segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

OS CINCO MAGNÍFICOS - A MONTANHA DOS SETE DESEJOS


AS LEGENDÁRIAS LENDAS ESCOTEIRAS

(Quinzenalmente ou mensalmente, iremos publicar contos na linha do imaginário. o titulo acima servirá para mostrar que o acontecimento é obra de ficção, mas não avalizo que possa ter alguma verdade. Você decide)

Os cinco Magníficos

(Os cinco Magníficos são seniores da patrulha Aconcágua, do 568º Grupo Escoteiro Pico da Neblina. Rotineiramente estarão aqui contando suas epopéias divertidas e aventureiras. Muitas já vividas pelos nossos magníficos seniores de todo o pais. Sejam bem-vindos a patrulha Aconcágua e os cinco Magníficos).

Historia de hoje: A montanha dos sete desejos

“Há quem passe pelo bosque e só veja lenha para fogueira” Esta frase é tão
verdadeira quanto bela.
Mas, com certeza, muitos ao passarem pelo bosque da vida
viram muito mais do que apenas lenha para fogueira.

Capitulo I

          As patrulhas escoteiras estavam em desabalada carreira morro abaixo. Fiquei preocupado, pois alguém poderia escorregar e o tombo seria desastroso. Lembrei das palavras de um homem famoso do passado em que dizia que os jovens devem jogar, e se possível com desafios e sem muitos padrões e que sejam jogos fortes, pois só assim poderiam um dia saber enfrentar as adversidades da vida. Não sei se concordava muito com isso.

          Era um jogo simples. Cada patrulha fez uma espécie de trenó (também designado por tobogã, usado para transporte sobre o gelo, é um veículo sem rodas construído com estreitas e longas tiras de madeira ou metal). E em duplas desciam um morro íngreme e o qual a chefia já tinha feito uma inspeção para ver se havia pedras e tocos. Algumas alcançavam enormes velocidades. Era uma diversão garantida. A preparação para esse grande jogo começou há meses atrás. Cada patrulha fez o esboço do trenó que iriam construir e tudo deveria ser feito no campo. Algumas desenvolveram ótimos projetos, mas não souberam construir conforme projetaram.

           Durante toda a tarde o jogo foi sendo disputado palmo a palmo. No final ganhou a Pica-pau e um grande troféu foi colocado no totem deles. Lembrei-me do grande explorador Americano, Robert Edwin Peary, que ficou conhecido por ter sido o primeiro homem a atingir o Pólo Norte Geográfico em 1909. Durante anos, a bordo de um Trenó descobriu a costa norte da Groenlandesa ate então nunca navegada. Eu gostava de acompanhar os escoteiros. Tinha pouco tempo e só vivia viajando, pois trabalhava em uma empresa como diretor comercial e toda semana negócios me levavam de norte a sul do país.

            Consegui quinze dias de férias as duras penas. Aproveitei para ficar um pouco com a tropa. Há tempos não fazia isso. E claro, oito dias seriam dedicados a um convite especial. Recebi um telegrama dos Cinco Magníficos e que dizia: - Vamos explorar a Serra da Estrela Negra. Se tivermos sorte chegaremos a Montanha dos sete desejos. Dizem que lá se podem fazer pedidos, no máximo sete e sempre atendidos. Quem sabe vais poder participar de uma das nossas grandes Aventuras?        

           Desta vez eles não me escapariam. Impossível não aceitar. Eu admirava aqueles seniores e passaram-se quase um ano quando os visitei pela ultima vez. Duas grandes aventuras me foram narradas por eles. Minhas dúvidas se verdadeiras ou não eram enormes. A primeira, disseram ter voltado no tempo, na França medieval e passaram peripécias de morte em um castelo. Depois na Mansão do Duende cor de rosa e para salvá-lo tiveram que enfrentar vários desafios perigosos. Eram histórias fantásticas inacreditáveis mesmo.

         Cheguei à cidade onde moravam, numa quarta pela manhã. Eram bons rapazes, educados e prestativos. Veio-me a memória quando os conheci pela primeira vez. Uma tempestade. Eu perdido em um taxi com pneus furados. E ali do nada eles surgiram. Alegres, sorridentes, molhados e cantando a pleno pulmões “Põe tuas magoas bem no fundo do bornal e sorri”. Lembrei-me quando cantava na época que era escoteiro. Sempre nas dificuldades lá estava ela na minha mente. Liguei par o Leo o monitor da patrulha e sua mãe me disse que ele agora estava na capital, pois estava fazendo faculdade. Caramba! Pensei.

