava para espantar a tristeza. Ele amava sua barraca, as noites mal dormidas, nas trilhas esquecidas e o céu estrelado com lua cheia a brilhar. Ele não tinha Chefe, não tinha Patrulha não tinha registro e nem sabia o que era a palavra união. Muitos perguntavam quem era ele e ele mesmo não sabia quem era. Dizia que poderia ser uma sombra, uma figura geométrica, um ser inanimado nas histórias escoteiras do Brasil.

- Desculpem... Sem querer comecei a contar uma história... Seria uma boa história? Acho que não. Prefiro não contar e me silenciar. – Mas deixem-me explicar... Houve um tempo que ele leu e estudou muito o Sistema da Formação Escoteira. Saia pelas florestas procurava uma boa aguada, fazia sozinho um fogão tropeiro, montava seu toldo de folhas verdes, um lenheiro e cozinhava para sí um belo jantar. E quando a noite chegava, ele olhava para o céu estrelado, pensava que poderia pegar uma carona em algum cometa viajado e sair por aí soltando poeiras coloridas no ar... Era um escoteiro danado, pegado nas trilhas do nosso país. Mas um dia cresceu, virou homem, continuou fazendo viagens “Escoteiras” e disse para si próprio que ainda não tinha encontrado o seu próprio “eu”.

- Nossa! Será que estou contando uma história, um relato, um artigo? Sei que não é. Pensando bem contar para quem? Quem se interessa pelo Escoteiro que cantava para espantar sua tristeza? Que saia pelos campos floridos, nos montes e horizontes, a escalar montanhas para acender uma fogueira e deixar as fagulhas subirem ao céu e irem procurar outros escoteiros moradores das estrelas... Pensava que o vento açoitava suas noites sem luar. Confuso pensava que sua fogueira poderia iluminar o mundo, fogueira faceira metida a escoteira, daquelas que soltavam fagulhas vermelhas no ar, que brincavam de pique esconde, a esconder dos pirilampos que acendiam suas lanternas querendo brilhar...

- Melhor ir parando a história no meio do caminho. Hoje não vou contar... Quem vai se interessar? Disseram para ele que havia no meio do caminho uma história... Uma história na beira do caminho! Travesso um façanhudo de Calças Curtas e Chapelão ele pensava que era um apaixonado escoteiro que gostava de cantar. Costumava cantar em Si-bemol, tocava uma harmônica e tocava um violão. Em qualquer trilha solfejava descansando na sombra de um arvoredo para o sol não o pegar. Gostava de colocar sua mochila e sair por aí cantarolando nas trilhas do faz de conta, pensando em encontrar Fernão Dias Paes, o bandeirante, aquele que adentrou pelas terras brasileiras a procura de esmeraldas... E se perdeu em uma montanha sem nada encontrar... Ele iria encontrar a sua? Uma linda e formosa Esmeralda tão verde como as matas do seu Brasil?

- Não, hoje não vou contar histórias. São tantas que nem sei quais são as verdadeiras, as vividas, as nunca esquecidas, as sonhadas, as que deixaram cicatrizes no vai e vem da vida ou as tiradas da imaginação. Nem vou dizer que o Escoteiro cantador adorava ouvir o som da floresta, ouvir a voz do vento, das estrelas e do firmamento, adorava os trovões das tempestades, ou de um raio brilhante no céu. E ao amanhecer de um novo dia ele sorria ao ver um belo dia de sol. Gostava de ver a passarada acordar nas madrugadas. Amava as noites escuras estreladas para ouvir a Cotovia e o Uirapuru quando saiam para fazer duetos para os insetos... Era como a audição do mateiro escoteiro ouvindo o doce chilrear de um sabiá laranjeira, o curió, “Deus Meu”! Era lindo demais. 

- Se fosse ontem, eu estaria preparado para criar uma bela história, falar da fraternidade, da humildade da Lei, da Promessa encantada dita com amor num cerimonial qualquer... Da bandeira, da Caverna, do Pico do Itacolomi. Mas hoje? Minha mente não sabe contar uma história. Hoje não. Não daquele Escoteiro que foi amigo do Lobo Cinzento, do Beija Flor farofeiro nas matas do Azulão. Ele era um amigo da floresta, dos pássaros, dos animais e tinha até uma dúzia de borboletas coloridas de estimação. Nunca esqueceu o dia que fez uma amizade perpétua com uma coruja de olhos verdes, se apaixonaram e até hoje fica tristonho ao lembrar que nunca mais a viu. Ela sumiu nas matas do meu Brasil.

