quinta-feira, 9 de maio de 2019

Lendas Escoteiras. Margarida, um jagunço do Sertão. (Uma história quase real).




Lendas Escoteiras.
Margarida, um jagunço do Sertão.
(Uma história quase real).

Prologo: - Minhas histórias têm verdades, tem sonhos, tem simplicidade e tem imaginação. Muitos me perguntam se foi verdade. Respondo que a verdade está na mente de cada um. Sherazade, da antiga pérsia com sua beleza e inteligência fascinou o rei ao narrar histórias fantásticas das mil noites. Dizem que ela teve a vida poupada e ganhou o eterno amor do Rei Shariar! Acreditem se quiserem!

                              - Conheço o caminho disse Boca Larga. Quando Escoteiro eu e minha patrulha entramos na trilha do Lobo e em menos de cinco horas saímos próximo a Malacacheta. Pela estrada do Rei iremos demorar mais de doze horas. Cento e cinquenta quilômetros só de subida. – Cabeçudo o sub Monitor concordou. Ele também já tinha percorrido a trilha do lobo. Unha Grande o intendente ficou em duvida. – Tem quanto tempo que vocês passaram por lá? Dois três quatro anos? Será que a trilha ainda existe? - Nariz Longo o Monitor pensava no que todos diziam. Cabeludo o cozinheiro nunca dizia nada, sempre calado. - Se formos iremos em cinco. Dedo Duro não vai, seu pai vai viajar e resolveu levá-lo consigo. Esta jornada não estava no programa. Foi o Chefe Sansão quem nos disse que soubera de um novo Grupo Escoteiro em Malacacheta. – Porque não vão lá e confirmem se realmente tem um Grupo Escoteiro? Afinal fazer novos amigo escoteiros não vale a jornada?             
                      
                                Ninguém nunca tinha ido a Malacacheta. Seu Tonico motorista do ônibus foi quem nos contou como era o caminho. – Olhe são quase cento e cinquenta quilômetros. O ruim é que é subida e descida. Tem a Serra do Quati que têm bem uns quatro quilômetros só de subida. Nariz Longo pôs em votação. Vamos pela estrada ou pela trilha do lobo? Todos votaram pela trilha. Se fosse verdade o que Boca Larga disse iriam fazer o trecho todo em menos de cinco horas. Tudo combinado, ração B para três dias, duas barracas de duas lonas, um caldeirão e uma caçarola, facão e machadinha. Às oito da noite de sexta feira partimos. A trilha margeava o Rio Doce um velho amigo conhecido. As duas da madrugada fizeram uma parada. Noite estrelada e uma lua cheia no céu. Não montamos barraca. Iriamos dormir sob as estrelas.

                                Uma sopinha fumegante logo apareceu. Uma fome danada. A madrugada ia brava e foi então que fomos surpreendidos. Apareceu de surpresa sem se anunciar. Estava ali a nossa frente em pé. Um homem magro, barbudo, uma fileira de dente cariados. Usava perneiras, pois era uma região espinhosa. Chapéu de couro. No ombro seu fuzil inseparável que ele chamava de Loló. Amarrado na barriga um enorme colt 45. Depois fiquei sabendo que em cada perna tinha um punhal escondido. Quem seria? Todos nós ficamos preocupados.

                      Posso me adentrá? Falou baixinho. Olhamos espantados. Ele sério. – Me chamo Margarida, dá para comer com vocês? – Claro eu disse. Ficamos de olho e atento no que ele ia fazer. Coragem? Nada disto, mas dizem que ficar alerta faz bem em toda e qualquer ocasião. Sentou tirou um prato sujo do seu bornal e Boca Larga encheu. Comeu feito um danado. Não pediu mais. Só água. Tínhamos café no bule esquentando no canto do fogão tropeiro. Bebeu com gosto. – Falou pouco. Meu nome é Margarida, meu pai me deu. Nunca mudei. Por causa dele matei muita gente. Se me chamam sem rir, tudo bem se derem um risinho esquento o bucho dele. – Olhei para Unha Grande e ele piscou. Queria rir. Meu Deus! Não deixa rir!

                     - Não precisam ficar com medo. Me trataram bem. Vou embora lá pelas cinco da manhã. Podem dormir tranquilos. Enrosquei em minha capa preta em volta do fogo. – Você nasceu onde? Perguntei. – Em Barra Dourada. Próximo a nascente do Paraopeba. Lembrei-me do rio. Cascalho imundo. Pobre do rio. Estragaram ele tentando achar um ouro que não tinha. Até hoje as máquinas estão lá sujando o rio. Cabeludo perguntou: - Matou quantos Senhor Margarida? – Não me chame de Senhor! Disse. - Putz grila! Pensei. Mas se quer saber matei mais de dez. Muitos porque riram do meu nome. Meu pai me batizou assim. Queriam uma menina e nasci macho. Agora não tenho onde ficar. A policia de captura sempre está atrás de mim.

                       Fiquei calado. Nariz Longo me olhava e piscava os olhos. Margarida desconfiou. - Porque esta piscação? Nada Seu Margarida. Nariz Longo tem um defeito na pálpebra. – E que merda é esta de pálpebra? Danou-se! Custei para explicar. Comecei a tremer. Margarida passou boa parte da noite sentado. Eu não consegui dormir. Fingia que dormia. Às cinco da manhã juntou suas coisas, um bornal que devia levar suas balas, seu fuzil e já ia partir quando dei ele um farnel de biscoito de polvilho. Agradeceu, ficou em posição de sentido, gritou Sempre Alerta e partiu sem sorrir. Consegui cochilar até as seis. Ouvi um tropel de cavalos. Cinco soldados e um Capitão. Deviam ser da tal policia de captura.

                       Ninguém apeou. O Capitão perguntou gritando: – Viram um jagunço magro, barbudo, armado até os dentes por estas bandas? E agora? O Escoteiro tem uma só palavra falar o que? – Não Senhor. Chegamos aqui às duas da manhã. Só deu para fazer uma sopinha um café e já íamos partir. – Vão para onde? Malacacheta Senhor Capitão. Fazer o que lá? Visitar um novo Grupo Escoteiro! Nos olhou como quem não acredita. – E tem Grupo Escoteiro lá? – Nosso Chefe disse que sim! Nos olhou ressabiado deu até logo e partiu. Pegamos as bicicletas, arrumamos tudo e quando íamos partir um barulho no mato e surgiu Margarida. – Ainda bem que não disseram nada, falou. Estava com a Loló (fuzil) armada e se dissesse que me viram iam levar uns tiros no rabo!

                     Foi embora cantando. “Sordado marvado, sai da carçada que lá vai porva!”. Resolvemos voltar para nossa cidade. O Chefe Sansão que nos desculpasse. Para dizer a verdade eu estava com as calças toda molhada e outros com elas borradas. Não dava mais para prosseguir. Nunca mais ouvimos falar de Margarida. Do capitão não. Era famoso. Quando a cadeia enchia, pegava uns ladrõezinhos de fancaria colocava em fila e saiam pelas ruas da cidade e fazendo-os gritarem – Roubei galinha! Roubei o porquinho da dona Noêmia. Depois soltava. Pois é. Seis meses depois recebemos a visita dos Escoteiros de Malacacheta. Não acreditaram em nossa história, mas conheciam Margarida. Ficamos amigos e fomos varias vezes na cidade deles a convite. Bons tempos, tempos que uma bicicleta ou um Vulcabrás nos pés nos levava a aventuras inimagináveis. E Margarida? Sumiu no mundo.    

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Era uma vez... Em uma montanha bem perto do céu...

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