           O único telefone que ainda tinha era do Max. Ele atendeu prontamente. Disse que todos estavam a minha espera na casa do Junior. Aluguei um taxi e em menos de dez minutos cheguei. Uma surpresa me esperava. Duas jovens simpáticas estavam com eles. Liv, quinze anos, morena cabelos curtos, um lindo sorriso e Marly, também com quinze anos cabelos castanhos compridos, sorria pouco, mas extremamente simpática. A principio não sabia por que estavam ali. Dei falta do Leo e o Ned. Max me explicou que fizeram dezoito anos e passaram para pioneiros. Leo mudou para a capital e Ned agora namorava firme uma pioneira. Ainda se encontravam, mas esporadicamente.

             Foi o Jan que me apresentou as jovens. Todas com mais de seis anos de escotismo. Passaram para guias e nos pediram para participar da patrulha. Olhe sempre fomos contra moças na patrulha. Mas fizemos um Conselho e chegamos à conclusão que estava na hora de ver se daria certo. Elas estão conosco há seis meses, são Liz de Ouro e vieram de lobinhas. Até agora nada a reclamar – disse o Jan. – Elas sorriram e Liv foi a primeira a falar – Olhe chefe, essa turminha ainda não sabe, mas somos muito melhor que eles – Vamos ver, vamos ver, disse o Junior. A prova será agora. Seis dias, uma subida das boas, se der uma chuva não sei não.

           Fiquei ali pensando como eles agora desenvolveriam seus planos, seus sonhos de Grandes Aventuras, como as que aconteceram no passado. O elemento feminino estava presente e era um grande desafio para aqueles três que tinham uma grande experiência de campo e se safarem sempre com um sorriso nos lábios. – Jan me disse que o Max era agora o monitor. Marly era a sub. Deram risadinhas entre si. As jovens não gostaram e nada disseram.

           Durante mais de uma hora, assisti a uma sessão de nostalgia. Desfiaram melancolicamente a perda dos dois. Leo e Ned. Como sempre Jan o mais palrador era quem mais sentia falta. – Olhe chefe, nossa ultima aventura, foi durante o inverno do ano passado. Foi a despedida. Fomos até a cachoeira das Mil Mortes e lá fizemos um desafio para saltar a queda d’água dentro de um tambor de 200 litros. Acho que não conhece. Um tombo de aproximadamente 25 metros. Queda livre.

          Foi divertido, mas meio sem graça. Muito parado para o meu gosto. – Junior interrompeu dizendo – Não foi lá essas coisas, mas valeu. Ao mergulharmos, o Ned encontrou uma fenda, por sinal bem grande e nos convidou a conhecer. Olhe mais de 30 metros abaixo da cachoeira saímos em uma gruta, onde o sol batia nas águas e deva um brilho amarelado, lindo, formando diversos arcos Iris, brilhante de um fulgor suntuoso, extremamente belo. Um espetáculo. Depois sem ninguém esperar, enormes morcegos começaram a voar em nossa volta. Não nos atacaram, mas não deixavam nos aproximar de uma grande pedra igual a uma cripta, de mármore que estava a menos de 50 metros.

      - Lá vem de novo às historias que só com eles acontecem, pensei. – Logo o Junior interrompeu dizendo que foi fichinha espantar os morcegos. Com um pequeno espelho que sempre carregava no bolso, aproveitando uma nesga de sol, clareou os olhos deles e se esconderam. O Max correu até a pedra de mármore e encontrou em cima dela um manuscrito feito de pedra calcária. Bonito chefe, muito bonito. Estava com lindos desenhos e esculpido com letras tipo Algerian, lindas como fizeram e quem fez eu não sei. - Pensei comigo, só com esses jovens acontecem essas historias improváveis.

       - Como num passe de mágica, o Max foi até uma mesa que estava na varanda onde estávamos, e trouxe o manuscrito. Era verdade. Do jeito que descreveram. As jovens sorriram entre si. Ainda não acreditavam muito nessas historias rocambolesca que eles contavam. Agora achavam que eles podiam ter feito tudo aquilo para impressionar. Mas eram da Patrulha Aconcágua e todos os novatos ali sempre juravam fidelidade e respeito. Não esqueciam a cerimônia que participaram na admissão.

