domingo, 22 de março de 2020

Lendas Escoteiras. Era uma vez... Um chapéu Escoteiro para Cimarron.



Lendas Escoteiras.
Era uma vez... Um chapéu Escoteiro para Cimarron.
(Qualquer semelhança com escoteiros vivos ou mortos não é mera coincidência).

- Eu tenho minhas historias preferidas. “Um chapéu Escoteiro para Cimarron” é uma feliz lembrança de historias Escoteiras nunca esquecidas. Vemos na história o verdadeiro Espírito de Patrulha, a Lei Escoteira e a Promessa vivenciada no Espírito Escoteiro. Uma das dez melhores que escrevi. Obrigado.

- A noite chegou e nos pegou de pronto no Pontilhão da Estrada de Ferro Vitória Minas. Passava da meia noite. Só Lilico sabia ver as horas nas noites escuras. Lilico era nosso mestre em orientação, sabia tudo das coordenadas do sol, da lua e das estrelas. Ficamos na entrada do Pontilhão a quem apelidamos de “esfola Escoteiro”. Tocaiávamos a passagem do próximo trem de minério e permanecíamos em vigília. Sabiamos que a qualquer momento o comboio de centenas vagões carregados de pó de minério com suas quatro locomotivas iria passar. O pontilhão era enorme, quase um quilômetro sobre o Rio Doce. Tininho olhou para Noka o Monitor. – Acho que vamos atrasar... – É... Respondeu Noka. Nosso Monitor falava pouco. Mas entendíamos sempre o que ele queria dizer.

Lilico dormitava despreocupado. Era quem nos alertaria sobre a chegada do comboio. Parecia que ao dormir se esquecia de suas obrigações. Não foi a primeira vez que atravessariam o Pontilhão da estrada de ferro. Se estivessem no meio do caminho e a buzina tocasse, adeus. Não tinha como fugir ou escapar do comboio, seria morte certa e para se salvar teríamos que pular nas águas do Rio Doce e perder tudo que tínhamos. Toliar um marreta sinaleiro sorria brincando com seu cabo trançado nas mãos. Sempre a fazer um ou outro nó. Era bom nisto. Diziam que fazia de olhos fechados mais de 50 nós escoteiros e marinheiro. Délio Abelha dormia. Sabiam que teriam de enfrentar muita coisa pela frente. Não era um marinheiro de primeira viagem. Pertencia a uma Patrulha de experimentados escoteiros. Todos sabiam o que fazer.

Lilico de olhos cemi-cerrados e com ouvidos atentos olhava a curva ao longe onde despontaria o comboio cujo barulho iria assustar os mais novos. Ainda bem que ali só tinha bons mateiros. Colocou os ouvidos no trilho. Está chegando gritou! A patrulha se levantou. Cada um pegou sua biscicleta e suas tralhas. Agora era esperar o comboio passar. Não tinham medo. Quem sabe seria Nonô o maquinista ou Zé Traíra que um dia foi sênior da Patrulha Resplendor. Ninguém contava os vagões. Quantas vezes contaram? Parecia quando Délio Abelha ficava em volta do fogo olhando para o céu contando estrelas... Uma duas, três e ele sorria dizendo que eram mais de milhão! Ficaram quase meia hora esperando o comboio passar. Cinco locomotivas a diesel arrastando o comboio de centenas de vagões que visto do alto do Pico do Ibituruna parecia uma serpente correndo na beira do rio. Diziam que era o maior trem do mundo. Quase três quilômetros de extensão. 40.000 toneladas de minério gemendo nos trilhos daquela ferrovia infernal.

Viram o farol forte do comboio jorrando facho de luz até onde estavam quando apareceu na curva do Maribondo. Potente! Iluminava tudo. O maquinista e o seu ajudante sorriram para eles quando puxavam a potente buzina. A patrulha sorriu. Délio Abelha sabia que todos sonhavam um dia estar ali, naquelas máquinas infernais, levando minérios e outros bichos para países do além mar. Quinze minutos até passar as cinco locomotivas acopladas a centenas de vagões. No ultimo uma vagonete com um lampião vermelho a querosene aceso viram Nonô no cangote final acenando para eles.

Atravessaram o pontilhão com calma sem pressa sabiam que antes do trem chegar a Derribadinha nenhum outro trem iria aparecer. Melhor que arriscar prender uma perna entre os dormentes... Um programa de índio. Do outro lado respiraram aliviados. Noka depois de minutos comentou com a Patrulha: - Acho melhor acampar no campinho de futebol do Arraial do Lagarto. Esta hora todos estão dormindo e sairemos cedo para a Serra do Roncador. Chegaremos lá antes das onze e a escoteirada de Conselheiro Pena já devem estar nos esperando! Deu um suspiro montou e lá foram eles. Meia hora e chegaram ao campinho.

