sexta-feira, 22 de junho de 2018

Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro. “Tarde demais para esquecer”. Uma janela no meu trem para lembrar.



Crônicas de um Velho Chefe Escoteiro.
“Tarde demais para esquecer”.
Uma janela no meu trem para lembrar.

                         Os ponteiros do Relógio atravessaram pausadamente o dia. A tarde chegou e se foi. Há noite vem chegando. Olho pela janela ainda com o sol tentando se sobrepor entre as nuvens. Ainda repouso quieto de olhos abertos em minha cama tentando recuperar as forças que havia perdido nestes últimos dias. São coisas de velhos principalmente os escoteiros que ainda acreditam estar subindo em uma montanha como se fosse aquele jovem menino de outrora. Roda vida a procurar um ponto qualquer no passado para ver tem algum importante para relembrar. Fechei os olhos devagar, uma música suave veio ao meu encontro. Que música era aquela? Lembrei-me de Cary Grant no seu papel de playboy mulherengo e Deborah Kerr uma ex-cantora que viajando em um cruzeiro para a Europa, se conhecem. Apaixonam-se. Mas precisam dar novo rumo as suas vidas e combinam encontrar seis meses após no alto do Edifício Empire State. Se ambos aparecerem o amor é verdadeiro e se casarão. “Tarde demais para esquecer”!

                       Não resisto às lembranças. Não tive um amor tão grande assim em minha vida. O que tive até hoje estamos juntos e felizes. “Affair To Remember” me marcou muito. A música foi entrando em meu ser. Dominando-me, me senti tonto, inebriado. O piano deslizava em minha mente tal qual um por do sol na Montanha da Lua onde tantas vezes acampei. Viajei no tempo. Na fila do Cinema Palácios, de braços dados com a Célia. Íamos assistir finalmente “Tarde demais para esquecer”. Não sabia o que íamos ver, não fazia ideia. Sou emotivo demais. Quando no final ele não a encontrou no Empire State chorei. Ainda não fazia ideia porque ela não foi. Um trágico acidente deixando-a paraplégica a impede de ir ao encontro. Ela toma um rumo emocionante e incerto. Saí do cinema perdido em conjecturas e nenhuma me agradava. Não seria eu o Leo McCarey o diretor para mudar tudo no final. Eu era apenas um Escoteiro, emotivo, noivo, amante de sua linda e futura esposa e que vivia a sorrir e cantar na natureza.

                         Agora me vejo sentando em uma poltrona viajando no meu trem do passado. A janela aberta, a fumaça volta e meia entra no vagão de primeira classe. Não reclamo. Adoro amo esta fumaça que até hoje me faz uma falta enorme. Ajeito o travesseiro para aceitar melhor. Minha cabeça fica zonza, pensando e pensando. Meus olhos se firmam na paisagem que o trem vai me mostrando em cada curva que faz. Um pontilhão me assusta. Sorrio. Pego de surpresa. Quantos pontilhões passei na minha infância? Correndo com medo de o trem chegar... Ah! A janela não para de me mostrar um passado, mas a música o piano gostoso, a melodia do filme que me marcou entra em meus poros. No final da passagem do túnel do Corcel perto de Derribadinha vejo-me ali, em pé, segurando meu cavalo de aço junto aos meus outros cinco companheiros. Esperando o trem passar para adentrar no túnel desconhecido.

                         O piano cessa. A melodia fica a parafusar minha mente. Preciso ouvi-la novamente. You tube? Sim! Vou lá. Ela volta agora e me refastelo na cama, minha cabeça repousa no travesseiro e minha mente de novo viaja naquele trem que me leva ao passado. Lembrei-me de Gilwell. Por quê?  Afinal “Na Affair To Remember” não tem nada do escotismo que amo. Quem sabe será porque me sinto Velho e fraco e preciso voltar? Voltar onde? Em Gilwell, no tempo? Assistir novamente o filme da minha vida? Minha mente embaralha. Já nem sei mais o que pensar. Volto novamente ao meu trem. Minha janela. A fumaça branca entrando. Meu paletó branco era macio como leite em calda. O trem vai diminuindo sua marcha. Entra na estação e vejo em algum canto da estrada a garotada correndo sem parar jogando uma pelada com bola de pano. Alguém grita: - Amendoim torradinho, doce de leite e cocadas! Comprem é barato!

                         O trem já vai partir. – Alguém diz com voz chorosa: - Não quer ir comigo? Ela responde chorando... Desculpe sou feliz aqui! Um grande amor interrompido? Minha mente volta ao Empire State. E ela? Mesmo em uma cadeira de rodas ainda pensa em casar com ele? Não sei. Não quero contar. Filmes são assim, trilhas sonoras inolvidáveis. Um piano tocante quem sabe na Floresta do Tenente, lá muito longe onde acampei. Alguém toca baixinho para mim “Na Affair To Remember”. Sento-me na porta da barraca. Uma noite linda, o céu salpicado de brilhantes estrelas. Cai uma brisa vinda da Lagoa dos Peixes dourados. Tudo é encantamento. Noite romântica mágica repleta de felicidade. Fecho os olhos, minha viagem vai chegando ao fim. Levanto-me meio tonto da minha cama. Olho pela janela, daqui a pouco vai chegar à madrugada. No meu trem ouço alguém dizer na estação final: - Muito obrigado meu jovem cavalheiro e escoteiro, muito obrigado por esta bela viagem. Desço do trem. Vejo-me fardado, na mão o meu chapéu de abas largas. É noite alta, lágrimas em meus olhos mostram que ainda penso no grande amor de Deborah Kerr e Cary Grant.

Nota – Apenas uma lembrança. Não é um conto e nem uma história. Nostalgia saudades que chegaram em um dia difícil de passar por ele. Os mais velhos irão lembrar-se do filme os mais novos poderão um dia conhecer um amor impossível de acontecer. “Tarde demais para esquecer” bateu forte em mim. Afinal sempre fui emotivo com histórias de grandes amores. Os poetas tem suas escolhas para definir a passagem de um grande amor em cada vida. Dizem eles que há sempre alguma loucura no amor. Mas a sempre um pouco de razão na loucura! Tenham uma excelente noite!

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