       Liv contou emocionada como foi. Feita a noite, no alto do morro da Carmana, próximo a cidade. A patrulha toda vestida com uma bata negra. Elas também usaram a bata. Foram apresentadas pelo Ned e iniciaram o ritual do Santo Graal, a frente uma mesinha, forrada com a Bandeira da tropa, em cima o cálice sagrado e uma pequena espada de metal. Lembrei-me das Lendas Arturianas, e dos Cavaleiros da Távola Redonda. Elas se aproximaram e Ned gritou alto:
        - Apresento Liv e Marly. Querem ser dos Aconcáguas! – Leo respondeu – Aproximem-se! A patrulha fechou o circulo e todos disseram juntos o juramento da patrulha – “Que todos saibam, hoje e sempre, que prometo por tudo que é sagrado, amar, aceitar e respeitar os meus amigos da patrulha, honrar sua historia, morrer se preciso para que seu nome seja conhecido pela coragem e abnegação. Farei prevalecer à verdade, hoje e sempre! Podem saber que seremos fortes como os touros que habitam o lago azul da vida. Que os ventos do Norte, que os ventos do Sul, que os Ventos do Leste e que os ventos do Oeste tragam a chama da liberdade, da honra e da palavra ao nosso coração.”

         Liv estava emocionada quando contava essa promessa. Em seguida ajoelhamos e todos colocaram uma mascara vermelha, e o Leo colocou a espada na cabeça e nos nossos ombros dizendo – Sejam bem vindas. Agora pertencem a Patrulha Aconcágua. Honrem seu nome por toda a vida! “Vamos beber na fonte dos deuses o sonho que nunca vai terminar, vamos juntos jurar fidelidade e amor entre nós, nada e nem nunca irão separar! – Com o cálice, bebemos essa água sagrada, colhida na fonte dos amigos inseparáveis!

         Realmente marcante essa cerimônia de batismo na patrulha. Fiquei emocionado. Conhecia outros rituais seniores, mas este foi uma surpresa. Nunca tinha visto nada igual. Dei uma olhada no manuscrito. Deduzi que estava escrito em latim. Entendia pouco. O Max me deu a tradução. – Dizia – “Lá, onde o vento sopra forte, onde a Estrela Negra mora, encontrarão a felicidade nos seus sete desejos”. Todos estavam calados. Mas o que deduziram para ir até a Serra da Estrela negra? Onde descobriram que ela existia? Perguntas. Respondida de pronto pelo Jan, o intelectual, o pesquisador da internet.

       - Olhe chefe, minhas pesquisas chegaram até a Serra das Ararás. Descobri que há tempos atrás, talvez mais de 800 anos, os índios Kuripakos, descendentes dos Aruak, do alto Amazonas, moravam próximo ao Rio Vermelho, e sempre iam venerar seu Deus Tupã, que morava no alto da serra dos Ararás e a chamavam naquela época de Estrela Negra. Talvez porque ali sempre foi muito envolto em nevoa e iam sempre lá pedir ao seu Deus, que não deixasse o impiedoso Anhangá destruírem suas plantações seus filhos e suas mulheres. Tinham muito medo de Caramuru e Gundirô.

        - Continuou o Jan – Eles acreditavam que foi Tupã o poderoso, que desceu a terra e fez nascer às flores, os frutos, as grandes florestas, os rios e os mares. Acreditavam que mesmo sendo mortais, Tupã os transformavam em espíritos imortais. E ali, no alto da serra, ajudados por Sumã e por Icatu eles venceriam os deuses do mal. Entre eles nunca haveria o ódio e se alguém os perseguissem seriam atirados nos infernos. – Fiquei impressionado. O relato de Jan tinha um que de verdade.

        - As jovens estavam caladas. Em seus olhos vi o desejo e o brilho da expectativa. Quem não sonha com uma bela aventura? Caramba! Esses Cinco Magníficos eram únicos. Tudo acontecia com eles. Agora tinham companhia. Das boas, duas guias da pesada. Vi mesmo que seus olhos não demonstravam medo. Era o mesmo brilho que já conhecia em todos aqueles que adentram no movimento escoteiro, em busca de grandes aventuras, de grandes atividades aventureiras.