Nada como estar de bem com a vida, com as atividades escoteiras tão conhecidas. Vinte minutos e estavam dormindo nas barracas de duas lonas. Deixaram os chapéus em cima da lona da barraca para apanhar a brisa da manhã e não perder a aba reta. O sol já surgia quando acordaram. Levantaram... Estava na hora de partir. Noka viu que o seu chapéu tinha desaparecido. Os demais estavam como os deixaram. Em volta viram uma turma de meninos e alguns adultos olhando. Eram moradores do Arraial. Noka perguntou se ninguém viu seu chapéu. Um menino gritou: - Foi Cimarron quem levou!

Noka perguntou quem era o Capitão da Cidade. Ele sabia que em qualquer arraial sempre tinha um. – Procure o Madrepérola. Ele já deve ter acordado, pois tem quatro vaquinhas leiteiras. Noka montou em sua bicicleta. Os demais o seguiram. A meninada correndo atrás. O centro nada mais era que um descampado sem grama e empoeirado com umas cem casas de taipa em volta. Uma plaquinha dizia – Casa do Capitão. Bateram palmas e a meninada riu. – Vá por trás. Ele está tirando leite da vacada! Os Escoteiros da Morcego não estavam rindo. Sabiam do valor do chapéu Escoteiro e como era difícil adquirir um. Viram o capitão abaixado tirando leite. Noka explicou com poucas palavras. De novo? Respondeu o Capitão. – Cimarron vai aprender. Eu mesmo vou lhe dar uma lição!

Madrepérola foi junto com os Escoteiros a casa de Cimarron. Sua mãe estava à porta com o chapéu de Noka. – Onde ele está dona Efigênia? No quarto Capitão. Não sei mais o que fazer com esse menino, ela disse. – Chame-o! Cimarron apareceu na porta chorando. – Conheço seu choro, disse o Capitão. A meninada gritava: Prende ele Capitão! Tudo para eles era uma festa. No arraial nada acontecia. Noka pegou seu chapéu. Olhou para Cimarron. Nunca tinha visto menino tão magro e de olhos caídos com uma tristeza que fazia dó! – Cimarron chorava. Soluçando disse que sonhava ser um Escoteiro. Viu uma foto na capa do seu caderno Avante!  Sabia que nunca seria um no Arraial. Mal tinha a escola para estudar. Noka se compadeceu. Chamou Délio Abelha e pediu para arvorar a bandeira nacional. Feito pegou na mão de Cimarron. Venha menino. Você vai ser Escoteiro! – Formaram uma ferradura pequena. O povo do arraial apalermado sem saber o que ia acontecer. – A bandeira em saudação! Gritou Noka. Pegou na mão de Cimarron ensinando. Firme! Descansar!

A patrulha ficou de sentido. Noka pediu para Cimarron levantar a mão direita. Ensinou a meia saudação Escoteira. – Repita comigo Cimarron! – Prometo, pela minha honra, fazer o melhor possivel para: - Cumprir meu dever para com Deus e minha Pátria, ajudar o proximo em toda e qualquer ocasião e obedecer à lei do Escoteiro! Sabe Cimarron, um Escoteiro não mente, um Escoteiro é leal, um Escoteiro respeita o que é do próximo. Agora você é um Escoteiro. Noka tirou seu lenço e o colocou em Cimarron. Depois pegou seu chapéu e o colocou em sua cabeça. Cimarron chorava, e como chorava. O povo entusiasmado batia palmas. – Alguém gritou! – Viva Cimarron um Escoteiro do Brasil! – Os patrulheiros o abraçaram. Arriaram a bandeira. Pegaram suas bicicletas e partiram. Muitos meninos ainda correndo atrás.

Pararam na subida da Onça Pintada. Noka desceu da bicicleta e olhou para trás, viu Cimarron na porta de sua casa chorando e gritando para eles: - Obrigado escoteiros! Foi o dia mais lindo da minha vida... E chorava, e chorava... Obrigado. Prometo ser um escoteiro de valor. Prometo que vão se orgulhar de mim. A patrulha montou em suas bicicletas e partiram na estrada que os levaria ao seu destino. Antes da curva da Coruja ainda ouviram ao longe a voz de Cimarron – Voltem um dia escoteiros, somos agora irmãos. Adeus amigos, adeus! Voltem um dia! Vão encontrar um Escoteiro Leal e amante da paz!

                      Ninguém disse mais nada. Cada patrulheiro sabia o Monitor que tinham. Um orgulho em pertencer àquela patrulha. Se Cimarron ia mudar ou não, era sua escolha. Uma boa ação foi feita. A patrulha virou a curva do morro da Coruja. Sumiram na estrada que os levaria ao seu destino. Eles acreditavam que Cimarron cumpriria sua promessa. Sabiam que ele aprendeu a raça, a cortesia, o respeito e a fraternidade de um escoteiro. Na descida da estrada do Cantador, imaginavam que deixaram para trás um Escoteiro sem tropa, sem patrulha, mas com um imenso amor para dar!

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