- Cutuco meus dedos... Reclamam do tique taque das batidas estridentes nas teclas invisíveis, daquela máquina esquecida, que ficou no tempo e hoje foi substituída pela modernidade. Estou triste... Não vou contar uma história. Não insista, por favor... Não vou falar do Escoteiro que no Vale dos Esquecidos, sozinho, hasteou a Bandeira Nacional, em posição de sentido fez sua promessa: - Senhor Baden-Powell, meu mentor... Eu prometo ser fiel a Deus e a minha Pátria. Cumprirei meus deveres para com sua bela filosofia e juro pela minha honra que serei um Escoteiro alegre sorridente nas dificuldades, que ajudarei o próximo em qualquer ocasião, que serei leal e puro nos meus pensamentos nas minhas palavras e nas minhas ações.

- Pisco de banda... Não posso hoje contar uma história. Para que? Dizer que aquele escoteiro não tinha inscrição no topo da pirâmide do seu país, pois ele nunca quis e preferia ser dono do seu próprio nariz! Dizia ser irmão de todos, que iria cumprir sua lei por toda sua vida. Disse ao Seu Deus que a vida passa e que as histórias ficam no tempo e nunca mudam de lugar... - Eu queria contar uma historia e me perdi no tempo, me perdi na memória e não sabia ir e nem aonde chegar... É... Eu queria contar uma história... Quem sabe você conta uma para mim?

Uma linda noite meu irmão de ideal. Desculpe mas desta vez não tem história!
Boa noite.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

Pequenos contos. O destino de uma linda árvore frondosa que amei.




Pequenos contos.
O destino de uma linda árvore frondosa que amei.

Eu a descobri por acaso. Não mais que a um quilômetro da minha residência. No final da Rua dos Afonsos. Nada que uma pequena caminhada para chegar até ela. Vi que era uma linda figueira. Enorme, Copada, uma sombra incrível produzia. Estava no meio do nada. Um matagal no final de rua. Apaixonei-me por ela. Durante três dias limpei o mato e o lixo em volta de sua sombra. Ali a gente se escondia. Pensei em plantar gramas e flores. Até que plantei uns chapéus de couro, lírios, flor de laranjeira, crista de galo e todas se deram bem. Era meu cantinho. As tardes pegava um livro, jogava nas costas uma cadeira de praia e lá ia eu. Sentava-me refastelava, sem nenhum barulho e viajava em meu livro nas paginas que me levavam a terras longínquas de um mundo fantástico. Li uma dezena de livros acobertados por aquela arvore que passei a amar. Minha bela vida de tardes sombreadas durou pouco. Um ano depois quando lá cheguei encontrei uns homens da prefeitura. Faziam medidas aqui e ali. – Oi! O que é isto? Perguntei. - A nova avenida. Isto aqui vai ficar mais agradável. Muitos carros, ônibus, novas casas você vai gostar! Olhei para ele. Coitado. Não sabia que a civilização não trás a felicidade. E minha árvore? Perguntei. Vai ser cortada. Ela fica bem no meio da avenida. – O que posso fazer para vocês deixarem ela viva? – Nada meu amigo. Nada. Demorou seis meses. Vi com tristeza em uma manhã de segunda, caminhões, tratores a caminho do meu sonho das tardes assombreadas. Minha árvore ia partir. Ainda bem que estou "Velho". Logo, logo também irei partir. A natureza não é mais a mesma. Não há respeito. Ela é jogada como lixo em todos os lugares. Voltei para minha varanda. Ainda tinha meu canto. Mas que saudades da minha linda árvore que um dia amei e achei que ia durar para sempre!

quinta-feira, 16 de abril de 2020

Lendas escoteiras. Desafio de bravos.




Lendas escoteiras.
Desafio de bravos.

... - Desafios existem e para os escoteiros são aceitos com um sorriso. Fugir? Correr? Desistir? Não faz parte do abecedário Escoteiro. Conheci muitos iguais a “Castelhano”, vi também valentes correndo com medo de um cabritinho que disseram ser uma onça pintada. Mas correr vale sim, desde que uma hora se canse e resolva voltar.  Batalhas são assim, hoje se perde uma amanhã se ganhas duas. E lembre-se, escoteiro não desiste! Insiste até vencer a jornada.

               Castelhano estava injuriado. Seis da tarde e nenhum menino para desafiar. Ele gostava. Adorava uma briga, sem arma só com os dentes e os braços. Todo dia uma acontecia e batendo ou apanhado ele se sentia realizado. Perdeu a conta dos pais que reclamavam com sua Avó. Vó! Tá no meu sangue! Puxei meu pai! – Puxou nada moleque. Voce não conheceu e nem sabe quem foi seu pai. Ele não sabia mesmo. Ouviu Zé Bigode na Barbearia dizer que ele morreu de morte matada enfrentando o Capitão Lourenço da polícia de captura. Resolveu cortar caminho. Entrou no Beco da “Catinga”. Do outro lado sua rua, sua casa. Sorriu ao ver Pequeno Polegar a sua frente. Um Escoteirinho de nada pequeno menor que um mosquito treteiro. Dava dó bater no coitado. Mas aquele sorriso, aquele uniforme aquele lenço e o chapelão seria um desafio. Sempre pensou em dar uma surra em um escoteiro. Aquele estava no papo!