        A noite estava chegando. Estávamos ali a mais de duas horas conversando. Conheci a mãe de Max, uma chefe de escoteiras, que adorava o filho e com um carinho próprio de quem pertence ao Movimento, aprovava tudo que seu filho gostava e fazia no escotismo. Disse-me que ele era um filho exemplar. Boas notas no colégio e sempre uma alegria para seus pais. Max não cabia em si dos elogios da sua mãe. Não demorou e a casa encheu de vários pais, todos dos jovens da patrulha Aconcágua.

     Estavam ali se confraternizando, pois a patrulha os fez aproximar um dos outros. Os pais de Leo e Ned também estavam lá. Seus filhos não. Encontraram outro rumo. Faz parte do crescimento. De uma nova vida. Um dia os filhos se vão e tem de encontrar seu próprio destino. Max e Ned eram grandes rapazes. Sabia que todos podiam confiar neles. Seriam um grande exemplo do que o escotismo pode fazer pelos jovens. Era uma alegria estar ali juntos daqueles pais, tão amigos uns dos outros e cuja aproximação se deu através de seus filhos.

     Já passava da meia noite quando me despedi de todos. Já sabia do programa que os Cinco Magníficos fizeram. No dia seguinte, por volta das quatro da tarde, partiríamos de trem em direção a cidade de Dom Firmino, que ficava bem próxima ao pé da serra. Seriam mais de seis horas de viagem. Por volta de dez/onze horas da noite chegaríamos. Logo pegaríamos a estrada para a serra. Mais cinco quilômetros e chegaríamos ao pé da serra. Se o tempo estivesse bom, iniciaríamos a subida. Até as duas da manhã percorreríamos um bom trecho.

    Achei interessante o programa dos Cinco Magníficos. Agora acompanhados de duas jovens que sabia de antemão, nada iriam dever a eles na coragem, na força na astucia e na audácia que eles sempre possuíram. Dormi o sono dos justos no hotel onde estava hospedado. Acordei com o telefone do Jan lá pelas nove dizendo que se encontrariam todos na estação, na Praça dos Ambequaras. Qualquer motorista de taxi saberia onde era.

    Um bom banho, um bom desjejum e um lauto almoço, me deixaram pronto para enfrentar pela primeira vez uma aventura com aquela patrulha, cuja historia seria contada e narrada em feitos históricos por todos que tiveram a honra de participar e ali passaram boa parte de sua juventude. Fiquei na mesa do hotel, durante meu almoço pensando como o escotismo atrai, fazendo com que jovens e adultos, que como eu já viveram uma boa parte da vida estarem juntos no mesmo ideal. Como dizia a velha canção dos pioneiros que corre de norte a sul nos Clãs do nosso país o que estávamos pretendendo, estava nos versos esplendidos, descritos de maneira tão peculiar e que encantava a todos. Uma exaltação da aventura e o sonho do desconhecido – “A sede de riscos que nunca se acaba, as rochas que a escalar, o rio tranqüilo que canta e que chora, jamais poderei olvidar”. E lá nós íamos. Em uma montanha bem perto do céu!

“quando analisar uma trilha percorrida, nela sempre encontrará o ponto onde errou. Se corrigir os planos, poderá iniciar uma nova jornada.
Tentar outra vez.
Assim também quando caíres. Levanta-te porque só na caí quem não aprendeu a cair. Disso sabe o bebê que aprendeu a andar. O filhote de pássaro que aprendeu a voar.
Não desista de realizar seu sonho. Pode não ter acontecido, pode ter falhado, mas quando tentamos realizar algum de bom sempre conseguimos.
 O maior fracasso sempre foi o de não tentar.
 Se orgulhe em dizer – “Pelo menos tentei”.   


AS LEGENDÁRIAS LENDAS ESCOTEIRAS

Os cinco Magníficos

(Os cinco Magníficos são seniores da patrulha Aconcágua, do 568º Grupo Escoteiro Pico da Neblina. Rotineiramente estarão aqui contando suas epopéias divertidas e aventureiras. Muitas já vividas pelos nossos magníficos seniores de todo o pais. Sejam bem-vindos a patrulha Aconcágua e os cinco Magníficos).

Historia de hoje: A montanha dos sete desejos

Capítulo II

          Uma excelente viagem. Uma camaradagem sem par. Liv e Marly nada perdiam para eles na alegria, na vontade de fazer amigos e todos ali naquele vagão de segunda classe se divertiam com eles. Jogos, canções tudo improvisado com o balanço gostoso do trem. Uma fumaça amiga entrava pela janela. Só quem um dia pode conhecer os prazeres de viajar na “Maria fumaça”, pode entender o que eu estou dizendo.

         Junior, Jan e Max não eram mais calouros. A maturidade de anos na patrulha tinha marcas profundas de amadurecimento. Os passageiros a princípio tímidos e fechados em si mesmo, agora se desabrochavam brincando e cantando com eles. Incrível uma patrulha assim. Acredito que isso era uma tradição de patrulha. Sabia que ela existia a mais de quinze anos. Quem teriam sido seus outros membros? Minha mente vagava pelas brumas que lá fora, pela janela deixavam ver os vagalumes com suas luzes coloridas. O barulho, o matraquear das rodas e espaçadamente o apito do trem me levavam longe.

       Acordei com o Max me chamando. Estávamos chegando. Uma pequena cidade apareceu. Dom Firmino não tinha mais que três mil almas. Tínhamos tudo preparado. Descemos sob os aplausos dos passageiros amigos e partimos para nosso destino final. Sempre me considerei um líder. Direção eu sempre tinha e fazia os outros me seguirem, ali, no entanto aqueles jovens estavam cheio de liderança, e me lembrei do que disse um dia BP, somos uma escola de liderança, mas aprendendo a liderar e ser liderado.

      A estrada, os canaviais ao lado, depois o capim colonião e já aparecia ali o gordura, um capim próprio dos lugares úmidos e frios. Sabia que em breve as samambaias iriam desabrochar a nossa volta. Cinco quilômetros divertidos. Os Cinco Magníficos eram uma patrulha de tirar o fôlego. Agora, acompanhados de duas jovens, nada ficavam a dever das grandes patrulhas de seniores e guias que existem nessa nossa bela terra, do Oiapoque ao Chui.

     Deixamos a estrada e iniciamos a subida propriamente da serra. Ainda um pasto verde, sem arvores. Lembrei-me de uma linda mensagem que foi escrita não sei onde - “Durante a subida, ah! Quantas vezes caio. Ou sou derrubado! Mas não me levo muito a serio nas frustrações e costumo rir de mim, sem perder o amor próprio. Percebo assim, que tenho força para reiniciar a escalada após a queda. Quando aprendemos a rir de nós mesmo em tudo, a subida torna-se mais fácil.”

     Sempre no inicio de uma jornada, a alegria, a cantoria os sorrisos e conversas paralelas dão o tom do humor de uma patrulha. À medida que a subida vai aumentando, os sons vão diminuindo. Já havíamos percorrido bem uns cinco quilômetros de subida. Eram duas da manha. Max sugeriu um pequeno cochilo de três horas. Paramos próximo a uma nascente onde enchemos nossos cantis. Ali naquela grama úmida deitamos sob o olhar do orvalho da madrugada e dormimos.

      Abri os olhos assustado. Estavam em pé, a nossa frente uns quatro homens mal encarados. Nada falavam, não riam, só olhavam. Levantei e os encarei. Procurei os outros, só vi a Marly. Os demais tinham desaparecido. Perguntei de chofre quem eram. – Só queremos o dinheiro. Nada mais! – Ladrões. Um tiro ecoou. Eles olharam espantados e saíram correndo. Não era tiro, era o Junior que estourou uma bexiga. Eles estavam escondidos no matagal próximo. Não deu tempo de nos acordar. Viram-nos quando chegaram de mansinho. Uma patrulha Sempre Alerta!
    
      Coisas da vida. Vivencias. Um mundo difícil. Dinheiro fácil. Isso não era escotismo. Preparamos-nos e partimos para continuar a nossa jornada. Nada nos impediria de chegar ao nosso destino. Não havia medo, não havia duvidas. Em poucos quilômetros de subida, nossa preocupação era uma só. Encontrar a Montanha dos Sete Desejos. O terreno agora era pedregoso, subida forte, muitas vezes ajudando uns aos outros. Eram mais de meio dia, estávamos cansados. Uma parada um lanche, um gole pequeno de água.

      A subida era forte, passo por passo. Liv e Marly eram uma surpresa. Conversavam pouco. Sabiam usar a pouca água que tínhamos. Não reclamavam. Não pediam ajuda. Orgulhava-me delas. Dez da noite. Um pequeno platô e paramos. Max achou que poderíamos descansar até o outro dia de manhã. Logo Marly fez um pequeno fogo e Junior um tropeiro. Um café quente ia bem.