              Arregaçou as mangas da camisa, preparou seu primeiro “sem dó” um na nuca e outro na testa e o Escoteirinho iria se esparrar no chão. Não viu Patativa e Lamartine as suas costas. Tinha mais. Eram quatro seniores que também resolveram passar pelo beco. Sentiu o hálito de Lamparina sorrindo e dizendo: Bater no Escoteirinho? Seja homem, bata em homem como nós. Castelhano não tinha medo, sabia que a barra pesou. Tentou seguir em frente e não conseguiu. - “Uai” você não é o valentão da cidade? Castelhano não respondeu. – Porque em vez de brigar não aceita um desafio nosso? – Eu? Desafio? Qual? – Entre nos escoteiros, fique três meses, se aguentar será mesmo um valentão, bater nos outros não é sina de valente é sina de covarde sem respeito. – Castelhano sentiu o sangue ferver. Seria a sina de seu pai?

               - Ouviu a voz de Mostarda, seu vizinho e escoteiro. – Vá lá! No sábado as duas. Se não aparecer iremos dizer a todos que grande “porcaria e covarde” é você! – “Eita danação”. Castelhano pensou e pensou. - Aceitar o desafio? Nunca foi com a fuça dos escoteiros. Sempre sonhou dar uma surra em um fardado. Seu plano seria adiado. Não iria correr. Ele não era disso. No sábado se aprontou, calçou seu Vulcabrás, cortou um pedaço de pau de goiabeira. Eles usavam sempre um a tiracolo. Duas em ponto entrou no pátio. Surpresa! Bateram palma para ele! Se sentiu um estranho no ninho. Ficou na Patrulha Águia. Seria o sexto antes do segundo que era o último. Que danação, não entendia nada! Correu, brincou, ensinaram a ele a arte dos nós, do evasão, do fateixa, do Aselha, frade e do Zangão, nó até bonito para fazer. Disseram a ele que na Sexta iriam subir no Pico da Cachaça. Deram o nome, pois descobriram um alambique logo na subida do Boi Zebu. Nunca tinha ido lá. Seria interessante conhecer.

               Nossa! Estava pregado! Ia pedir prá parar, sede, cansaço jurou que ali nunca mais iria voltar. Pedregulho com um sorriso maroto olhou para ele. - Tá difícil? – Não disse nada. Desafio é assim ou você começa e desiste ou vai até o fim. Quando voltaram passou um dia e uma noite de cama. Mas pensando bem até que não foi tão ruim. Pior foi o tal acampamento. As mãos voltaram em pandarecos. As tais pioneirías matavam qualquer um. Cortar madeira, furar buraco... Poxa não era Tatu! Só foram dormir às onze da noite. Escuro feito breu. Olhava as árvores e pensava que eram monstros prontos para o devorar. Pela primeira vez sentiu medo. Deram a ele a primeira fornada da sentinela noturna. Tremeu, um foguito, um café, um lampião um facão e mais nada. Ali deveria era estar com um Colt 45 daqueles que o Capitão Justino usava. Gostou da noite da fogueira, até chorou quando cantaram que não era mais que um breve adeus. Logo ele, o machão!

             Passaram três meses. Na bandeira ele foi chamado. Chefe Tutano perguntou: - E aí Castelhano, fica ou não fica? Ele sorriu. – Chefe, mudei de vida. Nunca fui covarde e medo não estava nos meus planos. Mas se deixar serei escoteiro por toda vida! – A tropa gritou: - “Urra, urra”, que o valente agora é um sorridente escoteiro!  Castelhano foi chamado a “promessar”. Se sentiu realizado com seu chapelão e seu lenço cor de anil.

              Outro dia subindo a Rua Dos Doutores vi descendo de um carro militar alguém que conhecia nada mais nada menos que Castelhano. Bati continência e ele orgulhosamente respondeu: - Vado Escoteiro, que bom vê-lo! Já era Tenente Brigadeiro da Força Aérea Brasileira. Era uma patente imediatamente superior à de Major-brigadeiro. Me contou prosas, me disse coisas, no final sorriu ficou em posição de sentido e repetiu: - Ser escoteiro Vado foi a melhor coisa que me aconteceu desde minha promoção a Tenente do meu Brasil!    

Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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