    Conversamos amenidades, claro algumas canções, e cantei para eles uma canção que aprendi em um Jamboree no Canadá. Terra do belo Olmeiro.  Lembranças de um Velho caçador de peles nos grandes lagos canadenses quando voltava para casa sem ter conseguido nada para seu sustento. Dizia mais ou menos o seguinte – “Terra do belo Olmeiro, lar do castor... lá onde o Alce airoso, é o senhor... ao lago azul rochoso, eu voltarei de novo! Era Linda a musica. Quando a cantava, meus pensamentos iam e vinham até os grandes lagos, onde a floresta termina e começam as montanhas geladas do Alaska. 

      Estávamos muito cansados. Dormimos logo naquela linda noite sob as estrelas. Ainda bem que o tempo estava firme e isso nos deu ânimo para prosseguir. Levantamos bem cedo. Liv dessa vez foi quem nos chamou. Mochila as costas, bandeiras ao vento e lá fomos nós montanha acima. Não era um morro, era quase uma escalada. Metro por metro a ser conquistado. Às onze da manhã avistamos um platô onde achamos ser o cume da Serra da Estrela Negra. Em menos de duas horas chegamos. Não havia mais subida, não havia mais nada. Decepção. Onde estava a Montanha dos Sete Desejos?

      Fiquei ali calado, matutando. Os Sete Magníficos não se entregavam. Não sabiam o que era desistir. Desconheciam a palavra desistir!  Começaram a vagar em volta até que o Jan deu um grito triunfal – Achei! Corremos todos para lá. Abaixo a SSW do platô, uma pequena entrada que mal cabia um de nós. Jan não se fez de rogado e adentrou no buraco, logo foi seguido por Marly, Junior, Max e Viv. Claro, eu forcei a entrada e me vi diante de um grande túnel, totalmente escuro. Uma lanterna apareceu na mão de Max. Caminhamos por uns vinte minutos, andando devagar e um claridade imensa apareceu em uma curva do túnel.

    Chegamos à borda de um penhasco imenso onde terminava o túnel, e avistamos o que seria nossa grande surpresa, uma cadeia de picos estonteantes, nevoeiros em volta, nuvens brancas com formatos de pássaros iam ao sabor do vento. Olhamos para baixo, até onde a vista alcançava, grandes extensões de rios e lagos. Difícil descrever. Uma visão maravilhosa. Era como nos estivéssemos aproximando de Deus. Impossível poder contar o que estávamos vendo.  Ficamos ali estáticos. Não havia palavras para narrar o que nossos olhos viam. Se um dia, alguém não crer num Deus supremo, ali estava à prova viva de tudo que existe, na criação do universo, e então me lembrei e como lembrei de que não era nada, apenas uma fração de um momento. Como eu era pequeno ali.  

      Não havia para onde ir. Descer impossível. Atingir os picos distantes seria uma miragem. Agora era só olhar e ficar apalermado com a visão do impossível. Não conseguia descrever e nos meus contos futuros, não saberia o que dizer. Sentamos a borda do penhasco e ali matutávamos o retorno. Então de maneira surpreendente, uma nuvem branca pairou sobre os nossos pés. Liv pisou sobre ela. Firme, como se fosse uma jangada para nos transportar. Sem pestanejar, todos foram a bordo da nuvem. Eu também tinha de ir. Não podia ficar para trás.

     A nuvem nos conduzia de maneira maravilhosa em uma velocidade razoável, como se tivesse um destino certo. Menos de minutos depois avistamos outras centenas ou milhares de nuvens como a nossa, todas transportando uma multidão de seniores e guias, como se ali fosse realizar um grande Jamboree, reunindo diversos países em um só destino e para uma só concentração. Olhe, tenho muitos anos de escotismo. Não sou mais um sênior, sou um escotista. Não podia ser verdade o que estava vendo. Só podia ser uma miragem. Belisquei-me, dei um pulo, outro, vários, mas a visão estava ali na minha frente. Insofismável, verdadeira. Não havia como dizer que tudo não passava de uma ilusão.

     Chegamos ao destino. Um enorme pico amarelo, cheio de luzes, como se milhares de arco-íris resplandecessem em sua volta. Todos nós estávamos em silencio. A nossa volta, jovens uniformizados do Japão, Groelândia, Grécia, Canadá, Estados Unidos, México, Chile países e mais países. Uniformes de todos os matizes, de todas as cores. Um espetáculo extraordinário. Também impossível descrever. Olhávamos uns para os outros sem saber o que dizer.

      Como se fosse transportada em uma aragem de vento, trazendo um perfume inigualável, uma senhora de idade, um rosto fisionômico de extraordinária beleza, cabelos prateados penteados em um coque, um sorriso maravilhoso, um lenço azul brilhante preso a cabeça e com um anel de couro negro trançado prendendo um lenço da Insígnia da Madeira, uma bata branca, e em sua volta milhares de borboletas coloridas se elevou acima de todos. Com uma voz meiga, simples, sem afetação, nos cumprimentou e disse:

- “Bem vindos jovens seniores e guias de todo o mundo. Trago-lhes a palavra do nosso criador. Sabem meus queridos amigos, vocês estão começando uma nova vida. Vocês vieram em busca dos sete desejos. Não existe aqui. Existem sim desejos mil para vocês meditarem e pensarem para ter uma vida melhor. (enquanto ela falava, uma sonata maravilhosa era tocada em um piano, acompanhada de bandolins num lindo arranjo musical),

- Todos vocês subiram a montanha da vida, esperavam encontrar aventuras e quem sabe muito mais. Encontraram sim. Na mensagem simples que o grande arquiteto do universo trouxe para vocês. Que suas vidas se transformem depois desta grande descoberta da Montanha dos Sete Desejos. Pensem e meditem nas palavras que vos trago.

- Escutem essa historia, meditem e pensem melhor qual o rumo que querem seguir. Historia simples, de um jovem que como vocês também passou por inúmeras dificuldades, mas conseguiu vencer todas elas.

- Ao pé dessa montanha, há muito e muitos anos atrás, num rancho simples, ele nasceu. No telhado feito de sapé cheio de furinhos por onde as estrelas entravam, uma delas disse – Seja bem vindo! Ele cresceu e descobriu que havia outra montanha em seu caminho. Cedo ele percebeu que a vida era como uma montanha difícil. Cheia de obstáculos. Mas ele sabia que tinha de subi-la. Mas qual o seu futuro se havia nascido em berço humilde? O futuro ele descobriu, pertencem aqueles que acreditam na beleza dos seus sonhos e que nada acontece a menos que se sonhe antes.

- Então, guardando com amor o saldo de sonhos que sobrou, e como se nada tivesse acontecido, pois o alvo principal de vocês deve estar no topo, aí sim dirão: - Ele é real e é para lá que eu vou. Portanto se um dia for uma pequena nuvem, contentem-se. Não queiram ser a dura rocha que vês lá embaixo, na encosta do mar. Porque a rocha um dia não existirá mais. Serão destruídas por gotinhas d’água que vestida de roupa de nuvem, cairão como chuva e fantasiada de riacho correrão para o mar.

- Mas caso queiram ser um pequeno riacho, não lutes para ser o mar, pensando que por ser poderoso o mar não tem problemas. Todos os têm. O mar ruge e sofre sendo chicoteado dia e noite pelo vento que o impele contra as encostas das montanhas. O vento cavalga e açoita o mar. Mas não tente ser a montanha. Porque o vento que não dá tréguas ao mar, incomoda também a montanha e aos poucos vai destruido-a pelos milênios adiante. Como o vento é poderoso.

- Não, não queiram ser o vento! Outra vez enganam-se. O vento segue a mesma lei do universo. Para existir e ser forte, o vento depende do calor do sol que ao aquecer o ar, o faz nascer. O vento não existirá se o sol não quiser. Assim seja você mesmo, pois o único que não tem limitações é Deus!

- Descubram as qualidades que vocês tem. Os animais de circo diferente dos da floresta, foram iludidos desde filhotes para não saber a força que possuem. O tigre pensa que é um gatinho. Nossa imaginação também é domada por tradições, hábitos e costumes que nos rodeiam desde o berço.

- Quando um problema se mostrar difícil, lembrem-se dessa historia. Havia dois náufragos no mar revolto. Um se debateu lutou continuamente contra as ondas ate esgotar sua energia e afundou. O outro, ao invés de dar braçadas contra o mar, apenas boiou, não gastou energias e pode assim, se salvar!

      Uma emoção sublime tomava a todos. O silencio era total. O tempo era ali uma eternidade maravilhosa. Incrível mesmo descrever a emoção que todos estavam tomados. Ela continuou:

- Quando invadirem em vocês os impulsos da altivez, do orgulho e superioridade, pare e olhe para o mar, a terra e as estrelas que existem há bilhões de anos e entendam – Suas importâncias, seus brilhos, suas superioridades aqui são diminutos se comparados com tudo o que vêem. São poeira perante as estrelas e um piscar de olhos. Mas se ao contrário se sintam pequenos demais, percebam que a vocês foi dado algo que as estrelas não têm. Elas são inanimadas e executam rumos fixos predeterminados pelo Senhor do Universo. Vocês, porém tem vida, podem rir cantar e amar...

- Finalizou dizendo: - Vocês não podem mudar certas circunstâncias ou situações, mas podem adaptar-se a elas sempre, escolhendo a forma do mal menor. Pode não ser o ideal, mas será o melhor. Aproveitem as oportunidades que lhes derem, mesmos que sejam aparentemente pequenas. As grandes árvores vêm de pequeninas sementes.

       Ela sorriu fez a saudação escoteira e foi pairando no ar até desaparecer. Um espetáculo inusitado. Palavras lindas. Tenho certeza que ficou gravada na vida de todos que ali estavam. Olhei para os meus amigos, olhos brilhantes, lágrimas abundantes caiam aqui e ali. Liv e Marly estavam soluçando. Max, Jan e Junior olhavam para os outros, e vi que todas as palavras pronunciadas por aquela senhora estavam marcadas para sempre em seus corações e suas memórias. De repente, uma redundante Palma Escoteira explodiu e ecoou por todo aquele vale, de picos altos e gelados, dados por seniores e guias de todo o mundo como a saudar aquela mensagem que ficariam marcadas profundamente no coração de cada um.

      As nuvens com os jovens ao nosso redor começavam a desaparecer. Sentimos que éramos transportados e logo estávamos no platô onde iniciamos a busca da Montanha dos Sete Desejos. Poderia ter sido um sonho. Um sonho de todos. Entretanto a dúvida persistia. Não foi um sonho, foi real. Insofismável. Tenho certeza que cada um pensava da mesma maneira. Uma mensagem maravilhosa visando o crescimento individual de todos. Agora tinham onde se segurar nas dificuldades da vida, que iriam cercear a escalada do crescimento de cada um.
 
     Descemos a serra, no início taciturno, mas depois a Marly começou a cantar gostosamente, “Avançam as Patrulhas”. O coro ecoou na voz de todos. A serra da Estrela Negra conheceu pela primeira vez a força dos Cinco Magníficos. Para eles não haveriam mais segredos, suas aventuras existiam e iriam perpetuar para sempre. Eles sabem aonde ir, tem sonhos e seus sonhos mesmo que pequenos irão dar a eles o sentido da vida.

      Voltei para minha cidade. Uma viagem simples, mas cheia de recordações que ficarão marcadas para sempre. Agora sabia que aqueles seniores, e também é claro as guias, gostavam e viviam aventuras que eles mesmos sonhavam e elas aconteciam. Magníficos jovens, com um alto Espírito Escoteiro. Seus ideais forjam os homens e mulheres de amanhã. Ali sempre soube e agora comprovava que a lei escoteira era ponto de honra. Só isso era uma garantia que ser sênior e guia vale para toda uma vida, a força que rege esses magníficos exemplos do nosso mundo escoteiro. Quem sabe um dia poderei de novo participar de outras belas aventuras com os seniores e as guias do Aconcágua, aqueles que se intitulam os Cinco Magníficos? Ah! Saudosas esperanças do futuro!

E quem quiser que conte outra...

Quem está disposto a subir grandes montanhas de felicidade deve estar preparado também para descer enormes ladeiras de decepções.
No entanto, a chance de chegar ao topo e sentir algo que o acompanhará para o resto da vida pode valer o risco.

Nota do autor – Muitas das frases, citações entre outras, foram baseadas no livro de John Fellinus, PARA SUBIR NA MONTANHA DA VIDA. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

Bem vindo ao Blog As mais lindas historias escoteiras. Centenas delas, histórias, contos lendas que você ainda não conhecia....